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I . Introdução pág.03
II . Teoria crítica da Escola de Frankfurt pág.04
Indústria cultural como sistema pág.05
O indivíduo na era da indústria cultural pág.06
A qualidade dos produtos culturais pág.07
Romances populares pág.08
Filme pág.08
pág. 2
I. Introdução
pág. 3
II. Teoria crítica da Escola de Frankfurt
1
Pertenceram ao instituto autores como Horkheimer, Adorno, Marcuse e Habermas
pág. 4
A teoria crítica propõe-se, assim, a concretizar o que escapa à sociologia, uma
teoria da sociedade que implique uma avaliação crítica da própria construção científica.2
Neste sentido os autores propõem a experimentação contínua dos pressupostos teóricos
criados, numa tentativa de provar o negar a veracidade dos mesmos.
Este termo “indústria cultural” foi pela primeira vez utilizado por Adorno e
Horkheimer no livro “Dialética e Iluminismo” publicado em 1947 e veio substituir o
conceito de “cultura de massas”, uma cultura que nasce instintivamente nas massas. O
significado lato de “indústria cultural” é totalmente distinto do de “cultura de massas”.
O sistema da indústria cultural é constituído pelos “filmes, rádio e imprensa”3. A
justificação deste sistema que é tecnológico, baseia-se no facto de o mercado de massas
impor estandardização e organização, gostos do público e as suas necessidades que
exigem patamares baixos e estereotipados de qualidade que obedecem e são fruto do
surgimento das indústrias de entretenimento que emergiram na Europa e Estados
Unidos da América nos finais do século XIX.
A estratificação dos produtos culturais, por qualidade técnica ou interesse adequa-
se ao sistema produtivo, oferece-se produtos em quantidade, mas de baixa qualidade,
não havendo nada de novo, mas uma representação, de contornos diferentes, de algo que
no fundo é sempre igual. Multiplicam-se os produtos culturais, mantendo-se
invariavelmente a essência. Neste sistema cultural, o processo é uniforme e raramente
mutável, existindo uma aproximação dos formatos, de modo a completarem-se e
rentabilizarem-se comercialmente de forma mútua. Desde o elemento mais básico,
como o argumento de um filme, até ao resultado final, como na cadeia de montagem de
Taylor, em que tudo se produz automática e sequencialmente.
Este modelo condiciona de forma clara todo processo de consumo, qualidade do
produto e autonomia do consumidor. No fundo, o aparelho da indústria cultural
determina o consumo e exclui tudo o que é inédito e possa acarretar riscos, preferindo a
eficácia dos seus produtos.
2
“Os fins específicos da teoria crítica são a organização de um vida em que o destino dos indivíduos seja dependente
não já do acaso e da cega necessidade de incontrolados laços económicos, mas da realização programada as
possibilidades humanas”, Marcuse, 1936
3
Adorno e Horkheimer, 1930, citado em “Teorias da Comunicação”, Mauro Wolf
pág. 5
A obra de arte foi mercantilizada pela indústria cultural. Perdeu o seu carácter
único de autonomia e “priva os seres humanos, de maneira enganosa, precisamente
daquela libertação do princípio de utilidade que deveria inaugurar. A sua contemplação
e gozo são substituídos pela troca de uma mercadoria que é valorizada, primariamente,
pelo seu valor de troca e não pelo seu carácter estético intrínseco”4.
4
John B. Thompson, “Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa”
2ª Edição, Editora Vozes, 1998
5
“Embora os indivíduos acreditem que os seus tempos livres se subtraem aos rígidos mecanismos produtivos, na
realidade, a mecanização determina tão integralmente o fabrico dos produtos de divertimento que aquilo que se
consome é apenas uma cópia e reprodução do próprio processo de trabalho”, in Wolf, Mauro; Teorias da
comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
6
Horkheimer – Adorno, 1947
7
Ibidem ‘5
pág. 6
O controlo psicológico emerge nas sociedades, verifica-se um desaparecimento da
individualidade, substituída pela “pseudo-individualidade”8, o indivíduo está veiculado
a uma identidade construída no seio da sociedade e limitada pela indústria cultural. A
forma estandardizada, repetitiva e homogénea dos produtos criados por esta indústria
para o consumo, faz da cultura moderna de massas “um meio de controlo psicológico
inaudito”9. Actualmente a indústria cultural é uma estrutura social em crescente estado
de hierarquização e autoritária que transforma a mensagem de obediência irreflectida
em valor dominante.
