You are on page 1of 23
fase y D3 copra TzvETAN TODOROV A Literatura em Perigo Tradugso Clo Meiea O1 DIFEL Parris neg one miss lena se treme wo conto elon Cone mes aeons Sirf inva seme mer rar om ia cx Mele nani an ea coo paseo Ae nas ean pr sb oer rove eles tcp nner ee ocr ar oe ove fran is ig om ogo dea tipi Lge ed recone eo sie sdapedos ps joes fil Ue Noto com estos Gein eas Andre, Tom Sen, te Ti «Os Mere Und sss sn femme nko devo fade meen con 0 fr pot eee am i i “oe Sb bon ote, 23 pp namo ea” Dun pinnate ever ee sua Ent uve ds ene donc ‘Teveran Toponov ‘porineos, balgaros ou estrangitos, cxjos textos passe a ler em versio integral, causavarme sempre um frémito de pra- zer: eu podia satisfazer minha cutiosidade, viver aventura, cexperimentar temores¢ alegrias, sem me submeter 3s fru ‘agBes que espreitavam minhas relagSes com of gazotos ¢ sgarotas da minha idade e do meu meio social. Néo sabia 0 ‘que queria fer da minha vida, mas exava certo de que teria aver com a literatura, Esrever, eu mesma? Tenei escrever, Ccompus poemas em versos pueris, uma pega em tres ator consagrada A vida de andes e gigantes até mesmo inicet a Pig na, Logo sent que nfo era esse 0 meu eaminho. Apesar de {nseguro acerea das conseqUéncas, oi ainda assim sem hest- ‘ago que, a0 final do ensino médio,escolhi minha carrera universitiria:estudaria era. Entei para a Universidade de Séfia, em 1956; falar de liveos seria a minha profisfo. ‘A Bulgstia fara entio parte do bloco comunista, © os cstudos de ciéncias humanasetavam sob o dominio daideo- gia oficial, Nos cursos de literarra, metade era eradigio, € a outra metade se compunha de propaganda ideol6gica: as obras estudadas eram medidas pela scala da conformida- de ao dogma marssta-leniniss, Era preciso mostrar de que forma esses escrito iluteavam a boa ideologia — ou, entio, ‘como eles falhavam em faz-lo.Ainda que no parsilhase da f6 comunista — sem, porém, me sentir imbutdo de um espl- rito de revolta—, refuglava-me no comportamento adorado cexcrta de um romance — mando asic da prime a6 A Literatura em Perigo por muitos de meus compatiotas: em piblico, oncordav om os slogans oficiais, silenciosamente ou com desprezo; do lado privado, uma vida de encontos de leitura, dice- cionadas principalmente aos autores que pressentamos nfo serem porta-vozes da doutrina comunista: sei por terem tido a sorte de viver antes do advento do marxismo- Teninismo, sja por babitarem paises em que eam livres para ‘escrever os livros que quisessem, Para texto nos estado superiores, porém, ea preciso redigir, a0 final do quinto ano, uma monografia de fim de curso, Como falar de leratura sem ter de me cutvar Bs exi- stacias da ideologia dominante? Tome um dos raroscami- ‘hos em que era postvel escapar da milisncia geal ssa via consstia em tratar de objetos sem cere ideolgico: ou sea, ‘nas obras literdvias, abordar a pr6pris materalidade do texto, suas formas lingtias, Eu nfo era 0 nico atentar cesta solugto: desde a segunda década do século XX, os formalist rusos jf haviam desbravado o camino, sep os posteriormente por outros. Na unversidade, nosso pro- fessor mas importante ere, logicamente, um especilista em versificacio. Escolhi, enti, escrever minka monografia ‘comparendo duas verses de uma longa novela de um autor Dalgaro, excita n inicio do sécalo XX, limitando-me an lise gramatical das modificagSesfetas