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REFLEXÕES SOBRE A SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA

Ana Cláudia Bortolozzi Maia

RESUMO: A adolescência é considerada um período importante mudanças físicas,


emocionais, psicológicas e sociais. Compreender o crescimento e amadurecimento
físico e cognitivo, lidar com sentimentos ambíguos diante das frustrações, da euforia e
do desânimo e ao mesmo tempo, lidar com a aceitação ou rejeição social, preconceitos e
discriminações é uma habilidade que requer o suporte social de familiares, educadores,
profissionais, e comunidade em geral. Este texto pretende informar e esclarecer sobre
estes aspectos no desenvolvimento humano, procurando refletir a respeito do período
chamado adolescência.

Fala-se muito de sexo e sexualidade na adolescência. A televisão expõe diariamente


pessoas jovens, saudáveis e belas, cheias de amigos, vendendo a impressão de uma
época sempre feliz. No entanto, nós educadores, lidamos no cotidiano com crianças em
transição da infância para a idade adulta, num período cada vez mais longo chamado de
adolescência, no qual, ao lado da alegria, da saúde e das amizades, ocorrem também
dúvidas sobre sexualidade e dificuldades e sofrimentos relacionados ao início da vida
amorosa e sexual.
As mudanças que ocorrem velozmente nesse período implicam, muitas vezes, em
situações em que imperam discriminações sociais acarretando sofrimento e angústia
para muitas dessas pessoas. Enfrentar o crescimento e o amadurecimento pessoal de
forma mais saudável exige muita colaboração e mediação dos adultos, sejam estes pais,
amigos, médicos ou educadores.

