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O Bom Mestre de Nazaré: Com o Coração Humano Nos Amou
O Bom Mestre de Nazaré: Com o Coração Humano Nos Amou
O Bom Mestre de Nazaré: Com o Coração Humano Nos Amou
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O Bom Mestre de Nazaré: Com o Coração Humano Nos Amou

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Frei Bruno Varriano inicia esta obra apresentando as raízes de Jesus, descrevendo a fé e os costumes do povo judeu. Em seguida, faz-nos participar dos trinta anos da vida escondida de Cristo em Nazaré, com detalhes de seu cotidiano familiar e de sua experiência como trabalhador, para então refletir a respeito de sua vida pública; nesta etapa, somos convidados a tocar na humanidade de Jesus, que privilegiava o encontro com os pecadores e os pobres. O livro traz, ainda, uma seleta biografia de homens e mulheres da Igreja que vêm, ao longo dos séculos, atualizando os gestos de humanidade e misericórdia de Jesus, aspectos relevantes da vida de São Francisco de Assis, Madre Teresa de Calcutá, Papa Francisco e outros nomes que nos recordam a importância de permanecer unidos à Cristo.
LanguagePortuguês
Release dateOct 27, 2016
ISBN9788576777724
O Bom Mestre de Nazaré: Com o Coração Humano Nos Amou

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    O Bom Mestre de Nazaré - Fr. Bruno Varriano

    lembranças.

    Prefácio

    Pela segunda v ez escrevo o prefácio para um livro de Frei Bruno Varriano, com a satisfação de ver que o autor continua a compartilhar conosco suas meditações. Na obra anterior, ele se dedicou à família, partindo do modelo da Família de Nazaré. Agora, Frei Bruno mergulha no mistério da misericórdia divina, bem de acordo com este tempo que a Igreja vive, e na perspectiva do pontificado do Papa Francisco que, com seus gestos e palavras, aproxima de nós o rosto humano de Jesus.

    A exemplo do livro anterior, esta obra está impregnada do clima de Nazaré, onde o autor exerce a missão de custodiar a casa de Nossa Senhora, o Lugar da Encarnação, desde 2013. Assim, o próprio Frei Bruno explica como

    nasceu o projeto deste opúsculo que tem como objetivo caminhar com Jesus, no conhecimento Dele, da sua humanidade que gera a misericórdia.

    Todo o percurso do texto se faz nesta complementaridade entre humano e misericordioso, começando pela descrição do contexto histórico e geográfico no qual Jesus se fez homem, passando pelos detalhes de sua figura humana, os aspectos de sua vida, convivência familiar e missão, até chegar à experiência de seus discípulos e à Igreja.

    Ao longo dessas etapas, percebemos como, em Jesus, Deus se humilha até à nossa condição humana para nos elevar à participação na sua vida divina. Nisto se constitui a mediação que o Senhor faz entre nós e a Trindade, mediação que se realiza em seu próprio ser, pela união entre as naturezas divina e humana na sua Pessoa divina.

    O autor nos conduz, então, a acolher o encontro com o Emanuel, nosso Deus que vem habitar no meio de nós como Verbo feito carne. Não poderia haver maior proximidade Dele conosco, pois esse Amor gratuito reveste-se de misericórdia ao vir ao encontro da nossa pequenez. É o que a Carta aos Hebreus afirma ao descrever Jesus como um sacerdote que se compadece das nossas fraquezas, pois passou pelas mesmas provações que nós, com exceção do pecado, e por isso, podemos nos aproximar Dele com confiança a fim de alcançarmos misericórdia (cf. Hb 4,15-16).

    Exemplos das vidas e obras de vários santos, bem como de personagens que conhecemos no cotidiano da Igreja no Brasil e no mundo, concluem este livro, recordando-nos a palavra do Senhor que se aplicou a eles, e também se aplica a nós: Sede misericordiosos como também vosso Pai é misericordioso (Lc 6,36).

    Estas reflexões de Frei Bruno Varriano são um convite a todos os leitores para que o acompanhem neste encontro com Jesus, a fim de que façam a inigualável experiência do seu amor, infinito enquanto divino e, ao mesmo tempo, tão próximo da nossa condição humana, e sejam mensageiros desse amor para o nosso mundo conturbado.

    Cardeal Orani João Tempesta, O.Cist.

    Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro

    Rio de Janeiro, maio de 2016

    Introdução

    Oconhecimento d e Jesus de Nazaré, dos mistérios da Sua vida, é para nós cristãos a fonte da nossa fé, a força do nosso esperar e a forma do nosso amor. E toda a Sua vida – os seus silêncios, milagres, predileção pelos pequenos e pelos pobres, o sacrifício na Cruz, e a Sua Ressurreição – é um mistério de recapitulação. O quanto Ele fez, disse e sofreu tem a finalidade de restabelecer ao homem a sua primitiv a vocação:

    Quando se encarnou e se fez homem, recapitulou em si mesmo a longa história dos homens e em breve nos deu a salvação, para que nós recuperássemos em Jesus Cristo aquilo que tínhamos perdido em Adão, sermos a imagem e semelhança de Deus. (Santo Irineu de Lione)

    Há mais de duas décadas vivo aqui na Terra Santa, e desde quando cheguei aqui na Terra do Santo, muitas são as situações, acontecimentos que me levam a meditar sobre o amor de Deus pelo homem, amor que, para salvá-lo e recapitular Nele todas as coisas (cf. Cl 1,16-22), se encarna, cresce, vive, ensina, encontra, morre e ressuscita por todos e para cada um.

    Esta busca do conhecimento de Jesus se fez ainda mais concreta com a minha transferência para Nazaré no ano de 2013, para custodiar a casa de Nossa Senhora, o Lugar da Encarnação, onde o Verbo de fez Carne, se fez homem – em coincidência com o início do pontificado de Papa Francisco, que desde o princípio demonstrou uma personalidade de homem de Deus, que viveu, vive e deseja continuar a viver na simplicidade, em uma cotidianidade feita de cordiais contatos humanos, de afetuosidade paterna, não paternalística; que abraça os pequenos, os simples, os doentes, as crianças, com as quais se entretém com gosto, mostrando-nos através de gestos que nos fazem senti-lo tão perto, tão junto, ao ver suas mãos ternas e seu olhar misericordioso superando as barreiras físicas, conceituais e ideológicas, como o Deus da Encarnação, que é Emanuel, Deus conosco; e também a humanidade, alegria, misericórdia e consolação, com a qual não perde a ocasião para chamar a Igreja e todos os cristãos a tomar consciência da necessidade de uma nova evangelização, sintetizada aqui em duas frases, entre as tantas por ele pronunciadas:

    Todo cristão e toda comunidade é missionária na medida em que vive o Evangelho, no testemunho do amor de Deus para com todos, especialmente para com aqueles em dificuldade. Sejam missionários da misericórdia de Deus, que sempre nos perdoa, espera e ama.

    Essas palavras foram pronunciadas no dia 5 de maio de 2013, dirigindo-se aos fiéis presentes na Praça de São Pedro.

    Em meio a estas maravilhas de Deus, nasceu o projeto deste opúsculo que tem como objetivo caminhar com Jesus, no conhecimento Dele, da sua humanidade que gera a misericórdia; Ele, que na sua vida, mediante a Sua Palavra, revela-se nosso modelo de Homem perfeito:

    Porque, pela sua Encarnação, Ele, o Filho de Deus, uniu-se de certo modo a cada homem. Trabalhou com mãos humanas, pensou com uma inteligência humana, agiu com uma vontade humana, amou com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, tornou-se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no pecado. (GS 22)

    Escrevendo aqui (hic), do lugar onde o Verbo se fez carne, lugar da Kenosis (abaixamento) de Deus, reconhecendo o meu limite, pedi o auxílio de Fr. Giovanni Claudio Bottini, ofm, docente emérito de Sagrada Escritura do Studium Biblicum Franciscanum de Jerusalém, onde foi decano da mesma faculdade, a quem agradeço pelo encorajamento, proximidade fraterna nas indicações, correções e supervisão no conteúdo bíblico.

    A nossa proposta se articula concretamente em quatro partes, no total de dez capítulos. Uma das características de todos os capítulos do livro é uma oração conclusiva, onde o irmão e irmã companheiros neste itinerário do conhecimento de Jesus de Nazaré é convidado(a) a rezar, a deixar-se conduzir pelo Espírito Santo, para que através do nosso sim, como aquele da virgem Maria e de São José, o mistério da Encarnação possa continuar nas nossas vidas e o Evangelho possa propagar-se em todos os confins da Terra.

