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Introdução

Existem diversas técnicas para observação de detalhes ampliados de superfícies, como, por
exemplo, com lentes, usando um microscópio ótico, inventado no século XVIII. Neste
século, foram desenvolvidos métodos de visualização baseados em feixes de íons ou de
elétrons mas a idéia dos microscópios de sonda é totalmente diferente.

Os instrumentos óticos possuem a limitação do comprimento de onda da luz visível dada


pelo critério de difração de Rayleigh. Ele descobriu que um sistema ótico, seja o olho,
sejam as lentes de um microscópio, é capaz de resolver duas fontes pontuais se os
correspondentes diagramas de difração estão suficientemente separados para serem
distinguidos. Estudando os diagramas de duas fontes luminosas Rayleigh concluiu que elas
podem ser resolvidas se o máximo principal (ou central) de uma coincide com o primeiro
mínimo da outra. Isto é equivalente à condição de que a distância entre os centros dos
diagramas deve ser igual ao raio do disco central. Calculando numericamente chega-se a
que só podem ser resolvidos objetos de 200 a 350 nm, ou seja, da metade do comprimento
de onda da luz visível.

Um microscópio eletrônico de varredura SEM (Scanning Electron Microscope), apenas


capaz de trabalhar em vácuo, pode resolver escalas nanométricas (1 nm = 10-9 m) mas, em
geral, com efeitos destrutivos para a amostra. Além disso, um SEM não é capaz de dar uma
boa informação sobre profundidade.

Um microscópio de varredura por sonda, ou SPM (Scanning Probe Microscope) é na


realidade um grupo de instrumentos compostos basicamente de sonda sensora, cerâmicas
piezelétricas para posicionar o objeto amostra e fazer varreduras, circuitos de realimentação
para controlar a posição vertical da sonda e um computador para mover os scanners de
varredura, armazenar dados e os converter em imagens por meio de softwares específicos
para esse fim.

Há diversos tipos de microscópios de sonda: o de tunelamento ou STM (Scanning


Tunneling Microscope), o de força ou AFM (Atomic Force Microscope), o de campo
próximo ou SNOM (Scanning Near-Field Optical Microscope) e todos os derivados.

O componente essencial do SPM é o sensor, com o qual consegue-se sondar as amostras e


obter as imagens com magnificações muito altas, de forma tal que podem ser medidas
distâncias com resolução de até 0,1 ângstrom (1Å =10-10 m).

Os sensores usados neste tipo de aparelhos são: para o microscópio de tunelamento, uma
ponta metálica para fazer tunelamento entre ela e a amostra; para o microscópio de força
atômica, um sensor de força em forma de ponta condutora ou isolante e para o SNOM uma
fibra ótica.

O STM foi inventado por Gerd Binnig e Heinrich Rohrer, da IBM de Zurich, em 1981 e
foi o primeiro instrumento capaz de gerar imagens reais de superfícies com resolução
atômica. Em 1986 os inventores ganharam por ele, o Prêmio Nobel de Física.
A partir de uma modificação do microscópio de tunelamento, combinado com um
profilômetro Stylus (aparelho para medir rugosidade em escala microscópica) Binnig,
Quate e Gerber1, desenvolveram o AFM em 1986.

No STM, o sensor de tunelamento mede a corrente i que passa entre a amostra e a sonda
metálica, posicionada quase tocando a superfície da amostra (que deve ser condutora).
Quando a distância sonda-amostra é aproximadamente de 10Å, os elétrons da amostra
começam a tunelar na direção da sonda ou vv. dependendo da polaridade de uma voltagem
aplicada entre a sonda e a amostra. A corrente varia com a distância entre elas, sendo
diretamente proporcional à voltagem V aplicada (alguns milivoltios de contínua) e
exponencialmente proporcional à distância d de separação entre a amostra e a sonda: i = V
exp{-cte.φ 1/2 d}, onde φ é a altura da barreira de potencial, função dos materiais com que
estão feitas a sonda e a amostra, e que representa a diferença entre o nível de energia de
tunelamento e o nível de energia máximo do sistema sonda-amostra.

Com o STM podem ser estudadas a topografia de materiais em escala atômica e as forças
que agem entre a sonda e a amostra. Podem ser feitas ainda muitas outras investigações
derivadas do potencial de medida das duas anteriores.

O SNOM, ou microscópio ótico de campo próximo, que –grosso modo– poderíamos


considerar como sendo uma combinação de microscopia de varredura por sonda com
microscopia ótica convencional e que surgiu como uma modificação de um microscópio de
tunelamento (a pesar de que a teoria do seu funcionamento já era conhecida há muito
tempo) supera o limite de difração. Costuma-se dizer que o SNOM foi "reinventado" por
Pohl2 e colaboradores, já que a teoria deste microscópio tinha sido proposta por Synge 3 em
1928. Para pôr em prática naquela época a idéia teria sido necessário possuir técnicas
operacionais da ordem dos nanômetros e, portanto, a proposta caiu rapidamente no
esquecimento. O SNOM melhora a resolução da ótica convencional em pelo menos uma
ordem de grandeza. Ele pode alcançar uma resolução espacial de até 25 nm, o que é bem
menor que a resolução de um microscópio de força atômica ou de um de tunelamento, mas
acrescenta informação que só é accessível com contraste ótico. É por isso que esta técnica
se utiliza como complementar ao AFM. O princípio é simples. A amostra a ser resolvida é
varrida com uma fibra ótica, que tem uma abertura muito estreita –de algumas centenas de
ângstroms de diâmetro na sua extremidade– e que está recoberta por uma película metálica
opaca. Pela fibra passa luz visível, que é refletida pela amostra, ou passa através dela para
um detector. A intensidade do sinal ótico detectado em cada ponto da varredura constitui
um conjunto de dados que irão reproduzir uma imagem da superfície da amostra com
resolução entre 25 e 50 nm, com a única condição de que a distância entre a fonte de luz e a
amostra seja da ordem de 50Å. Com o SNOM obtêm-se imagens óticas de uma amostra
que, para efeitos de análises dos dados, podem ser comparadas com imagens topográficas
adquiridas, simultaneamente, pelo método de controle de forças, que pode ser descrito da
seguinte forma. A fibra ótica utilizada para varrer a amostra é posta para oscilar em
ressonância, próxima da superfície. A amplitude e a fase ou freqüência de oscilação são
utilizadas por um sistema de realimentação para controlar a distância entre a fibra e a
superfície. Quando a ponteira se aproxima da amostra, as forças que agem entre elas
diminuem a amplitude de vibração e modificam a fase. A voltagem necessária para
controlar o movimento da cerâmica piezelétrica que mantém a amplitude constante é
detectada e transformada, por meio de um software, em uma imagem topográfica, da
mesma forma que em um microscópio de força atômica. Para a obtenção de imagens óticas,
a luz que sai da abertura da fibra ilumina uma pequena parte da superfície. Esta luz é
espalhada em dois tipos de ondas: as homogêneas, utilizadas por um microscópio
convencional e as evanescentes, que decaem rapidamente com a distância, mas que podem
ser coletadas pela fibra que está muito perto da amostra. O sinal é então direcionado para
uma fotomultiplicadora ou um contador de fótons que o repassam para o computador, que
por sua vez o transforma em imagem. As informações que podem ser obtidas com um
SNOM referem-se à observação de uma ampla variedade de propriedades óticas dos
materiais, como por exemplo:

-Monitorando a intensidade de luz podem ser feitas imagens que resultem em dados do tipo
transmissividade, reflexividade, polarização e índice de refração.

-O contraste do comprimento de onda ou fluorescência, permite observar luminiscência e


fazer espectroscopia para, por exemplo, identificação química.

Na figura 1, vemos alguns exemplos da versatilidade dos meios de magnificação.

