You are on page 1of 10
‘Temas volume 4 Estudos Berrios Explicagio. Primeira parte ‘Obras do al Na poesia houve fenémeno paralelo, mas diferente, que foi positivo: a tensfio entre 0 verso (elaborado segundo as regras) ¢ 0 hio-verso (livre, em vérios sentidos). Poetas como Drummond e Murilo Mendes pareciam reduzit 0 vetso a uma forma nova de expresso, que incorporou as qualidades da prosa e funcionou como adequado para exprimir o dilaceramento da conscién- cia estética, Sob este aspecto cles prolongaram a experiéncia mo- demista de apagamento das fronteiras entre os géneros, que fora empreendida nos anos de 1920 sobretudo por Oswald de Andrade {(cujo Serajim Ponte Grande, aliés, foi publicado em 1933); ¢ que nos anos 30 encontrou manifestagio curiosa no irtealizado O anjo, de Jorge de Lima (1934). © gosto, ou pelo menos a tolerincia pelo informe, 0 néo- -artistico (em selagdo aos padroes da tradigdo ou gos da vanguar~ da), levou por vezes a supervalorizar escritores que pareciam ter a virtude do espontineo; © a nao reconhecer devidamente certas ‘obras de fatura requintada, mas desprovidas de ideologia ostensiva, como Os ratas, de Dionélio Machado (1935) ou O amanuense le Ciro dos Anjos (1937). E talvez um artista de grande 10 Graciliano Ramos, tenha sido mais valorizado pelo considerado inconformista e contundente, do que pela rara ‘qualidade da fatura, que Ihe permitiu fazer obras realmente validas. Post Scriptum: Aqui foram abordados alguns aspectos da vida ceultural posterior a 1930; mas haveria muitos outros, relativos a0 teatro, radio, cinema, misica, que escapam & minha ‘competéncia. Tembro apenas que na rausica popular ocorreu um processo eq valente de "generalizagia” e “normalizagio”, s6 que a partir das sferas_ populares, rumo as camadas médias e superiores. Nos fanos 30-¢.40, por exemplo, o samba e a marcha, antes pratica- mente confinados aos morros e subtirbios do Rio, conquistaram 0 Pais todas as iando-se um pio-nesso quotidiano de consumo cultural whos aes 20 um mestre supremo cor 1930 ganharam escal homens como fa, Almirante, Lamar- Todo da Bahiana, Nassata, Joo de Barro © muitos buttos. Eles foram o grande estimulo para o triunfo avassalador a misica popular a0 anos 60, inclusive de_sua interpenetracéo ‘ima quebra de barreiras que € dos fatos portant a coatemporinea ¢ comecou 2 Se definit nos anos 30, com © interesse pelas coisas brasileites que ‘no movimento revolucionério. LS SMALL AAPA DDIM LAIN, 12 A NOVA NARRATIVA —————— ae 1 Pelo mundo afora, quando se menciona a “nova narrative latino-americana’, pensa-se quase exclusivamente na producéo de- ie todos os autores espalhades em todos os lezenove, de alguma reflexdo a gente se esforga por integrar no conjunto. Cn eee 200 diz Mario de Andrade no “Noturno de Belo Horizonte”, aludindo a unidade da América portuguesa ¢ aos atuais Estados brasileiro. (rs, alguns desses Estados, por vezes grupos deles, quiseram formar paises independentes, como a Confederacao do Equador (1824) ¢ a Repablica de Piratini (1835-1845), para mencionar apenas duas tontativas importantes que desencadearam guerras internas. Uma ergunta, talvez gratuita, mas curiosa, & a seguinte: se essas rept blicas tivessem subsistido, haveria hoje trés literaturas de lingua portuguesa na América? A Confederacao da Equador correspondia quase exatamente & atual regio nordestina, que sempre teve pro- dugao literdria bastante préprie, culminando no século XX por um poderoso romance regional. A’ Repiiblica de Piratini equivalia a0 Rio Grande do Sul, cuja producao também possui tracos caracte- risticos, que por vezes a aproximam mais da literatura gauchesca rioplatense que do romance urbano do Rio de Janeiro, No decénio de 1870 Franklin Tévora dofendeu a tese de que no Brasil havia duas literaturas independentes dentro da mesma lingua: uma do Norte e outra do Sul, regides segundo ele muito diferentes por formacdo histérica, composicao étnica, costumes, modismos lingiifsticos ete. Por isso, deu aos romances regionais ‘que publicou o titulo geral de “Literatura do Norte”. Em nossos dias um escritor gaticho, Viana Moog, procurou mostrar com bas- tante engenho que no Brasil bi em’ verdade litersturas_setoriais diversas, refletindo as caracteristicas locais. Pode-se entio pensar que, caso 0 Brasil se houvesse tornado uma pluralidade de p: falando portugués, haveria hoje algumas literaturas lingua, formanda ante o bloco hispinico um cor de maior peso, que_ suscitar diferentes de avaliacao e cla Mas a realidade € 2 que ficou indicada no comeco ¢ se reflete ro temério deste encontto, cujo pressuposto 6 a existéncia de tracos comuns as literaturas ibéricas da América Latina = 19 + 1. Estes, ‘racos seriam naturalmente devidos a0 fato de os nossos paises terem sido colonizados pelas duas monarquias da Peninsula, cujas afinidades eram notérias; ao fato de terem conbecido