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A cidade e a geografia do crime na ficcdo de Rubem Fonseca Vera Follain de Figueiredo rotors dx Unive dono eRe dance Resamo romano uur eabuca diverse Asad secon cora ura me tert verte resan Apa cnr Fennec dvi pero Pelaaschare israt The wont em Foren eer ne tase nbc vile ie atin wars te aoe of ait tk wore by etre of voce at pees vel ere els nt ty ace er verse bouton oe f= rch isawenen a eco as ar ote 3 Keywords ‘Uma cde gone gus mu igs pode ‘on Sta" ai en” [A obra de Rubem Fonseca gira em torno de doa vertentes temaicas biscas: a violEncia ‘no mundo urbano es buscada verdad, Essas das vertentes, entretanto, podem ser eduzi- dasa uma #6, jf que um dor sustenticulos da violéncia urbana é a imposiblidade mesma dese chegar a uma verdade sobre 0s fos AA cidade se configura como uma rede ‘nicadatecida pelos os de oma violencia que perpassa os mais diversas campos, tomando-te {ntl tetardercobrirondetsdo comes iden ‘ifiarresponsiveis, enuncira grande ment rague encobre, cobrenido, # yes crimsinosse dos detentores de alguma epécie de poder. Espago de prodapio e dculagdo de int mera verses sobre umn mesmo scontecimen- (o, ma cidade, a busca da verdade, feqien- temente, resulta na situagio final do romance A grands ete fita casete procurada 0 tempo todo, porque deveia conte: uma importante revelaio, stem branco. A rede de intrigas @ do bem urdida que, mesmo quando se coniegue uma conclasdo mas definitiva em relagio 3 um determinade fito, como em Agosto (Mattos descobre que Chicio matox 0 fempresirio), nfo se sabe o que fazer, pois ‘wats, apenas, de uma verdade parcial, per ida num mar de mentras cue a neutalizam. [Nese sentido, a palavra € uma arma eficaz ‘como qualquer outr Ainds em Aout, ve- mot que 0 atentado contra Lacerda, ‘ocasionador da morte do Major Va, € reali- ‘ado com uma arma de fogo ~ 0 revélver mas a arma da UDN, que, de cers form, tatow Geto foram as paiva, 0s boats, 25 iamagbes, a companha nos meios de come: nicagdo de mass (© Rio de Janeiro, na fcgio do autor, & apresentado com sussdivisBes de ordem £6- ‘io-scondmica ~a zona Sul, predominante- ‘mente dosricos, eazona Norte subitbiosem seni, onde vivem os pobres —, mat esta Gresio tem as fronteirat teativizadas pela peogratiado crime, que exgrups ot individa- cs segundo leis prépriss, podendo aproximar os poderosos © o5 marginaliados pela socie dade. A sproximacio se di de vicas maneis, (© macginalizado torna-se, muitas vezes, um asslariado do ene, servindo a0 empresiio aque mio quer jar at mast. Por outro lado, 0 recanismo de exchusio exstente, na cidade, gers um Hpo de populgio que cicula por todos os espagos, exitamente porque no tem, de ao, nenkum espago, Os excludes bouseam a zona Sul para fazer cabanas, atl tando ¢ matsndo, Viver peas russ ou em nicleos de pobreza infltradot nos baits Ficos~ edicios como aquele onde moravam, ‘ sualtantes do conto "Feliz ano novo” oa favels. O crime ultrapasa qualquer fonteira ‘oulimite, até porque Rubem Fonseca se nega a tematiae apenas 2 violéncis doe oprimidos. ‘A geografia da violencia se impde a outros postiveis recortes da cidade, diluindo contor- nos, embsralhando as linas do mapa, ‘A culeura de massa taz a viléncia para dentro das casas, oF valores descariveis do capitalismo de consumo redefinemaerelagbe, afedvase cram situarées como as que predo- fminam no Livro Lieia MeContney, onde 2 violénci, decoorente das vias formas de poder que os homens buscamexercersobreos, demas, toma imposivel uma comunicacio real entre se pessoas, ms relagio que fosse configurads pel toca, pelo intercimbio de cexperiéncas. O conto que di tiulo ao livro narra a istria de uma prostieus, envalvida morosimente com um cliente burgués, ¢ 4 Acs gang de sem fi de ab esa violencia surge do fechamento do outro da situagdo sem ssfds na qual ela se encontr, pois, Se rejetaro envolvimento, 6 he esta rotina da entrega sem emogio. A tensio do conto & alimentada pelo contrite entre a Aisponiilidade interior de Lécia ea igidex cxquemitcae Slosofante do parcero, 'O mundo rominsico de Licia,projetado ras cangSes dos Beatles, se tece de relagdes to intransiias quanto as que existem entre oF mcios de comunicagio de massa e 0 pico, isto a peronagem ecobe as mensagens mat info pode esabelecer uma reciprocidade com, quem as envia, no Ihe & permitida 3 ace sfetivaJostRoberto,oamante, profberespos- tas manda catas, mas Lica mio tem como respondé-ls, poisnio conhece 0 enderego do remetent; telefona, mas nio hi possibildade derecebertelefonems. Mantém, exatamente, no aivel pessoal, ditincise a simulagio de