    A primeira parte é introdutória, com três capítulos visando o conhecimento de Jesus, do verdadeiro motivo por que conhecê-Lo e reconhecê-Lo mediante a Sua Palavra; Ele que, através dos seus gestos humanos, habita corporalmente a plenitude da divindade (cf. Cl 2,9). Neste caminho de encontro com a humanidade e a misericórdia de Jesus de Nazaré, não podemos ignorar a sua ascendência, o seu povo, as suas raízes que, ao conhecê-Lo, se tornam também nossas. Por isso, mesmo que de forma muita sintética, vamos conhecer a sua humanidade ligada à sua estirpe, ao seu povo, às suas tradições.

    A segunda parte, com três capítulos, é dedicada à vida escondida de Jesus de Nazaré, que mediante o mistério da Encarnação, fazendo-se pobre, nos enriqueceu com a sua pobreza (cf. 2Cor 8,9). Acolhendo o Emanuel – Deus conosco – iremos conhecer o lugar concreto do amor, da humanidade e da misericórdia de Deus: Nazaré, onde tudo começou, onde Ele crescia e se fortificava (cf. Lc 2,40-52), desenvolvendo-se a nível fisiológico, psicológico e em graça (cf. Lc 2,52). Foram trinta anos em que Jesus habitou neste pequeno povoado desconhecido da Galileia, vivendo uma escola de humanidade e misericórdia, aprendendo a linguagem humana, vivendo relações e crescendo com elas; submisso a Maria e José, teve também a sua experiência de trabalhador nos longos anos que passou aqui, dando-nos o exemplo de santidade na vida cotidiana e ordinária.

    Na terceira parte, também composta de três capítulos, somos convidados a caminhar com Jesus na sua vida pública, demonstrando o quanto a sua vida escondida teve reflexos e continuação nos três anos de anúncio e ação salvadora. Seria justo dizer que, no seu estilo de vida, nas suas palavras e no seu comportamento, estes reflexos atravessaram toda as fases da sua vida, da infância à adolescência; da juventude até a maturidade. Da intimidade da casa de Nazaré, transfere-se para casa de Pedro; o pescador da Galileia conhece o Mestre de Nazaré. Teremos aqui um itinerário no conhecimento da humanidade de Jesus, que privilegiava o encontro com os pecadores, com os pobres, sofredores, os últimos da sociedade daquele tempo.

    Veremos o amor e a misericórdia na ida definitiva para Jerusalém, para oferecer o cálice da Nova Aliança oferecendo a si mesmo (cf. Lc 22,20), acolhendo a consumação de tudo das mãos do Pai, na agonia humana no Getsêmani (cf. Mt 26,42), aceitando na sua vontade humana que seja feita a vontade do Pai, fazendo-se obediente até a morte redentora (cf. Fl 2,8), carregando os nossos pecados na Cruz (cf. 1Pd 2,24).

    Ressaltaremos dois aspectos no mistério Pascal: com a sua morte, Cristo nos libertou do pecado; com a sua Ressureição, nos dá acesso a uma nova vida, porque como Cristo foi ressuscitado dos mortos por meio da glória do Pai, assim nós podemos caminhar em uma nova vida (cf. Rm 6,4). E Nele as nossas vidas humanas são transportadas na vida divina de Cristo (cf. 1Cor 3,1-3).

    A realidade da Ressurreição de Cristo comunica na vida dos discípulos a Sua mesma vida:

    Ele morreu por todos, para aqueles que vivem, não vivam mais para si mesmos, mas para Aquele que é morto e ressuscitado por eles. (2Cor 5,15)

    Enfim, a quarta parte e último capítulo tratará da humanidade e misericórdia na vida dos discípulos e da Sua Igreja, notadamente quando Jesus, bom pastor (cf. Jo 10,11), confirma a Pedro e à sua Igreja a missão depois da Ressurreição (cf. Jo 21,15-17). Ao aparecer aos discípulos, Ele não é reconhecido na sua fisionomia, por causa do seu corpo glorioso, mas é reconhecido nos seus gestos, aqueles humanos e de sempre: partir e repartir o pão, chamar pelo nome, ensinar a pescar diferente, cozinhar os peixes para os discípulos, ensinar as Escrituras.

    Ele é vivo, é verdadeiramente Ressuscitado! Aleluia! E continua vivo mediante o Seu Santo Espírito na vida dos discípulos e da Sua Igreja. Sempre que os seus gestos são repetidos e realizados, nós O reconhecemos.

