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Olhar em negativo: Contos de um instante
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Olhar em negativo: Contos de um instante
Ebook89 pages54 minutes

Olhar em negativo: Contos de um instante

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About this ebook

Através de um olhar voltado para a íntima combustão emocional e envolvendo temas e contextos passíveis de serem vivenciados por qualquer indivíduo pós-moderno, o autor promove uma caçada pelas reflexões alcançadas sob o efeito da instabilidade emocional, seja trazida pelo entorno, pela relação com o outro ou pelo confronto com os traços da própria natureza humana. Os personagens apresentados nas narrativas se tratam de indivíduos comuns, contemporâneos - e comumente afetados pelo mundo que nos cerca - atravessando momentos críticos que descortinam novas formas de interpretação do entorno, dos próprios sentimentos e da percepção de si mesmo.
LanguagePortuguês
Release dateApr 8, 2015
ISBN9788562226236
Olhar em negativo: Contos de um instante

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    Olhar em negativo - Assiz de Andrade

    Do mergulho em si

    A troca de guarda

    O precipício

    A criadora de distrações

    O inferno familiar

    Abençoada

    O sono perfeito

    Vazamento íntimo

    Aquele relacionamento era baseado na troca de acusações

    Mascarados

    Dos relacionamentos

    Aquele relacionamento era uma constante declaração de guerra

    De repente

    Aquele relacionamento era um eterno banquete sentimental

    O extermínio

    Aquele relacionamento era um eterno baile de Carnaval

    A dança delirante

    Do olhar à volta

    O imigrante

    A mudança

    A cruz dos culpados

    Traços reciclados

    O turno da covardia

    Perigos ocultos

    O estrangeiro

    Sobre o autor

    Créditos

    Índice das ilustrações

    Sonho Bom

    Deserto

    Banho de Sol

    Véu da Noite

    Rastros

    O Beijo

    Reflexo

    Em Fuga

    Cruz Urbana

    É no ventre do ser, ao contrário, no intransitório, no deus oculto, na coisa em si – que a sua causa tem que estar, e em nenhum outro lugar!

    Friedrich Nietzsche

    Esquecera-se mais uma vez de suas lamúrias, graças à recreação carnavalesca. Novamente o entretenimento manipulado pela televisão a seduziu pelo tempo exato de oitenta e dois minutos, que a fizeram orgulhosa de ter nascido, crescido e sobrevivido naquele bairro. De ser mais uma a compor a comunidade que acabara de ser representada na Marquês de Sapucaí com a predominância das cores verde e branco. Mas, ao fim do desfile de sua escola, a realidade a cutucava, anunciando que a hora do trabalho era chegada. Teria que deixar uma parte de si adormecida na mesma cama da qual se levantava, para privilegiar uma das tantas personalidades paralelas que guardava, como num arsenal de possibilidades, uma coleção de mentiras.

    Dali a trinta minutos entregaria seu corpo aos cuidados da personagem que ultimamente usava com mais frequência, talvez porque tenha sido desenvolvida há poucas semanas. Dentro de instantes seria uma enfermeira dedicada e cheia de volúpia. Passando um ar de inocência inicial, carregando uma lascívia perceptível a mais leve aproximação, e exalando luxúria por cada poro do corpo. Tudo para que cumprisse sua obrigação com eficiência e maestria: levar o máximo de homens possível para cama depois de embebedá-los com as bebidas mais caras do bar.

    Se fosse senhora da sua vontade e dona do seu próprio tempo, se deixaria distrair pela nova agremiação que entrava na avenida. Sabendo que seu coração era da estrela-guia e, por mais que quisesse, o lindo beija-flor prateado não seria capaz de dissolver suas angústias com a mesma eficiência, de fazê-la cantarolar, sozinha, um feio samba-enredo do início ao fim do desfile, ou de se emocionar com o rodopiar da porta-bandeira sorridente como se emocionou com o pavilhão de Padre Miguel. Sabia, porque nem mesmo a voz forte e imponente do puxador de Nilópolis a impediu de desligar a televisão e suspirar entristecida o romper daquele tempo de ilusão.

    Precisava encarar de frente sua rotina intragável, voltar ao baile de carnaval do termas ‘perfume de mulher’, ser abordada por algum homem à beira da terceira idade lançando a cantada mais óbvia que sua fantasia poderia evocar:

    Essa enfermeira deve estar doida pra encontrar um paciente pra cuidar!

    Ser obrigada a dar uma resposta ainda mais ridícula:

    Estou sim. Mas só se for um paciente bem safadinho...

    Para então se deixar tomar pelos braços do homem e converter todo o seu asco em poder de sedução:

    Você está precisando de cuidados, está? Vamos ali no bar tomar um remedinho e depois eu boto você na cama pra gente brincar a noite toda.

    Em seguida acompanharia o infeliz em, no mínimo, três doses de qualquer bebida para depois voltar ao quarto, prestar seu serviço com a mesma má vontade e o explícito fingimento de sempre, certa de que o cliente seria incapaz de diferenciar um orgasmo mentiroso de um espontâneo, porque talvez nunca tenha feito nenhuma mulher gozar.

    Conformada com o drama, voltou-se para o espelho e ficou alguns instantes a conferir sua minúscula fantasia, procurando garantidas de que a roupa emprestava à ela toda a vulgaridade necessária para cegar os clientes para os preços da casa. Ao se deparar com o próprio reflexo, foi tomada pela já frequente repulsa, sentiu-se suja e compreendeu que a resposta era sim, estava vestida feito uma puta. Desiludida, virou-se para a penteadeira, abriu a primeira gaveta e de dentro puxou

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