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DEP: COMO CALCULAR E COMO UTILIZAR

José Aurélio Garcia Bergmann


Escola de Veterinária da UFMG
Caixa Postal, 567 - 30.161 - Belo Horizonte, MG

Introdução
O principal objetivo dos programas de avaliação genética é condensar o,
usualmente, grande número de informações fenotípicas disponíveis nos animais com
potencial para serem selecionados em poucos números que podem ser utilizados para
classifica-los facilitando a escolha, ou seleção, dos melhores para serem os pais da
próxima geração. Para a maioria das espécies de importância econômica, inclusive bovinos
de corte, estes números são chamados de diferenças esperadas nas progênies, as DEPs. A
teoria genético-quantitativa que suporta os atuais sistemas de avaliação genética é
denominada de melhor predição linear não viesada, tradução do termo em inglês. best
linear unbiased prediction, ou BLUP.
O conjunto de dados utilizados nestas avaliações é composto das mais variadas
fontes, como diversos pesos, datas e outras informações observadas nos animais, em seus
em parentes e seus contemporâneos. A teoria BLUP possibilita a correta ponderação
destas diversas fontes para obtenção da DEP para características de importância
econômica e gerencial de todos os animais envolvidos nos dados.
Este folheto objetiva uma breve descrição sobre o uso das DEPs como método
de seleção nas comparações entre animais participantes de um mesmo programa de
avaliação genética. Questões como o que as DEP predizem e quais são as propriedades
dos sistemas de avaliação genética para obtenção das DEPs, assim como o que são as
acurácias e como devem ser utilizadas serão enfocadas. Para maior detalhamento sobre o
cálculo das DEPs e acurácias, Bergmann (1995, 1996) apresenta exemplos numéricos.

O que a DEP prediz


Toda a informação genética dos bovinos está contida nos 60 cromossomos (30
pares) que cada animal possui. Estas estruturas, os cromossomos, são responsáveis pelo
código genético destes animais, inclusive aquele associado ao seu desempenho produtivo.
Quando os machos produzem as células espermáticas e quando as fêmeas formam os
óvulos, cada uma destas células reprodutivas contém apenas a metade do número de
cromossomas característico da espécie a que pertencem, em bovinos 30 cromossomos. É
por isto que se diz que os gametas são haplóides (ou n), enquanto que as demais células
dos indivíduos, as somáticas, são ditas diplóides (ou 2n). As células espermáticas de um
touro possuem 30 cromossomas e, em cada uma delas, está uma amostra aleatória de cada
par de cromossomas. Da mesma forma, os óvulos produzidos por uma fêmea bovina
possuem uma amostra aleatória de 30 cromossomas. Após a fertilização, o recém formado
zigoto contém 60 cromossomas. Nas fases iniciais da embriogênese, este zigoto se
subdivide em duas, quatro, oito etc células diplóides (2n=60). As células descendentes
continuam a se subdividir e cada célula filha contém nos 60 cromossomas todos os genes e
alelos da célula inicial, até que o animal atinja a maturidade e comece a produzir gametas
(células haplóides, n).

