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Árvore Diabo
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Árvore Diabo

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About this ebook

As raízes do mal são mais profundas do que você jamais imaginou.

Lucas Sawyer e sua esposa, Tamsen, estão ilhados no coração de uma floresta selvagem no meio do século XIX. Eles são resgatados por Jonah Duvall, um misterioso lenhador que vive nesse estranho vale com sua esposa, Jezebel, e seu filho, Cordão. Perante todos, a Árvore Diabo – um imenso e terrível pinheiro que os invocou ao vale para alimentar-se de suas emoções coletivas e sua prole sobrenatural. Parte espírito da terra, parte antigo demônio – a árvore está cultivando todos eles.

Os personagens estão presos em um apertado nó do inegável destino. Conforme o inverno se aproxima, eles precisam encarar a fúria profana da árvore em um fim absolutamente terrível.

ÁRVORE DIABO é uma história que o levará até o coração de um horror inimaginável.

O que algumas pessoas estão falando sobre ÁRVORE DIABO.

"Uma jornada hipnotizante para uma escuridão inimaginável. ÁRVORE DIABO apresenta Steve Vernon no auge de seu poder e isso resultado em um profudanemte inquietante e provocador romance que você jamais esquecerá." - Greg F. Gifune, autor de THE BLEEDING SEASON

"ÁRVORE DIABO é um conto aterrorizante de um homem contra a natureza. Vernon já escreveu contos de assassinado, infidelidade, morte e depravação. Repleto de horror e escuridão - um conto sobrenatural sem par." - DARK RIVER PRESS

"Se você está procurando por uma história que irá lhe assustar, ÁRVORE DIABO é uma ótima leitura." - SIZZLING HOT BOOK REVIEWS

"Uma história bem escrita que atenderá tanto aos fãs do grotesco e do realismo mágico. Você precisa ter estômago forte para lidar com esse conto." - OPINIONS OF A WOLF

"Com um estilo cronenberguiano de terror, uma sub-trama estilo Wendigo e uma árvore malvada que faria qualquer vegetação do original EVIL DEAD precisar se superar, ÁRVORE DIABO é a melhor aposta para os fãs de terror cansados de não se assustarem com ficção de horror." - THE HORROR FICTION REVIEW

"O gênero está precisando de sangue novo e Steve Vernon é uma bela transfusão" - Edward Lee

"Steve Vernon nasceu para escrever. Ele é legítimo e temos sorte de tê-lo." - Richard Chizmar

LanguagePortuguês
PublisherBadPress
Release dateSep 6, 2018
ISBN9781547545391
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    Árvore Diabo - Steve Vernon

    PRÓLOGO

    Algumas jornadas eram como rios. Você colocava sua canoa na correnteza e se segurava com força enquanto era guiado. Outras eram como oceanos – profundas, vastas e difíceis de calcular. Essas foram as que você navegou com habilidade e avaliação precisa.

    E se errasse seu julgamento, certamente terminaria morto.

    Abraham Golightly enforcara um homem certa vez. A verdade é que o sujeito precisara do enforcamento muito mais do que a maioria, mas em algumas noites via aqueles pontapés na morte, o topo da árvore e a longa descida.

    Abraham viajara campo adentro nas últimas duas semanas, cavalgando às margens do rio Greensnake, preparando o terreno para uma iminente invasão de imigrantes. Ele passara a maior parte de sua vida observando e emboscando nessa região. Pensava não ter nada de novo para ver.

    Dificilmente.

    Ainda não.

    — O que há pela frente, Abraham? — Perguntou Wilson.

    Wilson era um novato cujas mãos descansavam em bolsos consideravelmente fundos. De uma forma bem direta, ele era rico. Ele tinha muitos amigos – banqueiros gordos e bem alimentados que sonhavam com cifrões e grandes lucros.

    Wilson contratara Abraham Golightly para explorar uma rota ao longo do Greensnake. Ele tinha um sonho. Ele desejava fazer uma rota comercial direta, afunilando os locais essenciais que viajantes precisariam para sobreviver e enviar para fora a carne, o peixe e a verdura que passasse por essa terra.

    Para Abraham o plano parecia idiota, mas Wilson era daqueles que o dinheiro não seria um problema e estaria disposto a utilizá-lo.

    Todos nós somos sedentos por alguma coisa.

