You are on page 1of 14
| Deteminanter Sct na Sade, mu Doenga en inervencéo | promover a assisténcia social aos pobres e controlar as frontciras, as po- Inticas de satide resultavam das necessidades de higienizagio do proleta- riado nascente, das tensdes entre.as lutas urbanas e operdrias e da ne- cessidade de assegurar os interesses das classes dominantes, mantendo a ordem social € 0 processo’ de acumulacio capitalista (Rosen, 1980; McKeown & Lowe, 1986). Tendo como bergo o Estado capitalista moderno, essas politicas vao se delineando progressivamenite, em razao tanto do’ conhecimento cientifico disponivel (por exemplo, as descobertas de Pasteur, Snow) quan- to do compromisso como responsabilidade puiblica de governo. Note-se a diferenga entre a criag4o do Servigo Nacional de Satide na Inglaterra, em 1948, um sistema abrangente que assistia 0 conjunto da populagio ingle- sa, € a criacdo, apenas em 1966, dos sistemas americanos Medicare e Medicaid, cuja cobertura, ainda hoje, € bem mais restrita. Em termos praticos, pode-se admitir que a definigfo de uma poli- tica de saiide deve repousar sobre trés conceitos basicos: + acompreensio de que a satide resulta de um processo de interacgio continua entre o individuo ¢ 0 ambiente fisico e social em que vive; + centendimento de que boas condig6es de satide consistem em uma * responsabilidade compartilhada, por todos, individuos € poder puiblico; e de que + a saitde é.um investimento para. sociedade_como.um todo, e que a diminuigao das desigualdades em satide no pais resulta nao apenas na efetivagio de um compromisso ético, mas tam- bém em elemento de desenvolvimento € progresso para toda a nacao (Canada, 1994). Para refletir Quais os prineipais campos de intervencio para incidir sobre os determinantes ‘econdmicos ¢ sociais das doencas de maior prevaléncia em seu municfpio? Quais, seriam os setores governamentais responsaveis por essas intervenes? PROMOGAO DA SAUDE: EM BUSCA DE NOVO PARADIGMA A frustragéo com os resultados da biomedicina, crescentemente caudataria dos interesses do. complexo médico industrial, ¢ responsivel ela propria por provocar riscos e danos, fez com que surgisse, a partir sobretudo dos anos 60 do século pasado, ¢ em varias partes do mundo ocidental, um pensamento.critico a0 modelo ¢ voltado para revalorizaras 153 Para saber mais sobre 1s diferentes sistemas de saiide ¢ suas refor- mas, consulte os capi tulos 3 © 25. 154“ pouncas Sista ce SAbDe No BRAS dimensdes Sociais e culturais determinantes do proceso satide-enfermi- dade, ultrapassando 0 foco exclusive de combater a doenga somente de- pois de instalada. z : Ei =~" Eabora diversificado em suas referéncias conceituais ¢ na varie- dade de perfis sanitérios ¢ sociais nacionais, tais idéias tiveram sua ex- pressio mais organizada no chamado movimento da promosio » da satide, fue, inspirado na reforma do sistema canadense, consolidow-se a Part da 12 Conferéncia Internacional de Promogio da Saiide, realizada em Ottawa, Canada, em 1986. © que caracteriza a promocio da satide moderamente é conside- rar como foco da aco sanitaria os determinantes gerais. sobre-a sade. Savide € assim Entendida como produto de um amplo espectro de fatores Felacionados 2 qualidade de vida, como padroes adequados de alimenta~ do e nutrigao, habitagao € saneamento, trabalho, educagao, ambiente ff- fico limpo, ambiente social de apoio a familias ¢ individuos, estilo de vida responsivel e um espectro adequado de cuidados de sadde. LA Carta de Ottawa define promogio da satide como “o processo de capacitagao da Comunidade para ‘tuar na melhoria de sua qualidade de vida e satide, incluindo uma maior participagio no controle desse pro- cesso” (Brasil, 2002). Destacando, na promogio da satide, seus papéis de dofesa da causa da satide (adeveary), de capacitasto individual e social para a satde ¢ de mediacio.entre os diversos setores envolvides 2 Carta ee Ottawa preconiza cinco campos de agio para.a promogio da sade: elaboragio e implementagio de politicas pablicas saudaveis; = criacdo de ambientes favordveis & satde; reforgo da ago comuni ria; + desenvolvimento de habilidades pessoais; + reorientagio do sistema de satide. A promogio da sadde'como campo conceitual ¢ de praticas ¢ come movimento politico desenvolve-se nese perfodo em uma seqiiéncia de conferéncias internacionais € nacionais (Quadro 1). | | | | | | Delerminntes Soins ne Sai. Dosnga v4 Intervensio Quadro 1 - Conferéncias de Promocao da Satide ~ 1986-2005 1986 ~ Carta de Ottawa sobre Promocao da Satide 1 Conferéncia Internacional sobre Promocio da Satide (Canada) 1988 ~ Declaracio de Adelaide sobre Politicas Publicas Saudaveis 28 Conferéncia Internacional sobre Promocio da Satide (Austrélia) 1991 — Declaragao de Sundsval sobre Ambientes Favoraveis a Saude 88 Conferéncia Internacional sobre Promocio da Satide (Suécia) 1993 — Carta do Caribe para a Promogio da Satide 18 Conferéncia de Promocao da Satide do Caribe (Trinidad y Tobago) 1997 —_Declaracio de Jacarta sobre Promogio da Sadde no século XX1 em diante ~4# Conieréncia Internacional sobre Promogao da Sade (Jacarta) 2000 ~ 5# Conferéncia Internacional sobre Promocao da Satide (México) 2005 — 6 Conferéncia Internacional sobre Promogao da Satide (Tailandia) Uma andlise detalhada dos marcos referenciais ¢ recomendagbes dessas conferéncias internacionais pode ser encontrada em Buss (2003). As idéias da promogao da satide difundiram-se e foram progressi- vamente absorvidas por policy makers ¢ profissionais envolvidos com a te- mética da satide, sobretudo no mundo ocidental, onde fatores como 0 envelhecimento da populagio, a difusto de habitos de sedentarismio e ali- mentacio industrializada, a exposigio a ambientes polutdos € 0 estresse da saturacao urbana vinham aumentando exponencialmente a prevalén- cia de doencas crdnico-degenerativas, com suas implicagdes na elevagio continuada dos custos da assisténcia. Aretorica baseada nas determinagoes sociais ¢ culturais do pro- joenca € na necessidade de estratégias de conquista da Sadide baseadas em-intervengées além das praticas médico-assistenciais logrou induzir p¥aticas inovadoras, tanto no campo da intersetoria- lidade como no Campo da educagddxe mobilizag4o por mudangas de comportamentos, principalmente estas ultinis. Praticas de aconse- ‘Thamento, acolhimentopraticas coletivas saudaveis (exercicio, ali- mentagao), além de_esforcos pelairesponsabilizagao ¢ conscientiza- ida sos Gu »wermeni)) comeca a.comppr a agenda de pr& [os servicos “As praticas’de Acdnsclhamento entram consulta dos bons profissionais e servigos médicos (inclusive na elf- nica privada). Embora freqiientemente exitosas em nivel local, as experiéncias de intersetorialidade tiveram pouco alcance geral e pouco impacto so- bre as desigualdades sociais ¢ sanitérias, em razdo de sua baixa possibi- lidade de influir sobre os determinantes sociais de carter mais estrutu- 155 is. 156 | Pouneas «Ss 0 Sas no Base ral, produzidos por politicas econdmicas geradoras de pobreza, desem- prego e risco social em geral. Na verdade, 6 discurso excessivamente geral da promocio da sa de tem gerado diferentes matrizes de pensamento e pratica. Nos paises 5 do Primeiro Mundo a tendéncia é a énfase nas mudancas comportamen- tais, na esfera dos individuos, e nas regulacdes sociais orientadas a livrar BE coletividades de riscos assumidos por individuos (tabagismo, drogas, atividades fisicas, alimentagao). Mesmo nesse terreno, hoje se considera que medidas educativas ¢ legislativas sto insuficientes para enfrentar com efetividade alguns desses grandes problemas. Sendo fruto dos complexos € mérbidos processos sociais ¢ culturais da humanidade contemporanea (industrializagdo predadora, saturagio urbana, cultura consumista de massas), esses riscos e doencas precisariam ser enfrentados no apenas com politicas de satide produtoras de atencao, educacao etc., mas também por meio de politicas reguladoras da prépria