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Por causa do processo aleatório a partir dos qual os cromossomas formam os
gametas, os diferentes gametas de um indivíduo (touros ou vacas) possuem diferentes
combinações de cromossomas, ou seja, de materiais genéticos. Desta forma, os diferentes
gametas produzidos por este indivíduo variam no seu valor genético. Este fenômeno da
amostragem faz com que os vários filhos de um mesmo acasalamento sejam diferentes em
genética e fenótipo. Tal fenômeno amostral é denominado de segregação Mendeliana.
Como um indivíduo produz milhares, milhões de gametas, cada um com mérito genético
diferente do outro, o mérito genético médio de todos os gametas produzidos por um
animal é a sua capacidade de transmissão. A DEP é um conceito estatístico que
representa esta capacidade de transmissão. Assim sendo, a DEP é a predição do mérito
genético médio dos gametas produzidos por um determinado indivíduo (um touro ou uma
vaca, no caso dos bovinos).
Nas iniciais DEP, a letra D significa diferença, logo o conceito da DEP implica
em alguma comparação entre indivíduos, e é desta forma que as DEPs devem ser usadas,
fazendo-se comparações. Por exemplo, suponha que o sêmen de dois touros, A e B,
estejam disponíveis para venda. Touro A possui DEP para o peso aos 365 dias de idade de
+10 kg. Touro B possui DEP de - 5 Kg. A diferença entre as DEPs dos dois touros é de
15 kg. Isto significa que, se os dois touros fossem acasalados com fêmeas aleatórias da
população e produzissem cada um grande número de filhos, deve-se esperar que a média
da progênie do touro A seja superior em 15 kg à média da progênie do touro B. Estes 15
kg de diferença na média das progênies reflete a diferença no mérito genético dos
gametas produzidos pelos dois touros. Note, entretanto, que as DEPs seguem distribuição
normal e que esta comparação envolve o conceito de média. Isto significa dizer que alguns
filhos do touro A poderão se mais leves dos que alguns filhos do touro B (veja ilustração
abaixo).
TOURO A TOURO B
DEP365 = + 10 kg DEP365 = - 5 kg

ACASALADOS, AO ACASO, COM MUITAS VACAS DA MESMA POPULAÇÃO

 

Filhos de A Filhos de B

Média Média
diferença de 15 kg
As DEPs são obtidas a partir de sistemas de avaliação genética baseados, quase
sempre, na teoria BLUP. Os sistemas atualmente em uso no Brasil e no mundo possuem
várias características desejáveis, como a obtenção de soluções simultâneas para DEPs
diretas e DEPs maternas (para características influenciadas pelo ambiente materno) para
todos os animais de uma população, inclusive animais que não possuem progênie e os que
não expressaram a característica. Outras vantagens do sistema são a incorporação de todo

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o parentesco conhecido entre os animais e a utilização de informações de características
correlacionadas geneticamente entre si, nas avaliações com mais de uma característica.
Características como o peso ao nascimento e à desmama são influenciadas por
dois genótipos, o genótipo de bezerro para crescimento (pré- e pós-natal, no exemplo) e o
genótipo da mãe do bezerro responsável, no primeiro exemplo, pelo ambiente intra-
uterino (que influencia o peso ao nascimento) ou pelo ambiente materno pré-desmama,
inclusive a produção de leite da vaca, que influencia o peso do bezerro à desmama. Sendo
assim, para características como estas faz-se necessário estimar dois tipos de DEPs,
relativas ao efeito direto sobre o crescimento e ao efeito da contribuição materna sobre o
crescimento. A DEP para crescimento direto estima o valor genético médio dos gametas
de um animal, ou seja, o valor dos genes que este indivíduo passa para sua progênie e que
irão influenciar o crescimento diretamente. A DEP materna avalia o mérito dos genes da
mãe do bezerro que influenciam a sua habilidade de prover meio materno para seus filhos.
Os mais conhecidos programas de avaliação genética da raça Nelore produzem sumários
de touros com avaliações para as duas contribuições dos reprodutores, seu efeito direto e
materno sobre o peso à desmama dos bezerros. Com estas DEPs, os criadores da raça
Nelore podem determinar não apenas o impacto de determinado reprodutor sobre o peso
à desmama de seus filhos, mas também o impacto que as filhas deste reprodutor terão
sobre o peso à desmama de seus filhos (os netos do reprodutor em questão) quando estas
se juntarem ao rebanho de reprodução.
Os mais importantes programas de avaliação genética do país incorporam todo o
parentesco genético conhecido entre os animais. Como animais parente têm, na média,
genes em comum, o desempenho de um indivíduo fornece informação, não apenas sobre
os genes que este indivíduo possui e que afetam a característica, mas também sobre os
genes que parentes deste indivíduo possuem. A informação existente em parentes de
determinado indivíduo é devidamente ponderada pelo parentesco genético e incorporada à
avaliação genética (DEP) do animal. Desta forma, a incorporação do parentesco genético
influencia tanto a DEP do indivíduo que expressou a característica quanto todos os seus
parentes, possibilitando a obtenção de DEPs mesmo para indivíduos que não expressaram
a característica, além de contribuir para maior segurança, ou acurácia, das avaliações.
Quanto mais próximo for o parentesco, mais valiosa é a contribuição da informação para
obtenção das DEPs para os parentes. Como exemplo, pais e filhos possuem 50% dos seus
genes em comum, este é o parentesco genético entre eles. Para netos e avôs, o parentesco
genético é, em média, de 25%. Desta forma, as informações da progênie de determinado
indivíduo vão influenciar mais o seu DEP do que as informações em seus netos.
Outra vantagem da inclusão da matriz de parentesco nos sistemas de avaliação
genética está relacionada à correção parcial da influência da seleção praticada na
população sobre as DEPs estimadas, o que faz com que animais de diferentes gerações
possam ser comparados. A eficiência desta correção depende do quão exatas e completas
são estas informações de pedigree.
Adicionalmente, a inclusão da matriz de parentesco está associada a uma outra
importante propriedade dos programas de avaliação genética, ou seja, a correção para
mérito genético dos animais que formam os pares para acasalamento. Isto significa que o
mérito genético, ou a DEP, obtida para determinado touro é ajustada, ou corrigida, para o
mérito genético das vacas com as quais este touro foi acasalado. Tal correção tem grande
importância prática, face à frequência com que os acasalamentos dirigidos ocorrem nas
populações animais.