    — Yonder — Abraham disse — O que há mais a frente é o condado de Yonder. Locais que você ainda não conheceu ou visitou. É tudo que posso lhe dizer. Essa terra cresceu muito e muito rápido. Nenhum mapa que foi desenhado até hoje é capaz de dar conta de toda área.

    Wilson fitou Abraham com uma carraca e um olhar intenso. Abastado ou não, Wilson não possuía muito senso de humor.

    — Vamos! — Vociferou — Mantenha o ritmo.

    Abraham Golightly decidira há algum tempo que Wilson nada mais era do que um forasteiro ambicioso. Ambições podem levar a alguns lugares, mas bom senso é capaz de guiar muito além.

    Dois Ursos e Olho de Coelho encontravam-se mais a frente, observando o território enquanto Abraham e Wilson seguiam mais atrás juntos da cavalaria de carga. Ambos eram excelentes exploradores. Conheciam o território melhor do que qualquer homem branco. Se houvesse problemas a frente, aqueles dois descobririam e resolveriam.

    Abraham vinha sentindo uma penetrante ansiedade invadindo seu coração como um bando de gansos migrando para o sul no inverno. Ele era incapaz de descrever o que sentia. Ouviu alguma coisa chamando-o mais a frente.

    Tivera uma sensação parecida havia seis anos quando um grupo de Absaroka[1] foi atrás de seu pônei e de tudo que carregava – inclusive dele. No final, ele ficou entre atirar ou correr. Não hesitou em atirar.

    Só que dessa vez era uma sensação diferente.

    –– Sinto uma coceira. – Confessou ao Wilson. – Só que não sei como coçá-la.

    — Espera algum tipo de confusão?

    — Estou procurando. — Golightly respondeu. — Até agora eu não encontrei nada, mas essa sensação incômoda não me deixa em paz.

    Os exploradores, Dois Ursos e Olho de Coelho retornaram. O primeiro era sempre sorridente. Costumava ter sempre alguma piada, mas não havia nada de engraçado em seu semblante. Olho de Coelho era o silencioso, como um pensador, e parecia pior.

    — Problema a frente, Golightly.— Dois Ursos sinalizou. — Você vem. Você vê.

    Olho de Coelho permanecia mudo.

    Abraham seguiu colina acima seguindo o rastro que se mostrava pela poeira como uma espécie de cobra, contorcida e esguia. Ele cavalgou do rio até o cume e percebeu que havia um vale que se assemelhava a uma profunda tigela.

    Sentia o cheiro de cinzas e velhice soprando das estranhas do vale. Cinzas antigas e abomináveis. Algo escuro havia queimado no fundo desse vale. Algo que deveria permanecer morto, mas que não conseguira.

    — Deveríamos ir até lá?— Perguntou Wilson.

    Abraham Golightly não queria cavalgar vale adentro, mas Dois Ursos não ligava para isso.

    — Você vem. — Sinalizou novamente — Você vê.

    — Hm. — Abraham resmungou consentindo e seguiu.

    O sol escalara um pouco céu acima e se escondeu atrás de uma nuvem, como se não quisesse ver o que os homens tramavam no coração daquele vale desconhecido. Lá, o fedor de pinho e fungos nunca tocados, podridão seca e morte. Fedia. Fedia como se cavalgasse adentro de um cemitério abandonado.

    No interior, Abraham viu um anel de cinzas a algumas centenas de metros. Seu pônei recuou ao alcançar a beirada das cinzas e recusou-se a continuar. Abraham não pôde culpá-lo.

    — Fique aqui com os cavalos.— Instruiu Wilson.

    Encarou Olho de Coelho, quieto nos momentos de tranquilidade, mas que atirava com uma precisão única se a situação piorasse mais do que deveria. Abraham percebia pelas linhas apertadas nos entornos da boca e o olhar congelante e duro que o nativo seria capaz de dar meia volta e sair em disparada se o forçassem mais um pouco.

    — Olho de Coelho, fique com Wilson.

    Abraham olhou para Dois Ursos.

    — Vamos?

    Dois Ursos acenou com a cabeça. Os dois entraram no círculo de cinzas. Abraham não conseguia identificar o que imaginava descobrir, mas sentia que havia algo  esperando por ele. Alguma coisa que ele precisava ver. O sol batia forte e firmemente como um martelo de carne. Abraham não conseguia ouvir nem pássaros nem grilos cantando.