Puberdade e Adolescência
Os conceitos de Puberdade e Adolescência não são sinônimos. Puberdade é um
conjunto que transformações físicas, de crescimento e amadurecimento do corpo, que
transformam meninos e meninas em pessoas com capacidade reprodutiva; é um
fenômeno universal que deve ocorrer em todos os indivíduos, independentemente de
cultura, classe social, nível educacional ou outras diferenças psicossociais. É com a
Puberdade que se inicia o período da Adolescência, caracterizado como um período que
envolve um conjunto de papéis sociais com repercussões psicológicas diretamente
relacionadas ao grupo social ao qual o sujeito pertence e ao momento histórico em que
vive; portanto, a adolescência é um fenômeno cultural (MAIA, 2003).
A palavra Puberdade vem de “púbis” que, do latim "pubertate" e "pubis" significam
"penugem; pêlo". Caracteriza-se por ser um conjunto das transformações
psicofisiológicas ligadas à maturação sexual. É uma etapa que está filogeneticamente
programada e começa, em média, aos onze anos na menina e aos treze no menino,
quando são ativados os hormônios que são responsáveis pelo desenvolvimento das
características sexuais secundárias, e pelo amadurecimento dos gametas sexuais,
responsáveis pelo processo de reprodução na espécie humana.
A puberdade é marcada pelo aumento na produção dos hormônios sexuais. Com a
influência hormonal o corpo de meninas e meninos começa a demonstrar modificações
tanto no crescimento dos órgãos quanto no amadurecimento de suas funções. O padrão
de crescimento e de amadurecimento, após as mudanças funcionais no eixo hipotálamo-
hipofisário, depende, principalmente, da mudança de funcionamento do sistema de
glândulas endócrinas, influenciada por diversos fatores do ambiente que agem
diretamente no estado de saúde geral do indivíduo. (COSTA, 1986; GOODSON e
DIAZ, 1990; JERSILD, 1976; PIKUNAS, 1979).
Nas meninas os hormônios essenciais são o estrógeno e a progesterona, e as
características desenvolvidas são: a) aumento dos seios, b) aparecimento dos pêlos
pubianos e axilares, c) a ocorrência da menarca, d) maior erotização sexual pela
lubrificação vaginal e, finalmente e) a capacidade de reprodução.
Nos meninos, o hormônio essencial é a testosterona e as características são: a) o
crescimento do testículo, b) o aparecimento dos pêlos pubianos e axilares, c) o aumento
do pênis, d) a mudança da voz, e) ejaculações, primeiramente sem e posteriormente com
a produção de espermatozóides, f) o aparecimento da barba, g) o aumento do impulso
sexual, da agressividade e da força física, h) o crescimento em estatura e, finalmente i) o
início da capacidade de reprodução.
A palavra “Adolescer”, vem do latim ad (para) + olescere (crescer) e significa: “crescer
para”, ou seja, “crescer”, “engrossar”, “tornar-se maior”, “atingir a maioridade”. A
adolescência é um período marcado por mudanças biológicas, psicológicas, existenciais
e sociais, compreendido entre a infância e a idade adulta. O período adolescente é um
período marcado por transições de cunho essencialmente social e reflete, portanto,
concepções históricas e culturais (BECKER, 1994; CALLIGARIS, 2000; CAMPOS,
1990; PAPALIA, OLDS e FELDMAN 2006; PEREIRA, 2005).
Neste sentido, entendemos que a puberdade é um fenômeno biológico que registra as
modificações físicas e corpóreas do crescimento e amadurecimento humano e
diferentemente, a adolescência, tal qual a concebemos, é um fenômeno social e cultural
(MAIA, 2003).
Segundo Vitiello e Loureiro Júnior (1986) buscar um conceito exato para a adolescência
é uma tarefa difícil, porém ainda mais difícil é fixar seus limites cronológicos, pois a
delimitação de seu inicio e término depende de fatores sócio-culturais, familiares e
pessoais. Apesar disso, muitos autores tentam definir esses limites em uma idade
cronológica que varia entre onze e vinte anos de idade. Basicamente, o surgimento das
características sexuais secundárias seria proposto como o limite inicial - o que não
acompanha obrigatoriamente a eclosão das características sociais e emocionais da
adolescência, ora precedendo, ora surgindo após seu estabelecimento, e seu limite final
seria a resolução das características psico-emocionais marcantes neste período
adolescente. Cavalcanti (1987), completa esta idéia afirmando que a adolescência,
socialmente, teria seu fim quando o grupo social atribuísse ao indivíduo o status, o
papel e a função de adulto.
É difícil separar as mudanças físicas da puberdade das mudanças psicológicas e do meio
social e cultural em que este indivíduo se desenvolve na adolescência, isto é, as
mudanças resultantes desse crescimento devem ser sempre consideradas como
psicossociais, especialmente para a Psicologia. Papalia, Olds & Feldman (2006) citam,
por exemplo, diversos problemas possíveis neste período relacionados à saúde física e
mental de jovens meninos e meninas que não podem ser considerados isolados da
sociedade em que vivem: distúrbio de sono, de nutrição e de alimentação; obesidade,
anorexia e bulimia nervosa, uso e dependência de drogas, devem ser compreendidos
como fenômenos psicossociais, embora se manifestem em indivíduos especialmente
durante a adolescência.