atividade econdmica. Assim.como a adigao compulséria de iodo ao sal marinho comercializado acabou com o hipotireoidismo endémico (bécio) ¢ a adicao de cloro e — mais recentemente ~ flor aos sistemas de abastecimento de Agua permi- tiu a redugio drastica da ocorréncia de doengas de veiculagio hidrica e da cérie dental, é poss{vel pensar que o controle da epidemia da obesidade, da hipertensio, das doengas cardiovasculares e da diabetes, por exemplo, exijam politicas de industrializagdo de alimentos que regulem ¢ mode- rem a presenga de patgenos nos alimentos industrializados, como gor- duras insaturadas, sal, agticar refinado etc. (Kickbush, 2003). Na América Latina, as idéias do movimento da promocao da satide ‘encontraram uma realidade de pobreza ¢ desigualdade que, desde logo, imps um deslocamento do foco_para as questes estruturais. Mais do que praticas educativas voltadas para mudancas comportamentais, a pro- mogio da satide na América Latina priorizou os processos comunitarios voltados para mudancas sociais. Ademais, desde 9s, anos 70 desenvolvia- 3e na regido um movimento criticd-A0 Modeld médico hegemnico que, com base numa abordagem ¢struturalista e numa pedagogia libertadora, foi refinando um campo de pensamento € pratica que viria a se consoli- dar no Brasil como o campo da satide coletiva. Nos anos 80, tal movimen- to plasmiou o programa da Reforma Sanitaria brasileira, orientado pelo principio da construcdo social da satide, da universalizagéo ¢ equalizagio_. do acesso nao s6 aos servigos, mas aos demais meios de obtenco de satide (Carvalho, Westphal & Lima, 2007). Por isso foi cunhada a expresso (cpromogio da sauide radical’ para expressar que o movimento canadense aqui, na América Latina e ii Brasil deve aplicar-se de forma associada a \ perspectiva da mudanga social (Buss; 2003). Apesar da existéncia de uma | Deieminants Scie a Sade, na Doenga # na Inersens variedade de tendéncias, seja na promogio da sade, seja na satide coletiva, pode-se considerar que elas apresentam uma convergéncia estratégica como projetos de construgio social.da satide (Carvalho, 2005). No Brasil, 0 Grupo de Trabalho sobre Promogao da Satide e Desenvolvimento Social da Associagéo Brasileira de Pés-Graduacio em Satide Goletiva (Abrasco) define a sua agenda em trés planos da determi- nagao do proceso satide-doenga: + plano da atencao a satide, envolvendo esforgo de mudanga da l6gi- ca assistencial ¢ dos modelos de gestio, no rumo de favorecer a autonomia dos sujeitos; + plano da gestao das politicas puiblicas, envolvendo esforgo de inter- setorialidade, 0 combate a fragmentagao de agoes e programas, a mobilizacio de organizacdes governamentais ¢ nao governamentais; + plano da politica (modelo) de desenvolvimento, envolvendo a de- fesa de politicas voltadas para a distribuicéo mais equanime dos recursos socialmente produzidos, para a solidariedade social para a subordinagao virtuosa da economia ao bem-estar e'a vida com qualidade. * INIQUIDADES EM SAUDE: ENFRENTAR AS CAUSAS DAS CAUSAS Ha eyidéncias de que as estratégias da promocéo da satide logra- ram avangos no controle de algumas doencas crdnicas ¢ agudas, relacio- nadas & vida moderna, sobrétudo por meio de inovagées na assisténcia sanitéria (protocolos ¢ praticas educativas), de politicas regulatérias dlegislacao, posturas urbanas) e da comunicagao de massa, todas incidindo sobre temas relacionados & alimentagao, a exercicios fisicos, uso de drogas ¢ outros habitos pessoais. Ou seja, ages que envolvam decisio politica de cardter inter ou transetoriais tém se mantido como excesées, com toda a énfase de recursos ainda concentrada nos servigos de satide. Na verdade, os avangos sanitarios, que sao reais, ainda ocultam ‘enormes desigualdades (em alguns casos, de forma crescente) nas médias em que se apresentam. As inigiidades em saiide entre grupos eindividuos, ou seja, aquelas sualdades de satide que, além de sisten nt veis, injustas e desnecessarias, segundo