    Havia algo naquele silêncio que o incomodava.

    Ele jamais ouvira florestas tão quietas quanto essa.

    O silêncio o assustava.

    Mas ele caminhou adentro do coração da clareira enegrecida e foi lá que encontrou o bebê.

    O bebê e a árvore.

    PRIMAVERA

    Os primeiros colonizadores consideraram o pinus banksiana uma árvore maligna – provavelmente por conta de seu plantio não ter sobrevivido ao solo pobre onde essa árvore costuma crescer.

    Native Trees of Canada.  R.C. Hosie

    Copyright Minister of Supply and Services Canada 1979

    O pinheiro Pinus banksiana tem seus pinhos apontados para fora e eles permanecem fechados até ficarem cinza e transformarem-se em casca. É preciso utilizar fogo para abrir os pinhos.

    The Guide to Trees of Canada and North America. Alan Mitchell

    Copyright Dragon’s World 198

    ––––––––

    E as árvores mortas não oferecem abrigo.

    T. S. Eliot 1888 – 1965

    CAPÍTULO I

    A correnteza era bem sorrateira. O fluxo seguia com uma força que crescia lentamente, aumentando sua velocidade até que a jangada movimentasse como uma semente num turbilhão de vento.

    Lucas Sawyer inclinava seu peito contra a abertura do remo de nogueira. Ele sentia a madeira tremer em suas mãos conforme lutava contra a intensa vontade da correnteza.

    O rio Greensnake não gostava de ser subestimado.

    — Naufragado. Nenhum sobrevivente.— Lucas murmurou, ecoando o medo que sussurrava em seu crânio. Ele estava assustado e tinha consciência disso. Ele tentava afastar sua preocupação com risadas. Ele agia como um tolo e sabia disso. O rio estava a diversas léguas do oceano.

    Não importava.

    Antigos medos corriam por suas veias e custavam a desaparecer.

    — Continue!— Ele disse a si mesmo, inclinando-se fortemente contra o leme.— O tempo urge!

    Lucas era um homem franzino com um grande nariz que se estendia pelo seu rosto como a proa de navio. Limpou o suor com seu antebraço, espalhando-o junto de saliva através de seus olhos. Estava quente e suas roupas pretas não o ajudavam muito.

    Eis um tremendo local para um ex-pregador vestido de corvo estar, pensou consigo mesmo.

    Deu um puxão no anel de cânhamo em seu pescoço — uma simpatia contra enforcamento. O cânhamo retorcido escondia o bócio que tinha, mais ou menos do tamanho e cor de uma pequena ameixa.

    — Usarei essa corda como um feitiço contra a morte.— Informara ao seu médico.

    — Tais amuletos são uma bobagem — O doutor respondeu. — Um homem de fé deveria dar ouvidos a um homem estudado. Não dê muito valor a esses contos da carochinha. A verdade está nos livros, não na fantasia.

    — Um é tão válido quanto o outro — Lucas retrucou.

    Lucas lera sua parcela de livros. Suas mãos pareciam estar sempre formando uma concha, como se não se sentisse bem sem a palavra de outro homem em suas palmas. Ele aceitara diversas palavras de vendedores de livros, professores e seus colegas seminaristas.

    E, é claro, de seu pai.

    De todos, somente seu pai foi responsável pela remoção de tantos livros. Ele acreditava em somente um.

    — O Senhor é o bálsamo e a sombra em lugares difíceis. — Seu pai pregara.

    Um é tão válido quanto o outro.

    Lucas virou-se e caminhou.

    Ele andou até a água e nunca mais olhou para trás.

    — O senhor é meu pastor. — Sussurrou. — E nada me faltará.

    Estou perdendo ela, pensou.

    Lutou dura e infrutiferamente para manter a jangada em seu rumo. As lágrimas causadas pelo vento se acumularam nos cantos de seus olhos. Ele tentou entender o fluxo da superfície mas era tão eficaz quanto se olhasse para o nada. Três anos no mar e parecia não ter acumulado experiência alguma como capitão.

    Ele servira como carpinteiro de navio. Aprendeu o que conseguiu, mas ninguém ofereceu ajuda. Os outros marinheiros o deixavam só.

    — Fracasso. — Ele dizia em voz baixa. — Incompleto.