Características psicossociais no período adolescente


As mudanças físicas têm um significado importante para o adolescente, e o fato de lidar
com essas mudanças pode gerar conflitos emocionais diante de uma imagem corporal
nova e desconhecida, como por exemplo sentimentos de baixa auto-estima e sintomas
depressivos. Quando as transformações biológicas não são bem compreendidas, o
adolescente pode sentir medo, vergonha e ansiedade. A desinformação pode gerar
fantasias e sentimentos de inadequação (GOODSON e DIAZ, 1990; LOYOLA, 1990;
VITIELLO, 1997). Além disso, o padrão estético ideal para um corpo jovem adulto
saudável é por demais inatingível e lidar com a dificuldade de reconhecer os limites do
corpo real e da imagem desejada também é uma situação que gera sofrimento e angústia
para todos, também para os adolescentes.
Por outro lado, o período de transição adolescente traz uma riqueza enorme de
possibilidades mentais e emocionais que são, em geral, exacerbadas e, pouco
compreendidas pelos adultos. Para Loyola (1990), o adolescente, basicamente, vive em
uma situação de instabilidade e imaturidade, como produto da ação de variáveis sócio-
culturais e afetivo-cognitivas. Com relação ao pensamento, a atividade cognitiva
também sofre uma maturação significativa.
Papalia, Olds e Feldman (2006, p.455) afirmam que “embora o pensamento dos
adolescentes possa permanecer imaturo em alguns aspectos, eles são capazes de
raciocinar de maneira abstrata e fazer juízos morais sofisticados, além de poderem
planejar o futuro de maneira mais realista”.
Piaget (1972; 1986) estudou e referendou o desenvolvimento cognitivo na infância e na
adolescência evidenciando as mudanças do pensamento, a partir da relação entre a
maturação cerebral, as funções do pensamento e as oportunidades ambientais, como por
exemplo, a influência da educação neste desenvolvimento, embora num sentido não
‘cultural’, isto é, para Piaget o sentido e a natureza do desenvolvimento não
dependeriam da cultura, mas de uma estimulação adequada, passível de ser fornecida
por várias culturas.
Goodson e Diaz (1990) descrevem as diferenças marcantes no tipo de pensamento:
absoluto para o concreto, relativo para o abstrato, atemporal para temporal, ilógico para
lógico, analógico para o dedutivo. Quem foi Piaget (data) Na infância é comum o
pensamento absoluto (não percebe o relativismo das situações; sim e não são eternos), o
pensamento concreto (compreensão a partir do real e palpável), atemporal
(compreensão incompleta do tempo, só percebe o presente), ilógico (voltado para as
necessidades egocêntricas) e analógico (pensamento marcado por comparações e
justaposições). Já com o amadurecimento, no período chamado adolescente, o
pensamento revela-se relativo (há relatividade de conceitos), abstrato (há generalização
do real para o mundo do possível), temporal (percebe o passado, presente e faz
projeções para o futuro), lógico (percebe a realidade como diferente de seu desejo) e
dedutivo (apresenta interdependência lógica dos conceitos). Evidentemente que as
mudanças cognitivas têm implicações sociais importantes.
As mudanças cognitivas ocorrem de maneira mais lenta que as mudanças do
crescimento físico corpóreo. O corpo cresce de forma desigual e rápida; o pensamento
ensaia mudanças e amadurecimento e esta fase é marcada por emoções intensas,
vulnerabilidade ao sofrimento e, ao mesmo tempo, sensibilidade ao prazer e ao sucesso.
A criança, então egocêntrica, ao se tornar adolescente passa a buscar sua própria
identidade. Essa noção de si mesmo é mediada pelos outros. Goodson e Diaz (1990)
comentam que a imagem de si mesmo da criança é um reflexo passivo de como os
adultos a vêem ou dizem que ela é. Já na adolescência, esta auto-imagem passa a ser um
processo que implica um reexame da auto-imagem, com uma postura crítica e mais
pessoal em relação a si mesmo.
