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7.

A Renascença

1. Introdução à Renascença
1.1. Contexto histórico
Desde 1580 e até 1640 Portugal perde a sua independência e a corte
desloca-se para Madrid ou Valladolid. É o período conhecido como Monarquia
Filipina.

1.2. Antecedentes literários


Há dois conjuntos de textos que podemos considerar obras de transição
da Idade Média para a Renascença:
1) Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, que contém composições proto-
épicas em que se tratas o tema das descobertas dum ponto de vista humanista
(face positiva e negativa).
2) Teatro de Gil Vicente, que contém personagens mitológicas (teatro alegórico)
e também trata o tema das descobertas desde uma perspectiva humanista.

1.3. Etiquetas ligadas à Renascença


A Renascença supõe a assimilação das formas artísticas greco – latinas e
do espírito que leva a utiliza-las, mas não a sua ressurreição porque já se tinham usado
na Idade Média. Deste modo, a etiqueta de Renascença ou Renascimento aparece
ligada a:
1) Humanismo: que implica o estudo da cultura greco – latina e, a partir dela, a
exaltação do Homem como cidadão do mundo e protagonista de feitos
gloriosos, quer dizer, o antropocentrismo que se opõe ao teocentrismo
medieval.
2) Classicismo: etiqueta que se refere a uma estética que estabelece um sistema
rigoroso de regras específicas para os diferentes géneros literários:
a) Épica.
b) Lírica, com subgéneros como:
■ Écloga / égloga: composições de ambientação bucólica e temática
amorosa ou social nas que intervêm mais duma personagem. Um dos
representantes mais importantes da écloga é Bernardim Ribeiro.
■ Epístola: carta em verso que abrange tanto temas intimistas como sociais.
São importantes as epístolas de Sá de Miranda.
■ Canção: composição metaliterária na que intervém no discurso o próprio
texto, o papel ou a pena. Consta do corpo do texto e um envio, uma
estrofe de menor extensão em que se apela à canção. Destacam as
canções de Camões.
■ Ode: composição comemorativa dum facto ou figura cultivada por quase
todos os autores renascentistas, entre os que destaca António Ferreira.
■ Elegia.
c) Drama, no que se diferencia muito claramente entre tragédia e comédia
(ao contrario que em Gil Vicente).

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1.4. Formas
A forma mais usada é o soneto de versos decassílabos, mas a medida
nova não impede a continuação da medida velha (redondilha) embora esta seja usada
para temas considerados menos importantes (lúdicos, folclóricos). Mas há uma
excepção: “Sôbolos rios que vão” de Camões, composição em que se trata um tema
sério em redondilhas.
António Ferreira repudiara a medida velha e mesmo criticara os poetas
coetâneos que a usam.

1.5. O Renascimento português


1) Temática das descobertas:
■ Elogiadas dum ponto de vista antropocêntrico.
■ Introdução do elemento exótico (costumes, paisagens...)
■ Dualidade entre a experiência / observação – saber livresco, que se
corresponde com a dualidade armas – letras que define o protótipo de
homem renascentista. Assim, diz Camões que ele tem numa mão a pena,
noutra a espada.
2) Admiração pelas literaturas italiana e espanhola:
■ Literatura italiana: Sá de Miranda é considera-o o introdutor das formas
renascentistas, já que estuda em Itália com uma bolsa concedida por D.
João III e entra em contacto com os intelectuais italianos do século XVI
(Dante, Petrarca, Bocaccio). Assim, assimila uma nova concepção da
literatura e o chamado dolce stil nuovo.
■ Literatura espanhola: quando Sá de Miranda volta da Itália passa por
Espanha e conhece a literatura espanhola do século XVI da mão de autores
como Garcilaso de la Vega ou Juan Boscán, quem animara a Sá de
Miranda a praticar o dolce stil nuovo.
3) Bilinguismo: prática que já se dava no Cancioneiro Geral e em Gil Vicente,
e que continua agora favorecida pela admiração pela literatura espanhola e o
contexto histórico (Monarquia Filipina). Todos os autores renascentistas
praticarão o bilinguismo, excepto António Ferreira quem mesmo o criticara
na sua obra Poemas Lusitanos1.

