Nossa História de Amor
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About this ebook
Este livro conta as memórias e experiências vividas pela autora, Fernanda Armoni, e pelo seu marido Shlomo Armoni.
Ambos nasceram no Cairo na década de 1920. Durante a sua juventude, foram perseguidos por motivos políticos e acabaram fugindo do Egito.
Durante essa jornada, enfrentaram grandes dificuldades como prisão, guerras, revoluções e até doenças graves, porém apesar de tantas adversidades o seu amor perdurou até o fim.
Fernanda Armoni
Fernanda Armoni nasceu no Cairo em 1925 e estudou formalmente até os 12 anos de idade. Estudou por conta própria Francês, Inglês e Português aprimorando e dominando essas línguas e a sua literatura.Ainda no Egito casou-se com Shlomo Armoni e ambos imigraram para o Brasil e têm dois filhos e seis netos.Fernanda sempre trabalhou como assistente executiva trilíngue em diversas empresas de diversos países e atualmente trabalha com tradutora juramentada português-francês e como tradutora português-inglês.Seu primeiro livro publicado: Nossa História de Amor, é um relato de sua vida ao lado do querido marido.
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Nossa História de Amor - Fernanda Armoni
Agradecimento
À minha família que me ajudou e incentivou a escrever a minha história.
Sobre este livro
Este livro conta as memórias e experiências vividas pela autora, Fernanda Armoni, e pelo seu marido Shlomo Armoni, chamado por ela de meu Querido
, ambos nascidos de famílias judias, no Cairo, em janeiro de 1925 e em junho de 1919 respectivamente, em uma época em que o Egito era governado pela dinastia Muhammad Ali.
Após a sua independência da Inglaterra, em 1922, o Egito foi governado pelo Rei Fuad I até o seu falecimento em 1936 e depois pelo seu filho, o Rei Farouk I, que reinou até 1952.
No entanto, a monarquia egípcia sofria uma interferência constante da Inglaterra, que ainda mantinha tropas no Egito, mesmo após a sua independência. Além disso, novas forças políticas surgiram nessa época, como o partido comunista, criado em 1925, e a irmandade muçulmana, fundada em 1928.
Apesar da ocupação inglesa, a França exercia uma grande influência cultural sobre o Egito e todo o norte da África, tanto que ambos, Fernanda e Shlomo, foram educados em francês e comemoravam o 14 de julho, dia da queda da Bastilha e dia nacional da França.
O fato é que, apesar de guerras, revoluções e adversidades, o amor de Fernanda e Shlomo perdurou até o fim.
Prefácio
É difícil descrever uma pessoa tão querida em poucas palavras, especialmente após 31 anos de convívio próximo, mas se eu tivesse que destacar a maior característica da minha avó ela seria alegria.
Ela sempre foi uma pessoa alegre e feliz; cantava o tempo todo, tanto que quando eu e o meu irmão éramos pequenos, nós lhe demos o apelido de: Vovó Hava
, já que ela sempre cantava Hava Naguila para nós.
Eu cresci ouvindo as histórias dos meus avós, e sempre encontrei nelas grandes lições de vida. Apesar de terem enfrentado tantas e tão grandes adversidades, eles nos contavam o seu passado não com tristeza ou amargura, mas com alegria, orgulho e até bom-humor. Mesmo os momentos mais difíceis eram lembrados em um tom alegre, pois acredito que o mais importante eles sempre tiveram: eles estavam juntos! E assim, juntos, eles venceram tudo o que a vida lhes deu e construíram uma família da qual eu me orgulho de fazer parte.
Obrigado Fernanda e Shlomo pelo grande exemplo que vocês nos deram e que está escrito nas páginas desse livro.
Felipe Armoni
29 de setembro de 2016
O sorriso de Fernanda, a retidão de Shlomo e a coragem de ambos, marcaram as suas vidas e também as de quem passou por elas.
É uma honra fazer parte desta linda história, a qual os convido a conhecer mais profundamente nas próximas páginas.
Renato Armoni
14 de novembro de 2016
Introdução
Naquela quarta-feira, 25 de Abril de 2007, às quatro e meia da tarde, você fechou seus lindos olhos e voou para o Infinito... Não respondia aos meus desesperados apelos te chamando, te chamando... Eu, olhando para tua face, sabia, no meu íntimo, que você havia partido, mas como não queria acreditar nisso, continuava te chamando, te chamando...
Já um tempo se passou, e somente hoje consegui começar a escrever a nossa história, meu Querido, para te honrar, para te homenagear... É verdade que muitos amigos me pediram para escrevê-la, nossa linda história de Amor, mas não conseguia sequer pensar nisso sem chorar, e chorar muito...
Não sei por onde começar, talvez pelo nosso casamento - eu tinha 23 anos e você 27; eu era uma moça pobre e você rico para os padrões da época, tinha até um carro, um Topolino verde-amarelo, conversível, e nossos amigos, um bando deles, subiam no teto, e nós saíamos cantando pelas ruas do Cairo. Isso foi em 1948...
Sim, porque nascemos no Cairo, aquela cidade barulhenta, onde havia ruas coloridas, vendedores gritando, burros carregados de mercadorias, carroças e crianças correndo descalças...
Minha Infância
Eu e minha família morávamos num pequeno apartamento de dois quartos no Cairo. Lembro-me vagamente da minha mãe gritando: Menina, volte!
, quando eu escapava, correndo ao redor da mesa, e minha mãe atrás de mim para me pegar e me dar banho. Devo dizer que eu era uma menina, digamos, um tanto desafiadora
.