Na invariável superioridade da sociedade, enquanto conjunto, face ao indivíduo
alienado, este “não passa de um fantoche manipulado pelas normas sociais”10. A
individualidade do consumidor altera-se. A influência da indústria cultural, em todas as
manifestações, transforma o sujeito num “prisioneiro que cede à tortura e acaba por
confessar seja o que for, mesmo aquilo que não fez” 11. Vejamos o exemplo do ouvinte
de música ligeira ou popular: devido às pressões exercidas pela estrutura social, cria-se
uma vontade de desistir, de acabar com a resistência tal o peso que tem sobre si, a
“unidade do indivíduo começa a desmoronar-se”12
8
Wolf, Mauro; Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
9
Ibidem ‘7
10
Ibidem
11
Ibidem
12
Adorno, 1941/44
13
Horkheimer e Adorno, 1947, citados por Mauro Wolf
14
Wolf, Mauro; Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
15
Ibidem ‘13
pág. 7
A essência permanece a mesma em qualquer dos produtos culturais, o interesse
daqueles que neles investiram reside no rendimento que possam retirar. Assim,
verifiquemos os casos de alguns desses produtos.
1. Romances populares: são as novelas, os romances populares e policiais,
elaborados de forma simplista e formatada. Os autores de Frankfurt
consideravam esta literatura a antítese da literatura clássica, que eles
caracterizavam da seguinte forma: moral da história é entrecruzada com
enredos secundários com inúmeras tramas, quase uma por personagem, para
arrastar os leitores ao longo das páginas do jogo narrativo.
2. Música ligeira: criada de forma específica que permite que a composição
captada pelo ouvinte seja simples e facilmente compreensível e não exija
esforço de entendimento. “Desta forma, a música ligeira priva o ouvinte da
sua espontaneidade e fomenta reflexos condicionados. Assemelha-se (…) a
um questionário de escolha múltipla, quem o preenche está invariavelmente
limitado a alternativas muito precisas e limitadas”16. No estremo oposto
encontra-se a música clássica, em que todos os elementos são organizados
num todo unido, adquirindo significado. Neste género musical, como na
poesia, cada nota adquire o seu sentido a partir da unidade e totalidade do
conjunto e não do seu uso quotidiano ou denotado. O reconhecimento pela
reflexão torna-se um fim e não um meio e assume-se como a única forma de
extrair algo de novo.
3. Filme: o espectador de um policial adivinha o final. A tensão apenas se
mantém superficialmente, sendo impossível obter um efeito sério. Baseado,
tal como os romances populares e as novelas, em fórmulas de sucesso
repetidas até a exaustão, com pequenas alterações formais, mantendo-se os
mesmos conteúdos.
4. Novelas (televisão): de traços característicos idênticos ao romances
populares e filmes. Sem arriscar sucessivamente em novos modelos, copiam-
se e alteram-se ligeiramente os assuntos tratados em cada produção, tendo,
invariavelmente, por base a mesma estrutura simples com lugares comuns
como amor, traição, valores como a maldade, bondade, pureza de espírito,
teorias da conspiração e o assassínio, o mistério da morte, transportado dos
16
Adorno, citado por Mauro Wolf em Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
pág. 8
romances policiais para o pequeno ecrã em prol da vertente economicista da
indústria cultural que alimenta a sociedade de massas em que vivemos.
No fundo, instala-se o easy listening, uma perda de expressividade que resulta da
simplificação de processos, da automatização da compreensão que dispensa esforço por
parte do receptor das mensagens, sejam elas escritas, faladas ou por imagens.
Os géneros
17
Adorno (1954) citado por Mauro Wolf em Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
18
Ibidem
19
Mauro Wolf, Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
pág. 9
desorganização mental, constituem, em suma, um instrumento necessário de economia
na aprendizagem”20
A capacidade de antevisão é resultado do crescimento da divisão do conteúdo
televisivo em género (policial, acção, comédia, romance, etc.) “conduziu ao
desenvolvimento de formas rígidas, fixas e importantes porque definem o modelo de
atitude do espectador, antes de este se interrogar acerca de qualquer conteúdo
específico, determinando, assim, em larga medida, o modo como esse conteúdo é
percebido”21.
A forma como as indústrias culturais investem nos seus produtos apenas se “interessa
pelos indivíduos como clientes e empregados”22. Segundo Adorno, este fortalecimento
dos estereótipos vai minimizando o espaço concedido para as pessoas modificarem os
seus preconceitos, no sentido de opiniões preconcebidas, sobre o mundo que as rodeia.
“Quanto mais dura e complicada a vida moderna se torna, mais as pessoas se sentem
tentadas a agarrar-se a clichés que parecem conferir uma certa ordem àquilo que, de
outra forma, seria incompreensível”23.
O expoente de Habermas
Ainda que o nosso foco de análise seja a chamada primeira geração da Escola de
Frankfurt, constituída pelo núcleo duro de Adorno e Horkheimer, preferencialmente
direccionada para a análise dos produtos culturais e da arte, não deixamos de referir,
como nota, a aplicação da Teoria Crítica à informação e à esfera pública que conheceu o
seu expoente com Habermas.
Para o pensador alemão, à semelhança do que acontece com a arte e a cultura,
também a informação e a esfera pública se degradariam com a emergência das
indústrias culturais.
