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Descobrindo Penelope
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Ebook267 pages7 hours

Descobrindo Penelope

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About this ebook

A escritora de romances Penelope Eames, de trinta e três anos, muda-se para a Espanha para evitar seu pai opressivo e o irmão viciado em drogas, Dermot. Quando ela conhece Ramón, um jovem professor espanhol, ela é imediatamente atraída por ele e sente que a felicidade que a escapara durante toda a sua vida pode enfim ser sua. Entretanto, ela recebe um pedido de socorro de Dermot, dizendo que ele está à mercê de Charlie Eliot, um cafetão e traficante de drogas na Costa. Ramón, cuja mãe foi morta por um viciado em drogas, diz a ela para manter distância de Charlie Eliot. Penelope tem que decidir: ela está preparada para se comprometer com Charlie Eliot e colocar em risco sua chance de felicidade com Ramón por causa de seu irmão viciado?
LanguagePortuguês
Release dateOct 27, 2014
ISBN9781633393240
Descobrindo Penelope

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    Descobrindo Penelope - James Lawless

    Livro

    Também por James Lawless

    Novelas

    Peeling Oranges

    For Love of Anna

    The Avenue

    A avenida

    (tr. Cristina Benassy Costa)

    Finding Penelope

    Poesia

    Rus in Urbe

    Critíca

    Clearing The Tangled Wood: Poetry as a Way of Seeing the World

    Iluminandi a floresta obscura: A poesia enquanto visáo de mundo 

    (tr. Marcella Mattar)

    ‘Eu nunca fingi oferecer tal literatura como um substituto para um charuto ou um jogo de dominós para um homem ocioso.’

    Robert Browning.

    Para Marguerite e Ava

    Prefácio do Autor

    Além de lançar um olhar irônico ao fenômeno chick-lit e tratar do papel do patriarcado em uma família, o romance Descobrindo Penelope é essencialmente uma história de amor que marca o crescimento na autorrealização da protagonista Penelope Eames. Mergulha na cultura de drogas e da criminalidade a ela associada, na Espanha (onde muito dinheiro do Tigre Celta acabou lavado), na Irlanda e no Reino Unido. A inspiração para o romance veio de Cervantes e um tema pode ser interpretado como uma espécie de paralelo moderno ao ataque de Don Quixote à proliferação de romances da época. Como setenta por cento dos leitores agora são do sexo feminino, eu queria entender mais sobre a mentalidade feminina. Então usei as ideias das mulheres que conheço, incluindo duas filhas adultas e pesquisei escritoras contemporâneas e livros como Everywoman e reli com olhos de mulher (ou pelo menos andróginos) meus já gastos Beauvoir, Anna Karenina e Retrato de uma Senhora. Simultaneamente, eu estava estudando a cultura do crime na Costa. O resultado é a personagem Penelope Eame

    ––––––––

    1.

    Ela ouve a voz na areia, grave e autoritária como a de seu pai. Pressione o botão e rejeite, esta sou eu, ela pensa, Penelope Eames, é assim que eu me sinto, ou melhor, como eu fui levada a me sentir ao longo dos anos, por ele. Ah sim, o antes estimado professor de Histologia e Anatomia Patológica com livros didáticos e artigos eruditos em seu nome, que não sabia ensinar compaixão ou amor filial. O sol espanhol da manhã a está embalando, fazendo-a meditar sobre coisas, coisas que ela havia decidido que pertenciam ao passado agora, a outro país. O topo de seu seio esquerdo está queimando levemente, o novo biquíni vermelho mais sumário do que o seu habitual maiô preto (ela devia ter pensado nisso), e então a pele está mais sensível lá, após ela ter entrado na faca. Foi Sheila Flaherty, sua agente, quem ironicamente lhe sugeriu que colocasse os implantes – seus seios eram de tamanho médio. ‘Bom para sua imagem’, Sheila havia dito.

    Ela ficou relutante, a princípio, considerando uma vaidade vestir a máscara de anestesia e submeter-se a uma chacina não essencial de si mesma (ela nunca nem mesmo havia passado tinta no cabelo, pelo amor de Deus). Sheila havia feito aquilo há um ano, transformando-se na loira turbinada que era agora. E para quê?

