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In: JORNADA
GOIANA DE ARTETERAPIA, 2., 2008, Goiânia. Anais... Goiânia: FEN/UFG/ABCA,
2008. p.114-122. Cap.13. (ISBN: 978-85-61789-00-8).
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Pesquisa inserida no Grupo de Pesquisas em Paradigmas Assistenciais em Terapias
Alternativas (NEPATA) da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás
(UFG).
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Arteterapeuta, Profª Drª da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás
(FEN/UFG), Presidente da Associação Brasil Central de Arteterapia (ABCA), membro do
conselho diretor da UBAAT, integrante da rede PsicoArte. E-mail: aclaudiaval@terra.com.br
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Graduanda de Enfermagem da UFG e relatora do trabalho
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Graduanda de Enfermagem da UFG
semelhantes às suas e, ainda, compartilhar dificuldades e anseios relacionados
ao próprio transtorno mental.
Considerações Iniciais
As pessoas portadoras de transtornos mentais são pessoas consideradas
diferentes dos ditos “normais” pelas suas dificuldades em lidar com sua
subjetividade e os relacionamentos e por terem idéias, valores, concepções
sobre a vida, que nem sempre são os esperados pela sociedade
(VALLADARES, 2006a, b. c e d; VALLADARES & FUSSI, 2003; VALLADARES
et al, 2003).
Os doentes mentais são seres humanos que possuem certa instabilidade
emocional nas suas relações mais próximas e sofrem, no decorrer da vida,
várias perdas relacionadas ao padrão de normalidade, à capacidade produtiva,
aos padrões sociais, às regras e normas sociais.
Os transtornos mentais constituem de desordens de origem psíquica,
gerando, muitas vezes, desvitalização e experiências estressantes e
traumáticas no paciente, família e comunidade. E para amenizar estes fatores,
o arteterapeuta poderá estimular o paciente a lidar com materiais lúdicos com a
finalidade de transformá-los criativamente, em objetos que darão nova forma e
novo “sentido” à sua vida (VALLADARES, 2004b; VALLADARES, 2006a, b. c e
d).
A Arteterapia é um processo terapêutico predominantemente não-verbal,
por meio das artes plásticas e da dramatização, que acolhe o ser humano com
toda sua complexidade e dinamicidade. A Arteterapia também procura respeitar
os diversos aspectos dos pacientes, como os afetivos, culturais, cognitivos,
motores, sociais entre outros, aspectos tão importantes na saúde mental
(VALLADARES, 2004a).
Com este estudo procurou-se fazer uma análise geral do processo
arteterapêutico desenvolvido com pessoas em sofrimento mental, seguindo os
parâmetros estabelecidos pela dimensão afetivo-cognitiva da análise
microgenética.
Percurso Metodológico
Utilizou-se neste estudo a abordagem qualitativa, tanto a exploratória
como a descritiva, a partir do acompanhamento das sessões de Arteterapia e
análise das produções artísticas efetuadas no período.
A clientela foi composta por 50 pacientes psiquiátricos adultos, de ambos
os sexos. As sessões de Arteterapia foram realizadas numa instituição pública,
sem internação, especializada em saúde mental no interior do estado de São
Paulo (Ribeirão Preto/SP).
O grupo foi formado por pessoas aquiescentes ao processo, o que tornou
rotativa, isto é, a clientela era livre para entrar e sair do grupo e das sessões
quando quisesse.
Foi desenvolvida durante seis meses no ano de 2005. Os usuários
incluídos no estudo apresentaram oscilação no diagnóstico clínico, com maior
prevalência de transtornos de pensamento (esquizofrenia) e de
humor/ansiedade (transtorno bipolar).
Levou-se à unidade um Projeto de atendimento com base na Arteterapia.
Após sua aprovação, iniciaram-se as intervenções de Arteterapia, que
consistiram de acompanhamento grupal em oito sessões, com duração
aproximada de uma hora e meia a duas horas cada uma, cujos objetivos foram:
permitir a exteriorização de sentimentos, tensões e angústias; trabalhar a
reorganização do meio interno do usuário; estimular sua imaginação, a
criatividade, o autoconhecimento e a auto-estima, bem como a inter-relação e a
socialização do indivíduo no grupo e ainda resgatar seus potenciais
desconhecidos ou inativados sobre a arte.