    São muitos os testemunhos dos discípulos de Cristo, que repetiram e repetem os gestos humanos, do homem novo, Jesus (GS 22). Certamente não é possível apresentar todos os exemplos que desejo, porque, como diz o Evangelista São João, se fôssemos narrar todos os acontecimentos e gestos do Senhor, todos os livros do mundo não bastariam para contê-los (Cf. Jo 21,25).

    Eu diria que, de maneira semelhante, todos os livros do mundo não seriam suficientes para fazer memória dos gestos humanos do Ressuscitado presentes na vida dos seus discípulos e da sua Igreja: São Francisco de Assis, misericórdia e perdão; São João Maria Vianney, mãos humanas da misericórdia; Madre Teresa de Calcutá, humanidade na caridade; Pe. José Melchiori, serviço à humanidade; Dom Hélder Câmara, humano irmão dos pobres; Dra. Zilda Arns, humanidade que cura; Mons. Jonas Abib, profeta da misericórdia; Padre Zezinho, cantor da humanidade; Frei Hans Stapel, esperança na humanidade; Francisco, o Papa da humanidade no ano da misericórdia.

    É pela potência do Espírito que os filhos de Deus podem dar frutos. Aqueles que estão unidos à verdadeira videira darão os frutos do Espírito, que são amor, alegria, paz, paciência, benevolência, bondade, fidelidade, humildade, domínio si (Gl 5,22-13). Esses frutos serão parte de nossa vida quando renunciarmos a nós mesmos (cf. Mt 16,24-26), e tanto mais fará o Espírito no modo como operamos (cf. Gl 5,25).

    Assim, queridos irmãos(as), iniciemos este caminho no conhecimento de Jesus de Nazaré, para Nele formarmos nas nossas vidas e existências o templo espiritual (cf. 1Pd 2,5), revestidos da Sua humanidade e misericórdia, preparados na caridade como uma esposa se adorna para o seu esposo (Ap 21,1-2).

    Fr. Bruno Varriano,

    ofm

    Nazaré, 3 de abril de 2016

    Domingo da Divina Misericórdia

    I. Conhecer Jesus de Nazaré

    Saindo da minha oração pessoal aqui na gruta da Anunciação, em Nazaré – lugar santo da Sagrada Família, onde vivo não por mérito, mas por graça – tenho nas minhas mãos o projeto desta criatura que chamamos de livro, que passa pelo calor das minhas mãos, na ternura de Deus que nos encontrou e que, aqui em Nazaré, se fez homem, vivendo na cotidianidade a escola da humanidade e da mis ericórdia.

    Confesso, não com pouca hesitação, que sinto a responsabilidade em falar do que é conhecer o mestre Jesus de Nazaré, a sua humanidade e misericórdia. Soa-me aos ouvidos uma pergunta que Ele mesmo fez aos discípulos, quando se encontrava na região de Cesareia de Filipe, na nascente do rio Jordão, aos pés do monte Hermon: E vós, quem dizeis que eu sou? (Mc 8,29).

    Se procurarmos responder seriamente esta pergunta, teremos que ter a consciência de que a resposta é uma escola. Trata-se da escola de humanidade no nosso cotidiano, nos nossos pensamentos, nos nossos afetos. Essa consciência nos levará a perguntar que lugar Ele ocupa nas nossas decisões, nas nossas vidas. Por isso, lanço o convite ao querido(a) irmão(a), companheiro de viagem nesta Escola da humanidade de Jesus e do conhecimento Dele, a fazer desta leitura um caminho, uma escola, deixando de lado a segurança de supostamente conhecê-Lo o suficiente – a qual não provocaria mais maravilhas nem deslumbre, minando o esforço de se aprofundar no Seu amor, que é maior que todo conhecimento (cf. Ef 3,18-19).

    Vêm à minha mente as meditações de São Bernardo de Claraval – pertencentes ao grande patrimônio cisterciense – sobre o Verbo de Deus que se fez carne e habitou entre nós, que são de grande riqueza no campo da espiritualidade, pois estão atreladas à humildade de um Deus que, sendo a grandeza por excelência, se faz pequeno a fim de nos ensinar a via para reconduzir-nos ao Reino celestial; sem a humildade de Cristo, Verbo Divino feito carne, não pode haver humildade em nós:

    O Verbo Encarnado é o mestre que, com seu exemplo, ensina e nos faz colocar em confronto com a verdade sobre nossa indigência, de cuja dolorosa experiência brotará nossa humildade.