2. As descobertas
2.1. Fase dos navegadores
1) Inicia-se em 1415, quando os portugueses chegam a Ceuta e conseguem
conquista-la. Nesta expedição participam vários membros da dinastia de Avis,
como D. João I, D. Duarte ou D. Henrique, o Navegador. Esta conquista é
recolhida na Crónica da tomada de Ceuta de Gomes Eanes de Zurara
(continuador de Fernão Lopes). É muito salientável a figura de D. Henrique,
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Obra publicada de jeito póstumo. O título também é colocado postumamente pela admiração que tem
à pátria portuguesa.
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quem tinha impulsado os estudos de Astronomia, Aritmética e Geometria na


Universidade de Lisboa para preparar pilotos eficientes e actualizados nos
progressos da náutica.
2) (Re)descobre-se grande parte do arquipélago dos Açores, do que já era
conhecida uma parte. Ademais, ultrapassa-se o Cabo de Não pela primeira
vez, um cabo sob o que existia o rifão quem for ao Cabo de Não, ou voltara ou
não.
3) Descobrem-se as ilhas de São Tomé e Príncipe, feitos que são recolhidos na
Crónica dos feitos de Guiné de Gomes Eanes de Zurara.
4) Diogo Cão chega à foz do rio Zaire / Congo.
5) Passagem do Cabo das Tormentas em 1486, que passa a chamar-se Cabo da
Boa Esperança por sugestão de D. João II. O capitão da expedição era
Bartolomeu Dias, quem volve consciente de ter aberto o caminho para a Índia.
6) É no reinado de D. João II que Cristóvão Colombo faz a sua proposição para
navegar à Índia e é rejeitado.
7) Em 1497 Vasco da Gama parte desde o Restelo com a não São Gabriel e a
não São Rafael para a Índia, e chegaria a Calecut.

Todas estas expedições realizam-se com caravelas, um tipo de


embarcação de concepção e fabrico inteiramente nacional que se torna mesmo um
emblema da representação das descobertas portuguesas.

2.2. Fase dos conquistadores


1) Inicia-se quando parte em 1500 desde Cabo Verde a segunda expedição para a
Índia dirigida por Pedro Álvares Cabral. Esta expedição teria mudado o
rombo por causa das correntes e produzir-se-ia deste modo o achamento do
Brasil, onde ficaria uma grande cruz que simbolizaria o domínio cristão e
português e que lhe daria o nome de Terra de Vera Cruz. Depois esta
expedição continuaria para a Índia.
2) Nesta altura cresce o domínio português no Oriente:
a) Nasce o cargo de vice-rei da Índia.
b) Assinam-se monopólios de navegação e comércio com diferentes
territórios, como a China.
c) Destacam capitães como Tristão de Acunha ou Afonso de
Albuquerque, quem toma Malaca (a cidade mais rica de Oriente na
altura, que destacava pela sua produção de especiarias).

2.3. Fase dos viajantes


É uma fase de decadência económica como consequência da dificuldade
que supõe organizar um império tão extenso. As expedições produzem-se
geralmente por iniciativas individuais e destaca a figura de Luís de Ataíde (vice-rei
da Índia). É o momento em que Camões escreve Os Lusíadas, obra na que se percebe

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uma certa saudade do apogeu passado. Destaca também o papel dos missionários
jesuítas, tema presente na Peregrinação de Fernão Mendes Pinto.

3. Bernardim Ribeiro
3.1. Vida
Há diversas hipóteses sobre a biografia de Bernardim Ribeiro, mas há
muito poucos documentos que as justifiquem:
1) Origem:
a) Alguns teóricos defendem que é de Torrão (Alentejo), já que numa das
suas éclogas aparece um pastor que diz ser desse lugar e interpreta-se esta
personagem como um alter ego do autor.
b) Outros autores crêem que tem de ser dalgum lugar o norte de Portugal pela
não distinção entre / / e / /.
2) Formação: por Menina e moça sabemos que domina o estilo palaciano e que
é quem de usar vocabulário jurídico.
3) Profissão: há um alvará do rei D. João III em que se nomeia a um Bernardim
Ribeiro como escrivão / notário, mas não há certeza de que seja o mesmo
autor de Menina e moça.
4) Confissão: é muito aceitada a tese de que é de origem judia, por razões como:
a) Menina e moça edita-se pela primeira vez em Itália, na tipografia do judeu
judeu Abrão Usque. Da sua tipografia sairam obras de tema religioso ou
textos sagrados para os judeus, em hebreu ou latim. Em português só
editou:
■ Menina e moça;
■ Consolação das tribos de Israel, do seu irmão Samuel Usque, uma
apologia do povo judeu.