por ele entre a duas _versbes: 08 verbo transtvos substeuam os intransitivs, 0 perfectivo se tornava mais freqhente que o imperfectiv. ” ‘Taverax Tooorov Assim, minhas observagies escapavam a toda censural Procedendo dessa mancira, no me expunha a violar os tabusideol6gicos do patio. ‘Nunca saberei como teria continuado ese jogo de gato © rato — nfo necesariamente a meu favor. Surgis a oportuni- dade de partic um ano “para a Europa”, como dizfamos na Ease lvzo € antes de nado uma biogra- fia, pis cecoe acontecimentos da vida de Dostoieski én papel extencial na compreensio no apenas da ganese, mas também do sentido de suas obras: por exemplo, sua quase execugdo em praga piblicae 0s quatro anos de pris que se seguiram, assim como as condig6es materiis difices por que passa ou as violencias fiicas que testemunha. Tate, igual- mente, de uma hist6ria social detalhada da Rissa e da Europa de meados do século KIX. A tudo isso se acrescenta tum debate flosfco: Dostoiewski vive num meio em que as Idelas de Hegel e Feverbach, de Bentham e John Stuart Mil 90 ‘A Literatura em Perigo sio consideradas como palavras do Evangelho;e cleat sbsorve antes de combaté-la, Ouro eelarecimentoprovém dos abundantsracunos cadernos de nous deixados por Dostoievsi, o que permite a partir de uma abordagem aenética,apreender& constituigio progresiva do sentido das obras. Por timo, aperar de nada jgnorar das diversas lnvestgagbes form as em andlise textual, Frank sabe wilt las de modo anos fazer er asaso 0 pensament do se autoe. ‘Aquilo de que nos damos cont, gradualmente, & que todas esas perspectvas ou abordagen de um texto, longe de serem rai, so complementaes — desde que se admita de inicio que o escritor € aquele que observa e compreende © mundo em que vive antes de encarar ee conhecimento em histrias, personages, encenagbes, imagen, sons. Em outros termes, at obras prodazcm 0 sentido, eorscrtor bonito papel do eco €0de converter ei sentido ee ‘penamento na linguagem comum da seu tempo — € pouco sos import saber quais os meios wslizados parading seu objetivo. O *homem” ea “obra” “hist” ea “estruura™ ainclusio da pensamentodoautor na debate infinito de que objeto a condigéo humana, o esudo lteririo de J. Prank vorna-se uma ligio de vid Devemos entender aqui a literatura no seu sentido amplo, recordando os limites historicamente instves dessa 2 Taverax Tovorov nogéo. Portanto, nfo romaremos come um dogma inabalével 0s axiomas jf batidos dos sltimosroménticos, segundo os ‘quis a estrela da poesia nio teria nada em comum com a cantlena da “eportagem universal” produzda pela linguae ‘gem comum. Reconhecer as virtdes da lisratura no nos obriga acrer que ‘a verdadera vida € literatura” ou que “eudo no mundo existe para se conduit a um livro", dogma aque excutiatrés quarts da humanidade da “verdadeira ida". Os textos hoje tdos como “ndositeftos” sm muito anos ensinar; ¢ quanto a mim, eu teria de bom grad toma “de obvigatio; em aulas de iteratura,o estudo da carta, Infolizmente nada fica, que Germaine Tilionesereven na piso de Fesnes,enderesada ao tribunal miltar lero, em 3 de janizo de 1943. Tae de uma obrapria de huma- idade, na qual forma econttdo soinsepariveis os alunos teria muito a aprender com ese texto." Nio “asisinamos 4 literatara® ((etomando o tulo de um panfeto recente) «quando também esudamos na escola extos “no-ltertios", sas