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chinesa do norte-produções
natureza

a minha verdadeira natureza


não é o que parece
circulo em automático
lubrificado
e esquecido de mim
a minha verdadeira natureza
encontro-a de vez em quando
vagueando por Lisboa
ou outro sítio.
que alegria!
então sou eu.
vejo os detalhes, além de os olhar,
reconheço-me,
sou eu e sinto
as raízes debaixo dos pés
mais fraco que há vinte
anos
fico com força para
percorrer Lisboa
e o planeta
lés-a-lés

carlos peres feio

in www. http://podiamsermais.weblog.com.pt
Calçada da Tapada

Ponho em prática um projecto antigo, o de escrever sobre a


minha terra. Pode-se ler no Guia de Portugal (Gulbenkian), no
volume a Lisboa dedicado, "A R. do Livramento continua-se com a
de Alcântara, onde se abre, à direita, a Calçada da Tapada, que
limita pelo Norte o bairro do Calvário talhado na antiga quinta
real".
Servem estas linhas de introdução por conterem uma
referência à rua onde nasci, a Calçada da Tapada – durante a
Segunda Guerra Mundial.
Para mim o início é aqui e começo a sentir a cidade quando a
Rua Luís de Camões se encontra com a Calçada, nesse local
exacto onde, à boa maneira lisboeta da década de quarenta do
século vinte, se nascia, em casa.
Nessa recordação de ruas, vistas de um quarto andar, há uma
vinha plantada no lado da Tapada e um amarelo carro eléctrico a
passar, do lado de fora do muro.
Não suspeitava inicialmente que
era vizinho do Instituto Superior de
Agronomia e do Observatório
Astronómico.
Com a cidade, o campo e as estrelas em mira, tinha todos os
elementos por perto para vir a sentir a minha passagem pelo
mundo como uma viagem com os pés entre o chão e as nuvens.
Tapada da Ajuda - o banco de Junot

Da Tapada da Ajuda, diz-se que Junot a apreciava e, num ponto


mais alto, se sentava para contemplar a paisagem até ao rio.
Onde hoje é o Largo do Calvário, ficava o velho Paço de
Alcântara. Foi primitivamente residência de um italiano rico,
sendo depois adquirido por Filipe I.
Nele residiram D. João IV, D. João VI e D. Pedro II, tendo este
último monarca falecido nesse palácio. Nas redondezas, existia a
Quinta da Ninfa, no local onde hoje está a Tapada. É o Marquês
de Pombal que a manda plantar, transformando-a em terreno de
caça para o seu Rei, D. José.
Por perto, outro ponto elevado, um dos melhores miradouros
sobre o
Tejo, é o
terreiro
onde se
encontra
um templo
cristão –
um dos
raros que
resistiu ao terramoto de 1755 – a Capela de Santo Amaro. É um
edifício de forma menos vulgar – redondo.
Do miradouro, desço para a Rua da Junqueira e encontro a
que foi das principais estações de Carros Eléctricos, hoje Museu
devotado a esse importante meio de transporte ainda em uso,
embora em circuitos restritos.
Será um desses Carros que me levará até ao próximo destino –
Belém.
Alcântara-Belém, em todo o terreno

A Rua da Junqueira terá sido a titular do campeonato de


palácios e palacetes ligados aos nomes da nobreza portuguesa,
tendo para
isso
contribuído
não só
algumas
famílias de
registo
antigo mas,
sobretudo, a inflação de títulos com que o século dezanove nos
brindou.
Exemplos de vizinhos? Condes e Marqueses da Ribeira
Grande, os Câmaras, Condes de Burnay, Condes de Porto
Brandão, Condes da Junqueira, Condes de Ega.
Não sei a cor das revistas cor-de-rosa da época, mas teria sido,
de certeza, notícia de mexerico o saber-se que a bela Condessa de
Ega era amante de Junot e que o Marechal, na retirada, a levou
para França, nada contrariada.
Também o antigo Forte da Junqueira albergou famílias
nobres, as envolvidas na conspiração dos Távoras; o Marquês de
Alorna, o Conde de S. Lourenço e, logicamente, o Marquês de
Távora e seus irmãos.
A Cordoaria Nacional, fundada em 1771, no reinado de D.
José, pela sua imponência e ser pertença do Arsenal da
Marinha, chegou aos nossos dias com a traça que conhecemos e
com diferente utilização. É Clube de Oficiais da Marinha
de Guerra, Arquivo da Marinha, repartição e local de muitas
exposições das mais variadas Artes.
No arquivo, tive oportunidade de colaborar na instalação de
equipamentos que defendem o pessoal, o espólio e o edifício da
ameaça de
incêndio, o terror
dos Palácios,
Teatros e Templos.
Continuo a
caminho de Belém,
sem ainda lá ter
chegado.
Desta vez, não
quero perder a tradicional cerimónia de Rendição Solene da
Guarda, a cargo do Esquadrão Presidencial do Regimento de
Cavalaria da
Guarda Nacional
Republicana, que
acontece, no 3.º
Domingo de cada
mês, às 11 horas,
no exterior do
Palácio Nacional
de Belém.
Em Belém

