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O coração é um predador solitário
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Ebook36 pages26 minutes

O coração é um predador solitário

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Sobre o autor

João Manuel Rosado Barreiros (n. 1952), é um escritor, editor, tradutor e crítico português de ficção científica, sendo um dos poucos exemplos de um autor de ficção fantástica com uma carreira longa e activa.
As suas obras encontram-se traduzidas para Francês, Espanhol, Inglês, Italiano e Sérvio. É autor de pelo menos meia centena de histórias, tanto em formato novela, como noveleta e conto. “O coração é um predador solitário” pertence ao universo Electropunk, criado por este autor para a antologia Lisboa no Ano 2000 e foi prémio Adamastor em 2014.

LanguagePortuguês
PublisherImaginauta
Release dateFeb 8, 2015
ISBN9781311330109
O coração é um predador solitário

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    O coração é um predador solitário - João Barreiros

    Pela madrugada, Eduardo Sequeira acorda com Herr Schmitt a gritar-lhe aos ouvidos, prisioneiro do demónio que o capturou. Hilfa, hilfa, como se o colector de destroços pudesse fazer alguma coisa, salvar da morte alguém que já perdeu o corpo físico. O adversário germânico morreu nos abismos, morreu no ventre da Serpente, e agora nada mais resta dele do que um fantasma eléctrico a passar e a repassar nos circuitos do fio de memorex do Coração capturado. Infelizmente o cérebro de Eduardo encontra-se em sintonia involuntária com o horror que arrancou aos abismos. Está prisioneiro de um acto secreto para o qual não há esperança redentora.

    Sentado na beira da cama desfeita, assolado pelos clarões dos relâmpagos que transformam os céus ainda obscurecidos pela tempestade, Eduardo estremece, rói os nós dos dedos, pede silêncio a que não lho quer dar, e fica assim, meio deitado, a ouvir os gritos de uma electroforma que lhe quer mal, um eco sonoro de raiva, medo e desespero.

    Por fim levanta-se, bebe um golo de schnapps da garrafa quase vazia que deixou caída ao lado da cama, coça a barriga, espreita pela janela entreaberta que dá para os armazéns que se estendem até ao mar, e fica a ver as luzes distantes dos cruzadores, cargueiros, corvetas, que cruzam a baía de Cascais rumo à vastidão labiríntica das docas de Alcântara. A casa inteira dorme ainda num sonho inquieto que tem vindo a crescer desde que arrancou aos abismos um pedaço de maquinaria de uma complexidade que o ultrapassa. Uma chuvinha miúda, pegajosa, repleta de grãos de cinza, cola-se aos telhados, transforma o empedrado das calçadas numa armadilha escorregadia, boa para quebrar as pernas a quem não tomar o devido cuidado. Da altura do terceiro andar, Cascais tem o aspecto soturno de uma vilória de pescadores que cresceu demasiado. Afastaram-se os burgueses e a fidalguia para as paragens mais viçosas do Estoril. As casas senhoriais que ainda restavam foram compradas pelas Companhias de Pesca & Recuperação de Carcaças. Eduardo Sequeira vive numa delas, no terceiro piso reservado à habitação, mais os pais e quatro irmãos ainda infantes. No segundo, existem os escritórios e os gabinetes de apoio técnico, de momento desertos. No rés-do-chão, protegidos por portas

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