a definigao de Margareth Whitehead (2004), séo um dos tragos mai ntes da situagéo de satide no Brasil e no mundo. A mortalidade infantil, cuja ‘média nacional em 2004 foi de 23,1 por mil nascidos vives (NV), segundo dados do Ministério da Satide, apresenta grandes disparidades regionais, erele- mar 137 ‘Voce vai saber mai sobre 2 situacdo de sad- de dos brasileiros no capitulo 5: 158 _[Pouncas Sree ot Sab no Beas observando-se taxas inferiores a dez. por mil NV em alguns municfpios do Sul'e do Sudeste e valores maiores do que cingienta por mil NV.em reas do Nordeste. De acordo com o relatério do Fundo das Nagées Unidas para a Infancia (Unicef) de 2006'sobre a situagao da infancia brasileira, em 2000 a taxa de mortalidade em menores de cinco anos (TMMS) entre filhos de mulheres:com até tés anos de estudo era de 49,3 por mil NV, quase 2.5 vezes maior que entre os filhos de mies com oito anos ou mais de estudo (TMM5 20,0 por mil NV). Os filhos adolescentes de mulheres brasileiras com até um ano de escolaridade t@m uma probabilidade 23 vezes maior de chegarem analfa- betos a adolescéncia em comparacio com os filhos de mulheres com 11 anos ou mais de estudo. Ha muito se reconhece que os principais determinantes dessas ini qliidades estio relacionad mas como se organiza a vida social. J& em meados do século XIX, Virchow entendia que a ciéncia médica intrinseca e essencialmente uma ciéncia social, que as condigées econd- micas e sociais exercem.um efeito importante sobre a satide ¢ a doenca ¢ que tais relacdes devem submeter-se A pesquisa cientifica. Entendia tam- bém que o proprio termo ‘satide publica’ expressa seu caratet politico que sua pratica deve conduzir necessariamente a intervengao na vida politica e social para indicar e eliminar os obstaculos que dificultam a satidé da populagio. Desde entao, muito se avangou na construgao de modelos expli- cativos que analisam as relacées entre a forma como se organiza ¢ se desenvolye uma determinada sociedade e a situacao de savide de sua populacio. Um dos principais desafios desses modelos explicativos € 0 estabelecimento de uma hierarquia de determinagées entre os fatores mais _globais de natureza social, econdmica, politica e as mediagoes pelas quais ‘esses fatores incidem sobre a situacio de saiide de grupos e pessoas. £ esse complexo de mediacdes que permite entender por que no ha uma ‘correlagao constante entre os macroindicadores da riqueza de uma sociedade, como o Produto Interno Bruto (PIB), € os indicadores de saide. Evidentemente, 0 volume de riqueza gerado por uma sociedade é um elemento fundamental para proporcionar melhores condigées de vida de satide, mas h4-numerosos exemplos de paises com PIB total ou PIB per capita bem superiot a outros que, apesar disso, apresentam indicadores de satide muito mais satisfat6rios. Nos tiltimos anos, auriientaram também em quantidade e qualida- de os estudos sobre as relagées entre a satide das populacées, as desigual- dades nas condigées de vida e 0 grau de desenvolvimento da trama de | Determinants Socits a Sadde, na Ovenga « na Inerensto | 159) vinculos e associagdes entre individuos e grupos. Tais estudos permitem constatar que, uma vez superado um determinado limite de crescimento econémico de um pais, um crescimento adicional da riqueza nao se traduz sondigées de sade. A pi lesse nivel, 0 ite explicar a situacao geral de saiide de um pats iio é sua riqueza total, mas a maneira como ela se se distribuiyy | | ue pobres, mas € também pre- | Judicial & satide da sociedade em seu conjunto. Grupos de renda média em | uum pais Com alto grau de iniqiidades de renda apresentam uma situasio de satide pior que a de grupos com renddinferior, mas que vivem em uma Sociedade mais eqiiitativa. Um estudo coriparative entre os estados dos UA revelou que os individuos que vivem em estados com grandes desi- gualdades de_renda tém pior satide que aqueles corn renda semelhante, mas que vivem em estados mais igualitérios (CNDSS, 2006). O Japao nao é © pais com maior expectativa de vida do mundo apenas por ser um dos paises mais ricos ou porque os japoneses fumam menos ou fazem mais, exercicio, mas porque é um dos pafses mais igualitérios do mundo. Umm dos principais mecanismos pelos quais as iniqidades de ren- da produzem um impacto negativo na situagio de satide é o desgaste do chamado capital social, ow seja, das relacbes de solidariedade e confianga entre pessoas e grupos (CNDSS, 2006). O desgaste do capital social em sociedades infquas explicaria em grande medida por que sua situacio de satide ¢ inferior a de sociedades em que as relagdes de solidariedade sao imais desenvolvidas. A debilidade dos lacos de coeséo social ocasionada pelas iniqitidades de renda corresponde a baixos niveis de capital social ¢ 7 Ge participacao politica. Paises com grandes iniqiiidades de renda, escas- 808 niveis de coesao social ¢ baixa participacao politica s4o os que menos nvestem em capital humano ¢ em redes de apoio social fundamentais \ para a promogao e a protecao da satide individual e Coletiva. | No caso do Brasil, o fardo ¢ duplo, pois além de apresentar graves | inigaidades na distribuicao da riqueza, ha grandes sctores de sua popu- _lagio vivendo em condicses de pobreza que nao Ihes permitem ter ac: ‘a minimas condicoes ¢ bens essenciais a satide. Além de a renda dos 20% mais ricos ser 26 vezes maior que a renda dos 20% mais pobres, 24% da populacao economicamente ativa possui rendimentos inferiores que dois délares por dia (CNDSS, 2006). Com um maior debate sobre as desigual- ( dades sociais, o entendimento sobre a pobreza também tem mudado. En- tende-se que a pobreza nao é somente a falta de acesso a bens materiais, mas é também a falta de oportunidades e de possibilidades de opcao entre diferentes aliernativas. Pobreza é também a falta de voz ante as instituicoes 160 Pouca Ssraua oe Sade No Bea. do Estado € da sociedade ¢ uma grande vulnerabilidade diante de impre- vistos. Nessa situacio, a capacidade dos pobres de atuar em favor de sua satide ¢ da coletividade esta bastante diminufda. Para ser coerente com essa ova maneira de entender a pobreza, as estratégias para combaté-la devem incluir tanto a geracdo de oport econdmicas como medidas que favorecam a construgao de redes de apoio e 0 ‘ftimento das capacidades desses grupos para melhor conhecer os proble- mas locais ¢ globais, para estreitar suas relagdes com outros grupos, para fortalecer sua organizacao e participacio em acbes coletivas, para constituir~ se enfim em atores sociais e ativos participantes das decisdes da vida social. A maneira mais moderna de explicar as determinag6es do proces- so satide-doenga, ¢ assim conceber os diversos planos de intervengio & expressa na Figura 3. Figura 3 - Determinagoes do processo satide-doenga gOS: UTR. ‘CONDIGOES DE VIDA, EDE TRABALHO sscore SERVIGOS Pa pra abeyN ey Fonte: Dahlgren & Whitehead, 1991 S as, as determinagées econdmicas € is mais gerais dos processos satide-enfermidade, envolve portanto agdes ndo apenas no sistema de atencao a sade, com mudancas nos mo- delos assistenciais e ampliacio da autonomia dos sujeitos, mas também intervencdes nas condices socioecondmicas, ambientais ¢ culturais por icio| oliticas publicas intersetoriais. E sobretudo em politicas de de- senvolvimento, voltadas para a distribuicéo mais equanime dos recursos socialmente produzidos, subordinando a economia ao bem-estar social, Enfrentar as causas das eau Determinants Soi na Sa6de, na Doane na lntevengio UMA AGENDA PARA O SECULO XXI Em marco de 2005, a Organizagio Mundial da Satide (OMS) criou a Comissao sobre Determinantes Sociais da Satide (Commission on Social Determinants of Health - CSDH), com o objetivo de promover em ambi to internacional uma tomada de consciéncia sobre a importancia dos de- rminantes sociais na situacao de saide de individuos e populacoes e, também, sobre a necessidade do combate as inigitidades em satide