Ainda na Rua da Junqueira, mas já na Freguesia de Santa


Maria de Belém, fica a Biblioteca Municipal.
A parte poente do palacete, que foi do Marquês de Angeja,
construído pouco depois do terramoto de 1755, foi desta família
até 1910 e de um outro proprietário até ser comprado pela
autarquia em 1962.
Em 1965 é adaptado para servir com a função que ainda hoje
tem, de Biblioteca.
Curiosamente, também é aí perto o pequeno barracão onde
recordo ter visto em actividade, talvez, o último ferrador de
cavalos, dentro de Lisboa.
Num instante,
chego a Belém,
avistando a Praça
Afonso de
Albuquerque e os
seus jardins, onde
vejo o escultural
monumento ao Vice-
Rei, e à direita o
Museu dos Coches e o Palácio Real de Belém, agora morada
oficial de Presidentes da República.
Este palácio era, no século XVII, dos Condes de Aveiras. Em
1726, D. João V compra-o ao 3º Conde por 200.000 cruzados.
São, de seguida, adquiridas mais quintas anexas, até aos
terrenos limítrofes onde foi construído posteriormente o Palácio
Real da Ajuda.
D. Maria II viveu no Palácio Real de Belém e foi este edifício
também escolhido para residência pelo Príncipe D. Carlos, depois
do seu casamento com D. Amélia de Orleães.
Serviu de acolhimento a muitas figuras da realeza, podendo
destacar Afonso XIII, Eduardo VII, Guilherme I.
Neste Palácio ocorreram cenas determinantes da nossa
história mais recente, como a destituição do Presidente
Bernardino Machado em 1917, pela Junta Revolucionária,
O Chefe de Estado que lhe sucede dorme aqui as suas últimas
horas, em 1918, antes de ser assassinado na estação do Rossio.
Alegrias e tristezas associadas a edifícios nobres, que
perduram através dos séculos.
Belém - e agora?

Faço uma pausa na descrição do que vejo nesta bela zona dos
jardins de Belém para reflectir sobre o que me diz só por si o
nome.
Admito que, para qualquer português, o nome lhe sugira “a
Torre” e que, para os lisboetas, seja também, de imediato, um
painel mais alargado: Torre de Belém, a esplanada da Vela
Latina, Padrão dos Descobrimentos, o Centro Cultural, os
Jerónimos e, para remate, a
pastelaria. Também se pode
considerar património um “Pastel
de Belém”, tradicionalmente
polvilhado com fino açúcar e
canela.
Recomendo vivamente a quem
não conheça a zona, ou a conheça de raspão, que tire um ou dois
dias para a sua fruição plena, em pura atitude de turista.
Obrigatória é a visita ao Jardim-Museu Agrícola Tropical.
Lembro ainda que, colados ao Mosteiro dos Jerónimos, estão
os Museus Etnológico e o da Marinha. E mais há nas redondezas.
Nesta crónica só há espaço para
umas notas sobre o mais
importante monumento de
Portugal - o Mosteiro dos
Jerónimos.
D. Manuel fez construir este
Mosteiro, no local onde existiu
uma ermida. Esta terá sido fundada pelo Infante D. Henrique,
junto à antiga praia do Restelo, e em Setembro de 1460 doou-a à
Ordem de Cristo.
Termino, indicando que não foi este Mosteiro construído para
comemorar qualquer descoberta marítima – foi uma inicial
intenção piedosa de um religioso.
A Índia, essa sim, contribuiu, depois, com a riqueza que
brotou da sua exploração, para que seja o mais elevado marco na
glória manuelina.
Jardim – Museu Agrícola Tropical

Estando em Belém, é obrigatória a visita ao jardim tropical.