quando fezemos das obras simples stragbes de uma ‘sf formalist, ou nls, ou solipsia da tera Vemos que se trata aqui de uma ambiglo bem mais sinpla do que aquela hoje proposta aos alunos. Alem disso, ss mudangasimplcadas teriam de resto conseqiénia ime- dian epecro profisona. Sendo o bee da ears a propria condicio humana, aque que alé ea compreende de wornard no um epetalsa em andlse Terria, maim 92 A Literatura em Perigo ‘onhecedor do ser humano, Que melhor introdusio & com- preensio das paixdes e dos comportamentos humanos do ‘que wma imerséona obra dos grandes escrtores que se dedi- cam a essa tarefa i milénios?E, de imediato: que melhor reparagio pode haver para rodas as profisees baseadas nas relag6es humanas? Se entendermos atsim a literatura © ‘orientarmos dessa maneira 0 seu ensino, que ajuda mais pre- cosa poderia encontrar o futuro esudante de dieito ou de citncias politica, o furaro assistente social ou psicoterapeu- 1, © historiador ou o sociélogo? Ter como professores ‘Shakespeare e Sofocles,Dostoievsi e Proust nfo € tra pro- veito de um ensino excepcional? Endo se v8 que mesmo umn fururo médico, para exercer 0 seu ofc, teria mais a apren- der com esses mesmos profesores do que com os manuals Preparatérios para concurso que hoje determinam o seu des- ‘ino? Assim, os estudos literdrios encontraram 0 seu lugar ‘no coraco das humanidades, a lado da histxia dos even tos das ideas, todas essas dsciplinasfarendo progredit 0 ‘pensamento ese alimentando tanto de obras quanto de dou trina, nto de ages politcas quanto de mutagde soca, tanto da vida dos pos quanto da de seus individu Se aceitarmos essa finalidade para 0 ensino liteitio, 0 qual nfo servria mas usieamente reprodusio dos profes- sores de Letras, podemos facilmente chegar a um acordo sobre oesptito que o deve conduit: € necestio incur as cobras no grande didlogo ene os homens, inicado desde a ‘Tavera Toposov noite dos tempos do qual eda um de 6s, por mai fafimo {ques nda participa, “E nessa comaniag nesgorive, ‘trina do espago edo tempo, que safes o slesnce ers literatura, escrevia Paul Bénichou2" A ns, adl- tos, noscabe rans as novas grades ema eran fr, cess palavens que shar a viver melhor. Notas 1. Doubrowy, T Todotov (tg) LEmujemant de a litre 1 Pais, Pion, 197, p 630. 2.J Rouse, Forme et sisi, Pai, Jot Cort 1962p. [3.CE T. Todaro, Thre du symbole. Paris Sul, 1977; MH. ‘Abas, Doing Thing with Texts, Nova York, Norton, 19895 1 Fee Home asta, Pri Grate 1990 4: tio, Feo, 600 S.A. Shlesbary, Characteitiesof Man, Matis, Opinion Time, od. de 1790,03, pp. 150451, 6.6. Vico, Science nono, Par, Nagel 1953, § 421. 7.1 Fee op. it p96. 8.GE. Lesing, Laokoon, Werke. Ba Si, Frasher, Destacher Kwier Veta, 1990 cap. 9,985. 9. Idem, Hambsrpuche Dramaturgie, Werke, Bd 6, Frasar ‘Deutcher Klasiker Veag, 1958, § 34 p. 348, p. 3905 § 30, 2.332 10. bid § 1, p. 2575 § 9, p26 ALB. Constant, Burs, Pris, Gallimard, 1973, Journal nti, '. 232 Riflexions a ral pp 908, 920 12. Idom, “aquinte Cun ex a [a ieatre du XVI tle", Gues complies, Tinga, M. Niemeyer, 1995, I, vl 1, ps2 13.6. de Sut, De a bitttueconiite dans es apport avec les insti socials, Pats, Pannaron, 1981, p. 66. 14.6. Baudeae, Eaores comple, 2 vl, Pais Galimard 1975- 1976, 333, 18. bid p. 127; Corespondance, 2: voln Galimard, 1973.1, pp. 336337; Bures complies Hyp. 2p 407; fp 182. i

You might also like