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Umuarama, domingo, 18 de janeiro de 2009 11

CRÔNICA Amor não tem hora nem


Claro e Simples lugar [King Kong]

A Verdade ou Realidade não é algo incerto, misterioso


ou escondido. Você não tem que perguntar a outra pessoa
para descobrir o que é. Nem para um professor, um buddha,
seus pais, um padre, um rabino, um xamã ou qualquer outra
autoridade do gênero. Ela também não é algo que se possa
pesquisar num livro. A verdade vem até nós através da visão.
Ver é Saber.
O ato de enxergar é imediato, não precisa de confirma-
ção, mas geralmente nós não somos muito bons em ver o
que está verdadeiramente à nossa frente.
Tenho um bom exemplo para o que estou dizendo:
olhe para a figura abaixo. Acredite você ou não, é uma
fotografia renderizada de algo muito familiar, algo que você
já viu ao vivo ou através de imagens incontáveis vezes. O amor é assunto recorrente e inquestionável. Música, cine- ma. Tão famosa que teve várias refilmagens, sequências e adapta-
Se você não reconhecer imediatamente o que está na ma, teatro ou boteco, ele está sempre lá. Afinal uma pessoa sem ções. Citarei apenas as três mais populares, pois valem a visita.
figura, preste atenção no seu estado de espírito e perceba amor pelo o que quer que seja não move uma palha na vida. Muitas A primeira versão de King Kong foi filmada em 1933, dirigida por
o quão confuso e perturbado isso lhe deixou. vezes a gente tenta fugir e, quando se dá conta, está com ele Ernest B. Schoedsack e Merian C. Cooper. Tinha no elenco, a bela
Aqui vai a Imagem da crônica. Tenta usar ela o maior q pululando na cachola, louco de vontade de ganhar algumas linhas Fay Wray, Robert Armstrong e Bruce Cabot. Essa versão tem uma
você puder. Valeu. ou dedos de prosa. Então, aproveitando o eterno gancho senti- atualidade tão incrível na fotografia e direção que deixaria muito filme
A maioria das pessoas, ao olhar esta figura pela primei- mental, vamos falar de amor. de hoje em dia no chinelo. O ritmo do filme
ra vez, dizem: “Eu acho que é um homem deitado.” Mas A gente sempre ouve aquela história ganha de mil a zero da refilmagem de 1976,
dizem isso sem qualquer certeza, ainda em dúvida. Elas do amor não correspondido ou do que se a mais famosa de todas, dirigida por John
acreditam ser esse homem deitado, mas não há o senti- corresponde e não é viável. É sim, vivemos Guillermin e com Jeff Bridges, Charles Gro-
mento de realmente vê-lo, não há a convicção de saber o nos apaixonando pelo que não pode, gos- din e a loiríssima Jessica Lange no elenco.
que realmente está desenhado na imagem. tando do que não deve e assim vamos Mesmo os efeitos especiais da versão de
Continue olhando a figura. Eu garanto que quando decorando nossa existência com as lem- 1933 tem mais poesia e magia do que os da
você realmente enxergar o que tem ali, toda a sua incerteza branças das desilusões e lições aprendi- versão dos anos 1970, que passou muitas
vai imediatamente desaparecer. Você saberá, sem sombra das. vezes na televisão.
de dúvidas, o que é e todos os “achismos” e desconfortos Por exemplo, o feio brutamontes que Apesar do filme de 1933 ser de uma
irão instantaneamente cessar. se apaixona pela bela e delicada donzela qualidade que não foi superada até hoje,
Se você ainda não viu, continue olhando. Alguma hora e dá início ao seu martírio para comovê-la Peter Jackson, em 2005, conseguiu igualar
você verá. E quando você conseguir, perceba a repentina e ganhar seu coração. Completamente o ritmo e a emoção da história com os da
mudança que acontecerá em sua mente. hipnotizado de amor ele se deixa levar, cai primeira versão. Tendo no elenco Jack Bla-
Notou o quanto você relaxou quando, de repente, em armadilhas e passa por situações ab- ck, Adrien Brody e Naomi Watts, além de
enxergou? Seu estado de espírito que antes era obscuro, surdas diversas até que consegue chamar efeitos especiais quase que inacreditáveis e
incerto e desconfortável foi transformado instantaneamen- atenção da garota e tê-la em seus braços. uma fotografia exemplar, a versão mais re-
te em clareza e convicção na hora em que você viu. E esta Mas não pode um sujeito diferente como cente de King Kong emociona, provoca ca-
clareza e convicção permanecerão com você em todas as ele ficar com uma moça tão sublime. Ele lafrios (a cena dos insetos gigantes é ines-
vezes nas quais você olhar esta figura novamente. Se lhe vai ser perseguido até que desista da ga- quecível) e no final (apesar das 3 horas de
disserem: “É a figura de um homem deitado”, você saberá rota e saia de cena. Será ele forte para duração), nos dá uma enorme sensação de
que estão errando feio e não existirão argumentos para agüentar as forças contrárias ao amor, satisfação e lágrimas pra os mais sensíveis.
influenciar o que você já sabe. Esta é a diferença entre como o preconceito e as instabilidades da Para finalizar, fica um dialogo da parte
realmente ver e simplesmente acreditar, ter uma idéia, um vida? final do filme, entre um policial e Carl De-
conceito. O enredo acima traz o mito que sim- nham, o diretor de cinema personagem do
Os ensinamentos budistas, também chamados de boliza o conflito entre a natureza primitiva filme, que ilustra e resume bem a mensa-
Dharma, apontam um caminho similar, porém mais univer- do ser humano - representada pelo instin- gem do mito encenado em King Kong:
sal e profundo para esse sentimento de “Ahá!”. Mas não se to, força e paixão do gorila - e seu lado - Foi um espetáculo impressionante! -
trata de reflexões vagas sobre algo distante, é sobre o aqui, civilizado, na imagem da mocinha gracio- comentou o policial. - Nunca pensei que os
o agora. Sobre o despertar para este exato momento e ver sa. É um clichê e se encaixaria em milha- aviadores fossem conseguir liquidá-lo.
o que realmente está aí. Da mesma forma que o seu estado res de filmes românticos “água com açú- - Não foram os aviadores que o liquida-
de espírito mudou quando você viu o que estava na figura, car” se não fosse vivido entre um macaco ram - disse Denham, lentamente.
o mesmo sentimento de certeza e convicção tomará conta de 15 metros de altura e uma mulher. Sim, - Como?
de você quando enxergar realmente o que você está viven- estamos falando de King Kong, uma das - Foi a Bela. Como sempre, a Bela
do. Então as coisas se tornarão claras. mas famosas histórias de amor do cine- acabou matando a Fera.
Isto é chamado de iluminação ou despertar, que está
disponível para todos nós, em todos os momentos, sem
exceção.

Obs: Para os que gostaram do texto, todas as pesquisas


que fiz indicam que ele foi retirado do livro “Buddhism: Plain
and Simple” escrito por Steve Hagen, com versão em
português: “Budismo: Claro e Simples”.

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