    Neste ícone do conhecimento do amor de Jesus de Nazaré, não posso deixar de citar a linda homilia do Papa Francisco, na missa da manhã na capela Santa Marta, no dia 20 de fevereiro de 2014. Naquela ocasião, o Papa afirmou que, para conhecer Jesus, não é necessário um estudo de noções, mas sim uma vida de discípulo.

    Deste modo, caminhando com Jesus, aprendemos quem Ele é, descobrimos Sua ciência, aprendendo como discípulos, nas nossas vitórias e fraquezas; é através destes encontros que nos aproximamos Dele e O conhecemos mais em profundidade.

    Quando cheguei aqui na Terra Santa, há mais de duas décadas, me impressionava o olhar das pessoas – é característico dos povos semíticos o olhar penetrante. A partir disso, eu procurava intuir como era o olhar de Jesus de Nazaré, como era o som da sua voz, o seu perfume, a sua presença; por isso, a proposta neste capítulo e nos seguintes é procurar intuir a sua fisionomia, a sua linguagem, o seu olhar de misericórdia. Mas necessitamos partir dos Evangelhos, do hic da Encarnação do Verbo, da Palavra Salvadora, que significa encontrá-Lo, escutá-Lo, renovar a nossa fé Nele.

    Quando procuramos conhecê-Lo, os nossos corações se enchem de alegria e de esperança porque Ele nos conhece e nos diz: Eu sou o bom pastor, conheço as minhas ovelhas (Jo 10,14). Conhecer Jesus é conhecer o amor verdadeiro.

    Rezo por ti, caro(a) amigo(a), e te peço que faça o mesmo por mim, para que nós possamos nos sentir amados por Deus em Cristo Jesus. Ir ao encontro do conhecimento de Jesus é ir ao encontro Daquele que nos conhece, nos aceita, nos ama como somos, realizando assim uma relação de conhecimento libertador, quando Ele se apresenta como o bom pastor, e nos doa o Seu Espírito de libertação (cf. 2Cor 3,17).

    Deste modo, o conhecimento do Senhor Jesus dá espaço na nossa existência a Ele, que será luz nas nossas vidas. Quando estamos na luz, muitas das nossas realidades são clareadas e vêm à luz aquelas partes que por vezes escondemos aos olhos das pessoas. Ele de fato nos diz: Eu sou a luz do mundo: aquele que me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida (Jo 8,14). Quem caminha na luz sabe distinguir as coisas, os valores; sabe de onde vem a salvação.

    Aqui me pergunto: quantos de nós realmente queremos ser iluminados pele conhecimento de Jesus, cuja luz chega às partes escondidas e escravizadas do nosso ser? Quando vivemos nas trevas, nos acostumamos com a escuridão e fazemos resistência à luz. Neste conhecimento da humanidade, Jesus quer nos encontrar onde nós estamos, porque Ele é o Emanuel – Deus conosco.

    No seu conhecimento, Jesus ainda se apresenta como o caminho que temos de percorrer para encontrá-Lo. Tomé fica perplexo diante desta afirmação e pede uma explicação: Senhor, não sabemos para onde vais, como podemos conhecer o caminho?. E Jesus lhe responde: Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai se não por mim (Jo 14,5-6).

    Penso não ser pessimista em afirmar que, nos dias de hoje, nos encontramos em frente a tantas estradas, mas é comum não sabermos qual é a estrada certa. O mestre Jesus de Nazaré se revela como a via, ou seja, o caminho que nos leva sem desvios e perdas de tempo ao encontro com Ele. Mas atenção, querido(a) companheiro(a) de caminho nesta leitura: Ele não é uma das possíveis estradas, da qual podemos nos servir ou não. Ele é a única estrada segura que nos leva ao encontro com o Pai. É uma via humana e divina ao mesmo tempo, acessível a todos, compreensível a quem não se fecha no próprio egoísmo e reconhece as suas próprias insuficiências.

