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O cajueiro Nordestino
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O cajueiro Nordestino

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Originário de uma tese apresentada pelo autor ao Instituto de Educação de Pernambuco, em 1955, o livro oferece uma visão abrangente do cajueiro e seu fruto, abordando-os sob diversos aspectos, como, por exemplo, o geográfico, o histórico, o cultural e o nutricional.
LanguagePortuguês
PublisherCepe editora
Release dateSep 1, 2015
ISBN9788578583132
O cajueiro Nordestino

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    O cajueiro Nordestino - Mauro Mota

    Apresentação

    Celebrar o centenário de nascimento do poeta, ensaísta, cronista e professor Mauro Mota é ato cívico para pernambucanos, nordestinos e brasileiros neste ano de 2011. No que diz respeito à Fundação Joaquim Nabuco, particularmente, a ação agrega não somente o sentimento de orgulho dos pesquisadores por terem tido na lida diária a satisfação de conviver com um autor de obra tão significativa para a cultura e a ciência do nosso país, mas também expressa o reconhecimento de todos pela atuação do intelectual na presidência da instituição, cargo que Mauro Mota exerceu de 1956 a 1970, período no qual deixou marcada a sua participação nas pesquisas e trabalhos do então Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais e confirmou a sua presença ativa nas sessões do Seminário de Tropicologia .

    No contexto comemorativo se inscreve a publicação da quarta edição do livro O cajueiro nordestino, originário de tese apresentada ao Instituto de Educação de Pernambuco para obtenção da cátedra de Geografia do Brasil, em 1955. Após proceder a algumas alterações no trabalho acadêmico, [...] mais sob o aspecto de eliminação do que de acréscimo, na intenção de ajustá-lo ao interesse do público leitor, Mauro Mota lança a versão literária de O cajueiro em 1956, sem abrir mão, contudo, de transportar para as novas páginas o apurado rigor metodológico da peça original.

    Temos como resultado um livro precioso, sob os mais diversos aspectos que nele podem ser observados, sejam geográficos, históricos, antropológicos, culturais, políticos, econômicos, nutricionais ou literários. No estudo sobre a árvore, o olhar do professor e do pesquisador recebeu como reforço aliado as mãos seguras do poeta e do escritor. Ao aprofundar a origem, o valor e a exploração do cajueiro, Mauro Mota termina por oferecer a mais emblemática metáfora das dificuldades e potencialidades do Brasil e do Nordeste brasileiro, como podemos extrair de suas linhas:

    Observa-se um prodígio de expansão vegetal na árvore. O cajueiro luta contra a prisão das raízes, cresce para os lados, agita-se, cai, levanta-se adiante, anda em passos trôpegos e sinuosos, mas anda nos movimentos elásticos e irregulares de sua galharia.

    E tudo o mais está escrito e descrito, e belamente dito, n’O cajueiro nordestino. Vamos à leitura e ao aprendizado. A edição que se apresenta é resultado de parceria firmada entre a Fundação Joaquim Nabuco, a família do escritor, e a Companhia Editora de Pernambuco – Cepe. Todos reunidos erguem, aqui, um brinde em sua memória.

    Fernando Freire

    Presidente da Fundação Joaquim Nabuco

    Prefácio

    Clóvis Cavalcanti¹

    Alegra-me escrever o prefácio desta oportuna reedição de O cajueiro nordestino . A tarefa não é simples, pois se trata de apresentar obra de um escritor do porte e clareza de comunicação de Mauro Mota. Mas é gratificante, pela oportunidade de falar da fruta de que mais gosto. Para mim, a mais bonita. A mais cheirosa. A mais útil. A mais simbólica de minhas raízes nordestinas. No tempo em que só se chupava caju local — pois hoje o que chega ao Recife é quase todo um tipo clonado que vem de Petrolina —, o primeiro que eu via no início da estação própria era motivo da minha maior alegria. Pegava-o para consumir junto com uma lapada de cachaça. Aprendi essa arte com tios meus, contra a vontade de meu pai, que não tinha particular admiração por cachaceiros. Se bem que, depois dos 80, ele, para minha surpresa, pediu-me certa vez que lhe desse uma lapada de Pitú. Eu quis pôr limão na aguardente. Meu pai retrucou: Quero pura.

    De qualquer forma, havia uma tradição na nossa família de tomar cachaça de fabricação própria, fazendo-a acompanhar, no verão, do indefectível caju — puro ou com um salzinho. A avó paterna de meu pai era dona do engenho Taquarinha, onde se destilava aguardente, engarrafada e vendida com a marca Rainha Pernambucana. Os cajueiros eram do próprio engenho. Ficava fácil associar as duas coisas: pinga e caju. Uma deliciosa combinação a que Mauro se refere neste belo livro. Aliás, ele aborda o assunto numa perspectiva mais larga. É seu o raciocínio: Para agradar-lhes [às pessoas sadias, tendo falado antes das virtudes do caju para as doentes], o caju entrega-se de várias formas, apesar das ‘barreiras psicológicas’, observadas por Josué de Castro. Fresco e sumarento, tirado do pé na hora [...] ou como complemento de feijoadas e peixadas; em boa isca para pescar aratu, guaiamum ou caranguejos; em cajuada, em cajuína, em sorvete, em vinagre, em cachaça, em vinho [...] Em passas, em doces em massa, calda ou seco cristalizado.