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A maioria dos programas de avaliação genética da raça Nelore utilizam modelos
com características múltiplas (usualmente duas). Neste tipo de avaliação as estimativas de
DEPs são obtidas simultaneamente para mais de uma característica. As vantagens
decorrentes deste tipo de avaliação é a correlação genética entre as características. A
correlação genética entre duas características quantifica, principalmente, a magnitude em
que os mesmos genes afetam estas duas característica. Esta associação pode ser positiva
como a existente entre o peso ao nascimento e à desmama, ou negativa, como a existente
entre a produção de leite e a percentagem de gordura no leite, mas pode sempre ser
utilizada com vantagem nas avaliações. Um exemplo clássico de correlação genética é a
existente entre o crescimento pré- e pós-desmama bovinos de corte (40%, em média). Isto
significa que genes que influenciam a habilidade dos indivíduos para crescer do nascimento
à desmama também vão influenciar a habilidade dos indivíduos para crescer da desmama
ao abate. Além de possibilitar maior quantidade de informações, a utilização de modelos
com características múltiplas parcialmente corrige para o problema da seleção em etapas
praticada entre os animais. Para a maioria das situações em pecuária de corte, a primeira
etapa de seleção dos bezerros ocorre após a desmama, havendo poucas eliminações
intencionais de animais antes desta idade. Logo, a freqüente utilização do peso à desmama
associado a outra característica ponderal ulterior à desmama em análises com duas ou
mais características corrige parcialmente para os efeitos da seleção.

Acurácias
As DEPs são predições da capacidade de transmissão obtidas com quantidades
de informações que variam, de um indivíduo para outro. Desta forma, a segurança com a
qual as DEPs são estimadas também varia. Esta segurança recebe vários nomes, sendo o
mais comum acurácia.
Para indivíduos com muitas informações em um conjunto de dados, o que
usualmente está associado com grande número de filhos, as acurácia das DEPs tendem a
ser altas. Para indivíduos com poucas informações, as acurácias tendem a ser baixas. Para
cada avaliação genética novas acurácias são obtidas e publicadas associadas às novas
DEPs nos sumários de touros. A medida de acurácia mais utilizada pelos programas de
avaliação genética de bovinos de corte em todo o mundo é a recomendada pelo BIF (Beef
Improvement Federation) dos Estados Unidos, sendo, por isso, denominada acurácia BIF.
Entretanto, existem outras formas de expressar a segurança associada às estimativas das
DEPs, como acurácia real (diferente da acurácia BIF), erro-padrão da DEP e mudança
possível da DEP.
O valor da acurácia BIF varia de 0 (zero) a 1 (um). Estes valores podem também
ser expressos em percentagens, logo a acurácia pode variar de 0 a 100%. Quanto mais
próximo do valor 1, ou 100%, melhor a acurácia, maior a segurança no valor estimado da
DEP. A interpretação desta segurança, ou acurácia BIF, pode ser também vista em termos
de redução da incerteza associada à estimativa da DEP de determinado animal
proporcionada pela informação disponível. Desta forma, uma acurácia de 0,20, por
exemplo, significa que apenas 20% da incerteza, ou risco, associado àquela DEP foi
removido pela informação disponível. Em outras palavras, na medida em que mais
informações sobre o animal em questão forem incorporadas ao sistema de avaliação, é
provável que o valor de sua DEP sofra alteração para cima ou para baixo. Por outro lado,