Poderá haver alguma confusão com mais jardins existentes na
zona, mas aquele que a seguir refiro é o “Jardim - Museu Agrícola
Tropical”, pertença do Instituto de Investigação Cientifica
Tropical, neste momento, sob tutela do Ministério da Ciência e do
Ensino Superior .
A entrada está no início da Calçada do Galvão, por detrás, e
ligeiramente à esquerda, de quem estiver virado para a pastelaria
dos Pastéis de Belém.
Tem este Jardim como origem o Regius Hortus Suburbanus,
criado por D. João V.
Anteriormente ao Hortus, o
interesse por este aprazível local foi
criado pelos frades arrábidos, que
aqui viveram num hospício e que
dotaram as paisagem envolventes de
especial beleza pelas plantas que criavam.
Em 1906 é criado o Jardim Tropical, em zona muito afastada
deste ponto (Laranjeiras), e só em 1912 passa para este local.
Com uma área de cerca de 5 hectares e com mais de 400
espécies exóticas, dispõe de alguns exemplares raros em Portugal.
Uma gigantesca Yucca, a
primeira colecção de
plantas gordas do País,
palmeiras, coqueiros, etc.
A zona dedicada ao
oriente é particularmente
atraente pelo modo como
o jardim está organizado,
dispondo de uma dezena de pequenas pontes sobre um
improvisado curso de água. Entra-se pelo Portão chinês, que
representou Macau na Exposição
do Mundo Português em 1940 e, no
seu interior, durante o circuito, é
prestada homenagem a Luís de
Camões com o seu busto, uma placa
com versos d’ Os Lusíadas e uma
réplica da gruta dos Amores.
É com mágoa que vemos, na
parte mais norte do Jardim, o
estado de degradação das estufas construídas em 1914. São belas
estruturas de aço e vidro, que dispunham de aquecimento por
circulação de água.
Um belo lago dá uma
ambiência de calma ao
local, sem que a presença
de patos, cisnes e pavões
perturbem um ambiente
que produz imagens
inesquecíveis. Quem visita este jardim não mais o esquecerá
Ajuda - O Palácio

Já referi
alguns palácios
nestas
redondezas, mas
este é, para
mim, O Palácio.
Duas razões
fortes, ser um
belo edifício - a
que os arquitectos Fabri e Costa e Silva, sobre um projecto de
Caetano de Sousa, introduziram uma estética neoclássica – e
considerar que, a par com muitos outros monumentos, este,
Nacional - encerrado com a implantação da República, e nos
inícios da 2ª metade do século
XX, com uma parte
transformada em Museu - tem
sido sempre maltratado.
Justifico esta minha opinião
afirmando que devia este
Palácio:
- ser recuperado nas zonas que
ainda mostram os efeitos de um antigo
incêndio;
- ter em seu redor uma envolvência
mais digna e sem circulação automóvel.
Depois do terramoto de 1755, foi
neste local construída, em madeira e à
pressa, a provisória “Real Barraca”.
Lembro que a anterior residência
Régia, o Paço da Ribeira, na zona do Cais das Colunas, ruiu nesse
cataclismo.
Neste Paço Velho da Ajuda, que vem a arder em 1794, morre o
Rei D. José.
Apesar do magnífico plano inicial e dos grandes recursos
financeiros, o Palácio só a espaços foi habitado, até que D. Luís aí
se instalou e sua mulher, D. Maria Pia de Sabóia, empreendeu
novas obras, criando
espaços, exóticos e
funcionais.
A descrição das estátuas
alegóricas que adornam o
pátio, a decoração interior e
o recheio contêm matéria
para várias crónicas, pormenores não adequados ao estilo leve
destes apontamentos, mas fica-me a vontade de voltar ao tema.
Não se pode no entanto contornar o recheio da Biblioteca,
inserida neste Palácio, das mais notáveis pelas preciosidades que
encerra.
Criada pelo Marquês de Pombal teve a função de substituir a
que ardeu no Paço da Ribeira. Posteriormente enriquecida por
nela terem sido incorporadas as livrarias da Mesa da Consciência
e Ordens, dos Padres do Oratório das Necessidades e do Colégio
dos Nobres.
Foram seus bibliotecários o historiador Alexandre Herculano
e o prosador Ramalho Ortigão.
Não nos podemos despedir destes livros – e desta deambulação
– com referência a personagens mais ilustres.
(Não duvido que os responsáveis pela Cultura, que até lá têm
escritórios, ao lerem esta crónica, mandam iniciar as obras para a
semana!)
Janelas Verdes - O Museu