Em nosso apartamento, moravam minha mãe, que se chamava Esther, minha irmã Yvonne, de 7 anos, e os três filhos do meu pai, Mary (18), Jacques (16) e Maurice (14), pois meu pai, que tinha o nome de Henri, era viúvo quando se casou com minha mãe, e já tinha esses três filhos do seu primeiro casamento. No apartamento da frente moravam o irmão da minha mãe, meu tio Moussa com a sua esposa Lise, o filho deles, Moni, que tinha a minha idade, além de minha tia Camille que nunca se casou, e minha avó Bolissa com seus lindos cabelos brancos e andar ereto. Ela devia ter aproximadamente uns 80 anos.
Morávamos no primeiro andar, e para nos distrair, eu, minha irmã e meu primo ficávamos no terraço - todas as casas tinham terraço - e colocávamos nossas pernas entre as grades do balcão, balançando-as no vazio e comendo os pedaços de cana de açúcar que minha mãe descascava para nós.
Mas tínhamos também outras distrações. Jogávamos baralho com as crianças da vizinhança, e nesse tipo de jogo - não me lembro exatamente qual - a pessoa que perdia tinha que sair da brincadeira. Mas acontece que quando eu perdia, eu não queria sair, e dizia: "Je joue ou je taquine, ou seja:
Eu jogo ou eu atrapalho", e embaralhava todas as cartas, estragando a brincadeira!
A minha irmã Yvonne me protegia - ela era quatro anos mais velha do que eu -, já que pelo meu jeito travesso, pode-se imaginar que eu não era a preferida da casa. Porém ela me dizia que eu era muito bonita, com meus cabelos cacheados e que, quando meu pai chegava do trabalho, ele me pegava nos braços, e me lançava no ar, brincando comigo com carinho. Não me lembro de nada disso, mas gostava de ouvi-la contar.
A preferida por alguns era a Yvonne, que era muito amável e obediente, o que não era meu caso. Ela era mimada pela minha tia Camille e pela minha nona, mas eu não me importava com isso, ou talvez... Talvez me importasse! Me lembro até hoje de um dia em que eu estava brincando no chão, e minha nona, que andava com uma bengala, disse à minha tia, quase gritando: Tira essa menina daqui! Ela vai me fazer cair...
, isso me deu como que um golpe no coração, um sentimento de não ser amada, embora, naquele momento, eu não soubesse ainda traduzir esse sentimento.
Meus meio-irmãos, apesar de tudo, gostavam de mim, e minha mãe não fazia diferença entre eu e eles, mas olhando para trás, eu vejo que não devia ser fácil a nossa convivência. Minha meia-irmã Mary era muito religiosa - éramos de religião israelita -, e ia muitas vezes ao templo. Ela falava muito e com saudades da sua falecida mãe e dos seus tios, e isso talvez incomodasse minha mãe, que fazia de tudo para ajeitar a situação.
Meu meio-irmão Maurice já trabalhava - começou muito cedo -, e às vezes comprava caixas de sardinhas ou de atum e as fechava à chave no seu armário para comê-las sozinho. Essas coisas eram consideradas um luxo e nós quase não comíamos isso. Meu meio-irmão Jacques era um amor, gentil e generoso, e muitas vezes trazia presentes para minha mãe.
Minha meio-irmã Mary era enfermeira, mas muito religiosa, e quando era obrigada a trabalhar no sábado - o sábado é dia de repouso para os israelitas -, ela dava aos pobres do Quartier Israélite todo o dinheiro que recebia. Ela era, por causa disso, adorada por eles, mas quando o dinheiro acabava, pedia mais para os seus irmãos. Isso, muitas vezes, acabava em confusão.
Quando ficávamos doentes, não me lembro de chamarem um médico para nos examinar. Quando eu tinha dor de garganta, chamavam minha tia Lise, que era a tia mais forte, para me segurar: me sentavam no peitoril da janela, abriam a minha boca, e ela pincelava a minha garganta com tintura de iodo. Não era muito agradável, mas resolvia. Para dor de estômago, tomávamos óleo de rícino! Era horrível!
Minha mãe nasceu na Síria, em 1882, e tinha três irmãos e quatro irmãs. Ela nos contava que todos moravam numa casa próxima a uma praça, onde havia uma fonte da qual jorrava água. Lá fazia muito frio.
Embora naquele tempo não fosse costume enviar meninas à escola, minha mãe frequentou a escola de francês.
Ela nunca trabalhou. As meninas ficavam em casa aprendendo os ofícios do lar, e aguardando o casamento. Quando os irmãos chegavam em casa, após o trabalho, as meninas lavavam seus pés numa bacia de água quente! Nossa família descendia da aristocracia, e tinham muitos conhecidos. Minha mãe era a mais bonita, e cantava muito bem.
A família imigrou para o Cairo, e lá moravam todos próximos uns dos outros.
Era costume, nas famílias antigas, que primeiro se casasse a filha mais velha, e depois a seguinte, e depois a seguinte, etc. por ordem de idade. Cada uma tinha que esperar que a irmã mais velha se casasse, antes dela mesma poder se casar. E isso aconteceu com minha mãe, que tinha uma irmã - minha tia Regina -, que namorou o seu primo Ernest durante dez anos, até que finalmente eles se casaram! Minha mãe, que ficou esperando os dois se decidirem, naquela altura, já estava com quarenta anos, o que era considerada uma idade avançada para o casamento. Ainda assim, ela encontrou um viúvo, meu pai, com três filhos e se casou com ele. A irmã seguinte, minha tia Camille, não teve a mesma sorte e acabou ficando solteira.
Meu pai era um homem moreno, bonito, que só conheci por fotografia, porque ele faleceu quanto eu tinha três anos. Era professor, e o homem mais culto da família. Minhas primas vinham