a eserav como regime de trabalho, a monocultura ea miacracéo, como vidade econémica; de passarem em geral por um processo am de mestigamento com povos chamados de cor; de terem prod te de crioulos que dirigiu o processo de independéncia em 9s sensivelmente paralelos, e depois o capitalizou em beneli- cio proprio, a fim de manter mais ow menos iniacio 0 estatuto econdmico € soci Com efeito, trata-se de condicionamentos com bastante ana- logia, quando vistos em grosso. A isto se deve juntar, no plano 201 lterétio, a imitagio das tendéncias européias, sobretudo francesas, que se misturaram 88 das metr6poles e sjudaram a estabelecer uma Gerta autonomia em relagéo a clas. Por toda a América Latina, a Franga foi um fator de unificagao, quied alienante, mas diferen- ciador Nos nossos dias aparecem outros tragos para dar certa fisio- nomia comum, como, por exemplo, a urbanizagao acelerada © desu- ‘mana, devida ‘a um processo industrial com caracteristcas pareci- das, motivando a trensformagio das popalacdes 1 masses mniserdveis e marginelizadas, despojadas de seus usos estabilizadores ¢ submetidas a neurose do consumo, que & invidvel devido & sua Peniria econémica. Peitando sobre isto o capitalismo predatGrio dias imensas multinacionais, que as vezes parecem mais fortes do que os governos dos seus paises de origem, transformando-nos (salvo Cuba) em um novo tipo de colénias regidas por governos militares ou militarizados, mais capazes de garantir os interesses internacionais ¢ os das classes dominantes locais cultural, ocorre em todos os nossos paises a in- dora dos Estados Unidos, desde a poesia de revolta © a técnica do romance até os inculeamentos da televisio, que semina o espetéculo de uma violéncia ficcionsl, correspondenie 2 violencia real, aio apenas da Metr6pole, mas de todos nés, seus satélites. ‘Assim, no passado e no presente, muitos elementos comuns permitem refletir sobre a cultura e a literatura da Amética Latina como “um conjunto”, Parafraseando Mério de Andrade — sobre © tconco dos idiomas ibéricos a anamorfose imperialista criou vinte lorguideas sangrentas, desiguais entre si, mas sobretudo em rela- gto a ele. Por isso, o caso do Brasil pode ser analisado neste contexto. $6 que convém explicar com detalhe as raizes das tendéacias atuais, emontando no passado mais do que seria preciso para as Titeratu- tas de lingua espanhola, melhor conhecidas fora dos imbitos na nas, F.antes de terminar este préloga, quero registrar as posigées autagSnicas de dois textos brasileiros contemporaneos. A primeira, num trecho do conto “Intestino grosso”, de Rubem Fonseca Paiste uma literatura latino-americana? [Niko me faga rit, Nao existe nem mesmo uma ‘como semelhanga de estrutura, estilo, earacte soja. Fxistem pessoas escrevendo na mesm: ingua, em portugues, ‘9 que ji é muito © tudo. Fu nada tenho com Guimaries Rosa, tstou ebcrevendo sobre pessoas empilhadas na cidade enquanto os tecnocratas afiam 0 arame farpado. E agora Roberto Drummond, numa entrevista com o editor Granville Ponce: wa Jatino-americena, nfo temos que ser Sucursal de um movimento de Nova Io cde Londres, Nos temos condigaes de citar, Eo que a jteratura latino-americana ti fazendo, pois hoje voce encontra americano imitando Borges. ‘Acho que nés, de Sao alternativas que existem ndo apenas na consciéncia dos ficcionistas, mas na dos eriticos © do publico. E preciso nao as perder de vista 2 portugnesas da América, ¢ em se- ie a8 reagruparam, acabaram for- do com as coavencoes houve © hi apenas uma Bteratura de lingua portuguesa neste continente. Mas por isso mesmo as diferencas locais se exprimiram com intensidade regionalismo, que quem sabe corresponde nalguns casos @ lite- fas nacionais atrofiadas, embora sig ‘no plano geral ttnificador, uma procura dos elementos especificos da nacionalidade. No comego do periodo independente, que coincidiu com 0 Romantismo, esse elemento de identificagao ¢ comushio foi © idianismo, que apresentava o habitante original do Pais como fuma especie de antepassido mitico, oposto a0 colonizador. Pouco Gepois surziu o regionalismo na ficcdo, assinalando as peculiarida- Ges locais e mostrando cada uma delas como outras tantas maneiras de ser brasileiro. Por estarem organicamente vinculadas & terra & pressuporem a descrigio de um cert ato cultural, tis pecnliaridades pareciam a muitos representar melhor o Pais do que bs costumes € a linguagem das cidades, marcadas pela constante influéncia estrangeira, Esta linhagem especificadora percorre a histéria da nossa Titeratura, com mom: jot ou menor relevo € significad No século XIX teve mento do Pais. No comeso do século XX, sob 0 nome de Sertaneja”, tornou-se na maioria das vezes uma subliteratura " explorando 0 pitoresco segundo o angulo duvidoso do exo- tismo, palernalista, patrioteira sentimental. Segundo a maioria dos

You might also like