b) Uma das leituras que admite Menina e moça é uma leitura religiosa ligada
ao povo judeu.
5) Relação com Sá de Miranda: há indícios de que Bernardim Ribeiro e Sá de
Miranda se conhecessem:
a) Na obra de Sá de Miranda há referências a um Bernardim Ribeiro ligado
à introdução do bucolismo em Portugal e do que se diz que esteve em
Itália.
b) Numa écloga de Bernardim Ribeiro aparece uma personagem chamada
Franco de Sandomir, que é interpretado por alguns estudiosos como um
anagrama2 de Francisco Sá de Miranda.

3.2. Obra
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O anagrama é um recurso muito utilizado na Renascença.

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3.2.1. Composições do Cancioneiro Geral

Há cinco composições do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende da


autoria dum Bernardim Ribeiro, mas não sabemos se é o mesmo autor de Menina e
moça, embora incluam elementos ligados ao judaísmo:
a) Importância da cor amarela, que eram obrigados a usar os judeus em Portugal
para serem discriminados.
b) Parodia ou fingimento de praticar os ritos católicos.
c) Aparece o tema da partida.

Deste modo, podemos falar duma certa intertextualidade entre Menina e


moça e estas composições.

3.2.2. Éclogas

Berndardim Ribeiro é autor dum conjunto importante de éclogas.

3.2.3. Menina e moça

A) Edições:
1) Em 1554 é editada na cidade italiana de Ferrara, na tipografia do judeu
Abrão Usque3 sob o título de História de Menina e Moça por Bernardim
Ribeiro agora de novo estampada e por suma diligência emendada. A
locução de novo tem sido interpretada à moderna, de modo que implica a
existência de edições anterior, mas no século XVI também podia significar
pela primeira vez e tudo parece indicar que esta é a primeira edição da obra.
2) Posteriormente reedita-se em Évora e adiciona-se uma quinta parte: O
romance de cavalarias.

1) Manuscritos:
a) Manuscrito A, data-lo pelo professor Asensio em 1543, já que na ultima folha se
faz referência à morte de Rui de Sá Pereira e do Bispo de Coimbra, que foi nesse
ano.
b) Manuscrito M, encontrado em Madrid. Data da segunda metade do século XVI e
é mais breve que o anterior.
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Desde 1545 a Inquisição perseguia os judeus em Portugal, razão pela que muitos fugirom para a
Itália, entre eles Abrão Usque.
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2) Edições:
a) Edição de Ferrara (1554), a cargo de Abrão Usque. Contém também 5 éclogas,
poesias menores e uma carta a Cristóvão Falcão.
b) Edição de Évora (1557/1558), a cargo de André de Burgos. Contém 5 éclogas
e o romance Ao longo da Ribeira.
c) Edição de Colónia (1559), uma repetição da de Ferrara publicada por Arnold
Birkman, conhecido pelos seus interesses comerciais em Antuérpia, um dos
lugares aos que iam os judeus exilados da Espanha e Portugal.
Há certas variantes na língua e no texto das diferentes edições, mas
geralmente segue-se a edição de Ferrara.

3) Títulos:
a) História da Menina e Moça: edição de Ferrara e manuscrito perdido do
bilibliógrafo Francisco Inocêncio da Silva.
b) Tratado de Bernardim Ribeiro: manuscrito A.
c) Saudades: manuscrito M e edição de Évora.
d) Saudades ou tristezas: manuscrito perdido de Nicolau António.
e) Menina e moça: título posto pelos leitores tendo em contas as primeiras palavras
da obra.

B) Interpretações: é considerada uma das obras mais enigmáticas do século XVI


em Portugal, já que pode ser interpretada de diferentes formas:
1) Mensagem religiosa e judaizante, que se deve a:
a) As circunstancias da sua publicação;
b) À uma personagem da sua obra, um cortesão que se torna pastor e, como é
habitual nas novelas bucólicas, tem de trocar a vestimenta e o nome. O
nome que elege é o de Bim’arder4 já que vê como um camponês foge dum
fogo mentes grita vi-me arder. Este nome tem-se interpretado como um
anagrama de Bernardim Ribeiro e o fogo do que foge o camponês como a
Inquisição. Assim, a novela seria uma lamentação pela situação do povo
judeu que tem de partir de Portugal (Menina e moça me levaram de casa de
minha mãe para muito longe).
2) Pastoril, bucólica.
3) Amorosa.
4) Autobiográfica.