Aumento meio imagem danos


microsc. Ótico 10 3
ar, líquidos 2-D nenhum
varredura laser 10 4
ar 2-D mínimos
feixe de íons 105 vácuo 2-D graves
SEM 106 vácuo 2-D alguns
mínimos ou
SPM 109 liq.,ar, vácuo 3-D
nenhum

Figura 1: Tabela comparativa dos meios de magnificação existentes.

1. G.Binnig, C.F.Quate and Ch.Gerber. Phys.Rev.Lett.56 (9), 1986.

2. D.W.Pohl, W.Denk and M.Lanz. Appl.Phys.Lett.44, 1984.

3. E.H.Synge. Phil.Mag.6, 1928.


O Microscópio de Força Atômica

O AFM, ou microscópio de força atômica, ou ainda, SFM (Scanning Force


Microscope), pode ser operado de diversos modos. Entretanto, seu princípio fundamental é
a medida das deflexões de um suporte (de 100 a 200 µ m de comprimento) em cuja
extremidade livre está montada a sonda. Estas deflexões são causadas pelas forças que
agem entre a sonda e a amostra. As diferentes técnicas fornecem diversas possibilidades
para fazer imagens de diferentes tipos de amostras e para gerar uma ampla gama de
informações. Os modos de fazer as imagens, também chamados modos de varredura ou de
operação, referem-se fundamentalmente à distância mantida entre a sonda (que
chamaremos ponteira) e a amostra, no momento da varredura, e às formas de movimentar a
ponteira sobre a superfície a ser estudada. A detecção da superfície realiza-se visando à
criação de sua imagem. Há um contínuo de modos possíveis de fazer imagens, devido às
diferentes interações em função da distância entre a ponteira e a amostra, assim como ao
esquema de detecção utilizado. A escolha do modo apropriado depende da aplicação
específica que se deseja fazer.

O AFM opera medindo as forças entre a ponteira e a amostra que dependem de diversos
fatores como, por exemplo, dos materiais que compõem a amostra e a ponteira, da distância
entre elas, da geometria da ponteira e de qualquer tipo de contaminação que houver sobre a
superfície da amostra.

Quando a ponteira se aproxima da amostra, é primeiramente atraída pela superfície,


devido a uma ampla gama de forças atrativas existentes na região, como as forças de van
der Waals. Esta atração aumenta até que, quando a ponteira aproxima-se muito da amostra,
os átomos de ambas estão tão próximos que seus orbitais eletrônicos começam a se repelir.
Esta repulsão eletrostática enfraquece a força atrativa à medida que a distância diminui. A
força anula-se quando a distância entre os átomos é da ordem de alguns ângstroms (da
ordem da distância característica de uma união química). Quando as forças se tornam
positivas, podemos dizer que os átomos da ponteira e da amostra estão em contato e as
forças repulsivas acabam por dominar.

A grande vantagem do AFM sobre o STM é que permite estudar não apenas materiais
condutores, mas também todo tipo de material isolante, já que o método não utiliza corrente
de tunelamento para produção de imagens.
Forças a distâncias microscópicas

Para entender o funcionamento de um AFM devemos então ter conhecimento das forças
que agem entre os sistemas microscópicos a distâncias muito pequenas e cuja interação é o
princípio que o microscópio utiliza para funcionar. Na figura 2, estão representadas as
forças que agem entre a ponteira e a amostra em função da distância que as separa.

Figura 2: Forças entre a ponteira e a amostra em função da distância entre elas.

Na área abaixo da linha de força nula, as forças são atrativas. Acima da linha do zero, as
forças são repulsivas. Este tipo de força é proveniente do potencial de interação entre dois
ou mais átomos (que pode ser Lennard-Jones, ou seja, A/r12- B/r6 , ou qualquer outro
potencial de interação entre átomos, com uma dependência desse tipo em r, sendo r a
posição da ponteira em relação à superfície).

A tentativa de classificação de forças é bem extensa. Por exemplo, as forças


intermoleculares podem ser classificadas em três categorias: forças de origem puramente
eletrostáticas (forças coulombianas entre cargas, dipolos permanentes ou quadrupolos),
forças de polarização (provenientes dos momentos dipolares induzidos nos átomos e nas
moléculas por campos elétricos de cargas vizinhas e/ou dipolos permanentes) e forças de
natureza mecânica quântica, que dão lugar às ligações covalentes – incluindo as interações
de transferência de cargas – e às interações repulsivas de intercâmbio (devidas ao princípio
de exclusão de Pauli) e que são as que equilibram as forças atrativas a distâncias muito
curtas. Esta classificação não é rígida e, por exemplo, nela não estão incluídas as forças
magnéticas pois, se comparadas com as anteriores – dentro de sua região de interação – são
muito fracas.

Certas forças, como as de van der Waals, não se enquadram dentro deste tipo de
classificação e fala-se delas, como de forças intermoleculares atrativas de longo alcance e
repulsivas de curto alcance.
Para dois corpos eletricamente neutros e não magnéticos, mantidos a distâncias entre
uma e algumas dezenas de nanômetros, predominam estas forças de atração a "grandes"
distâncias. Em 1873 van der Waals postulou a existência das forças intermoleculares, que
ficaram conhecidas pelo seu nome. Fritz London1 descreveu a natureza delas e as atribuiu
ao movimento dos elétrons dentro das moléculas. As interações das forças de van der
Waals devidas especificamente às flutuações dos elétrons em moléculas ficaram conhecidas
com o nome de London, de flutuação de cargas, eletrodinâmicas, ou de dispersão, estão
presentes até em moléculas polares permanentes e são, em geral, a maior contribuição para
as forças intermoleculares. É por isso que elas têm um papel muito importante em
fenômenos diversos tais como adesão, tensão superficial e muitos outros. Este tema é muito
extenso e pode ser visto no livro Intermolecular and Surface Forces de Jacob Israelachvili
– Academic Press, London (1995).

A interação repulsiva de distâncias curtas origina-se no princípio de exclusão de Pauli: dois


férmions não podem estar no mesmo estado, isto é, com o mesmo spin, o mesmo momento
angular, a mesma componente z do momento angular e a mesma localização espacial.

As forças de van der Waals agindo entre dois átomos ou moléculas podem ser
classificadas em forças de orientação, de indução e de dispersão, representadas na figura
3.

As forças de orientação resultam da interação entre duas moléculas polares com


momentos dipolares permanentes (ver Fig.3a). As forças de indução se devem à interação
de uma molécula polar e uma não polar, onde a polar induz uma polaridade nas vizinhanças
da outra. O campo elétrico da molécula polar destrói a simetria da distribuição de cargas da
molécula não polar, resultando em uma atração semelhante à registrada entre moléculas
polares (ver figura 3b).

Figura 3: Forças de van der Walls. a) Forças de orientação; b) Forças de indução; c) Forças de
dispersão.
As moléculas não-polares possuem dipolos flutuantes finitos e momentos multipolares
grandes em intervalos de tempo muito curtos, os quais interagem, dando lugar a forças de
dispersão entre eles. Para as moléculas não polares, a distribuição eletrônica é, em média,
simétrica. Mas, a cada instante, uma parte da molécula possui mais elétrons que outra.
Assim, cada molécula (ou átomo) se comporta como polar, mas esta "polarização" varia
constantemente em grandeza e direção. Temos, então, momentos flutuantes (ver figura 3c).
As forças de dispersão geralmente são maiores que as de orientação e de indução, exceto no
caso de moléculas polares muito fortes como as de água. As forças de dispersão ou, em
geral, as forças de van der Waals são normalmente atrativas e crescem rapidamente quando
as moléculas, átomos ou corpos se aproximam uns dos outros. A relação força-distância
para a parte atrativa é descrita normalmente por uma potência da distância s:

FvdW(s) ∝ - 1/s7 .

Quando as separações s são maiores que alguns nanômetros, as forças de dispersão


sofrem retardo de origem relativista, levando a um decaimento mais rápido das forças com
a distância, que pode ser descrito por

FretvdW (s) ∝ -1/s8 .