    Aqui tocamos um ponto que considero essencial no conhecimento de Jesus de Nazaré, que é a nossa pobreza, a nossa limitação; aquilo que pensamos que possa ser um impedimento no conhecimento de Jesus, torna-se na verdade a condição para tal:

    Eu te bendigo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondestes estas coisas aos sábios e entendidos e as revelastes aos pequenos. (Mt 11,25)

    Caro(a) amigo(a), se tinhas em teu coração a tentação de deixar pela metade esta leitura, ou melhor, esta experiência do conhecimento da humanidade e da misericórdia de Jesus de Nazaré, abra a tua mente e o teu coração, e inicia a amar e bendizer a Deus pela tua limitação, porque Ele quer te encontrar ali, por isso se fez Sarx (Carne), Verbo, a poucos metros de onde vos escrevo, para encontrar a tua carne, a tua fragilidade. Por isso, traduzimos Et Verbum caro factum est como E o Verbo se fez carne; partindo da palavra grega Sarx, a tradução seria carne, mais precisamente: fragilidade.

    Fico sem palavras ao meditar o amor de Deus Pai, que nos amou em Jesus Cristo no mistério da Encarnação. E se nos deixamos fascinar por Jesus, procurando realmente conhecê-Lo, não necessitaremos mais procurar estradas diferentes, que deixam sempre um vazio existencial e uma profunda insatisfação.

    Nascendo da Virgem Maria, por obra do Espírito Santo, Ele se fez realmente um de nós, exceto no pecado, como afirma a Gaudium et Spes, 22:

    Ele é o homem perfeito, que restitui aos filhos de Adão a semelhança divina, deformada desde o primeiro pecado; já que Nele a natureza humana foi assumida, e não destruída, por isso mesmo, também em nós foi ela elevada a sublime dignidade. Porque, pela sua encarnação, Ele, o Filho de Deus, uniu-se de certo modo a cada homem. Trabalhou com mãos humanas, pensou com uma inteligência humana, agiu com uma vontade humana, amou com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, tornou-se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no pecado.

    Ele sofreu com a carne de homem, chorou com os olhos de homem, tocou com as mãos de homem, sofreu com o coração de homem. E fez tudo para nos ensinar a única via que, com Ele e por meio Dele, nos leva ao Pai. Assim, para conhecer a humanidade de Jesus, precisamos não nos deixar cair nas distrações das mil vozes que podem vir às nossas mentes, aos nossos ouvidos, e concentrar a nossa atenção somente Nele, que é a Verdade divina, o único que nos pode fazer viver uma existência humana em caminho para as realidades eternas. Por isso te convido a rezar comigo a oração que rezo com os peregrinos aqui na Terra Santa, especialmente em Nazaré, de modo que a tua mente, o teu coração, a tua humanidade, mediante esta experiência do conhecimento de Jesus, seja transportada para este lugar Santo da Encarnação, onde tudo começou:

    Senhor Jesus,

    Verbo Encarnado-crucificado-ressuscitado, com a tua permanência histórica de Nazaré à Jerusalém, santificaste e abençoaste cada canto desta Terra e nos revelaste o amor misericordioso do Pai, anunciando o Evangelho, expulsando os demônios, curando todo tipo de enfermidades, morrendo e ressurgindo por todos e cada um de nós.

    Ajuda-nos, ó doce Emanuel, a recuperar ou melhorar a nossa vida cristã e eclesial em todos os níveis (pessoal, familiar, social).

    Ajuda-nos a preencher-nos de Ti, luz e potência divina, do teu Espírito de verdade e de amor, da vontade salvadora e normativa do Pai celeste. Somente assim, seremos vitais e fecundos sinais da história da salvação.

    Faz, ó Salvador e bom Mestre, que não nos deixemos distrair por nada e por ninguém, e que nos baste somente a Ti, valor e fonte vivente de todos os bens, como bastavas a Maria tua e nossa Mãe, a São José, aos Apóstolos e aos discípulos da Igreja nascente.

    Faz com que realizemos uma plena sintonia espiritual com o Mistério do conhecimento da tua humanidade e que o Lugar Santo da Encarnação nos abra um novo caminho: o caminho santo do teu Evangelho e a vida nova que és Tu mesmo, nosso amor e nosso tudo, nosso destino de salvação e de glória.

    Amém. Gratidão sem fim!