dilogo dos mass-metia, afrmando a unlate- ralidade da comunicaeio. Recorrendo.0 pen- samento de Boudellard, egundo o qual “o poder pestence iquele ue pode dar e a0 qual sendo pode retbuir", vemos queJoxé Rober- to, encamand 0 poder, detém o monop6lio sda palvn, impedindo que esta seja wocada ou remibuids. A solidio de Lisa MeCarmey, expressa no préprio preudénimo, se define pela impossiblidade de dar resposas, de iar ‘um espagorecproco onde sa plavrachegue verdadeiramente a0 outro, Na casa da tin da penonagem, arotinaentreamulhereomarido teitera a intransiividade das rela: Mew tio chegs dasiamente por vols dat sete horas com oBstadodeS, Paulo debsixo do brago e diz sempre a mesma fae: “uf, aque dia, nom tive tempo de ler © joral”, sempre com mesma inflexdo emesma ita de digniicado ou destinstirio (como ojor- ‘que, no fim de semana é vendido peso pela minha ial), Meu to liga a teeviso.? 1 Raten FONSECA, “Li MCs" nba MC 5 Rie iz, Fn ls 987-3, ” Ure Soetade As palavras do to do varias, os coments tos repetdos da esposa simulamn uma toca ‘queniohi, asim como. dscursodatelevisio paraa qual olham todas a notes. A violencia ‘st presente nese cotidiano pela suxéncia de reciprocidade, ue caracteria vidanacidade ‘moderna, condenandoo individuopreudo- ‘comunicagio, 2 isolamento, (© estilo 20 consumo, operado pels po- Dicidade, surge em varios cons, como ma sgressio conta os que se encontram i margem «bs benesesdo capitalise, “Felzano nova" se inicia com 2s pesonagens dante da tle, [Um mundo encantado de fests de fim de ano ‘maravithosassurge dante dos clos dos que slo temogquecomer. Oxsalo queredizasionacas des g-inos ser, de ceto modo, uma reposts 2 ese agresso primeira Em “O ecbradot”, 0 pessonagem naradoe declare: (Quando minha céleresti diminnindo cea percoa vontade de cobraro que me devem eu sento ma fente da teevido e em poco tempo meu édio vols, Quero muito pegar uum camarads que fa anincio de uaque ? [No caso dor romances de Rubem Fonseca, 2 opcio pelo género polical vem reiterar 0 Angulo de vio que pricie a violEncia como principio bisco da vida urbana, Se podemos ‘encontrar inimers emelhangas ent o5 £0 smances do autor e 0 rman noir de melhor uulidede, como ode Hammer. porexerplo, percebemor também que Raber Fonseca es tabelece um dilogo crtico com ess obs, partindo dels para chegar 2 indagagdes mais profindss. A disslugio dos valores hum nistcos,ageneraizacio do-crime, queseesten- de a0 mundo dos negbcios, esters insituc- ‘ons, oromantsmo nosdlgico do dete, que _perde a imnidade,oenfoque pirandeliano da verdade so tagospresentes no texto do ator ce que podemos encontrar crescentemente no ‘romance poical de 0 para ci em oposigio 20 romance de enigma, Neste, odetetvechegava A verdade através do raciocinio lgicoe ndo se cenvolvia na pereguigio dos suspeitos como acontece no romance de aventura. O texto polical de Rubem Fonseca, entretanto, rto sma, na tajt6ria do detetve narrador, a tradi- (0 dorommance poli, imprimindo-The uma marca propria, Emest Mandel, em As dlls do ene, considera que pasiagem do pensamento para 22¢40, por parte dos detetives, fia chave para 2 tansforma¢io intema do gnero. O peo nnagem, no intesior do univerio ficional de Rubem Fonseca, refi este percurto ~ do pensamento 3 a;3o ~para chegara vm ponto ainda mas adiante: 0 so da imaginagio para ‘rie verses plusiveis. A indagacio sobre a verdade éradicalizda na medida em que se question nioséadedusiolégica do romance e enigma, mas também a expesiéncia con ‘ret, como caminho paaatingi-ta. Osperso- nnagens narradores, a0 perceberem a impossi- bilidade de chegar 3 palvza original, elegem a interpretagio, conferindo ao ato de narra ‘area de construgio de uma versio verosimi que substieui a verdade inatingivel, como scontece tanto em A grande are, como em Bufo & Spalonzan ( relaivisma dos paptis-detetive, rimi- oso e witima — j& presente no romance ppolicial mais recente, & levado 3s dlkimas consequéncis por ubem Fonsecs,fizendo- ‘nos lembrar da observagdo de Umberto Eco, partir da idéia de que ainda ts escreverum Tivro no qual 0 asassino & o leitor: “Uma vverdadeia invertiggio polical deve provar aque os culpados somos n6s" ‘A oposigio detetive/criminoso se relatviza em A grande ane com a divida Iangada 20 Gna, sobre 2 posibilidade de ‘Mandrake ser autor de algune crimes e, no Bufo & Spallenzan, pela eversbilidade dos 2 FONSECA, “0 ahead a O abr Rode uci, Nove Fost, 1979, 168, papéis de Guedes ¢ Canabrava~ este éltimo 1 havia se comportada coma detetive no ‘aso da companhia de seguros eo primeiro,

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