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Os escritores que no leem

Eles j no leem mais. Apenas a si. Deixam os olhos perdidos quando


palavras de outrem surgem frente. Um conto dificilmente ser lido
na tela, muito menos no impresso. Preferem viver a memria, ler os
antigos, falar com as paredes ou com falsos intelectos, querem ser
lidos, ao extremo. Querem ver nmeros, na conta e em exemplares.
Os escritores de hoje no leem mais. A afirmativa poderia ser
duvidosa, se no fosse to verdade quanto parece ser mentira. A
generalizao equvoca, verdade, mas a vontade de chamar a
ateno para o ponto em questo vale a pena o risco. No ter em
mos livros de novos poetas, no comprar, no caixa das livrarias,
livros de desconhecidos no ocorre, e muito dificilmente isto ocorrer.
Somos muitos e somos invlidos. Criticamos os que no nos
compram, os nossos objetos produzidos com as pontas dos dedos,
mantidos a cafs, a relaes ntimas, que pelo desgaste acabam
encontrando na metafico o escape da realidade. Seramos, ento,
ns, verdadeiros escritores? Sem a leitura atual, contempornea,
onde residimos? Em nossas bolhas, obviamente. Todos j sabemos
disso, todos criticamos isso, e todos permanecemos imveis.
prefervel o nico movimento de estender os braos, de dar alguns
passos, apenas quando os Correios nos chegam. Em nimo, pomo-nos
afoitos para a leitura, que logo deixada de lado ao varrer alguns
poucos pargrafos, algumas poucas frases, alguns poucos sons,
preferimos, novamente, encolhermo-nos. O livro enviado pelo amigo
escritor no atingiu o esperado. E ficamos estticos, com a respirao
pesada, esperando que os prmios em pedra-sabo nos cheguem,
primeiramente, em forma de convite. A este lemos, vrias vezes, pois
impossvel acreditar. O esperado agora se torna realidade. Os
nmeros aumentaro, os leitores viro, novos escritores iro ser
instigados pela produo da escrita. Seremos entregues nos braos
dos que leem. Mas quem somos ns? Quem somos ns? Somos ns?
Ns? Sim, ns quem mais podemos contribuir para o melhor

desenvolvimento da leitura, da aprendizagem em um possvel


consciente coletivo. Leiamos mais, critiquemos sem adjetivaes
sublimes, mas pesando a mo para manter o tom. Sejamos o que
quisemos ser: escritores.

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