    Para os homens.

    Sim.

    Foi quando descobriram o caroço em seu seio esquerdo. Muito jovem para aquilo, a enfermeira havia dito, e Sheila tentou fazer uma piada daquilo - você é o caroço que saiu, eu sou o que ainda está aqui,’ e a enfermeira a ensinou o autoexame.

    Ela ouve a voz na areia, a rouquidão do fumante fedendo a pseudossabedoria; ele pensa que é o melhor de todos. ‘Não, meus queridos,’ a voz (claramente inglesa) está dizendo; ‘ao contrário, roer unhas é bom para vocês; ricas em proteína, sabe? Se eu pudesse alcançar minhas unhas do pé, eu...’ Homens, velhos estúpidos, mas talvez haja um humor ali – quem pode explicar gostos? Ela ergue os olhos timidamente sob seu chapéu de palha e localiza de onde a voz vem: aquele cara velho a alguns metros de distância, com o rabo de cavalo prateado, sentado sob um grande guarda-sol na cadeira de lona. Ele está discursando a um bando de beldades bajuladoras – assim como ele. Tentando parecer jovem como um hippie renascido ou algo antiquado, como ele, os olhos azuis de ardósia, seu pai escrito.

    Exceto, claro, pelo rabo de cavalo.

    A fina areia de cor castanha que ela escorre livremente entre seus dedos, deixando escapar, facilitando sua vida. Ela está protelando. O sol a fez ficar preguiçosa. Ela deveria estar de volta à quietude do seu apartamento para trabalhar naquele recalcitrante segundo romance, antes que o sol alcance seu apogeu. Ela sabe disso, e evitar uma queimadura. Há um som de risada. Ela pode distinguir através das crescentes ondas de calor: rapazes sorridentes (o mais bronzeado é o salva-vidas? Ela pensou tê-lo visto mais cedo em seu elevado) e duas mulheres entre eles, jogando vôlei, enquanto ela olha para o sol sob a proteção de sua mão (porque ela tirou o chapéu, que estava lhe raspando a testa).

    Ela não havia percebido a rede antes. Há gritos, em espanhol, de ‘anda’, e ‘olé’ se misturando ao discurso do velho. Os jovens, em um véu de luz e calor, estão rindo de uma menina usando apenas a parte de baixo do biquíni, que acaba de errar a bola. O comentário mordaz. O que sempre emanava de seu pai. Ela queria que ele tivesse orgulho dela como ele tinha de Dermot, seu irmão caçula, quando ele começou sua licenciatura em ciências. Oh, quantos elogios. Um cientista na família. Misturando produtos químicos e poções no Laboratório de Quinlan. Quão certo, quão profético ele era. E anteriormente seu primeiro livro, no qual ela se enfiou, ela tinha certeza de que ele ficaria orgulhoso; ela esperava – seu primeiro romance a ser publicado – mas tudo o que ele fez foi se perguntar o que poderia ser feito daquilo, de ela escrever, como se isso fosse uma das suas patologias estudadas.

    Seu braço direito está ficando dormente por ela estar deitada de lado. Ela se vira. O Svengali das unhas roídas está chamando as garotas para sair do sol. Elas estão tagarelando em diferentes línguas – principalmente russo, ela acha – entre elas, e em um inglês fraco e recortado com ele. ‘Vocês vão fritar lá fora, minhas queridas.’ Ela pode vê-lo claramente agora, pois ele está olhando pra lá e pra cá, seu rabo de cavalo balançando como um pêndulo. E as garotas vêm correndo. E ele se senta em sua cadeira como um rei em seu trono, seu harém aos seus pés, e a loira que estava jogando vôlei sem a parte de cima – a vadia sem vergonha. É diferente deitar de bruços fazendo topless, Penelope se convence, com a toalha pronta para cobrir qualquer movimento necessário, mas exibir-se daquela maneira a homens esportistas e ele falando sobre unhas... Realmente! As garotas estão ignorando as provocações dos garotos do vôlei para irem jogar; elas estão concentradas no homem maduro, nitidamente babando nele. Ele é algum cara rico? É isso? Elas estão atrás do dinheiro dele, ou talvez ele seja algum poderoso diretor de cinema – a cadeira, afinal de contas, em seu tecido de lona, pode ser interpretada como diretorial. Elas estão procurando por papéis; é isso, para se tornarem famosas em seu próximo filme. E o devasso de cabelos cromados puxa a cordinha da calcinha do biquíni da garota mais próxima.