Evidentemente que não podemos descartar que a imagem interna construída pelo
adolescente tem muito do padrão social que a cultura impõe cotidianamente e que a
construção da auto-imagem reflete, portanto, uma relação dialética entre o particular e o
universal.
Os jovens adolescentes vivem sentimentos de ambivalência em função da necessidade
de independência, geralmente com relação à família, necessidade de manter
relacionamentos afetivos e sexuais, necessidade de auto-aceitação. Ou seja, diante da
busca de liberdade e autonomia, muitos jovens apresentam muitas vezes atos de
rebeldia, solidão, negação de valores familiares e sociais e assumem comportamentos
sexuais arriscados (GOODSON e DIAZ, 1990; LOYOLA, 1990). Neste sentido, em
geral, precisam aprender a lidar com a sua sexualidade, e durante o processo de
aprendizado rejeitam pontos de referência, como a autoridade aos pais e de adultos,
embora ainda não tenham autoconfiança suficiente para estabelecer vínculos profundos
e responsáveis, isto é, para assumir de fato papéis sexuais adultos em relação à vida
sexual.
Lembramos, citando LOYOLA (1990), que o desenvolvimento da sexualidade biológica
e psicológica sobre influências diretas dos padrões sociais; é por meio da aprendizagem
social num contexto cultural, que depende da região geográfica, da classe social, do
perfil familiar, da educação religiosa e de valores e hábitos, que a expressão da
sexualidade na adolescência irá se manifestar.
Pensando no adolescente da classe média, o processo da criança transformar-se em
adulto com deveres e responsabilidades é incerto, pois tanto poderá levá-lo a assumir a
sua sexualidade com prazer quanto ser um processo muito doloroso. O adolescente deve
ingressar no mundo dos adultos, para o qual ainda não está preparado, ao mesmo tempo
em que se desprende do mundo infantil; papéis sociais estavam definidos de forma mais
clara. Para isso, o adolescente deve assimilar algumas perdas importantes: perda do
corpo infantil, do papel e da identidade infantis, perda dos pais da infância. A
intensidade da crise do adolescente na elaboração dessas perdas está ligada às
características da cultura na qual se insere, à dinâmica de seu núcleo familiar e a sua
história de vida (ARAÚJO, 1993).
Papalia, Olds & Feldman (2006), Pereira (2005) e Rangel (1999) argumentam que em
muitas culturas há rituais de iniciação para demarcar a passagem da infância para o
amadurecimento (vida adulta). No Brasil, ou seja, na nossa sociedade, não há rituais
bem delimitados, mas ocorre um período, chamado de adolescência, em que várias
iniciações vão caracterizando a transição da criança à idade adulta.
Em sociedades indígenas brasileiras, por exemplo, as crianças desde cedo são treinadas
pela família para imitar o adulto e a aprender as suas futuras funções no grupo. Num
determinado momento essa criança passa por um ritual (uma festa, dança, pintura no
corpo, objetos de adornos, até mesmo a mutilação genital) demarcado pelo grupo para
se tornar, socialmente, um membro adulto, com as mesmas funções e atribuições dos
demais, isto é, estar preparado para assumir o casamento, a reprodução, o trabalho e a
educação de novas crianças (RANGEL, 1999).
Pereira (2005) comenta:
O final da adolescência também não é claramente definido. Este é um fenômeno
relativamente novo em nossa sociedade, pois cerimônias como a Crisma (confirmação
cristã) e o Bar Mitzvah judeu eram originariamente ritos de puberdade que
oficializavam a entrada do indivíduo na vida adulta. Nas sociedades modernas
podemos constatar que esses ritos perderam seu reconhecimento formal e seu
significado simbólico. Cerimônias sociais foram substituídas por uma seqüência de
etapas, como por exemplo a graduação escolar, que levam a um aumento do
reconhecimento social. Os ritos também foram substituídos por definições legais de
papéis, direitos, privilégios e responsabilidades (PEREIRA, 2005, p.2-3).