    A única pessoa que acreditava nele era sua esposa, Tamsen. Ela se ajoelhava próxima às ovelhas, seus joelhos dobrados em um travesseiro feito de lã, tentando acalmar os animais com sua presença.

    — Tamsen. — Lucas a chamou, erguendo sua voz acima da corrente do rio. — Consegue ver alguma coisa?

    Ela balançou a cabeça.

    — Árvores. — Disse com um sorriso. — Tudo que vejo são árvores. Acredito que estejamos no meio da floresta.

    Ele tinha que rir. Ela era uma mulher corajosa e confiante, com um coração tão duro quanto um carvalho robusto. Ela escondia algumas coisas, mas não maldosamente. Ocultava-as tão bem por trás de seu sorriso que Lucas nunca sabia por quais conflitos ela passava.

    — As árvores estão se movendo? — Perguntou retribuindo o sorriso.

    — Para frente e para trás. — Tamsen disse. — Elas se movem para frente e para trás.

    — Talvez elas estejam sendo amigáveis. — Disse.

    — Talvez. — Ela respondeu.

    Era uma mulher orgulhosa e estava sempre bem-humorada.

    O orgulho precede a destruição, seu pai constantemente o alertava — e a arrogância, a queda.

    Lucas cuspiu.

    Ele não era seu pai. Gostava de assistir Tamsen lutar contra os problemas, mordendo os lábios e mantendo-se quieta, determinada a lidar com o que quer que a atormentasse.

    Era forte e Lucas gostava dela desse jeito.

    — Fique alerta. — Ele avisou. — Ainda não saímos dessa floresta.

    — Você consegue arpar isso aqui?

    — Essa foi a terceira vez que me perguntou isso.

    — Terceira vez que você me deixou sem resposta.

    — Eu consigo atracar....

    O remo se retorceu na sua mão como uma cobra enfurecida. Deixou-o de joelhos no convés de madeira.

    — Lucas! — Tamsen tentou alcançá-lo. A guinada em seu curso a deixou estatelada no convés. Ela rolou até a borda da jangada, segurando-se nos cabos de segurança que Lucas colocara no perímetro da embarcação.

    Enquanto ele estava tentando chegar até ela, a jangada ficou à deriva.

    — Droga! — Ele batalhava para corrigir o curso. Lutava contra a correnteza até o limite enquanto rezava para que o remo chiante não quebrasse.

    Tamsen rastejou em sua direção buscando por ajuda.

    — Continue abaixada. — Ele avisou.

    Ela se arrastou para a frente mas o cabo ficara enrolado no seu tornozelo.

    A jangada guinou em lenta roda de corrente.

    — Lucas! —Tamsen chamou.

    Lucas olhava fixamente além dela, na direção em algo longo, similar a um dragonete, que se erguia das profundezas na frente deles.

    — Serpente marinha! — Ele berrou.

    Tamsen olhou por cima dos ombros e gritou. Por trás dela elevava-se a ponta cega de um tronco coberto de lama subindo de sua cova no leito do rio. Sua superfície escorregadia de lodo deslizava sobre a jangada, erguendo cada vez mais alto conforme a correnteza arrastava a embarcação e tronco juntos.

    Inclinava cada vez mais para frente e, assim, percebia-se o peso do tronco. Lucas soltou o remo e agarrou Tamsen em uma disparada para a margem, esperando que essa oportunidade, aliada a um salto preciso, pudesse deixa-los seguros.

    — Pule! — Gritou.

    No limiar do salto, a jangada enfim cedeu ao agressor. A massa absoluta do tronco baixou-se no convés. Ela se inclinou para frente e quebrou. O súbito elevar catapultou o casal para fora do rio. No ar, pareciam um par de anjos alados.

    No topo de seu vôo, Lucas vislumbrou a costa.

    Um grande veado de chifres negros observava calmamente sua aproximação.

    E então ele afundou. O choque da imersão total o trouxe de volta àquela gélida realidade. A profundidade do rio parecia ainda maior do que a última sondagem mostrara. Ele se sentia confuso, não conseguindo identificar topo ou fundo, procurando uma iluminação e prendendo sua respiração e a pequena e clara mão de sua esposa.

    Ela não estava nadando. Talvez pelo choque ou por não saber nadar.

    Sentiu-a afundar.