Damos um salto na cidade, mantendo-nos perto do Tejo. Estamos


agora no percurso entre Alcântara e o Cais do Sodré, rumando a
nascente. Não muito longe do local onde iniciei esta viagem pela
nossa Lisboa, está o Museu das Janelas Verdes, também Museu
Nacional de Arte Antiga.
No século XVII, o 1º Conde de Alvor, da casa dos Marqueses
de Tancos, mandou construir o seu Palácio – uns anos mais tarde
seria vendido a Matias de Eça, segundo Director da Casa da
Moeda, autor da notável obra que
são as “Reflexões sobre a Vaidade
dos Homens”. É um filho deste que
vende o Palácio ao Marquês de
Pombal.
O Museu, enquanto espólio, previamente instalado no
Convento de S. Francisco da Cidade, vem a ser aberto ao público
em 1884.
Situado entre Santos e Alcântara, com vista sobre o rio Tejo,
tem uma situação que oferece, do largo da entrada ou dos seus
jardins, uma vista panorâmica que mais não se esquece.
No seu interior uma rica
colecção, única em alguns
aspectos, constituída
principalmente por pintura
primitiva portuguesa, pintura
das escolas espanhola, italiana,
alemã, holandesa e flamenga –
ainda a ourivesaria, cerâmica, tapeçaria, os paramentos religiosos,
etc.
A não esquecer a biblioteca privativa do Museu, que José de
Figueiredo declarava ser de 3000 volumes – hoje quantos terá?
Os espólios dos objectos de arte provenientes dos conventos
suprimidos, quando da extinção em 1833 das Ordens Religiosas, e
o da Rainha Carlota Joaquina, os donativos do rei D. Fernando,
o legado do Visconde de Valmor, a cedência dos quadros do
Poeta Guerra Junqueiro e obras trazidas do estrangeiro por Reis
são parte importante do que muito belo podemos ver.
Termino com o que parece
inevitável – visitem o Museu! Neste
século XXI estamos em posição de
melhor que ninguém apreciar a
delicadeza e a elegância de tantas
peças pinturas e mobiliário.
A criatividade do Homem é
sempre um desafio mesmo quando a tecnologia não acompanha o
sonho. À medida que os materiais
se desenvolvem e a tecnologia
avança, as realizações humanas
não param de nos surpreender.
Acima disso tudo está a arte e essa
teve sempre realizações excelentes
– muitas patentes no acervo ímpar deste Museu.
Da Central Tejo à Torre mais famosa

Em Belém, mais
concretamente no Cais de Belém,
começado a construir no reinado
de D. João V, terminado já no de
D. José, embarcaram em 1759 os
Jesuítas expulsos do reino. Daí
saiu a família real, no ano de 1807,
em fuga para o Brasil. Em 1828 aí
desembarcou D. Miguel.
Além da estação fluvial, com o
seu imponente farol, é importante na paisagem o edifício da
Central Tejo, o primeiro grande complexo fabril que
transformava carvão em electricidade e iluminava os lisboetas a
partir de 1909. Funcionou até 1975 e é hoje o Museu da
Electricidade, através dos muitos edifícios que foram sendo
acrescentados.
E foi neste Museu que recentemente ocorreu o lançamento
de Farândola do Solstício, livro de memórias de infância por terras
de Miranda do amigo e
companheiro de letras
Jorge Castro – o
exemplo de um
equipamento que há uns
anos já deixou de gerar
electricidade aos
lisboetas, mas que
continua a iluminar-nos o espírito com a beleza das suas
instalações e com todos os eventos culturais que por lá ocorrem.
Nesta zona, não passa despercebido o Monumento aos
Descobrimentos, ex-libris da Exposição do Mundo Português, de
1940. Simbolicamente em forma de caravela, tem, na proa, o
infante da casa real D. Henrique, e, nas rampas laterais,
personagens marcantes ligadas aos descobrimentos. Todos olham
o rio e o mar com a vontade de partir que os deve ter animado há
500 anos.
O popularmente
chamado Padrão dos
Descobrimentos,
reerguido em 1960,
lembra esses tempos de
descobertas, que, por
vezes, atrapalham os
nossos dias com uma
excessiva carga que nos amortece a força para as realizações tão
necessárias neste princípio de século.
A pouca distância temos a Torre de Belém, ícone da cidade, e
monumento que não mais abandona as mentes dos turistas que
nos visitam. É na realidade um monumento nacional ímpar, que,
enquanto edifício, nasceu com a missão de defender o rio e em
homenagem ao patrono da
cidade, São Vicente.
Chamado de “mestre do
baluarte do Restelo”, o
Arquitecto Francisco de
Arruda foi quem a construiu
por volta de 1516.
Classificada pela UNESCO como Património Cultural de
Toda a Humanidade e eleita como uma das sete maravilhas de
Portugal, pode dizer-se que é um dos mais elevados expoentes da
arte Manuelina, com raiz na tradição romano-gótica, embelezada
com a decoração de origem muçulmana.
Uma peça que bem simboliza um povo nas suas características
inconfundíveis a par com as tradições onde durante séculos
bebemos a nossa europeia cultura.
Que eu tenha, com estas linhas, conseguido o feito de pensarem
nos próximos dias de lazer visitar ou revisitar estes monumentos
que tanto contribuem para que Lisboa seja a bela capital que é!
A continuar.
Em breve. Talvez.
Quem sabe….
em

www.http://birdbird-birdbird.blogspot.com

chinesa do norte – produções

Lisboa, Janeiro de 2009

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