As mudanças biológicas (físicas e corpóreas), psicológicas (como percebemos e


sentimos o crescimento) e as sociais (papéis que a sociedade delimita como sendo
infantis, joviais e de adultos) vão caracterizar, portanto, a manifestação da sexualidade
no período adolescente (MAIA, 2003). Destacaremos, a seguir, algumas manifestações
típicas da adolescência: a masturbação, relacionamentos amorosos e a gravidez.

Masturbação adolescente
A manipulação dos genitais é freqüente entre os adolescentes como uma forma de
reconhecer o corpo em mudança e de obter prazer; a masturbação, então, é um elemento
importante para o auto-conhecimento corporal e para a obtenção de sensações
prazerosas que irão permear a vida sexual adulta. No período da adolescência a
curiosidade em relação ao corpo é mais evidente e aumentam as chances de
manipulação e experimentação das sensações prazerosas relacionadas ao toque do
próprio corpo e ao de outros.
Na nossa cultura, a masturbação nos meninos é reforçada pelo grupo social, mas sobre a
menina há repressão; muitas vezes, se impede que ela conheça seu próprio corpo, seus
potenciais e as formas de expressão da sexualidade que a mulher adulta terá. Como
fonte de prazer, a masturbação é uma vivência comum na adolescência, mas pode trazer
sentimento de angústia, ocasionado pela repressão social e pelos mitos que ainda
cercam este tema, como: a masturbação faz “nascer espinhas”, “crescer as mamas”, “tira
o desejo sexual”, “faz ficar louco”, “viciar”, dentre outros (RODRIGUES JR., 1993).
Neste sentido, a masturbação, geralmente, é mais freqüente nos meninos, mas em
ambos os sexos podem ocorrer sentimentos ambivalentes, pois sua prática pode gerar
culpa e ansiedade embora, ao mesmo tempo, produza imenso prazer. Os jovens atendem
uma necessidade de aliviar a tensão sexual e, como não têm compromisso com o
desempenho, acabam por fortalecer a autoconfiança sexual e desenvolvem, numa
condição segura, habilidades que são importantes para uma futura experimentação
sexual. Portanto, apesar de toda gama de tabus que ainda existe acerca da masturbação,
ela pode ser uma conduta positiva no processo de desenvolvimento sexual na medida
em que não produza danos físicos ou emocionais (LOYOLA, 1990).
Conceição (1986) reitera que o ato de se masturbar nos adolescentes traz alívio da
tensão sexual e conhecimento da sua própria sexualidade. Além disso, ajuda no
desenvolvimento e no equilíbrio do indivíduo, minimizando os efeitos maléficos da
abstinência e exercitando a sexualidade. Em suma, a masturbação, especialmente nesse
período da vida, é um comportamento “normal” e comum e pode ter o sentido de auto-
conhecimento e/ou obtenção de prazer.
O que devemos fazer, como adultos atentos, é dialogar com o adolescente de maneira a
ajudá-los a perceber o lado prazeroso da masturbação reforçando, no entanto, as
responsabilidades relacionadas, como a manutenção da higiene, da privacidade alheia e
do respeito ao outro.