Este efeito pode ser explicado da seguinte maneira. Quando dois átomos estão separados
por uma certa distância, o tempo que leva o campo elétrico de um para chegar no outro e
voltar pode ser da mesma ordem do período da própria flutuação do dipolo. Isto se deve a
que a distância percorrida pela luz durante uma rotação de um elétron num átomo de Bohr é
da ordem de

C/fe ≅ 3x108(m/s)/3x1015(c/s) ≈ 10-7m = 100 nm.

A freqüência da órbita de um elétron num átomo de Bohr é de 3,3 x 1015 c/s. Assim, na
sua volta, o campo encontra o dipolo instantâneo, com uma direção diferente da original e
menos favorável para uma interação atrativa. Como conseqüência do aumento da
separação, a energia de dispersão entre os dois átomos começa a decair mais rapidamente
que r-6, chegando a r-7 para r > 100 nm. Isto é o que chama-se efeito de retardo e, por isso,
as forças de dispersão entre moléculas e partículas a "grandes distâncias" chamam-se
forças retardadas. Para duas moléculas no espaço livre, os efeitos de retardo começam a
uma distância entre elas de aproximadamente 5 nm e, portanto, não são de muito interesse.
Entretanto, num meio onde a velocidade da luz é menor, os efeitos começam a distâncias
menores e tornam-se importantes se a interação é num meio líquido. Note-se que apenas a
energia de dispersão sofre efeitos de retardo; as energias de indução ou de orientação, a
freqüência zero, não sofrem este efeito a nenhuma distância, de forma tal que, quando a
separação aumenta, as contribuições inicialmente fracas, acabam dominando a interação.
Isto significa que, à medida que a distância aumenta, a dependência da energia de van der
Waals entre duas moléculas varia como -1/r6 → -1/r7 → -1/r6.

As forças de dispersão retardadas, isto é, a distâncias "muito grandes" são conhecidas


pelo nome de forças de Casimir. As não-retardadas, levam o nome de forças de London.
As forças de van der Waals atrativas que agem entre dois corpos macroscópicos podem
ser calculadas em primeira aproximação, desprezando as retardadas e supondo que são
aditivas2. Para uma esfera (ou paraboloide) de raio R mantida a uma distância s da
superfície, integrando-se sobre todas as forças das moléculas que compõem a ponteira
suposta esférica, chega-se a que

FvdW(s) = -HR/6s2 ,

onde H é a constante de Hamaker, dependente das propriedades óticas dos materiais. Para a
maioria dos sólidos, seu valor varia entre 0,4x10-19 e 4x10-19 Joules.

As forças de van der Waals já foram estudadas experimentalmente durante muito tempo
antes da invenção dos microscópios de varredura com sonda. Para isto, foram utilizados
aparelhos como o surface force apparatus, instrumento mecânico que utiliza
interferometria para medir distâncias e cuja resolução chega a 10 -8 N. Para este tipo de
medidas, o AFM é capaz de conseguir resolução de 10-10 N.

Em condições ambiente (em ar, a temperatura ambiente), existirá sempre uma pequena
camada de contaminação, como se mostra na figura 4, cobrindo a superfície da amostra. Ela
é composta por contaminantes do ar ambiente e/ou restos produzidos durante a preparação
da amostra, os quais preenchem as irregularidades da superfície. A espessura desta camada
pode variar entre 25 e 500 Å, dependendo da umidade ambiente.

Quando a ponteira se move na direção da superfície da amostra contaminada, numa certa


altura ela é puxada fortemente para dentro da camada, por atração de capilaridade. Portanto,
as forças atrativas são muito mais fortes quando existe camada de contaminação do que
quando não há. O efeito disto pode também ser visto quando a ponteira é retraída da
superfície. A atração de capilaridade tende a segurar mais fortemente a ponteira. Então, a
uma dada distância, as forças podem ser menores quando a ponteira se move na direção da
amostra, do que no sentido contrário.

Figura 4: Contaminação sobre uma amostra e ponteiras dentro dela.


O aspecto da ponteira é fundamental para fazer uma imagem, pois, na realidade, a imagem
será a resultante das formas da ponteira e da amostra. Uma ponteira grossa, de raio grande e
baixa relação entre comprimento e raio ou diâmetro (aspect ratio) terá uma grande área de
interface com a camada de contaminação, resultando em forças atrativas muito grandes.
Uma ponteira fina, de alta relação, terá uma área menor de interface com a camada de
contaminação e, portanto, atração menor de capilaridade da amostra. Uma ponteira fina
poderá, ainda, entrar e sair mais facilmente da camada de contaminação, como observado
na parte inferior da figura 4.

A amostra também afeta a adesão entre ela e a ponteira. Algumas amostras são mais
suscetíveis a uma maior contaminação do que outras. É preciso levar em conta ainda que
algumas amostras desenvolvem com facilidade cargas elétricas estáticas. Eletricidade
estática sobre a superfície da amostra pode ter efeito significativo sobre sua interação com a
ponteira, dificultando a produção de uma boa imagem.

A relação entre força e distância também pode depender da dureza da amostra. Uma
amostra mole pode deformar-se como resultado das forças exercidas pela ponteira.

1. E.Eisenschitz and F.London, Zs.Phys.60, 491(1930):Teoria Quântica para as Forças de van der Waals.

2. Ao contrário das forças gravitacionais ou das coulombianas, as forças de van der Waals não são aditivas por pares, já que a força entre duas
moléculas é afetada pela presença de todas as outras moléculas vizinhas.
Suporte da sonda

A ponteira é apoiada num suporte chamado cantilever que pode ter forma de V ou de
haste, em geral retangular. A força que a amostra exerce sobre a ponteira é determinada
pela deflexão do cantilever, dada pela lei de Hooke F = -k x , sendo x o deslocamento do
cantilever e k a sua constante de mola própria, determinada pelas características de
construção. O cantilever possui duas propriedades importantes: a constante de mola e sua
freqüência de ressonância. A primeira determina a força entre a ponteira e a amostra
quando estão próximas e é determinada pela geometria e pelo material utilizado na
construção do cantilever. Veremos mais tarde que, por exemplo, no modo de AFM contato,
usam-se cantilevers muito leves e com baixas constantes de mola.

O componente mais importante do AFM é, sem dúvida, o cantilever. São necessárias


grandes deflexões para atingir alta sensibilidade. Portanto, a mola deve ser tão macia
quanto possível. Por outro lado, é preciso uma alta freqüência de ressonância para
minimizar a sensibilidade a vibrações mecânicas, especialmente quando se está fazendo a
varredura. Como a freqüência de ressonância do sistema da mola é dada por

ω 0 = (k/m)1/2 ,

onde m é a massa efetiva que carrega a mola, é claro que um grande valor de ω 0 para uma
mola relativamente mole (k pequeno) pode ser conseguido mantendo pequena a massa m e,
portanto, a dimensão do sensor deve ser tão pequena quanto possível. Estas considerações
levam diretamente à idéia de utilização de técnicas de micro fabricação para produção de
cantilevers.

Na figura 5 vemos uma imagem obtida com o SEM da COPPE (UFRJ) de um cantilever
de fabricação comercial usado no nosso laboratório e a sua ponteira. Trata-se de um
cantilever de Si3N4 de aproximadamente 210 µ m de comprimento no eixo maior, com
ponteira piramidal integrada.
Figura 5: Cantilever com ponteira

Visando um bom funcionamento do equipamento, também devem ser levados em conta


os fatores externos ao aparelho: os ambientais, como umidade e temperatura, e as vibrações
provenientes do entorno onde está localizado o aparelho, que podem vir a causar
interferências. Algumas freqüências típicas de fontes de instabilidades são:

Máquinas: 10-200 c/s


Trânsito na rua: 5-100 c/s.
Vibrações acústicas: ~ 20 c/s.
Equipamentos com motor: 10-50 c/s.
Ressonâncias dos primeiros andares e/ou térreo: 5-50 c/s
Balanço dos prédios altos: 0,1-5 c/s.