por eles geradas. Um ano depois, em 13 de marco de 2006, por meio de de- creto presidencial, foi criada no Brasil a Comissio Nacional sobre Deter- minantes Sociais da Satide (CNDSS), com um mandato de dois anos. 0 fato de o Brasil ser o primeiro pats a criar sua propria comissao, integrando-se precoce e decisivamente ao movimento global em torno dos determinantes sociais da satide (DSS) desencadeado pela OMS, responde a.uma tradigéo do sanitarismo brasileiro. De fato, desde o inicio do sécu- Jo passado.os sanitaristas brasileiros vém se dedicando a aprofundar 0 conhecimento das relacdes entre os determinantes socioecondmicos € a situagio de satide € a desenvolver agoes concretas, baseadas nesse conhe- cimento. Mais recentemente, inspirados por essa tradicio, diversos seto- res da sociedade se articularam em um movimento de Reforma Sanitaria, que consolidou sua forga politica e sua agenda de mudangas na memord- vel 8? Conferéncia Nacional de Satide, em 1986, com a presenca de mais de quatro mil representantes de diversos setores da sociedade. Tal movi- mento contribuiu decisivamente para a incluso na Constitui¢ao de 1988 do reconhecimento da satide como um direito de todo cidadao e um de- ver do Estado, assim como para a criacdo do Sistema Unico de Satde (SUS), fundado nos principios de solidariedade e universalidade. A cziagio da Comisséo Nacional sobre Determinantes Sociais da Sa de se inscreveu nese processo de desenvolvimento da Reforma Sanitaria, Integrada por dezesseis expressivas liderancas de nossa vida social, cultu- ral, cientifica ¢ empresarial, sua constituigio diversificada é uma expres- sio do reconhecimento de que a satide é um bem publico construfdo com a participacao solidaria de todos os setores da sociedade brasileira. No inicio de 2008, a Comisséo Nacional sobre Determinantes Sociais da Satide apresentou o seu relatério final, contendo diversas recomenda- Ges tendo como énfase a necessidade da criagio de espacos institucionais para o enfrentamento dos determinantes sotiais da satide, sobretudo ¥i- sando integrar a acdo de diversos setores governamentais ¢ da sociedade. Segundo o relatério, as interveng6es sobre os DSS com 0 objetivo de promover a eqitidade em satide devem contemplar os diversos niveis assinalados no modelo de Dahigreen e Whitehead (1991), ou seja, devem 164 Mais informagies sobre (8 temas e deliberacées da 8° Conferéncia Nacio- nal de Satide vocé en- contra nos capftulos ele. 462 Pouca Ssromace SadDe No Baa, incidir sobre os determinantes ‘proximais’, vinculados aos comportamen- tos individuais, ‘intermediarios’, relacionados as condigées de vida e traba- lho, e ‘distais’, referentes 4 macroestrutura econémica, social e cultural. S4o exemplos dessas intervencoes: + politicas macroeconémicas ¢ de’tercado de trabalho, de protecao _ambientale de promogio de uma cultura de paz e solidariedade que visem promover um desenvolvimento sustentavel, reduzindo as desigualdades sociais e econémicas, as violéncias, a degradacao ambiental ¢ seus efeitos sobre a sociedade; politicas que assegurem a methoria das condicées de vida'da po- pulagdo, garantindo a todos o acesso a agua limpa, a esgoto, habi- ~tagao adequada, ambientes de trabalho saudaveis, servigos de sati- de e de educacdo de qualidade, superando abordagens setoriais fragmentadas e promovendo uma acio planejada e integrada dos diversos niveis da administrag4o publica; politicas que favorecam acées de promocio da satide, buscando es- treitar relacdes de solidariedade e confianga, construir redes de apoio ¢ fortalecer a organizacio e a participacdo das pessoas € das comu- nidades em agGes coletivas para melhoria de suas Condigdes de sati- de € bem-estar, especialmente dos grupos sociais vulnerdveis; + politicas que favorecam mudangas de comportamento para a re- ducio de riscos ¢ para. aumento da qualidade de vida mediante programas educativos, comunicagao social, acess0 Tacilitado a ali- mentos saudaveis, criagio de