    Conhecer o amor

    Não basta conhecer a humanidade de Jesus de Nazaré, saber que Ele é o Bom Pastor, que é luz que ilumina, que é a via, a verdade e a vida, que nos faz participar da natureza divina. Quando este conhecimento se realiza verdadeiramente, mediante a ação do Espírito, transforma-se em convicção e certeza de sermos amados por Ele, por um amor verdadeiro e pessoal. E não basta conceber o nosso conhecimento de Jesus somente na esfera dos sentimentos, afetos e emoções que são sujeitas à instabilidade, sobretudo nestes tempos de tantos pseudossentimentos. Não podemos contar somente com a emoção para conhecer e estar com Cristo, mas sim com a Sua Palavra, cuja ação é misteriosa, eficaz e intrínseca. Lemos no Evangelho de São João:

    Com efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para todo que Nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus não enviou seu Filho ao mundo para condená-lo, mas para que o mundo seja salvo por meio Dele. (Jo 3,16-17)

    E a carta de São João nos confirma isso quando diz:

    Nisto se manifestou o amor de Deus para conosco: em nos ter enviado ao mundo o seu Filho único, para que vivamos por Ele. Nisto consiste o amor: não em termos nós amado a Deus, mas em ter-nos Ele amado, e enviado o seu Filho para expiar os nossos pecados. (1Jo 4,9-10).

    E se somos capazes de amar é porque Ele nos amou por primeiro (1Jo 4,19).

    Peço perdão pela minha insistência, mas até que não tenhamos descoberto e conhecido o fato de sermos amados por Deus em Jesus de Nazaré, não poderemos avançar na vida espiritual, no conhecimento de Jesus, sobretudo no discernimento do que Ele quer de nós. Por qual motivo? Porque o nosso amor para com Deus, o nosso gesto de procurá-Lo, o nosso desejo de encontrá-Lo leva aos seguintes questionamentos:

    Como podemos amar a Deus, se antes não nos sentirmos amados por Ele?

    Como podemos amar o nosso próximo, conforme o mandamento de nosso Deus, se não nos deixarmos impregnar, permear, educar e guiar pelo amor de Deus?

    Convém lembramos que este conhecimento é tecido de experiência, de cotidianidade e sinceridade humana. Seria muito mais difícil para nós acreditarmos que somos amados por Deus, que acreditarmos no quanto somos capazes de fazer para Deus.

    Quando procuramos amar a Deus, fazemos grandes esforços para termos certeza de que estamos fazendo algo para Ele, e somos contentes por podermos fazê-lo; mas sermos amados e nos sentirmos filhos de Deus e irmãos do nosso próximo, quando estamos na escuridão, quando somos vítimas das seduções do pecado, quando somos indecisos ao fazer escolhas definitivas nas nossas vidas, é a coisa mais difícil que possa existir.

    No meu apostolado de trabalho como psicólogo clínico e psicoterapeuta, encontrei muitos presbíteros, religiosos, religiosas, seminaristas, membros de comunidades de vida, que abandonaram o caminho de discipulado não por falta de fé nas doutrinas – tampouco por não acreditarem mais nos carismas ou no chamado de Deus na vida deles – mas porque não acreditavam que Deus continuava a amá-los, mesmo depois de um grave pecado, uma desilusão ou escuridão da existência. Mas como colocar a certeza do amor de Deus, junto com o medo de abandonar-se a este amor?

    Aqui, como podes ver, não estamos somente diante de sentimentos e de emoções, que facilmente podem passar. Trata-se de algo muito mais profundo, mais forte, capaz de resistir a todas as tentações, até mesmo aos escândalos. Trata-se da certeza de sermos amados por Deus em Cristo a partir da nossa situação, do nosso nome, de onde nascemos, na família de origem, do que estamos vivendo neste momento.

    Depois desta tentativa de mergulho espiritual no amor inefável de Deus por cada um de nós, podemos louvar o Senhor e sermos felizes por existirmos neste momento histórico do nosso mundo, do nosso tempo, no terceiro milênio cristão, com tantas belezas e maravilhas que possam existir, mas com tantas contradições.

    Este é o primeiro passo que devemos dar para descobrirmos que somos amados por Deus em Jesus de Nazaré, porque Ele próprio, no seu imperscrutável desígnio de amor, fez com que vivêssemos neste espaço e neste tempo, para darmos a nossa contribuição para este mundo; além de descobrirmos, através das nossas imperfeições e momentos de fragilidades e fraquezas, o amor de Deus que tem tanta paciência para conosco.

    A dinâmica que nos guia a este amor é a atitude de reconhecer o que somos, as nossas fragilidades e os nossos pecados. Esta consciência da nossa condição abre a Cristo a

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