A ponteira no cantilever pode ser colada ou solidária, isto é, o cantilever pode ser
diretamente fabricado com uma ponteira aguçada em sua extremidade. A constante de mola
deve ser tão pequena quanto possível, visando a detecção de forças bem pequenas. Como já
mencionado, a freqüência de ressonância deve ser bem alta, para minimizar a sensibilidade
às vibrações mecânicas. O ângulo de abertura da ponteira deve ser tão pequeno quanto
possível, para facilitar a penetração quando se varrem áreas relativamente grandes e
rugosas.

Vejamos alguns valores típicos: para resolução atômica, seria razoável ter um k da mola
típico de acoplamento interatômico em sólidos, que é da ordem de

kat = ω at
2
mat ≈ 10 N/m ,

para freqüências de vibração atômica típicas (ω at ≈ 1013 Hz) e massas atômicas típicas (mat
≈ 10-25 kg).
Um cantilever com uma constante de mola menor que kat pode ser facilmente fabricado
com folha de alumínio. Um pedaço de 4 mm de comprimento, 1 mm de largura e 10 µ m
de espessura, terá um k de aproximadamente 1 N/m, de acordo com a relação

k = (E/4) wt3/l3 ,

onde E é o módulo de Young (relação entre a força e a deformação) e l, w e t são o


comprimento, a largura e a espessura do cantilever, respectivamente.

Uma força de cerca de 10-10 N torcerá um cantilever como este em 1 Å, o que pode ser
facilmente medido. Pareceria, então, que está tudo resolvido. Entretanto, esse tipo de
cantilever possui freqüência de ressonância de apenas 1 kHz, muito baixa para operar em
AFM. Para aumentá-la, a massa deve ser reduzida consideravelmente. É por isso que os
cantilevers, hoje em dia, são feitos de óxido de silício (SiO 2), nitreto de silício (Si3N4), ou
silício puro, utilizando técnicas de fotolitografia, com ponteiras piramidais ou cônicas, para
as quais conseguem-se raios menores de 300 Å.

Essa produção em série possui a vantagem de fornecer muitos cantilevers com as


mesmas características, coisa essencial para reproduzir uma experiência. Cantilevers
microfabricados, com dimensões laterais típicas da ordem de 100 a 200 µ m de
comprimento, de 10 a 40 µ m de largura e espessuras de aproximadamente 0,3 a 2 µ m,
possuem constantes de mola entre 0,1 e 1 N/m e freqüências de ressonância entre 10 e 100
kHz. Os cantilevers em forma de V têm baixa resistência mecânica às deflexões verticais e
alta resistência às torções laterais.

Uma alta freqüência de ressonância tem como conseqüência no sistema de AFM que ele
se torne insensível às vibrações mecânicas de baixa freqüência, pois a transmissão de
vibrações externas de freqüência ω , através de um sistema mecânico de freqüência
ressonante ω 0 dá-se através do fator (ω /ω 0)2. Além disso, uma alta freqüência de
ressonância do cantilever permite velocidades de varredura razoavelmente altas, pois, para
a eletrônica do aparelho, é possível medir mais rápido, quanto maior for a freqüência. Isso
ocorre porque o sampling (tempo de medição da amostragem) do aparelho é inversamente
proporcional à freqüência.

Os cantilevers em forma de V possuem uma dureza lateral grande, se comparados com


os de forma retangular. Isso reduz a sensibilidade a forças laterais de atrito que poderiam
resultar em séria degradação das imagens, especialmente de superfícies topográficas com
variações grandes em altura e inclinação.

Quando um cantilever é tirado da sua posição de equilíbrio, após se soltar, oscilará com
sua freqüência natural de ressonância, determinada por suas propriedades mecânicas. Um
cantilever duro, com alto k, irá ressonar a freqüência mais alta do que outro mole, de baixo
k. Ainda mais, essa ressonância não depende apenas do material e das dimensões do
cantilever, mas também das forças que agem na ponteira. Finalmente, a freqüência de
ressonância depende também fortemente da massa na ponta do cantilever, isto é, da
ponteira que ele suporta. Valores típicos das freqüências próprias dos cantilevers utilizados
em AFM variam de 15 a mais de 500 kHz.

A curva de deflexão de um cantilever pode ser obtida movendo a ponteira na direção de


superfície da amostra e medindo essa deflexão. Na figura 6, é mostrada uma curva típica de
deflexão para a ponteira se aproximando e se afastando da amostra.

Figura 6: Curva típica de deflexão de um cantilever.


Ponteiras

As imagens de SPM derivam da combinação da superfície da amostra e da ponteira


utilizada. Um bom entendimento da interação amostra-ponteira é importante para saber
avaliar as imagens resultantes. Para isto, não é apenas necessário conhecer o material do
qual a amostra é feita, mas também a geometria e a composição da ponteira.

1. -Ponteiras piramidais. Como já vimos, a ponteira mais comum em AFM é uma


pirâmide de nitreto de silício, cuja base é um quadrado de aproximadamente 5 µ m
de lado. O aspect ratio é aproximadamente 1:1 e o raio da ponteira da ordem de
1000 Å. Existem também ponteiras piramidais de base triangular.
2. -Ponteiras por deposição química de vapor. Ponteiras muito finas e de alto aspect
ratio podem ser feitas com um feixe de elétrons combinado com deposição química
de vapor. Estas ponteiras são crescidas na extremidade de uma ponteira standard
piramidal e possuem diamante em sua composição, o que as torna muito rígidas.
Dimensões típicas são: 1,5 a 2 µ m de comprimento, aspect ratio > 10:1 e raio de
100 Å.
3. -Ponteiras piramidais gravadas. São vendidas comercialmente, no feitio
piramidal, mas trabalhadas com ácido de forma que suas extremidades fiquem
muito agudas. O aspect ratio delas é de 2 a 3:1.
4. -Ponteiras cônicas de silício. O silício é freqüentemente utilizado para fazer
ponteiras sobre cantilevers ressonantes, isto é, para usar com modulação em não
contato. Em contato, as ponteiras cônicas quebram mais facilmente que as
piramidais. As ponteiras assim feitas possuem raios na base do cone de 3 a 6 µ m e
alturas de 10 a 20 µ m, resultando em aspect ratios de 3:1. Os raios das
extremidades são de aproximadamente 200 Å. Estas ponteiras feitas de silício têm a
vantagem ainda de que podem ser dopadas para fazê-las condutoras tornado-as mais
versáteis. Elas podem ser utilizadas, por exemplo, para fazer microscopia de força
elétrica ou para prevenir cargas não desejadas na ponteira e/ou na amostra.