    Seu pai sempre chamava por Dermot, nunca por ela, quando ele queria alguma coisa, fosse para anunciar ou para confidenciar, ele fazia seu vínculo com Dermot. Dermot, o cientista, o filho orgulhoso, o viciado em drogas – escolha o que você quiser. Ah sim, o pai não sabia. Em um momento de orgulho ferido e muita inveja, que ocorreu quando ele o chamou, ela pensou em contar para o pai, tirar o irmão do pedestal em que estava, e revelar a ele o que o seu garoto platinado realmente vinha fazendo em todos aqueles anos de cegueira. O hábito da cocaína que começou depois da morte da mãe, nas festas da faculdade, o círculo social da elite de Dublin (alguns dos quais, menos sagazes, estão reduzidos, como Dermot agora, à sarjeta). A sociedade da admiração mútua, era do que ela chamava, de todo o talento e inteligência de neófitos advogados e dentistas e financiadores, e cientistas, um verdadeiro turbilhão de brilhantismo em um país emergente.

    Mas ele chamou por ele, ao primeiro sinal de fracasso, por esse drogado. Era como um desprezo a ela, uma rejeição a alguém que havia tomado conta de suas necessidades o tempo todo.

    Todas aquelas necessidades. O tempo todo. Todas aquelas exigências. A vida inteira. Os melhores anos.

    E a última vez que Dermot veio – Penelope o havia encontrado com a ajuda da unidade de narcóticos, em um lugar destruído: uma estrada, ela não conseguia lembrar o nome daquilo – a estrada de Crow, era isso, repleta de garrafas e seringas e fezes e um odor pungente de urina que estava preso na rua estreita por enormes edifícios, para que, ela pensou, os drogados pudessem encontrar o caminho para casa, como animais, seguindo seu próprio cheiro.

    Algumas vezes ela desejava que ambos sentissem a dor dela, por todos aqueles anos, não de negligência material – ela nunca passou necessidade nesse aspecto – mas por todos os anos de indiferença. Deve ser o mais cruel dos ferimentos a infligir em alguém, ela considerava, fazer algo inconsciente ou indiferente ao dano que isso causaria: impor a alguém habituar-se à inutilidade.

    Mas – e ela baixa os olhos para suas unhas se contorcendo, como em coro aos seus pensamentos – ela não é inútil. Ela é uma escritora. Ela escrevia para costurar os ferimentos, para procurar afirmação de outras fontes. O grande mundo lá fora.

    Ela teve sua primeira história publicada em uma revista adolescente. ‘É muito promissor, o editor havia dito. A história era sobre uma garota órfã. Sobre o que mais poderia ter sido? ela pensa, olhando para trás, tolerando o calor do sol mediterrâneo agora no auge (persuadindo-a a permanecer). E então o primeiro romance, muitos anos depois. Cheiro de Rosas, um romance sobre os anseios não realizados de uma jovem, até que ela conheceu o negro estrangeiro em uma praia exatamente como esta, alimentando o que o seu pai considerava imaginação frenética de fêmeas impressionáveis.

    Os homens, ela pensa, enquanto as ondas batem ritmicamente (ela vai se aventurar na água, em breve; ela está suando; ela pode sentir as gotas escorrendo por seu decote). Ela foi capaz de largar o emprego – o seu último emprego onde ela havia trabalhado como guia turística temporária em um museu de Dublin, depois de uma jornada desastrosa anterior em um banco e ainda antes, uma passagem pelo Telesales. Ela havia vagado por um curso de Artes mas não soube o que fazer depois dele; não tinha ninguém para guiá-la. ‘Qualquer pateta pode se formar em Artes’, seu pai disse, e aquele era o fim de tudo o que lhe dizia respeito. Em contraste, ela se lembra de algumas de suas colegas de faculdade com suas carreiras traçadas, perseguindo única e exclusivamente uma carreira na mídia ou no corpo diplomático ou mais tarde apareciam em colunas sociais, casando-se com algum advogado ou dentista rico.