Inicialmente, procurou-se estabelecer uma relação de confiança com o
grupo de usuários da instituição, por meio de contato individual e coletivo,
como também despertar sua curiosidade, a fim de permitir que aqueles que
não conhecessem o processo arteterapêutico tivessem a oportunidade de
conhecê-lo, mas de forma livre, sem imposições, para, em seguida, aderirem
ao grupo de trabalho espontaneamente.
Durante as intervenções de Arteterapia trabalhou-se vários tipos de
modalidades de arte apoiadas às necessidades dos usuários, tendo as
intervenções favorecido as condutas focal e imediata, isto é, as necessidades
emergentes conflitantes dos usuários e reforçado o vínculo do usuário tanto
com a arteterapeuta como com a instituição.
Esta proposta terapêutica focal transcorreu de forma simples, pertinente
com a temática predominante naquele momento específico, ou seja, estimulou
a busca e o encontro de significados por meio da relação do usuário com o
objeto e com as diferentes dinâmicas propostas. As intervenções consistiram
de técnicas lúdicas e de atividades artísticas, com condução espontânea das
dinâmicas, favorecendo, assim, a exteriorização da subjetividade do usuário.
Durante as sessões de Arteterapia utilizou-se músicas instrumentais de
fundo, a fim de favorecer a introspecção e o aprofundamento emocional dos
usuários. Nas intervenções, utilizou os seguintes tipos de modalidades
terapêuticas: desenho, pintura, colagem e recorte, construção, dramatização,
livros de histórias e escrita criativa.
Na coleta dos dados, fez o uso de técnicas de observação direta e
participante, objetivando, no processo como um todo, o desenvolvimento e o
produto final, bem como analisar a relação que o usuário estabeleceu com o
material ao utilizá-lo como forma de expressão dos seus conteúdos internos.
Registrou-se com fotografias a produção dos usuários, sendo estas
previamente autorizadas tanto por eles como pela Instituição e ainda anotou
todas as observações ocorridas no processo logo após o término das sessões.
Para análise dos dados, voltou-se à análise qualitativa, tendo seguido os
parâmetros estabelecidos pela dimensão afetivo-cognitiva da análise
microgenética, desenvolvida por Allessandrini (2004) dentro do contexto da
Arteterapia.
Considerações Finais
A experiência psicótica (agressividade e sofrimento) projeta-se na vida
cotidiana do doente mental, desvitalizando-a, por este motivo, cabe aos
profissionais de saúde, aos serviços e em especial aos arteterapeutas, a
responsabilidade pela inserção de usuários no novo modelo de atenção à
saúde mental, a fim de promover a reorganização de sua vida.
As artes, no âmbito da saúde mental, proporcionam mudanças de atitudes
e de comportamentos aos clientes, aspectos que vividos positivamente
promovem melhoria na qualidade de vida desses indivíduos (VALLADARES et
al., 2003; VALLADARES, 2004a).
Concluindo, trabalhar com portadores de transtornos mentais, utilizando a
Arteterapia, possibilita o resgate da cidadania, ultrapassar a exclusão, a
rejeição, o isolamento e o preconceito; a troca com o outro que possui
características semelhantes às suas e ainda, compartilhar dificuldades e
anseios relacionados ao próprio transtorno mental.
A Arteterapia também auxilia os personagens a expressarem e lidarem de
uma forma mais natural com a doença.
Este trabalho pode trazer contribuições relevantes para a área de saúde
mental, por ser a Arteterapia uma prática acessível ao tratamento de doentes
mentais por isso pode-se constituir num suporte importante para esta clientela,
devido aos resultados satisfatórios obtidos.
Este estudo também poderá ser aplicado em outros contextos de
Arteterapia clínica ou institucional, tendo em vista o valor e a eficácia do
trabalho arteterapêutico.
Enfim, este estudo foi o início de um caminhar do arteterapeuta em
direção à construção de um trabalho sólido voltado à saúde mental, no
atendimento às pessoas com transtorno mental, visando à valorização da
subjetividade, singularidade, afetividade e respeito ético e solidário ao ser
humano que precisa e quer ser ajudado.
Referências
ALLESSANDRINI, C. D. Análise microgenética da oficina criativa: projeto de
modelagem em argila. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004.