Resolução e Forma da Ponteira

A resolução lateral em uma imagem de AFM está determinada pelo espaçamento da


medida e pelo raio mínimo da ponteira. O espaçamento entre dois pontos nos quais se faz a
medida chama-se medida do passo e está determinado pelo tamanho da varredura e pelo
número de pontos por linha que é varrida. Esta medida pode variar de algumas décimas de
ângstroms até 100 µ m para um número de pontos por linha de 64 a 512. Em geral, nos
equipamentos comerciais o número de pontos por linha é igual ao número de linhas da
varredura. Considerando uma imagem que tenha 500 x 500 pontos de dados para uma
varredura de 1 µ m x 1 µ m teremos uma medida de passo e, portanto, uma resolução
lateral de 1 µ m/500 = 104Å/500 = 20Å. A ponteira mais fina que pode ser encontrada no
mercado pode ter um raio da ordem de 50Å. Devido a que a área de interação entre a
ponteira e a amostra é uma fração do raio da ponteira, este tipo de ponteira fornece uma
resolução lateral de 10 a 20Å. Então, a resolução das imagens de AFM maiores que 1 µ m
x 1 µ m está geralmente determinada não pela ponteira e sim pela medida do passo. Na
realidade, a melhor resolução em AFM depende de como ela é definida. Como já dissemos,
em ótica convencional, dois pontos se consideram resolvidos se a imagem satisfaz o critério
de Rayleigh. Em SPM a interpretação deste critério requer que a diferença entre um vale e
um cume existentes entre duas rugosidades contíguas seja no mínimo de 19% da altura total
da imagem. Para determinar a resolução lateral experimentalmente faz-se o mesmo que
com as fontes luminosas, isto é, se aproximam as rugosidades até chegar aos 19% entre
picos. A mínima separação entre duas rugosidades determina a melhor resolução. Com esta
definição e com uma ponteira bem fina, se atingem resoluções de 10 a 20Å. Isto está em
aparente contradição com o que dissemos que conseguíamos imagens de resolução de rede
atômica. Vejamos primeiro o STM, que consegue verdadeira resolução atômica. A corrente
de tunelamento é uma exponencial da distância entre a ponteira e a amostra; portanto, só
interagem os átomos mais próximos. No AFM, a dependência da deflexão do cantilever,
com a distância ponteira-amostra é mais fraca (não é exponencial) e portanto, vários átomos
da ponteira interagem simultaneamente com vários átomos da amostra. No AFM cada
átomo da ponteira que participa na imagem "vê" a amostra como uma rede periódica.
Devido a que os átomos da ponteira estão localizados lateralmente em forma diferente, a
rede vista por cada átomo é diferente. E mais, cada átomo da ponteira está a uma altura
diferente com relação a amostra e a grandeza do sinal visto por cada átomo enfraquece com
a distância. Quando todas as contribuições de todos os átomos participantes na ponteira são
combinadas instantaneamente e o resultado é somado durante o tempo em que a ponteira
varre a superfície periódica, a imagem resultante é periódica, tendo a simetria e o
espaçamento corretos. Entretanto, se estiver faltando um átomo, o lugar em que está
faltando não será detectado pois a imagem é uma superposição de muitas imagens. Para ter
uma real resolução atômica deveríamos poder detectar um átomo. Portanto, gerar uma
imagem em escala atômica com um AFM não significa que obtivemos resolução atômica.
Operação do AFM sem modulação

O AFM mede as forças entre a amostra e a ponteira, visando a geração de imagens da


superfície da amostra. Há dois métodos para medir estas forças, que dependem de se o
cantilever está sendo modulado ou não. No AFM sem modulação, um sensor detecta a
deflexão do cantilever. A força aplicada sobre a amostra pela ponteira é calculada pela lei
de Hooke.

Figura 7: Método de detecção sem modulação.

Na figura 7, está representado o sistema de detecção com luz de laser, refletida pela parte
de cima do cantilever e detectada por um fotodetector de quatro segmentos (dos quais só
vemos dois). A força que o raio de luz exerce sobre o cantilever é desprezível.

Este método é muito sensível a asperezas na superfície da amostra. Entretanto, tem a


desvantagem de que o cantilever pode esquentar, mudando sua reflexão. Por isso, usa-se,
em geral, laser de HeNe que garante aquecimento desprezível. Quando o cantilever se
move, devido a mudanças na topografia da amostra, a luz que ele reflete se move sobre o
fotodetector. O quanto o cantilever se moveu pode ser calculado a partir da diferença na
intensidade de luz nos setores do fotodetector.

As mudanças na saída do fotodetector são utilizadas para ajustar uma cerâmica


piezelétrica na direção vertical z, cujo valor é registrado em função das coordenadas (x,y),
para depois ser traduzido em topografia z(x,y). As coordenadas x,y também são
monitoradas através de voltagens aplicadas nas cerâmicas piezelétricas colocadas nos
drives x e y do scanner, assim como em z.

O controle de movimentos em distâncias tão pequenas é possível graças ao uso de


cerâmicas piezelétricas. Em estes materiais ocorre uma mudança em suas dimensões
quando é aplicado um campo elétrico. As cerâmicas são fabricadas em uma grande
variedade de formas, em geral de um conglomerado de pequenos cristais de titânio,
zircônio e chumbo. Para torná-las piezelétricas, é necessária a aplicação de uma voltagem
muito alta para alinhar os momentos elétricos de regiões espontaneamente polarizadas.
Assim, as cerâmicas passam a possuir momento dipolar líquido e responderão linearmente
– pelo menos em princípio – a um campo elétrico ou a um stress, sempre que estes
estímulos não estejam por cima daqueles utilizados para polarizá-las.

Cada tipo de cerâmica possui um único coeficiente de expansão que permite calcular a
distorção produzida pela aplicação de um potencial. Os coeficientes variam de 1 a 3000
Å/Volt. Assim, as cerâmicas permitem a localização exata da ponteira. Por exemplo, se o
coeficiente é 1 Å/V, a cerâmica irá se expandir 0,1 Å se aplicarmos 100 mV. O processo é
realizado por meio de um circuito de realimentação acoplado às cerâmicas, com o objetivo
de obter um mecanismo de posicionamento. A figura 8 mostra um esquema do circuito.

Figura 8: Circuito de realimentação para posicionamento de um piezelétrico.

Com um circuito como este, o sensor (no caso, a ponteira) pode ser mantido a uma
distância fixa da superfície. Quando a ponteira se move na direção da superfície, aumenta a
saída da eletrônica a ela acoplada. O amplificador diferencial compara o valor aumentado
com o valor de referência e envia uma saída de correção de voltagem que excita o
piezelétrico para contraí-lo e, assim, afastá-lo da superfície. O integrador (basicamente um
capacitor) serve para "suavizar" a realimentação, pois a correção seria um pulo ou "golpe"
de voltagem sobre o piezo. O processo é denominado método de força constante e é
análogo ao que ocorre em um sensor de tunelamento. Neste caso, quando a ponteira se
move na direção da superfície, a corrente cresce e o circuito faz que a cerâmica se contraia,
mantendo a ponta a uma distância fixa da superfície.
Figura 9: Esquema de um microscópio de varredura.

Com um sistema de realimentação como esse, o funcionamento do nanoscópio torna-se


simples. Esquematicamente, um microscópio de sonda de varredura sem modulação é como
o mostrado na figura 9.

Um "rastreador" movimenta a ponteira no plano x,y. A eletrônica da ponteira realiza a


realimentação e mantém constante a distância ponteira-amostra de forma tal que a força
permaneça constante. Um computador armazena e processa os dados, além de capturar o
sinal de erro que opera o mecanismo de posicionamento.

As imagens da superfície são geradas passando o sensor sobre ela, armazenando os sinais
de saída dos drivers que movimentam os piezelétricos no computador, que finalmente os
transforma em imagens.

O piezelétrico usado na varredura, deve ser otimizado com relação a vários itens. Para
uma operação estável de varredura, os piezelétricos devem ser sensíveis e estáveis. Existem
diferentes tipos de scanners que diferem na forma e, logicamente, nas propriedades: há os
que têm forma de tubo, com altas freqüências de ressonância e desenho mais rígido e os em
forma de tripoide que possuem maior alcance de varredura mas são menos estáveis. Altas
freqüências de ressonância são requeridas com o propósito de aumentar a velocidade de
varredura sem o risco de aparição de vibrações espúrias.

Os drives dos piezelétricos, por sua vez, devem possuir alta sensibilidade e conseguir
grandes áreas de varredura para uma mesma voltagem aplicada. Grandes áreas de varredura
são úteis, tanto para ver estruturas superficiais de grande escala, quanto para checar o quão
representativas são as estruturas superficiais observadas em pequena escala. Por outro lado,
se não houver necessidade de grandes áreas de varredura, a voltagem de saída da eletrônica
para os drives do piezelétrico pode ser diminuída, obtendo-se, assim, maior sensibilidade.
Existem vários outros fatores que contribuem para a estabilidade e a sensibilidade de
operação de um nanoscópio.