    Ela comprou um apartamento na Costa Del Sol sob a recomendação de Sheila (‘Um país tão romântico’) com algumas economias que ela tinha, estimulada pelos royalties de seu primeiro livro e o adiantamento pelo próximo. Uma sequência, bem, não necessariamente, mas na mesma veia, mais do mesmo, é o que eles disseram, não se mexe em time que está ganhando. Outra história de amor, talvez com um pouco mais de excitação, desta vez, sim, é o que eles disseram. Ela podia ser mais ousada neste segundo livro – é o século 21, afinal, Sheila disse, como se Penelope já não soubesse disso. Não exatamente um rasgador de lingeries, não, não estamos buscando isso, mas escrita de qualidade e expressão sincera, estas são as coisas que estamos buscando em um romance para a mulher independente de hoje, que não tem medo de se aventurar et cetera, et cetera. Mas há um problema desta vez: a mente de Penelope está agitada. Afinal, o primeiro romance foi completado antes da morte de sua mãe e antes que Dermot realmente tivesse ido ladeira abaixo. Uma mente precisa, se não de estabilidade, pelo menos a semelhança disso, para escrever. Ela tem trinta e três anos, agora, e tem que pensar em seu futuro. Todo o tempo antes disso, por causa da condição que seu pai lhe impunha (ela culpa isso), ela não pensava no que ela queria, mas no que os homens exigiam. Mas não mais. Melhor não ter se amarrado de jeito nenhum do que dolorosamente sofrer depois, como sua mãe havia feito – tanto amargor, e ela era testemunha daquilo tudo. Penelope Eames havia sofrido toda a gama de emoções negativas antes de sair da adolescência, sem ter que colocar um pé fora de casa.

    Ela sente uma palpitação quando o Sr. Unhas dobra sua cadeira preparando-se para sair. É como se ela já estivesse sentindo falta dele, de uma forma doentia, o pai dela que está minguando agora, ela deve admitir, de qualquer maneira. Ela teme soltar-se das correntes. Querendo e temendo ao mesmo tempo. Como ela havia saído? De que maneira? O teimoso e desafiante ‘Vá se quiser’ dele, seguido pelo louco ‘Onde você pensa que vai?’ E ele se recusou a ir para a simpática casa de repouso em Booterstown, que ela poderia ter lhe arranjado. Deixar alguém tomando conta dele, ocupando o seu lugar. Mas ele não queria isso. Sempre ganhando a batalha moral, para fazer a culpa ficar sobre ela.

    O Senhor Unhas dobrou sua cadeira, sua camisa berrante se agitando, revelando um bosque de pelos crespos em seu peito magro e bronzeado. Ele está indo embora, a linha na areia com a marca de sua cadeira já desaparecendo, enquanto seu harém se dispersa.

