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Bronislaw Malinowski.

Os Argonautas do Pacífico Ocidental – Capítulo III


Características Essenciais do Kula. São Paulo. Abril Cultura, 1978

No capítulo III do livro Argonautas do Pacífico Ocidental, Malinowsk faz uma pequena
definição do que seria o Kula, sem muitos detalhes, ele disserta sobre as características, regras
e costumes dos nativos das ilhas Trobriand. Desta forma ele tenta explicar como o kula é
importante ao servir de base para as culturas das aldeias localizadas em um grande círculo
fechado, no extremo oriente da Nova Guiné.
Os “soulavas”, colares longos que são feitos de conchas vermelhas, e os “mwalis”, braceletes
feitos com conchas brancas, são os símbolos principais do kula. A movimentação deles pelas
tribos do círculo rege os costumes dos habitantes e, é o maior acontecimento entre eles. Por
meio de trocas os colares viajam pelas ilhas no sentido horário, enquanto que os braceletes são
passados no sentido anti-horário.
Os participantes do Kula trocam os objetos constantemente entre eles, as trocas são regidas
por uma série de regras e ritos mágicos e acontecem periodicamente. Não são todos os
moradores de uma aldeia que fazem parte do kula, no entanto, “uma vez no Kula, sempre no
Kula” é a principal regra que Malinowski observou no sistema.
Este, funciona como uma rede de parcerias na visão do autor. O indivíduo recebe o artigo de
um parceiro e entrega um diferente, por exemplo: ele recebe um mwali e entrega um soulava;
guarda o objeto com ele por um tempo e depois passa à diante a um outro parceiro recebendo
um objeto diferente. Essa trocas ocorrem de maneira cerimoniosa e embora pareçam um
sistema simples usado por culturas simples, Malinowski alerta para o que ele sustenta.
Para o etnólogo, o Kula é uma instituição altamente complexa, pois associado a ele ocorre um
comércio comum entre os nativos das ilhas, a construção de canoas e algumas cerimônias
fúnebres. A parceria no Kula é permanente, mas a posse do objeto nunca, ele deve sempre
estar em movimento através das tribos.
Os praticantes do sistema acreditam que seus ancestrais eram homens que conheciam a magia
e que, por meio dela fizeram enumeras façanhas em longas e audaciosas expedições
marítimas. O Kula foi o legado deixado para seus descendestes.
Malinowski entende o Kula como a atividade primária, o comércio entre as ilhas, a
organização social e as expedições de trocas são secundárias. Ele acredita ser necessário ao
etnólogo estar de fora para poder observar isso, pois alguém de dentro do sistema não enxerga
o valor dele, dado que, vive-o. Assim um nativo não consegue descrevê-lo, pois, nas palavras
do autor – “Ele faz parte do todo e não consegue vê-lo de fora”. A posição de Malinowski fica
clara aqui, ele é mais um que não acredita em estudos feitos por etnógrafos locais.
O Kula é um tipo de comércio, quando este, significa uma permuta de mercadorias. No
entanto ele está fora do que é conhecido como “comércio primitivo”, caracterizado pro uma
troca de artigos indispensáveis, que ocorrem de maneira irregular e sem cerimônia, ou regra.
É diferente do que acontece no Kula, ele é uma parceria permanente que une milhares de
indivíduos das ilhas do círculo, eles se reúnem periodicamente, respeitando as rotas planejadas
para as expedições que uma tribo faz a outra, a troca dos braceletes e colares ocorre
publicamente em meio aos ritos místicos e não existe nenhuma outra necessidade do que a
cultural para que aconteça. É um grande elemento intertribal.
Os “mwalis”, braceletes, são obtidos da concha de um caramujo que é quebrada e depois
polida, já os “soulavas”, grandes colares, são feitos de conchas vermelhas e medem de dois a
cinco metros. Os dois enfeites são usados apenas nas festividades e nunca diariamente. Mas
eles podem ser emprestados, o que é praticado normalmente. O interessante é que a maioria
dos braceletes são muito pequenos, já outros são tão grandes, e por isso tão importantes que
praticamente nunca são usados.
Malinowski não entendeu por muito tempo como os povos da nova Guiné criaram uma
simbologia tão grande e forte, em torno de objetos simples e inúteis. Até que, em visita a um
castelo de Edimburgo, na Escócia, foram-lhe mostradas as jóias da Coroa, o guia falava do
valor empregado, quando foram usadas e por quem. Todas as informações o fizeram lembrar
do tratamento dado pelos habitantes das ilhas Trobriand aos artigos do Kula. Da mesma forma
que as jóias, a posse, a glória e a fama de possuí-los e que estimavam o valor deles.
Por terem estado com pessoas importantes e passado por acontecimentos históricos, tanto os
objetos históricos europeus, quanto os “vaygua’a”, objetos valorados pelas tribos, tornam-se
preciosidades. A grande diferença que o autor aponta, é que enquanto na cultura européia os
artigos ficam com os possuidores de maneira permanente, no Kula eles são trocadas de tempos
em tempos.
Muitos objetos são chamados de “cerimoniais” na Nova Guiné, contudo, na visão de um
europeu não seriam classificados desta forma, são na verdade apetrechos melhor elaborados,
feitos com bons materiais como enormes armas de pedra esculpida. Outros eles chamam de
“objetos de parada”, usados apenas em ocasiões festivas. Os únicos que no olhar de
Malinowski poderiam ser chamados de “cerimoniais” são alguns objetos usados somente em
ritos mágicos ou religiosos. Os artigos do Kula estão dentro desse vasto conjunto de objetos.
Os parceiros no sistema se comportam como amigos e respeitam enumeras regras que variam