O acoplamento dos movimentos dos piezodrives x, y e z, mais conhecido por cross-talk,


deve ser o menor possível. Entre as três direções ortogonais de movimento, o cross-talk
está sempre presente nos scanners, independentemente de sua geometria (tripoides ou
tubos). Esse efeito pode tornar-se significativo quando se varrem grandes áreas, já que
introduz distorções nas imagens.

A histerese, a não linearidade e o creep, são outros fatores que introduzem distorções e
portanto devem ser minimizados. A histerese do piezelétrico pode causar distorções muito
significativas nas imagens, quando se varrem grandes áreas. Baixa histerese dielétrica
significa que a contração e dilatação devem ser efetuadas praticamente pelo mesmo
caminho. Isto pode ser visualizado desenhando um gráfico de deslocamento dielétrico D
(proporcional à polarização), em função do campo elétrico E. As não linearidades aparecem
quando se aumenta a voltagem (diminui a sensibilidade) do piezelétrico para varrer áreas
maiores. Ser linear significa ter a mesma relação dilatação/contração, em função da
voltagem aplicada e para qualquer voltagem.

O creep é uma deformação da superfície. Os elementos piezelétricos mostram um lento


creep logarítmico após uma mudança rápida de voltagem. Este creep é causado por um
lento reordenamento de domínios ferroelétricos. A cerâmica continua a deformar-se depois
de acabado o estímulo. Se L é o comprimento do piezelétrico, o creep é dado por ∆ L/L = a
+ b ln t , onde a e b são constantes e t é o tempo. Então, o creep do piezelétrico introduz
distorções nas imagens a mais longo tempo que os efeitos anteriores, devido à dependência
logarítmica com t. As distorções causadas por histerese e creep podem ser reduzidas por
uma escolha apropriada das cerâmicas piezelétricas, ou eletronicamente, introduzindo
elementos capacitivos. Como alternativa, as distorções podem ser eliminadas por uma
correção da varredura por software, posterior à aquisição da imagens. O assunto, entretanto,
será abordado com mais detalhes no capítulo sobre artefatos.
Métodos com modulação

Modular significa introduzir modificações de alguma propriedade ou grandeza,


utilizando um sinal de uma certa freqüência (em geral, alta). Nesta técnica, modula-se a
freqüência do cantilever, geralmente, montando na sua base uma cerâmica piezelétrica, a
qual é submetida a uma voltagem de corrente alternada capaz de causar oscilação. A
relação entre a oscilação da entrada e a do cantilever depende de sua freqüência de
oscilação ressonante. Na figura 10 mostra-se a amplitude e o deslocamento de fase da
oscilação de um cantilever em função da freqüência de oscilação de entrada. Quando é
aplicada uma freqüência mais baixa que a freqüência de ressonância do cantilever, seu
movimento é dado pela oscilação de entrada, como se mostra na figura 10a. Quando a
freqüência aumenta, aproximando-se da ressonância, o cantilever oscila para cima e para
baixo a uma amplitude maior, para a mesma voltagem aplicada ao piezelétrico, como
mostrado na figura 10b. Passando a freqüência de ressonância, o cantilever se atrasa em
relação ao sinal de entrada.
Figura 10: Amplitude e deslocamento de fase em função da freqüência de oscilação

Por exemplo, quando a cerâmica piezelétrica atinge o topo de uma oscilação e começa a
descer, o cantilever está ainda subindo.
O atraso na oscilação do cantilever em relação à entrada é um phase shift que, a freqüências
ainda maiores, pode chegar a 180° . A amplitude, por sua vez, pode diminuir a níveis muito
baixos. Isto é mostrado na parte c da figura 10. A amplitude e o deslocamento de fase como
função da freqüência estão apresentados na figura 10d.

A oscilação do cantilever também depende da distância até a amostra. Em outras palavras,


depende da força que age sobre ele, pois quanto mais perto da amostra, menor é a
freqüência de ressonância, isto é, o cantilever comporta-se como se a sua massa aumentasse
com a

Figura 11: Mudança de freqüência de ressonância nas proximidades da amostra.

proximidade da amostra. Ou seja, quando a ponteira se aproxima da superfície, a força


entre ela e a amostra causará um deslocamento da freqüência de ressonância, como
mostrado na figura 11. Esta variação de freqüência, em fase ou amplitude, é utilizada na
medição da força (e/ou para controlar a realimentação) quando se modula o cantilever.
Métodos de realimentação

O circuito de realimentação do AFM controla o movimento da cerâmica piezelétrica na


direção z (perpendicular à superfície), assim como a aquisição de dados nessa direção. Há
basicamente dois métodos de realimentação em AFM: aquele no qual o cantilever não
oscila e aquele em que se utiliza o deslocamento de fase e/ou a variação

Figura 12: Loop de realimentação sem oscilação.

da amplitude. No primeiro, a saída do sensor é utilizada para ajustar a cerâmica


piezelétrica z e gerar dados nessa direção, como se mostra na figura 12.

A variação na fase ou na amplitude associada com a oscilação do cantilever perto da


amostra pode ser utilizada para controlar o loop de realimentação em AFM. Nesse caso, o
cantilever oscila, e a saída oscilante do fotodetector é comparada com a oscilação de
entrada através de um loop de phase-lock. A saída é proporcional à variação na amplitude
ou na fase, e é utilizada para controlar a realimentação que vai à cerâmica, assim como para
gerar os dados na direção z. O circuito para realizar esta operação é mostrado na figura 13.
Figura 13: Circuito de realimentação para o cantilever oscilante.
Modos de fazer imagens em AFM

Como já dissemos, o AFM pode ser operado de diversos modos, os quais fornecem
grande variedade de opções para a construção de imagens de diferentes tipos de amostras,
gerando diferentes tipos de informação.

Globalmente, os modos de fazer imagens podem ser classificados em dois tipos –


operação em contato ou em não-contato – dependendo das forças líquidas entre a ponteira e
a amostra. Quando o aparelho é operado na região atrativa, o método chama-se não-
contato. Nesta região, o cantilever de AFM se enverga na direção da amostra. A operação
na região repulsiva chama-se contato e o cantilever se dobra, afastando-se da amostra. Na
figura 14 é mostrada a deflexão do cantilever em ambos modos. No modo de não-contato
ele é atraído pelas forças de capilaridade da camada de contaminação ou pelas forças de
van der Waals, quando a amostra é limpa. No modo de contato, vê-se como a deflexão do
cantilever é na direção oposta à da amostra.

Figura 14: Deflexão do cantilever operando em não-contato e em contato.

Figura 15: Regimes de operação.

Na figura 15 estão representadas as duas regiões que determinam os modos de operação


do AFM.
Modo D.C. Contato

Este é o método mais utilizado para fazer imagens em AFM. Possui as seguintes
características:

A força é repulsiva e o cantilever, em geral em V, é mole, para conseguir uma boa flexão
sem deformar a amostra. As constantes de mola dos cantilevers moles mais usados variam
entre 0,02 e 0,05 N/m. Eventualmente, podem ser utilizados cantilevers duros. Entretanto,
devem ser operados a altas forças. Neste caso, durante a aproximação da ponteira, o
cantilever é puxado fortemente para a superfície, podendo distorcê-la ou danificá-la se a
amostra for mole. As constantes de mola dos cantilevers duros mais utilizados variam entre
20 e 80 N/m.

A realimentação é por deslocamento da ponteira. Na operação standard, este deslocamento,


que é produzido pela deflexão do cantilever respondendo à topografia da amostra, é
utilizado pelo loop de realimentação para ajustar a cerâmica piezelétrica z, de forma tal que
a força entre a ponteira e a amostra se mantenha constante. A voltagem requerida é
utilizada como dado na direção z para fazer a imagem. Como já dissemos, este é o modo de
força constante que também chama-se de varredura lenta. Se a varredura for muito
rápida ou se o loop da realimentação for desligado, a cerâmica não conseguirá seguir a
forma da superfície da amostra. Neste caso, a saída do sensor (que reproduz da deflexão do
cantilever) utiliza-se diretamente para gerar a topografia. Este modo chama-se de força
variável ou de varredura rápida, ou ainda, de altura constante.