espacos piiblicos para a pratica de esportes ¢€ exercicios fisicos, bem como proibicéo a propaganda do tabaco € do alcool em todas a suas formas. Para que as intervenges nos diversos niveis do modelo de Dahlgren ¢ Whitehead (1991) sejam vidveis, efetivas ¢ sustentaveis, de- vem estar fun em trés pilares basicos: a intersetorialidade, a participagdo social ¢ as evidéncias cientificas (Figura 4). Determinants Sv a Sade, na Doengae aa Itevengia 168 Figura 4 ~ Pilares das interveng6es sobre os determinantes sociais Es ‘conDigoe8 DE vipa 1BDE TRABALE Distas Tntermedisnios Proximais Intervengées sobre os DSS bbageadas em evidéncias © promotoras da eqlidade em sade Fonte: Dahlgren & Whitehead, 1991 Uma vez que a atuacdo sobre os diversos niveis dos DSS extrapola as competéncias e atribuicdes das instituigdes de satide, torna-se obriga- t6ria a acdo coordenada dos diversos setores € instancias governamentais. Com Vistas a institucionalizar um processo sustentavel de coordenacad das ages intersetoriais sobre os determinantes sociais da saitde que permita superar os problemas de baixa articulagao anteriormente mencio- nados, a CNDSS recomenda estabelecer no ambito da Casa Civil da Presi- déncia da Repéblica uma Camara de AgGes Intersetoriais para Promogao da Satide ¢ Qualidade de Vida com a responsabilidade de realizar 0 seguimento e a avaliacdo de projetos, programas, intervencoes ou politicas relacionadas aos DSS desenvolvidas pelas diversas instancias nele repre- sentadas. Deverd também propor a Casa Civil mecanismos de coordenagio das acées em curso, constituindo-se numa instancia de revisio e aprovagio dessas acdes, segundo seu impacto na satide, além de elaborar projetos ¢ captar recursos para a implantacéo de novas interveng6es intersetoriais sobre os DSS de cardter estratégico. A camara seria coordenada pela Casa Givil da Presidéncia da Republica ¢ o Ministério da Satide, devendo fun- cionar como a sua Secretaria Técnica/Executiva. Recomendou-se, num primeiro momento, prioridade as acdes in- tersetoriais relacionadas a promocio da satide na infincia e na adoles- 464 | Pounchs Ssrona ot SADE No Beast. céncia - respondendo & atual mobilizagéo da sociedade com relagio ao tema —e ao fortalecimento das redes de municipios saudaveis jé existen- tes no pais, por meio de um programa continuado de disseminacao sele- tiva de informagées, capacitacio de gestores municipais e criagao de opor- tunidades e espacos de interagio entre gestores para intercdmbio ¢ avali- ago de experiéncias relacionadas aos DSS. Ademais, foi proposto o for- talecimento de duas outras esiratégias da promogio da satide, experi- mentadas com sucesso em diferentes contextos: as escolas promotoras da saiide ¢ 0s ambientes de trabalho saudaveis. Para a produgio regular de evidéncias cientificas sobre os DSS, sugeriu-se a criagio de um programa Conjunto do Ministério da Ciéncia ¢ ‘Tecnologia e do Ministério da Sade para apoio, por meio de editais peri6- dicos, de projetos de pesquisa sobre DSS-¢ estabelecimento de redes de intercmbio e colaboragao entre pesquisadores ¢ gestores, visando a0 se- guimiento dos projetos e & utilizagéo de’ resultados. Sugeriu-se também estabelecer no nfvel da Rede Interagencial de Informagdes para a Satide (Ripsa) um capitulo sobre dados e informagées relativos aos DSS, incluindo um conjunto de indicadores para monitoramento das iniqiidades de satide ¢ para avaliagdo de imp: Ses intersetoriais sobre a satide, 10 da participagao social, com vistas a conferir a » politico As acdes sobre os determinantes sociais da satide ¢ pata ‘empoderar’ os grupos populacionais vulnerdyeis, de maneira que possaii participar das decisées relativas a sua satide ¢ bem-estar, foi | reiterada a necessidade de fortalecer os mecanismos de gestao participativa, | principalmente os Conselhos Municipais de Satide, por meio de agées de \ disseminagao intensiva de informagées pertinentes e capacitagio de lide- \ rangas comunitarias com relagio aos DSS, além de fortalecer as ages de comunicagio social referentes aos determinantes sociais da saide. Iniciativas como essas da Comisséo Nacional sobre Determinantes ociais da Satidé contribuem para a agio coordenada dos diversos seto- res governamentais com participagao social, condicao necesséria para ‘enfrentar as determinagdes econdmicas e sociais mais gerais dos proces- sos satide-enfermidade. | Determinants Socks ne Sue, na Doensa LEITURAS RECOMENDADAS CZERESNIA, D. & FREITAS, C. M. (Orgs.) Promocdo da Side: conceitos, eflextes, tendéncias. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003. MARMOT, M. & WILKINSON, R. (Eds.) Social Determinants of Health, Londres Oxford University Press, 1999. MCKEOWN, T. & LOWE, C. R. Jntroduccién a la Medicina Social. México, D.F. Siglo Veintiuno, 1986. ROSEN, G. Da Policia Médica 4 Medicina Social. Rio de Janeiro: Graal, 1980. REFERENCIAS BLANE, D. The life course, the social gradient, and health. In: MARMOT, M. & WILKINSON, R. (Eds.) Social Determinants of Health. Oxford: Oxford University Press, 1999. BRASIL. Ministério da Satide. As Cartas da Promogéo da Sade. Brastlia: Ministério da Satide, 2002. Disponivel em: . BREIHL, J. & GRANDA, E. Saiide na Sociedade: guia pedagégico sobre um novo enfo- que do método epidemiolégico. Sa0 Paulo: Instituto de Saride, Abrasco, 1986. BUSS, P. Promogio da sade e qualidade de vida. Ciéncia & Satie Coletiva, 5(1): 163-177, 2000. BUSS, P. Uma introdugio ao conceito de promocao da satide. In: CZERESNIA, D. & FREITAS, G. M. Orgs.) Promogdo da Saiide: conceitos, reflexdes, tendéncias. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2008 CANADA. Ministere de la Santé et des Services Sociaux. La Politique de la Santé et du Bien-Etre. Québec: Gouvernement du Québec, 1994. CARVALHO, A. 1; WESTPHAL, M. F. & LIMA, V. L. G. Health promotion in Brazil. International Journal of Health Promotion and Education, supl. 2: 7-18, 2007. CARVALHO, 8. R. Satide Coletiva ¢ Promogdo da Satide. Sio Paulo: Hucitec, 2005. COMISSAO NACIONAL SOBRE DETERMINANTES SOCIAIS DA SAUDE (CN DSS). Inigitidades em Sade no Brasil: nossa mais grave doenca, 2006. Disponivel em: , Acesso em: fev. 2008. DAHLGREN, G. & WHITEHEAD, M. Policies and Strategies to Promote Social Equity in Health. Stockholm: Institute of Future Studies, 1991 DAVEY, B.; GRAY, A. & SEALE, G. (Eds.) Health and Disease: a reader. Buckin- gham: Open University, 2001 ENGELS, F.A Situagéo da Classe Trabaihadora na Inglaterra. Sao Paulo: Global, 1985, HASKELL, W. Physical activity and the diseases of technologically advanced soci- ety. The American Academy of Physical Education Papers: Physical Activity in Early and Modern Populations, 21: 73-87,1998, HIPOCRATES. Textos Hipocrdtcos: 0 dente, médico, o deenga. Rio de Janeiro: Abrasco, 2005. [ 166 _Pouneas Ssranace SA0DE No Beast. KICKBUSCH, I. The end of public health as we know INTERNATIONAL CONGRESS OF PUBLIG HEALTH, Y, 2003, Brighton, England, LALONDE, M. A New Perspective on the Health of Canadians: a working document. Ottawa: Health and Welfare Canada, 1974 LEAVELL, H.R. & CLARK, E. G, Medicina Preventiva. Sao Pauloi McGraw-Hill, i 1976, i MCKEOWN, T. & LOWE, C. R. Introduccién a la Medicina Social. México, D.F. Siglo Veintiuno, 1986. ROSEN, G. Da Policia Médica a Medicina Social. Rio de Janciro: Graal, 1980. ROSEN, G. Uma Histéria da Satide Pablica. S40 Paulo, Rio de Janeiro: Hucitec, Abrasco, 1994. SIGERIST, H. The University atthe Crossroad. Nova York: Henry Schumann Publisher, 1956, TEIXEIRA, S. F. Reflexdes tedricas sobre democracia e reforma sanitdria. In: TEI XEIRA, S. F. (Org.) Reforma Sanitéria: em busca de uma teoria. Sao Paulo, Rio de Janeiro: Cortez, Abrasco, 1989. > WHITEHEAD, M. The concepts and principles of equity and health. Infernational Jonrnah of Health Services, 22(8): 429-445, 2004 WUNSCH FILHO, V. Perfil Epidemioligico dos Trabalhadores. Disponivel em: . Acesso em: 7 fev, 2006,

You might also like