de acordo com a distância de suas aldeias. O número de parcerias no Kula depende da posição
social do indivíduo, um chefe certamente terá mais parceiros. Além de trocar os artigos
principais, existe também a permuta de outros presentes. Um nativo geralmente se relaciona
com seus amigos ou parentes, e um ou dois chefes das aldeias vizinhas, quando isso ocorre,
ele presta alguns serviços ao chefe e sempre lhe oferece a primeira escolha quando recebe
novos vaygu’a.
As parcerias mais distantes oferecem comida, presentes, proteção e abrigo, menos para
dormir, desta forma aliados são criados fora do próprio território do nativo. A troca só se
processa entre os participantes do Kula que são divididos em duas categorias: os que dão
braceletes e os que dão colares. Jamais um soulava é dado para um parceiro que já tenha
recebido um mwali do mesmo. Malinowski explica que o tipo de troca depende da localização
geográfica. Se estivesse na tribo de Sinaketa só receberia braceletes do norte e do leste, já do
sul e oeste receberia colares.
Obedecendo a regra há dois movimentos, um no sentido horário, que é o dos colares e um no
anti-horário, dos braceletes. Desta maneira o círculo é contornado, sem os vaygu’a nunca
serem negociados de volta e jamais pararem. Malinowski faz referência à posse permanente
de um ou dois braceletes muito valiosos, mas que ele acredita que estão definitivamente fora
do Kula. Nenhum participante pode manter os objetos consigo por um ou dois anos, podendo
sofrer a pena de ser censurado por sua mesquinhez. Algumas aldeias têm fama de serem lentos
e difíceis de manejar.
Quando o nativo está de posse do vaygu’a ele adquire orgulho, exibe a peça, conta como
conseguiu e planeja com quem vai trocá-lo. Mas ele tem por obrigação passar o objeto à
diante o quanto antes, por isso que ter o aparato em mãos não significa que ele será usado. Por
conta disso, Malinowski faz uma analogia entre os “soulavas e mwalis” e os troféus. Os dois
não têm fins práticos, contudo são símbolos de valor, sendo uma vitória no Kula geralmente
atribuída a poderes especiais do indivíduo advindos da magia.
O valor de um presente recebido nunca é questionado em público, pois há uma grande
distinção entre o Kula e o escambo, que eles chamam de “gimwali”. Quando um aldeão age de
forma incorreta os nativos costumam dizer que ele age como se o Kula fosse um gimwali.
Quem dá o presente é que decide se ele é equivalente ao que recebeu, se não for a outra pessoa
também não poderá reclamar nem deixar esse parceiro de lado.
No mundo do Kula possuir é sinônimo de dar, o autor diz que a riqueza é indício de poder, e o
poder de generosidade. Assim a avareza é muito criticada e de maneira bastante forte, é um
princípio moral. Há uma enorme competição sobre quem é mais generoso, e assim se alguém
recebe um vaygu’a que apresenta um valor menor do que foi dado não reclama e sim gaba-se
de sua generosidade.
Malinowski dá um exemplo de como se processa o Kula, ele explica o que é um “vaga”,
presente que inicia as transações, um “yotile”, que é um contra presente, e um “basi”, um
presente intermediário dado por um parceiro do Kula como sinal de confiança, ele dá o basi
para explicar que ainda não tem um presente com o valor igual ao recebido. O “kudu” é o
presente que encerra a troca.
Existe o costume de oferecer ofertas por um artigo importante, é uma competição pela honra
entre os parceiros. Eles dão “pokalas”, oferendas de menor valor, e “kaributus”, presentes de
solicitações mais valiosos.
Ligado ao Kula de maneira secundária está a construção de canoas e o comércio, a primeira
atividade é cercada de misticismos e reforçada pela necessidade de segurança nas expedições
às aldeias distantes, essa é uma parte preliminar e importante do sistema. A segunda ocorre
como uma troca de presentes, as expedições partem carregadas de produtos para dar aos seus
parceiros de além mar, quando voltam estão abarrotados de artigos que ganharam da tribo
visitada.
Malinowski ,no entanto, afirma que existem vários outros lugares nas proximidades que nunca
ouviram falar do Kula ou que o conhecem e não o praticam, e que mesmo assim realizam
expedições comerciais. Mas ele ressalta que nos lugares onde é praticado, o kula domina todas
as outras atividades.
O autor encerra o capítulo explicando que a comunidade Kula é composta por uma ou várias
aldeias onde os habitantes participam juntos, como uma unidade nas expedições e na execução
dos rituais de magia. Desta forma o Kula se processa primeiro dentro da comunidade, com
trocas internas, para depois ocorrer nas grandes viagens marítimas.
O objetivo de criar uma impressão do que é o Kula é alcançado pelo etnógrafo, ele consegui
explicar a importância, os termos básicos e uma parte do funcionamento do sistema,
desmistificando a idéia de uma simples troca de objetos entre selvagens. Com as comparações
feita com as jóias da coroa e os troféus, ele faz o leitor entender que o que ocorre nessas ilhas,
não está distante da nossa realidade, não é algo estranho, e sim uma questão de costumes.
Universidade Federal de Sergipe
Departamento Ciências Sociais

Resenha do Capítulo III


-Características Essenciais do Kula -
do Livro Os Argonautas do Pacífico
Ocidental de Bronislaw Malinowski

Por: Jôline Cristina de Oliveira

Resenha apresentada para


avaliação na Disciplina de
Antropologia I Curso de Direito
Diurno bacharelado da
Universidade Federal de Sergipe.

Prof. Hyppolite Brice Saborge

São Cristóvão
2008

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