    Ela deve voltar também, e deixar o mergulho pra lá. Mas como escrever, se concentrar, não sabendo onde Dermot está, seu único irmão, seu caçula. Ela pensou que fosse ser fácil, apenas ir embora e deixar tais preocupações para trás, mas não é tão simples, ela percebe agora; porque estes pensamentos também viajam e encontram seus próprios ancoradouros. Dermot começou seu ato de desaparecimento depois da morte da mãe; ele desaparecia durante dias, durante semanas no final, e então reaparecia do nada com suas roupas sujas e esperava que ela fosse sua empregada, enquanto ele relaxava, da mesma forma como ela fazia para seu pai. Penelope cuidava de Dermot; aceitava isso no começo, da mesma forma como sua mãe. Mesmo saber onde ele estava, não importa qual angústia pela qual ele pudesse estar passando – é autopunição, afinal. Mas seria um alívio; descansaria sua mente, apenas saber que ele estava bem, ainda na linha, conforme ela havia tentado colocá-lo antes de ir embora, porque ela não podia, em seu coração, tê-lo abandonado insensivelmente na condição em que ela o encontrou na estrada de Crow. Ela o trouxe para a unidade de reabilitação de drogados, na Merchant’s Quay antes que ele percebesse para onde estava indo, dirigiu até lá, ela lembra, para repugnância do motorista de taxi. Depois de alguns dias de sua bajulação (ela ainda sente os esforços disso), e em um curso de metadona, ele vagarosamente melhorou. Ela o enfeitou com um terno e gravata, arrumou-lhe um emprego, não em um grande cargo científico, não, nada disso agora, mas um trabalho de meio período em um Supervalu, sem licença. Ela conhecia o gerente de lá, que havia trabalhado com ela na Telesales. Foi tudo muito apressado, mas pelo menos serviria para mantê-lo longe das ruas antes de ela ir embora para a Espanha.

    No dia em que ela estava partindo, ela lhe deu seu número de celular e seu endereço.

    ‘Você está me abandonando, porra’ ele disse, tentando fazê-la sentir-se mal, exatamente como seu pai havia feito.

    ‘Se algum dia você quiser me visitar...’

    ‘Ha.’ O escárnio.

    ‘Falo sério, Dermot...’

    Mas ela não falava sério, ela sabia, enquanto olha para a água cristalina.

    Não, ela ainda não havia se estabelecido aqui, apesar da aparente tranquilidade das redondezas: as colinas, as praias macias, suficientes para prover o bálsamo, mas não a tão sonhada obliteração. Mas ela está há apenas alguns dias aqui, afinal; a pessoa deve dar tempo ao tempo para se beneficiar de seus poderes curativos. Sua pele mal havia mudado de cor; ela ainda está com o rosto pálido. Quem costumava chamá-la assim? Dermot, sim, cara pálida, ele costumava dizer, e ele ironicamente estava sempre mais pálido do que ela. Ela pretende ficar três meses completos, pelo menos, o que Sheila havia recomendado. E quem sabe ela fique mais. Quem sabe? Ela pode até mesmo ficar permanentemente; afinal, quem quer voltar para o que ela havia deixado para trás. Mas um período de três meses de gestação é necessário para fazer incursões em um romance, Sheila havia dito, pensando que essa era a sua única razão para sua mudança para a Espanha, pois Penelope nunca revelara as intimidades de sua família para ela. Uma vez que aquela incursão inicial estivesse concluída, Sheila disse, tudo pode ser arrumado em uma sombria Dublin, durante as escuras noites de outono. ‘E o gelado inverno’, Penelope acrescenta mentalmente, encontrando um consolo masoquista na tristeza de uma canção. E ela olha agora para o céu da Espanha e se deslumbra com a luz. Mas – e um pânico a assola – ela não havia feito nenhuma invasão, nem mesmo a menor investida nessa carapaça da imaginação, e nada para constituir o final feliz que é de rigor para seus editores. ‘Deus sabe’, Sheila disse, ‘que há mistério suficiente no mundo, sem que precisemos usar nossa imaginação. Escreva este final feliz primeiro e, então, volte e conte os obstáculos.’

    Então o que devo fazer? ela se pergunta. Quais são os obstáculos para a felicidade?

    A própria vida dela agora.

    Ela não pode ficar se preocupando com Dermot. Ele tem quantos anos? Vinte e cinco anos, pelo amor de Deus, em junho, um quarto de século. E ainda as palavras: ‘Eu quero sair dessa, quero sair dessa’ que ele ficava repetindo na estrada de Crow, estão assombrando-a agora, o choro dele, que lhe parecia rebelde mas sem esperanças, aquela vez que ela o encontrou esparramado naquele beco lodoso, gritando para o mundo que ele queria sair. Oh, será que ele reincidiria para aquele estado novamente? Este é o medo que a está assombrando. E sua mãe, onde estava ela durante toda sua malformação filial? Ela estava em uma jornada metafísica de sua própria incapacidade, abafada pelo

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