Relacionamento amoroso
O namoro pode ser para o adolescente tanto fonte de prazer quanto de ansiedade e
conflito. Geralmente a falta de experiência em relacionamentos românticos gera
angústia e fantasias inadequadas. Socialmente espera-se do menino que ele tome a
iniciativa e seja capaz de “ensinar” a menina quando na verdade ele também desconhece
vários aspectos da relação afetiva e sexual (RODRIGUES JR, 1993). Abandonar a
“segurança” do grupo de amigos para ingressar na construção de uma relação amorosa
não é uma tarefa fácil para ambos os sexos, gerando ansiedade, pois é preciso abandonar
uma relação estável da vivência da “turma” para desenvolver um novo papel de amante
(MONESI, 1993).
Além disso, é importante lembrar que há uma cobrança social imposta pela necessidade
de (ter) um namorado (a). Não desconsidero a necessidade intrínseca de amar e de ser
amado, porém, o modelo de relacionamento amoroso imposto pela mídia e pela
sociedade é idealizado na figura do amor romântico, monogâmico, heterossexual e
sexualmente satisfatório. Atingir esse ideal como meta de felicidade, quando ainda se
está amadurecendo emocionalmente, é uma tarefa árdua para os jovens pois,
reconhecidamente, o modelo ideal desconsidera a enorme diversidade dos desejos e das
aspirações e, muitas vezes, os estereótipos relacionados aos relacionamentos amorosos
tornam certos jovens alvos de discriminações. Ter um parceiro (a) amoroso nesta fase
da vida pode significar uma maior aceitação do grupo social, maior aceitação pessoal
em relação ao próprio corpo e a sua identidade, por isso os jovens almejam tanto
efetivar uma relação amorosa ou sexual. Ao mesmo tempo, é exatamente neste período,
em decorrência desses modelos ideais, das cobranças familiares e sociais, de uma
imaturidade emocional e de insegurança pessoal diante do desconhecido, que as
experiências amorosas vão ser marcantes para o desenvolvimento. Essas experiências
podem envolver a reciprocidade de sentimentos amorosos no outro ou não, isto é, tanto
podem repercutir no (a) outro (a) situações de indiferença, rejeição e desamor e gerar
sensação de insucesso, de insatisfação e de sofrimento, quanto podem repercutir no (a)
outro (a) situações de aceitação e amor e gerar sensação de confiança e satisfação
pessoal.
Na segunda metade dos anos 80, surgiu uma nova prática de relacionamento entre os
jovens adolescentes: o ficar (CHAVES, 1997; VITIELLO, 1997). Os autores definem
essa modalidade de relacionamento como um exercício de sedução; um relacionamento
marcado pela falta de compromisso e pela pluralidade de desejos e de regras e usos,
cujo objetivo principal é a busca de prazer. O “Ficar com” é uma atividade que contribui
para a maturação sexual de garotas e garotos. Apesar de não parecer sê-lo, é um
comportamento repleto de regras. Entre elas, podemos citar a necessidade de locais
apropriados, a existência de permissões e proibições quanto aos atos envolvidos, quanto
ao número de parceiros possíveis, regras relacionadas ao lapso de tempo entre uma
ficada e outra, etc. Pode envolver relações sexuais ou não e é inclusive incomum que ela
aconteça quando se trata de púberes. O “ficar” tem seu auge na adolescência, e tende a
deixar de acontecer na medida em que os jovens vão ficando mais amadurecidos,
emocional e sexualmente, e procuram estabelecer vínculos mais duradouros (CHAVES,
1997; VITIELLO, 1997).
Atualmente, além do ‘ficar com’, novas possibilidades de aproximação amorosa têm
surgido entre as pessoas, como relacionamentos virtuais com o uso da internet. Alguns
pesquisadores têm se preocupado em estudar o fenômeno dessas novas modalidades de
relacionamento amoroso, mas ainda não há consenso entre os teóricos da psicologia
sobre este tema no desenvolvimento humano.
É preciso considerar que devemos orientar os jovens para que não usem o “ficar” como
uma “válvula de escape”. O outro (o “ficante”) é um ser humano, que tem sentimentos e
desejos que devem ser respeitados. Muitas vezes, o jovem fica com outro para benefício
próprio, ou seja, para a obtenção de prazer e satisfação pessoal, como se o corpo do
outro fosse uma ‘mercadoria’. Quando as necessidades e desejos do outro são
desconsiderados, penso que o ficar com pode ser considerado maléfico. Porém, a meu
ver, esse tipo de relacionamento tem representado prioritariamente benefícios sociais.
Quando o ficar envolve um pacto mútuo e é praticado com o consentimento de ambos,
seja para fins amorosos, sexuais ou simplesmente troca de carícias e experimentação de
sensações prazerosas, seria mais um tipo moderno de relacionamento. Um
envolvimento que, a despeito de promessas de envolvimento e relações duradouras,
pode favorecer o auto-conhecimento, a experimentação de sensações prazerosas,
aumentar a auto-estima e segurança emocional e ajudar no desenvolvimento de vínculos
amorosos na idade adulta.