C) Género:
não é possível classifica-la como novela ou romance já que, embora
tenha diferentes partes pouco conectadas entre sim, tem também uma grande
complexidade.
D) Partes não muito ligadas, senão que são uma espécie de adição:
1) O romance de Belisa5 e Lamentor:
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Também pode aparece como Binmarder ou Bimarder.
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Os nomes das personagens são anagramas em muitos casos:
- Belisa Isabel;
- Aónia Joana;
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■ Está composta por:


Um monólogo da menina, quem poderia ser considerada como a
protagonista da obra atendendo ao título, mas a novela não tem um
protagonista individual.
O relato da morte dum rui senhor, que pode ser interpretada
simbolicamente como a perda da liberdade.
O encontro da menina com a Dona do Tempo Antigo, uma mulher idosa
e sabia. Esta Dona do Tempo Antigo é uma personagem muito famosa.
■ Exploram-se as ideais da Morte e a Fortuna.
■ A linguagem é mais lírica e subjectiva que a das demais partes.
■ O discurso baseia-se na meditação, de modo que quase não há acção.
■ Aparece já uma importante carga simbólica, que se desenvolverá no resto da
obra.
■ A voz principal é a de uma jovem apresentada sozinha reflectindo sobre a
sua solidão, tristeza e condição feminina.
■ O discurso da jovem é como um estudo psicológico da mulher desde uma
perspectiva sexista, que opõe a psicologia do homem à da mulher:
Mulher: ser triste que nasce destinada à reflexão;
Homem: ser mais liberado das impressões de angústia que nasce
destinado à acção.
■ Intertextualidade com as cantigas de amigo, já que se aprece uma
capacidade de transvestimento de Bernardim Ribeiro nessa jovem.
■ Reflexões metaliterárias: a jovem menciona um livro redigido para
pessoas tristes, que dizer, para mulheres. Isto pode ser interpretado como
um prólogo da própria obra.

Comentário dalguns trechos


- Intertextualidade com:
• Novela bucólica;
• Écloga: personagem que sai da cidade por causa
dalguma desgraça pessoal, sobre tudo amorosa, e que
se refugia em solidão no campo.
- Léxico relacionado com a Fortuna / Destino, a tristeza
Trecho 1 (linhas 1 – 36) e a natureza.
- Ideia do exílio.
- Tema da mudança dos tempos, muito presente na
Renascença (Camões:”Mudam-se os tempos, mudam-se
as vontades”). É sempre uma mudança negativa.
- Interpretação religiosa: a moça pode ser a voz do
povo judeu que foi expulso de Portugal e fica errante,
fora de contacto com a sociedade.
Trecho 2 (linhas 53 – 98) - Psicologia feminina: a mulher é a emissária e
destinatária da obra pela sua condição de ser triste.

- Anima Maria;
- Avalor Álvaro.
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- Referências metaliterárias: Bernardim Ribeiro parece


transvestir-se na personagem da jovem para apresentar a
obra.
- Intertextualidade com:
Cantigas de amigo (transvestimento de
Bernardim Ribeiro na personagem da jovem);
Consolação das tribos de Israel, de Samuel
Usque, obra em que se trata o exílio do povo
judaico e a consequente tristeza.
- Discurso disfórico: léxico relacionado com a tristeza. É
o tipo de discurso mais marcado em toda a literatura
religiosa hebraica.
- Tema da partida para outros lugares e experiência da
solidão.