Na mudança estrutural da esfera pública, “A comercialização da comunicação de
massa alterou o seu carácter de maneira fundamental: o que tinha sido, numa época, um
fórum privilegiado de debate racional-crítico transformou-se em apenas mais um campo
de consumo cultural, e a esfera pública emergente transformou-se num mundo
20
Ibidem, ‘18
21
Adorno (1954), citado por Mauro Wolf em Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
22
Mauro Wolf, Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
23
Horkheimer – Adorno citados por Mauro Wolf em em Teorias da comunicação; Editorial Presença; Lisboa; 1992
pág. 10
fraudulento de pseudo-privacidade que é criticado e controlado pela indústria cultural”.
Para Habermas, a comercialização da informação de massa levaria mesmo à destruição
progressiva da esfera pública.
Características fundamentais da Teoria Crítica
pág. 11
III. Aspectos positivos da Teoria Crítica
A Teoria Crítica primou, então, por frisar que as indústrias culturais tiveram o
efeito de romper com a tradicional autonomia dos produtos culturais em relação ao
mercado. Com a cultura de massas e as indústrias culturais a arte foi, precisamente,
direccionado para os mercados e o paradigma da criatividade simbólica e romântica foi
substituído pelo paradigma da criatividade instrumentalizada e racionalizada, por
estudos de mercado e de rentabilidade, para formatos preparados para as massas. Neste
quadro, não é despropositado ponderar um empobrecimento e um atrofiamento da
24
Benjamin, Walter, Sobre arte, técnica, linguagem e política; Relógio de Água; Lisboa; 1992
pág. 12
criatividade e da liberdade artística. Ainda que comprometida ideologicamente, a
denúncia de Frankfurt da lógica capitalista, que transformou as obras de arte e os
produtos culturais em meras mercadorias para consumos em massas e cujo valor
dependia do nível de rentabilidade e aceitação popular, assume hoje contornos,
particularmente, pertinentes.
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por um filme que gera toda uma linha de produtos associados à sua temática, ainda que
por mais díspares em termos de forma: roupa, brinquedos, álbuns de música, reedição
em DVD, entre outros. Por outro lado, numa perspectiva mais sociológica, a Teoria
Crítica destacou-se por realçar o que para muitos estudos de comunicação ainda não era
claro no seu tempo: os media como as novas, e tendencialmente dominantes,
instituições de sociabilização.
28
Tar, Zoltán; A escola Francoforte (pág.201); Edições 70; Lisboa; 1977
29
Pressupõe-se aqui a Teoria da Reificação: o conhecimento de uma realidade naturalizada que se afirma como única
e não como construção histórico-material, em relação à qual o homem perdeu a capacidade de pensar ou recriar uma
versão alternativa dessa realidade que conhece.
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IV. Aspectos positivos da Teoria Crítica
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destes formas de expressão simbólica. Por outras palavras, a perspectiva demasiado
pejorativa destes produtos pelos autores de Frankfurt resulta de uma visão constrangida
e limitada à arte clássica – onde se integra a música clássica, a pintura tradicional, o
teatro ou a literatura clássica - e de uma certa incapacidade de renovar essa arte para
novos padrões emergentes em que a técnica interviesse para a sua democratização, isto
é, para o aumento da sua acessibilidade aos públicos.
Se o cinema foi uma das áreas mais afectadas em relação à qual Adorno que ele
próprio se sentia mais estupidificado, os casos de Chaplin, Worson Welles, Hitchcock,
Howard Hawks ou mais recentemente Woody Allen, David Fincher, David Lynch ou
Steven Sodenbergh haveriam de mostrar uma utilização inteligente, criativa e urdida dos
pág. 16
códigos pré-fabricados30, os quais, para os autores de Frankfurt estavam condenados à
formatação estupidificante.
Também a fotografia e a literatura deram sinais da sua arte entre a formatação das
formas e o caso da música clássica até terá beneficiado com a reprodutibilidade como
meio para a sua familiarização. Desta forma, os públicos não ficaram, exclusivamente,
limitados a conteúdos estupidificantes que não lhes exigisse esforço de descodificação e
puderam exercitar a sua capacidade crítica e interpretante em variados tipos de
conteúdos.
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individual), a radiodifusão directa, etc. – como também aos media electrónicos
convencionais, que são objecto das mais variadas reapropriações simbólicas originais e
imprevisíveis por parte dos indivíduos (na imprensa, na fotografia, no cinema, etc.).”31
Por fim, referir que toda a Teoria Crítica acusa condições específicas do seu
tempo, que entendidas no comprometimento ideológico de índole marxista, acaba por
limitar o seu alcance científico e a sua validade no tempo.
31
Esteves, João Pissarra; Questões Políticas Acerca da Teoria Crítica: A indústria da cultura, nº33; UFBa/FC; São
Salvador da Baía; 1995
pág. 18
Bibliografia
(Ordenada alfabeticamente por nome de autor)
pág. 19
pág. 20