Gravidez na adolescência
Nos últimos anos, tem aumentado a preocupação social diante de freqüentes gestações
entre as adolescentes. Na verdade, no passado, as meninas casavam muito cedo e tinham
seus filhos ainda adolescentes. A preocupação atual, portanto, refere-se à alta ocorrência
de gestações em pessoas que não desejam a maternidade (para cada mil adolescentes,
120 engravidam em um ano). Isso decorre do exercício da sexualidade entre púberes e
adolescentes que ainda não são capazes de avaliar e ou assumir o ônus da vida sexual
ativa (VITIELLO, 1993).
As Revistas e os Jornais atuais têm alertado para o fato de que muitas garotas ficam
grávidas na adolescência de forma desejada e não indesejada. Em geral, essa motivação
para a maternidade nada tem a ver com uma decisão amadurecida dessas jovens e por
isso ainda há conseqüências psicossociais preocupantes. Seu discurso mostra
pensamentos fantasiosos e expectativas deturpadas em relação ao nascimento de um
filho, como se essa fosse a única forma de romper com a família ou de garantir da
manutenção do parceiro. Por isso optamos por chamar de “gravidez na adolescência” e
não “gravidez precoce” ou “gravidez indesejada”.
Para Vitiello (1993), a preocupação com a gestação e o parto em mulheres jovens tem
sido objeto de interesse por uma série de razões médico-sociais, porém, os problemas
associados às gestações na adolescência são na realidade, muito mais psicossociais que
propriamente orgânicos, o que pode ser constatado pela observação de ótimos
resultados perinatais, sempre que a gestação é desejada e ocorre em situações
socialmente favoráveis. Sendo constatada uma gravidez indesejada, três soluções são
mais comumente observadas na classe médio-inferior e média: abortamento provocado,
casamento de conveniência ou assumir ser mãe solteira. As conseqüências, em qualquer
uma dessas “soluções”, incluem um grande desgaste emocional para a mãe, para seu
bebê, para os familiares e a comunidade, em geral.
Fatores político-sociais, sócio-culturais e familiares influenciam a sexualidade do
adolescente. O choque entre as informações provenientes dos meios de comunicação de
massas e as da família, da escola e da comunidade tem sido, muitas vezes, um fator
gerador de conflito (LOYOLA, 1990). Para Rodrigues Jr (1993) a responsabilidade do
adulto, em especial dos pais e educadores, é orientar leituras científicas e esclarecer o
adolescente com informações precisas, que permitam a eles conhecer a sexualidade de
maneira integral e correta visando diminuir as culpas, recriminações ou preconceitos.
Lidar com a gravidez na adolescência não parece ser uma tarefa simples. Os
atendimentos médicos, educacionais e psicológicos têm enfrentado essa dificuldade
tanto em termos preventivos, quanto remediativos. A sociedade, a despeito da repressão,
apresenta padrões sexuais que estimulam a pratica sexual – muitas vezes promíscua e
desprotegida; quando se fala de doenças e Aids, há uma aparente associação entre sexo
a desprazer e isso dificulta a prevenção pois os jovens não se identificam com as
situações que envolvem riscos.
Ao mesmo tempo há informações disponíveis mas, em geral, estas não são incorporadas
no processo de educação sexual dessa população. Saber sobre a existência de métodos
anticoncepcionais não significa saber como ter acesso e usar adequadamente esses
métodos, como dialogar com o (a) parceiro (a) sobre seu uso, como procurar um
ginecologista para a indicação desses métodos, etc.
Os jovens têm desejo sexual e cada vez mais cedo estão tendo oportunidades e
condições de experimentar a atividade sexual. Não podemos desconsiderar esse fato e
discursar sobre uma suposta abstinência. O início da vida sexual deve ser uma escolha
pessoal, não uma resposta aos padrões sociais, considerando que ora eles defendem que
não é “legal ser virgem”, ora mantêm a posição conservadora de que “é melhor ser
virgem ao casamento”. Porém, diante da escolha da vida sexual, responsabilidades com
a própria saúde e a do (a) outro (a) devem ser respeitadas. É esse tipo de orientação, a
meu ver, que deve ser incentivada. Uma vez assumindo uma vida sexual, medidas
preventivas devem ser tomadas para que a sexualidade signifique para ambos prazer,
satisfação, gratificação e não problemas psicossociais como um adoecimento ou uma
gestação inoportuna.