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uma acurácia de 0,99 significa que 99% da incerteza associada à estimativa da DEP foi
removida pela informação disponível. Neste caso, o grau de segurança associado àquela
DEP é resultante do grande volume de informações utilizado para estimativa da DEP. É
provável que o animal em questão seja um touro em coleta de sêmen, com grande número
de filhos distribuídos por vários rebanhos. Em outras palavras, este valor de acurácia,
0,99, significa que a inclusão ao banco de dados de mais informações sobre o animal,
provavelmente, não influenciaria o valor da estimativa da DEP. Uma vantagem a respeito
da utilização da acurácia BIF é que o seu valor tem o mesmo significado para qualquer
característica. Por exemplo, uma acurácia de 0,20 significa que 20% da incerteza
associada à estimativa da DEP foi removida, quer esta característica seja o peso ao
nascimento direto, ou materno, o peso à desmama direto, ou materno, o peso aos 365 dias
de idade, o perímetro escrotal aos 12 meses, o número de dias para o parto etc.
Como dito anteriormente, nas avaliações genéticas dos animais, assim como nos
catálogos de touros com estas avaliações, para cada DEP estimada existe uma acurácia
associada. O produtor deve estar atento para o fato de que o critério de seleção dos
animais deve ser a DEP (ou as DEPs), e não as acurácias. A seleção deve ser feita
baseada no valor da DEP e não no valor da acurácia da DEP. Isto significa dizer que
seu determinado touro tem DEP para determinada característica que coincida com os
anseios do produtor em termos de melhoramento genético, este touro deve ser
selecionado e usado como reprodutor, independente da acurácia de sua DEP. A utilidade
da acurácia está relacionada, entretanto, à intensidade com a qual este animal será usado
como reprodutor.
Desta forma, uma vez que os reprodutores a serem utilizados como pais da
próxima geração tenham sido selecionados (pelas DEPs), o produtor deve limitar o
número de fêmeas que serão acasaladas com reprodutores de baixa acurácia e utilizar mais
intensivamente reprodutores de alta acurácia. Alternativamente, o produtor pode destinar,
por exemplo, 50% do plantel de fêmeas para vários reprodutores de acurácia mais baixas
e o restante do plantel para um menor número de reprodutores de acurácia mais alta. No
caso de inseminação artificial, deve-se salientar que usualmente o preço do sêmen de
reprodutores de DEP elevada e alta acurácia é mais elevado do que o preço do sêmen de
touros jovens, de DEP elevada, mas de baixa acurácia. Em suma, parafraseando um dito
popular “o produtor não deve colocar todos os ovos(ou seriam vacas) dentro de uma
mesma cesta”.

Bibliografia
BERGMANN, J.A.G. Modelo animal, DEP e acurácia.Curso sobre Avaliação Genética em
Bovinos de Corte. I. PROGRAMA DE MELHORAMENTO GENËTICO DA RAÇA
NELORE, USP, Ribeirão Preto, 1995. p.65-81.

BERGMANN, J.A.G. Modelo animal, DEP e acurácia.Curso sobre Avaliação Genética em


Bovinos de Corte de Goiás, I. NÚCLEO REGIONAL DE GOIÂNIA/GO/EV/UFG do
PROGRAMA DE MELHORAMENTO GENËTICO DA RAÇA NELORE, USP,
Goiânia, GO, 1996. p.51-68.

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