Fernando António de Nogueira Pessoa nasceu, em 1888, em Lisboa, no 4º andar de um
prédio do Largo de São Carlos. Os primeiros anos da sua infância, passados no pacato meio lisboeta, decorreram felizes. A morte do pai (tinha ele cinco anos), seguida pouco tempo depois pela morte de um irmão com apenas um ano de idade, mergulhou, porém, a família num ambiente de tristeza e terá talvez marcado profundamente o destino do pequeno Fernando. Tornou-se então o filho único acarinhado, “o menino de sua mãe”, de que nos fala mais tarde num famoso poema (manual pág.56). Já por essa altura se refugiava no mundo da imaginação. Desde os cinco anos que lia e escrevia correntemente. E assim inventou a sua primeira personagem – o Chevalier de Pas -, escrevendo cartas dirigidas a si próprio por essa figura imaginária. Quando tinha sete anos, a sua mãe casou em segundas núpcias com o cônsul de Portugal em Durban (África do Sul). Nesta colónia britânica, para onde partiram logo após o casamento, iria decorrer o resto da infância e adolescência de Fernando Pessoa. Seria feliz na sua nova família, a qual foi crescendo com o nascimento de cinco irmãos (dois dos quais morreram de tenra idade)? É difícil sabê-lo. O certo é que o jovem se tornou um excelente aluno, apaixonado pela literatura. Aos quinze anos, chegou mesmo a receber, entre 899 candidatos à Universidade, o prestigioso prémio «Queen Victoria Memorial Prize», pelo melhor ensaio em língua inglesa. Entretanto, a sua personalidade tinha-se definido. Inteligente, sensível, com grande sentido de humor, levava uma vida solitária, embrenhado na leitura e nos seus devaneios. Continuava a criar personagens imaginárias. Escrevia muito, tanto poesias como textos em prosa. Em 1905, Fernando Pessoa regressou a Lisboa, a fim de frequentar o Curso Superior de Letras. Mas a paixão pela vida literária fê-lo, em breve, abandonar os estudos. Do mesmo modo se desinteressou de uma carreira profissional. Embora a excelente educação recebida na África do Sul lhe permitisse obter bons lugares, Pessoa preferira, até ao fim da vida, trabalhar sobretudo como correspondente de línguas estrangeiras nos escritórios de várias firmas comerciais, o que lhe proporcionava maior liberdade de horário. O país assistia, logo após a Implantação da República, ao começo de uma grande efervescência cultural. Pessoa torna-se uma das personalidades mais destacadas dos novos movimentos literários que despontavam. Colabora nas revistas Águia, Portugal Futurista, Athena, Contemporânea. É amigo de Mário de Sá Carneiro, Almada Negreiros e de muitos outros poetas e intelectuais. Com eles, organiza o primeiro número da revista Orpheu que revoluciona o panorama português. Até 1935, data em que morreu, Fernando Pessoa desmultiplicou-se numa intensa actividade cultural. A sua figura esguia, reservada, via-se frequentemente nos cafés do centro de Lisboa. À mesa do Martinho da Arcada ou da Brasileira do Chiado, umas vezes sozinhos, meditando ou escrevendo, outras cavaqueando com os amigos em amena tertúlia, Pessoa tornou-se uma figura quase lendária dos meios intelectuais lisboetas. No entanto, poucos conheciam a riqueza da sua obra, de que só foram publicados alguns poemas em revistas ou jornais e um único livro – Mensagem – pouco antes de morrer. Mas, como alguns raros amigos já sabiam, a criatividade literária de Fernando Pessoa era quase inesgotável. Não era apenas um poeta – ele próprio, Fernando Pessoa; desdobrava-se em um, dois, três, vários poetas e pensadores. Era Alberto Caeiro, um poeta simples, desligado dos valores da cultura, para quem as coisas são o que são, naturais e objectivas. Era Ricardo Reis, discípulo de Caeiro, monárquico e requintadamente culto que, nas suas poesias rigorosamente clássicas, exprimia o prazer das sensações. Era Álvaro de Campos, engenheiro formado na longínqua Escócia, ousado, inquieto e futurista, seduzido pelo ritmo trepidante da vida moderna, mas reflectindo, com ironia, sobre a angústia da existência. Era outros ainda… Quando morreu, mal se apercebia ainda a enorme dimensão do génio. Hoje, publicados os seus inúmeros escritos o mundo inteiro reconhece a extraordinária originalidade e profundidade da obra de Pessoa.