    Mas não é disso, exatamente, que trata O cajueiro nordestino. Tese de concurso para professor catedrático da notável Escola Normal do Recife, em 1954, o livro oferece uma visão abrangente da realidade do caju. Examina componentes da história natural, da botânica, da geografia, de valores nutricionais e terapêuticos, além de culturais e simbólicos, desse tesouro da flora brasileira. Certamente, um espécime da riqueza biodiversa do País, da opulência vegetal que os portugueses encontraram aqui. E de que não souberam cuidar, legando não só a devastação — como a da Mata Atlântica —, mas o ranço, entre nós, de uma sociedade antiecológica, como explica Paulo Prado em Retrato do Brasil.

    Mauro aborda bem o problema, dedicando um capítulo deste livro à devastação das matas de caju. Uma devastação que se manifesta na expulsão do cajueiro da paisagem mais deles no Estado. Do Recife e de Olinda, do Rio Doce e Conceição. De Boa Viagem, Piedade, Candeias, Venda Grande, Barra de Jangada. Nessas praias os cajueiros formavam bosques onde podíamos ficar perdidos. Depois foi a vez dos bosques se perderem. Ficaram apenas as sobrevivências, como as de um semiafogado agitando os braços fora d’água. Consequência disso é que o caju que se vê, atualmente, nas ruas, antes combinando grande diversidade de espécies — cajus grandes, pequenos, anões, gordos, esguios, redondos, compridos, encarnados, amarelos, alguns arroxeados e rosa, outros manchados e tortos —, hoje é uniforme, homogêneo: da mesma cor rósea, do mesmo tamanho, do mesmo desenho. Cajus fabricados em plantações de clones de uma mesma espécie, reproduzidos linearmente. Sem nenhuma graça. Uma tristeza ecológica.

    Como salienta Mauro Mota: Sem qualquer intuito compensador, antes com outro plano, vêm surgindo cajueiros, de uns tempos para cá, em municípios do interior pernambucano, às vezes em áreas de muitos hectares. Esses cajueiros são os cajueiros escravos. Esquecidos na sua nobreza e nos próprios valores orgânicos, com a finalidade frutífera subsidiária. Criados como cercas vivas nas propriedades rurais. Criados para sombreamento de cafeeiros ou para suporte de pimenta-do-reino. Os cajueiros reduzidos à servidão. Cajueiros comerciais, cultivados para dar lucro, o que se obtém principalmente da castanha (aliás, o fruto em si, uma vez que a parte carnosa, macia e comestível, que atrai a vista, não passa de pedúnculo). Para Mauro, há quase sessenta anos, tudo isso [era] uma paisagem perdida. No Recife, que era caju por todos os lados, de cajueiros como vegetação dominante nas praias e nos sítios de arrabalde, os cajus tornaram-se fruta esquiva, caçados muitas vezes os sobreviventes para enfeite de mesas de banquete ou para oferecer a olhos de turistas os restos da ‘cor local’ esmaecida.

    Quando O cajueiro nordestino foi publicado, eram enormes os bosques de caju em, por exemplo, Casa Caiada e Rio Doce, em Olinda, ou Piedade e Candeias, em Jaboatão dos Guararapes. E mesmo no Recife. A fruta aparecia de forma abundante a partir de outubro. Era comum comprá-la em rodas. As rodas eram um tipo de arrumação em que os cajus vinham atados por tiras de fibra vegetal, de maior ou menor comprimento, dependendo da posição da fruta, convergindo todas para um pivô em que uma argola da mesma fibra, construída solidamente, permitia que se suspendesse o conjunto de cajus. Quando isso acontecia, eles se distribuíam como se formassem uma roda compacta. Vê-las, penduradas, para venda nas margens das estradas, oferecia um espetáculo agradável, de forte colorido. Tal espetáculo desapareceu. Não se vende mais, em Pernambuco, costumeiramente, caju em roda. Contudo, em janeiro de 2011, tendo pedido a meus filhos que iam à praia que comprassem caju, se o encontrassem para venda, recebi uma roda contendo quase 120 cajus amarelos. Presente deslumbrante. Foi uma verdadeira glória!

    Pois, a verdade, como diz Mauro, é que, No caso de árvore frutífera, nenhuma foi, até hoje, mais destruída do que o cajueiro nordestino. Calcula-se em menos de quarenta por cento as suas sobrevivências temporárias em Pernambuco [na década de 1950]. A destruição continua sem intervalo. Essa é uma denúncia ambientalista em sintonia com o que se percebe hoje. Ela fala da destruição do revestimento vegetal da terra, feito com enxada, com fogo, com animais de pasto, etc. , sinal do "primeiro avanço na destruição do ciclo hidrológico. E isso significa o começo do fim da massa de acúmulo vegetativo do solo, sem árvores que o ajudem a proteger-se

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