O modo de força constante é útil para uma ampla variedade de aplicações. Pode ser
utilizado tanto com amostras duras quanto com moles, embora as amostras moles
requeiram o uso de cantilevers moles e forças fracas.

A força constante é utilizada quando existem mudanças significativas na altura da amostra


sobre a área varrida. A força variável é utilizada em áreas muito pequenas, com amostras
muito planas, tais como corrugações atômicas. Este modo é muito eficiente também para a
construção de imagens de amostras submersas. Quando uma amostra está em um meio
líquido, não há menisco de contaminação entre a ponteira e a superfície. Logo, pode ser
feita uma imagem com forças muito fracas. O processo é útil para preservação de amostras
mais moles.
nterpretação das superfícies medidas por microscopia de força
constante

A invenção e desenvolvimento do AFM com a conseqüente capacidade de resolução


atômica no modo de contato levou certamente a uma nova percepção das forças
interatômicas que agem em sistemas que devem ser tratados por mecânica quântica.

Historicamente, e em certa medida, o conceito de força na Física e na Química Quânticas


foi deixado de lado. Do ponto de vista da teoria quântica, isto deve-se ao fato de que as
forças não são constantes de movimento, pois não comutam com os Hamiltonianos. Em
conseqüência, as forças são, na maioria dos casos, tratadas como gradientes das funções de
energia potencial, as quais sim, são consideradas fundamentais.

Do ponto de vista experimental, sempre foi mais difícil medir forças do que níveis de
energia para sistemas microscópicos. A invenção do microscópio de força contribuiu, sem
dúvida, para o aumento do interesse pelas forças agindo nesses sistemas.

A relação fundamental entre força e energia, é dada pelo teorema de Hellmann-


Feynman1. A expressão obtida para a força atômica possui duas componentes. A primeira,
Fion, se origina na repulsão coulombiana entre caroços de íons. A segunda, F el, é devida à
interação dos elétrons de valência com os caroços dos íons. Para pequenas separações entre
a ponteira e a superfície, a força repulsiva F ion é maior que a Fel (em módulo) e varia mais
rapidamente com a posição do átomo mais externo da ponteira do que Fel. Então, se espera
que o AFM operado no modo de contato repulsivo seja muito sensível à interação
coulombiana repulsiva entre os caroços de íons da ponteira e os da superfície da amostra.
Em conseqüência, espera-se também que o AFM explore diretamente a posição dos caroços
de íons, o que não acontece, por exemplo, no STM. Neste caso, o contraste observado é
dominado pela estrutura eletrônica superficial local, perto do nível de Fermi, a qual pode
diferir significativamente do arranjo geométrico dos caroços de íons.

Quando se aumenta a separação entre a ponteira e a amostra, Feldecai mais lentamente


que Fion e Ftotal = Fion + Fel muda de sinal, resultando numa força líquida atrativa. Neste
regime, o AFM sondará principalmente a distribuição da densidade de carga total na
superfície da amostra, em vez da repulsão íon-íon.

Grande parte dos estudos por AFM são realizados na região de força repulsiva forte.
Entretanto, a força repulsiva medida sobre o átomo mais externo da ponteira é, em geral,
menor que a esperada, pois as forças atrativas de van der Waals de longo alcance sentidas
pelos átomos mais internos da ponteira (que estão mais longe da amostra) podem contribuir
significativamente para a força total que age sobre a ponteira. Então, a força repulsiva
parece menor do que realmente é. Inclusive, quando a ponteira possui raio grande, de cerca
de 1000 Å, a contribuição destas forças atrativas de longo alcance pode ser até maior que
10-8 N (da ordem das repulsivas). Pode ocorrer ainda que quando nos afastarmos da
superfície, enquanto a força total da ponteira deveria ser atrativa devido à distância
ponteira-amostra, os átomos mais externos da ponteira, podem ainda estar em um regime de
força repulsiva forte, levando eventualmente a uma deformação local da superfície,
especialmente no caso de materiais elásticos moles.

Em resumo, se espera que as medidas com AFM no regime de contato explorem


fundamentalmente as forças de repulsão íon-íon, que decaem rapidamente com o aumento
da separação ponteira-superfície.

A forte dependência com a distância das forças repulsivas íon-íon, fornece a chave para a
grande resolução espacial atingida pela microscopia de força de contato.

1. Quantum Theory of Molecules and Solids. John C.Slater. McGraw-Hill,1963. Biblioteca do CBPF: 530.4 s631
Resolução espacial em microscopia de contato

Experimentalmente já foi mostrado que a periodicidade em escala atômica pode ser


resolvida por AFM no modo de contato para diversos tipos de materiais, como grafite, BN,
metais de transição dicalcogênicos, mica, cristais iônicos como LiF, NaCl, AgBr, KBr e
metais como Au. Para materiais em camadas, tais como grafite, a periodicidade em escala
atômica foi resolvida com forças de carga de 10-8 a 10-7 N.

Supondo uma ponteira de extremidade monoatômica, foi mostrado teoricamente que as


forças repulsivas de aproximadamente 10-8 N têm capacidade de produzir uma deformação
compressiva elástica da superfície do grafite e que forças maiores podem levar à destruição
da superfície pois a ponteira monoatômica pode furar a superfície.

Nas figuras 16, 17, 18 e 19, mostram-se diversas imagens de resolução atômica.

Figura 16: Resolução da rede atômica dos átomos de grafite (carbono


ordenado exagonalmente) em duas dimensões.
Figura 17: Resolução atômica em três dimensões, de um filme de NH12.

Figura 18: Resolução atômica em três dimensões, de Cu[L-alamina2].


Figura 19: Resolução atômica de átomos de Silício.

Para explicar as imagens de resolução atômica de AFM obtidas com forças de carga da
ordem de 10-7 N ou maiores, supõe-se que, na realidade, a extremidade da ponteira é
composta por vários átomos. Em particular, foi sugerido que a ponteira de AFM poderia
arrancar uma lasca do grafite, a qual poderia ser arrastada pela superfície enquanto está
acontecendo a varredura. Neste caso, o AFM não faria a imagem de átomos individuais mas
sim dos vários máximos de repulsão entre os átomos da parte arrancada pela ponteira de
grafite e os da célula unitária da superfície de grafite. O procedimento levaria a melhorar a
imagem, pois aumentaria a força. Ainda mais, para ponteiras multiatômicas, a força por
átomo pode ser suficientemente pequena e não causar danos na superfície. Tal mecanismo
de fazer imagens, poderia também explicar os resultados obtidos para outros materiais em
camadas, como nitreto de boro e mica, onde só a periodicidade da célula unitária é
resolvida, em vez da estrutura atômica ou molecular dentro da célula unitária.

Alternativamente, foi proposto que para BN, o AFM é apenas sensível aos átomos N,
mais "duros" e, portanto, não faz a imagem dos átomos de B , mais "macios", apesar de eles
serem de maior tamanho. De qualquer forma, para uma força de carga de 2x10-7 N, medida
experimentalmente sobre BN, ela parece estar distribuída sobre vários átomos e o
argumento de fazer imagens preferencialmente de sítios N, não se aplica.

Os estudos por AFM de cristais iônicos provam que a periodicidade em escala atômica é
observável também para materiais que não são em camadas, nos quais o contraste em
escala atômica não pode mais ser explicado pelo arraste –contra a superfície da amostra– de
uma lasca colada na ponteira. As imagens de AFM de superfícies de cristais iônicos
somente mostram também a periodicidade de célula unitária. Isto foi explicado em função
da feitura de imagens preferencialmente de sítios ocupados pelos íons negativos fortemente
carregados, como é o caso de F-, Cl- e Br-.