    Não soltou. Seu fôlego batia nas paredes de seu pulmão, implorando para ser liberto. Viu o brilho da luz do dia acima de sua cabeça debaixo d’água, como se o provocasse. O rio parecia não ter fundo. Continuava a afundar, suas tentativas de nadar impedidas pelo peso morto de sua esposa.

    Ela respirava?

    Não conseguia saber.

    Permitiu-se uma olhadela, notando o cabo se alastrando por trás dela.

    — Solte-a — Uma voz invisível sussurrava.

    Não deu atenção. Chutava e lutava. O sangue latejava e batia em suas têmporas, esmagando-o sentido abaixo. Sua mente delirava em pânico. Ele ouvia um canto – a voz baixa e fúnebre de seu pai soando Banhado em Sangue enquanto o velho segurava crianças sob as sagradas águas paradas do barril batismal feito em pinho.

    — Solte-a. — A voz sussurrou ainda mais gravemente.

    — O Senhor é o meu pastor. — Lucas recitou silenciosamente, contrariando o comando aterrorizante do rio.

    — Solte-a.

    Forçou-se a relaxar. Tentou flutuar. Não sentiu o reconfortante puxar para a superfície. Lembrou do verão em que seu pai o lançou no lago abaixo de sua casa.

    — Afundar ou nadar, Lucas. Afundar ou nadar. — Gritava alegremente o velho.

    SOLTE-A! — Gritou a voz.

    Lucas lembrou a última caminhada embaraçosa de seu pai para dentro daquele mesmo lago gelado.

    — Pai, perdoe-me. — Lucas disse para si.

    Pequenos pontos de luz dançavam como peixes assustados perante seus olhos.

    — Faz-me repousar. — Lucas cantou mentalmente.

    Ele esticou a mão na direção massa disforme e preta que encontrava-se perto dele.

    — Me conduz a águas tranquilas.

    Sentiu o que parecia ser a superfície viscosa de uma árvore que se erguia. Uma raiz subaquática? Ele a agarrou. Firmou-se por um momento. Engoliu água, moendo seus dentes contra o impulso de cuspi-la. Balançou suas pernas e começou a nadar. As mãos escorregaram pela superfície apodrecida.

    — Solte, solte, solte.

    Num súbito de pânico, Lucas quase desistiu.

    Tamsen quase deslizou.

    Nadou firmemente, utilizando uma das mãos como remo enquanto agarrava Tamsen, imóvel, com a outra. Quando fraquejou, tentou alcançar o interior amadeirado daquela raiz morta. Do coração da raiz, conseguiu extrair vigor, fazendo com que conseguisse continuar seu caminho para cima como se fosse uma forma bizarra de inseto aquático.

    Ele segurara sua respiração por um tempo.

    Quanto?

    Segundos?

    Minutos?

    Horas?

    Dias?

    Ele observou a brilhosa e filtrada luz do dia sabe Deus por quanto tempo, provocando-o e rindo dele, desejando-o morto.

    E ainda assim eu caminho pelo vale...

    — Maldição! Maldição! Mas que maldição!!! Eu quero viver!

    Enfim ele emergiu das profundezas, rindo e ofegante e engasgando, sua mão direita firmemente entrelaçada em uma massa de raiz apodrecida.

    — Deus seja louvado! — Disse roucamente.

    Foi somente nesse momento que lembrou de Tamsen, ainda em sua mão direita, molenga. Sua cabeça movia-se serenamente — o rosto virado para a silenciosa e suja água.

    Lucas soltou a raiz, virou-se para segura-la e escorregou inexoravelmente para trás de volta para o alcance ávido do rio. Esticou sua mão para fora e para cima.

    — Você é meu — disse uma voz profunda e amadeirada.

    2

    Sonhos molhados, sonhos de afogamento, sonhos de morte.

    A mente moribunda de Tamsen estava lavada com a gargalhada rouca do rio borbulhante em seus ouvidos. Sussurrando sugestões fantásticas enquanto flutuava e se sentia erguida, em direção ao paraíso, uma visão sombria e divina sobre ela murmurando palavras que não ousava ouvir.

    — Para cima, para baixo, para cima, para baixo.

    Sua cabeça balançava livremente, engasgando e engolindo. O tronco erguia-se como um grande e gotejante membro de um esquecido e sombrio deus do mar. Poseidon, Netuno, Tritão — alguns

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