2) O romance de Aónia e Bimarder:

■ Presença do autor, que faz que a novela também possa ser qualificada de
autobiográfica. Assim, narra-se o percurso do povo hebraico ao mesmo
tempo que o de Binmarder, personagem que se identifica com Bernardim
Ribeiro.
■ Temática da tristeza (esta parte inicia-se com uma elegia pela morte de
Belisa).
■ Repete-se a modo de glosa todo o relatado na primeira parte.
■ Há mais acção:
durante o pranto de Aónia pela morte da sua irmã Belisa um cavaleiro
apaixona-se por ela e, para conquista-la, muda a sua vestimenta de
cavaleiro para a de pastor e o seu nome trocando-lhe as letras.
O resultado é que o cavaleiro fica com o nome de Binmarder, que
também tira da frase Bin m’arder!, pronunciada por um pastor que fugia
de ser queimado.
Sob a nova e falsa identidade consegue o amor de Aónia, abandonando
a Aquelísia, uma mulher com a que tinha uma relação de modo oficial e
por obrigação.
Aónia casa com outro cavaleiro como estratégia para esconder a sua
relação com Binmarder, mas este não sabe que é uma estratégia e foge
pelo bosque.
■ Simbolismo:
Binmarder parece o alter ego de Bernardim Ribeiro.
O fogo do que foge o pastor simboliza o fogo da Inquisição, já que os
judeus que não se arrependiam eram queimados vivos, mentes que os
que si se arrependiam eram mortos antes de serem queimados.
Aquelísia é um anagrama e Eclesia, pelo que a relação de Binmarder
com a Igreja tinha sido por obrigação e não por devoção. Isto é uma
referência à obrigação que tinham os judeus conversos de fingirem que
praticavam a fé cristã.
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■ Bucolismo cada vez mas presente (rebanhos, cães, lobos, pastores...)


■ Interpretação do ponto de vista hebraico: os elementos judaicos estão
cada vez mais presentes:
Descrição dos rituais funerários judaicos;
Oposição entre o amor por devoção com Aónia, e o amor por obrigação
com Aquelísia.

Comentário dalguns trechos


- Tema da mudança, sempre negativa.

Trecho 1 (linhas 1398 –


- Tema da Fortuna: o atento à sorte que supõe a falsa
1407) conversão.
- Referências metaliterárias: Binmarder como alter ego
de Bernardim Ribeiro.
Trecho 2 (linhas 1408 –
-
1425)

3) As aventuras de Avalor:
■ Intertextualidade com as novelas de cavalarias, já que contém as
aventuras cavaleirescas de Avalor.
■ Acção:
Avalor é levado pelas ondas a uma praia deserta, onde o visita o seu
próprio espectro da morte e parece dizer-lhe que não pertence a este
mundo. Introduz-se de novo um elemento enigmático.
Posteriormente ouve a voz duma donzela (elemento característico das
novelas de cavalarias) que lhe pede ajuda. Esta donzela representa a
sua própria alma, condenada a partir e errar pelo mundo.
Avalor vai ajudar a dama que tinha sido abandonada no monte com as
mãos atadas por uma rede de caça e, antes de empreender a aventura,
conta que ao seu pai lhe tinha acontecido o mesmo com outra dama.
Depois desafia ao cavaleiro que lhe tinha quitado a honra à dama e a
obra termina assim: disse [...] estas palavras:, um fim que não sabemos
se é consciente ou se a obra está inacabada.
■ Interpretação em chave hebraica: destino do povo judeu errante depois
de ser expulso da Espanha e de Portugal (édito de expulsão sob o reinado de
D. Manuel I).

Comentário dalguns trechos


Trecho 1 (linhas 2742 – - Tema da mulher e a tristeza: relação com o início da
2868) obra (reflexão sobre a psicologia da mulher) e com o
cabalismo hispânico ou Iluminismo.
- Anagramas.
- Ambiente cortesão que se opõe ao pastoril das outras
partes.
- Oposição entre as terras próprias e as estrangeiras e

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tema da partida (judeus).


- Mistério: Arima é descrita como uma mulher enigmática.
- O único fio de união com as outras partes da obra é a
morte de Belisa.

4) O romance de cavalarias:
■ Acréscimo da edição de Évora (1557), que não estava incluído na de
Ferrara. Em geral, não se inclui nas edições modernas ou inclui-se como um
apêndice. A maioria terminam com [...] ou um laus Deo depois da quarta
parte. A razão de que apareça este acréscimo na edição de Évora
desconhece-se.
■ A autoria desta parte não está clara. Mesmo se tem lançado a teoria de que
Menina e moça é uma colecção de escritos de diferentes épocas
remodelados de forma que parecessem um conjunto, mas no que
intervieram diferentes autores.
■ Acção:
Começa com um discurso dum cavaleiro, mas que não é o mesmo que
ia falar ao final da quarta parte.
A donzela é reposta nos seus direitos e recupera a honra e os bens, mas
a partir de certo momento Avalor é substituído por outro cavaleiro
andante: Tasbião.
Tasbião vê-se implicado em combates, traições, lutas com feras...
Aparece também um ermitão que ora pelas almas de Aónia e
Binmarder, das que se diz que estão no “outro mundo”.