Reflexões finais sobre o tema da adolescência


Ao pensar sobre o período da puberdade e da adolescência costumo ter a imagem
metafórica do período da gravidez. Uma mulher grávida deve administrar um novo
corpo, que muda drasticamente em um período curto de tempo e, que até então era
desconhecido para ela. Olhar no espelho e se ver em uma nova forma física que causa
estranhamento exige um amadurecimento psíquico e adaptações drásticas. Além disso, a
mulher grávida deve assimilar, com todas as concepções sociais já estabelecidas, um
novo papel de mulher e de mãe, com novas responsabilidades e cobranças. O menino ou
a menina na adolescência também vai lidar com um corpo novo e diferente, que muda a
cada dia, além das cobranças sociais até então despercebidas e isso, em geral, pode
causar ansiedade e angústia e exigir certa compreensão social do mundo dos adultos
(MAIA, 2003).
Diante das mudanças físicas do corpo, cognitivas do pensamento e sociais os púberes e
adolescentes vivem um cotidiano atribulado de ambigüidade de sentimentos e emoções
em relação à sua sexualidade. São conflitos e dúvidas que refletem um sentimento de
temor; medo em não pertencer a um padrão de normalidade socialmente desejável. Este
padrão refere-se a estética corporal, a identidade e ao gênero, a saúde, a beleza, a
capacidade de exercer a atração e a sedução, a expressão da afetividade e do
desempenho sexual. Além disso, vivem de maneira conflituosa as dúvidas em relação
ao tamanho dos órgãos sexuais, ao desempenho em uma relação sexual, à virgindade e
mesmo à realização de práticas sexuais, especialmente quando também se misturam os
valores morais e religiosos da família.
Muitas pesquisas ainda mostram que os adolescentes têm acesso a informações gerais
sobre sexualidade, porém ainda revelam informações distorcidas e deturpadas e
assumem pouca prevenção quando se referem aos métodos anticoncepcionais, às
doenças sexualmente transmissíveis e a temas relacionados à prática da sexualidade. A
melhor maneira de lidar com essa situação é, sem dúvida, a prevenção. O que, no
entanto, extrapola o nível informativo e depende em grande parte, de uma educação
sexual que favoreça a discussão, a troca de idéias, a reflexão, esclarecimentos e a
apropriação do saber entre os jovens e os educadores.
Neste sentido, não podemos desconsiderar o contexto da puberdade e da adolescência
no desenvolvimento. É preciso perceber, compreender e refletir se e como os possíveis
conflitos na adolescência interferem no cotidiano de jovens meninas e meninos, também
na vida escolar, afetiva e social. Se há esta percepção, como podemos ajudar esses
jovens a dialogar e a refletir sobre essas questões? Em que medida temos o
conhecimento amplo em relação às teorias do desenvolvimento para compreender as
mudanças físicas e psicossociais dos nossos jovens? Em que medida tornamos as
informações sobre sexualidade acessíveis e reflexíveis aos jovens de modo a fazer com
que eles extrapolem o mero nível informativo e atuem na formação, na mudança de
atitudes favoráveis à promoção da saúde sexual?
Uma última reflexão final é necessária: Será possível pensarmos as questões da
adolescência sem considerar diferentes contextos sociais e, em muitos casos, com
precárias condições sociais, educacionais e econômicas A que tipo de adolescência
podemos nos referir ao pensar nos meninos marginais, infratores e miseráveis? Ao
pensar nas meninas pobres, de pouca idade (11, 12 anos), que ficam em casa cuidando
de seus irmãos mais novos e da casa para que sua mãe e/ou pai possam trabalhar fora?
Para muitas pessoas, esse período da adolescência praticamente não existe. Muitos
meninos e meninas, embora sendo crianças, realizam tarefas que correspondem às
atividades de um adulto, tendo que assumir responsabilidades sociais diversas e
experienciar, de forma totalmente diversa, a passagem pela adolescência.
Em que medida a adolescência que estudamos na literatura atual considera as
desigualdades sociais e econômicas de muitas sociedades? Uma boa parte da literatura
idealiza a adolescência como se só houvesse jovens de classe média com acesso à
educação e recursos diversos. Toda a descrição que fizemos até aqui refere-se à essa
literatura que desconsidera jovens que vivem na pobreza e na miséria. Apesar de
reproduzirmos os aspectos estudados não poderíamos deixar de apontar que temos
clareza desta lacuna e deste viés. Faltam estudos, inclusive, que acompanhem o período
adolescente em famílias menos favorecidas economicamente, nos quais a criança é
inserida no mundo adulto do trabalho mais cedo e tem menos acesso a bens materiais.
Se conseguirmos pensar sobre essas questões, debater o tema da sexualidade como algo
educativo, dialogar entre diferentes profissionais como trabalhar a sexualidade em
diferentes situações, já seria um grande feito. Acredito que propostas educativas sobre
sexualidade poderiam contribuir sobremaneira para uma educação sexual emancipatória
na adolescência e sobretudo, na promoção de uma vida sexual saudável e responsável
para toda a vida.

Bibliografia
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, M. L. M. Aspectos psicossociais da sexualidade do adolescente. In: RIBEIRO, M. Educação sexual: novas idéias, novas
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