Comentário dalguns trechos


- Situação na obra: último trecho da última parte da
edição de Ferrara.
- História de cavalarias (complexidade de Menina e
moça, que pode ser qualificada de diferentes modos) e
elogio do serviço à dama. Paralelismo entre o cavaleiro
Trecho 1 (linhas 3792 –
andante e o judeu errante;
3918)
- Paralelismo com o início da obra pelo afastamento da
terra própria.
- Intercalação duma história dentro doutra (Avalor conta
uma história parecida à que está a viver, mas em que o
protagonista era o seu pai).

E) Menina e moça e Crisfal

■ Crisfal é uma écloga publicada em 1554 em Ferrara, considerada por parte


da crítica como obra de Bernardim Ribeiro.
■ Crisfal seria um criptónimo de Cristóvão Falcão e, a partir do carácter
amoroso da composição, ter-se-ia criado um mito em relação com a
biografia de Cristóvão Falcão:
Nobre que esteve em prisão por casar com uma menor, história à que se
faz alusão na écloga.
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Para evitar polémicas é enviado por D. João III a Roma e, mais tarde,
seria capitão de várias fortalezas na África.
De volta a Portugal seria preso de novo por agredir um fidalgo, até que
consegue uma carta de perdão.
Finalmente casa com outra nobre.

F) O Judaísmo / criptojudaismo em Menina e moça

A partir de certas reflexões de Helder Macedo vem-se interpretando


Menina e moça como uma novela mística / religiosa em chave judaica:
1) Interpretação que tem sentido tendo em conta que:
a) Bernardim Ribeiro foi um cristão novo;
b) É escrita no momento em que os judeus são expulsos e perseguidos em
Portugal.
2) O carácter feminista de Menina e moça não poderia inserir-se dentro da
tradição hebraica em geral, mas sim tendo em conta a obra Zohar ou Livro do
esplendor redigida no século XIII por Moisés de León, que estava em pleno
apogeu a época de Bernardim Ribeiro. É uma obra que se caracteriza por:
a) Exortar ao povo judeu à resistência e à fidelidade de maneira alegórica.
b) Estar ligada ao cabalismo hispânico ou corrente dos Iluminados, que
pretendia explicar certas questões místicas da doutrina judaica, entre as que
está a de que cada mulher, como filha, noiva ou mãe, constitui para o
homem um meio de aceso à salvação (Chéquina). Esta visão da mulher
nesta obra judaica pode explicar que se considere Menina e moça como
uma novela de carácter religioso, embora não apresente a mulher no modo
tradicional da cultura hebraica.

Não podemos esquecer que a situação dos judeus em Portugal é


muito difícil nesta altura:
1) Em 1497, durante o reinado de D. Manuel I, são forçados a se converterem já
que após a expulsão dos judeus de Castela (1492) muitos refugiaram-se em
Portugal. O facto de serem forçados a se converterem deve-se, em parte, à
pressão de Castela.
2) Em 1506 produz-se o Massacre de Lisboa ou Matança da Páscoa:
■ Inicia-se um domingo de Abril em que os cristãos rezavam pelo fim da
seca e da peste e dizem ver o rosto de Cristo iluminado num altar, mas um
cristão novo diz que é apenas o reflexo do Sol.
■ Por causa desta afirmação o cristão novo é perseguido e assassinado e
estende-se a ideia de que os judeus são culpáveis da seca, da peste, da
fome..
■ Houve um chamamento para a persecução dos hereges (mesmo se tinha
prometido a absolvição dos pecados para aquelas pessoas que matassem
judeus) que tem como resultado o assassinato de entre 2000 e 4000 judeus.
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■ Quando a família real volve a Lisboa (estava fora da corte por causa da
peste) penaliza às pessoas que tinham fomentado esta persecução.
3) Em 1540 instaura-se a Inquisição em Portugal e os judeus fugiram ou foram
expulsos e, ademais, mesmo os que tinham sido expulsos tinham de pagar um
resguardo à Coroa para poder sair de Portugal.

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