Para uma demonstração conclusiva da habilidade de resolução atômica da microscopia


de contato, é muito importante a observação de defeitos na superfície, como veremos mais
adiante. A força de interação deve estar altamente localizada no espaço, oferecendo a
possibilidade de explorar sítios de um átomo (como é feito em STM). De qualquer maneira,
deve ser sempre levado em conta que a resolução em um SPM está determinada por
diferentes fatores, já que este microscópio aumenta nas três direções. A resolução no eixo z
está limitada pelo nível de vibrações entre a ponteira e a superfície. Há já diversos
mecanismos para estabilizar estas vibrações até uma fração de ângstrom. No plano x,y, a
máxima resolução alcançada depende da geometria da ponteira.

Figura 20: Caracterização de uma ponteira.

Quando varremos superfícies muito planas, a resolução é determinada pelo diâmetro do


átomo (ou átomos) da extremidade da ponteira. Esta medida, mostra-se como sendo d na
figura 20. L/W é o aspect ratio.

A estrutura macroscópica da ponteira não é então crítica quando fazemos resolução


atômica. Por outra parte, quando se trata de ver grandes superfícies, a qualidade da imagem
depende da geometria da sonda, como pode ser visto na figura 21. O diâmetro e o aspect
ratio da ponteira são críticos.
Figura 21: Imagem resultante do tipo de ponteira utilizado na varredura.

Pelo número de parâmetros que intervém na feitura de uma imagem, vemos claramente que
é difícil definir o que seja resolução em um microscópio de varredura por sonda. Vejamos
um exemplo disto na figura 22.

A amostra consiste em um par de agulhas bem finas, separadas por uma distância d. A
imagem delas é feita com uma ponteira parabólica de raio R na extremidade. Já que a
amostra é mais afiada do que a sonda, a imagem resultante é uma dupla de ponteiras
invertidas. A interseção destas superfícies define uma pequena cavidade de profundidade
∆ z entre as agulhas, que está determinada pela forma e medida da ponteira, além da
distância de separação d entre as agulhas.

Figura 22: Resolução dependente das formas da ponteira e da amostra.

Uma definição de "resolução" é a mínima separação d para a qual a cavidade ∆ z é maior


que o ruído do instrumento. Isto é o análogo mais próximo da definição de Rayleigh de
resolução em microscopia ótica.
A dificuldade de definir uma idéia simples –como aparenta ser a de resolução– é mostrada
na parte b. Quando a diferença em altura entre as duas agulhas cresce, a profundidade da
cavidade diminui, de forma tal que as duas agulhas, "resolvidas" quando suas alturas são
aproximadamente iguais, podem não estar resolvidas quando possuem alturas diferentes.

Este exemplo mostra que a resolução em AFM, diferentemente da microscopia ótica, é uma
função da diferença de alturas entre objetos adjacentes e, portanto, deve ser definida de
acordo com o objeto do qual se quer fazer a imagem. Isto é conseqüência da natureza não
linear da aquisição de imagens em AFM.

Usando a definição precedente, a separação mínima resolvida d, que resulta para uma
cavidade ∆ z, para agulhas cujas alturas diferem em ∆ h e são varridas por uma ponteira
parabólica, é dada por

d = (2R)½ (∆ z½ + ∆ z½ + ∆ h),

para d > (2R∆ h)½. Para objetos da mesma altura, uma ponteira parabólica com um raio na
extremidade de 10 nm e uma profundidade de cavidade detectável de 0,5 nm resulta uma
separação mínima resolvida d = 6,4 nm. Se a diferença de alturas fosse de 2 nm, a
separação mínima resolvida seria em torno de 12,5 nm.

Devemos salientar que a definição utilizada para estes cálculos só serve para superfícies
rígidas. Na prática, a amostra tende a se deformar sob a pressão da ponteira e a resolução
verdadeira pode ser melhor ou pior que a dada pela fórmula anterior, dependendo da
geometria da amostra e de suas propriedades elásticas.
Microscopia de força lateral

O LFM (Lateral Force Microscopy) é uma modificação do modo standard DC-contato de


fazer imagens, com a qual a imagem é feita a partir da medição das forças laterais sobre a
amostra movendo o cantilever de forma tal que a varredura é na direção perpendicular ao
eixo principal dele. Assim, visualizam-se variações de atrito na superfície e também
aumenta-se o contraste nas bordas. Este modo chama-se também microscopia de força de
atrito (FFM, Frictional Force Microscopy).

O regime de força e os cantilevers utilizados em LFM são similares àqueles usados na


forma convencional de fazer imagens topográficas por contato: A força é repulsiva e o
cantilever relativamente mole.

A microscopia de força lateral trabalha com um princípio similar ao de força variável, no


qual os movimentos do cantilever, em resposta a variações na topografia da superfície, são
detectados por variações na corrente do fotodetector. O que se usa para fazer a imagem de
força lateral é a variação da corrente de saída do detector. Já a topografia é feita em força
constante e usa-se a voltagem para manter a distância ponteira-amostra. Isto é feito a partir
da medição da diferença entre a saída das metades superior e inferior do fotodetector de
quatro setores. Quando o cantilever é entortado no eixo z, as quantidades relativas de luz
que batem nas metades superior e inferior mudam, fornecendo assim dados topográficos.

Os dados de força lateral são obtidos com o monitoramento da diferença entre os sinais dos
lados esquerdo e direito do fotodetector. Quando o cantilever se move (torção ao redor do
seu eixo principal) devido a variações na força lateral sobre a ponteira de AFM, a
quantidade relativa de luz que bate sobre essas metades muda, fornecendo os dados de
LFM para fazer as imagens. Como a saída dos quatro setores pode ser detectada simultânea
e separadamente, os dados de topografia e força lateral podem ser obtidos durante a mesma
varredura. O valor da força de carga é calculado a partir dos dados de saída das metades
superior e inferior do fotodetector que fornecem a deformação da cerâmica piezelétrica z.

Quando o LFM é utilizado em conjunto com o modo de topografia, mostra variações no


material e aumenta o contraste nas bordas. Então, ele pode ser usado para ajudar na
interpretação de imagens, assim como para estudos de tribologia (efeitos de contato).
Atrito

O estudo da capacidade de controlar o atrito e reduzir o desgaste de um material


começou com Leonardo da Vinci no século XV. Isto deve-se à necessidade de aumentar a
eficiência de partes móveis de máquinas e equipamentos. O desgaste durante o contato de
duas superfícies se produz pela deformação plástica das rugosidades. Nesse contato, há uma
força devida à adesão, com ou sem carga, e outra devida à atração entre os materiais,
mesmo sem movimento; isto pode ser classificado como atrito estático. O atrito dinâmico
ocorre quando dois corpos em contato se põem em movimento relativo entre eles. O que
está claro até hoje em relação ao atrito entre duas superfícies é que ele não depende apenas
do material do qual são feitas as superfícies atritantes mas de diversos outros fatores entre
os quais estão o material da interface, o tempo de contato, a velocidade relativa entre as
superfícies e a temperatura e umidade do ambiente.

A teoria de atrito é regida pelas velhas leis de Amonton (1706) que dizem que a força de
atrito Fat é proporcional à força de carga Fc e independe da área aparente de contato:

Fat = µ Fc ,

onde µ é o coeficiente de atrito.

Para explicar esta relação, devemos considerar as propriedades estruturais da interface de


contato. Como as superfícies em geral possuem rugosidade, pelo menos em escala
microscópica, a área real de contato é limitada a pontos discretos da interface entre os dois
corpos. Parece então razoável supor que a força de atrito é proporcional à área real de
contato A:

Fat = f A ,

onde a constante de proporcionalidade f (shear strength) é a "força" (tem unidades de


pressão) compartilhada da junção, que tem como resultado que duas superfícies em contato
escorreguem paralelamente ao plano de contato entre elas.

Foi mostrado que para uma superfície rugosa com uma distribuição normal de alturas de
rugosidades, a área real de contato, quando uma superfície é pressionada contra outra
superfície plana e suave, deve ser sempre proporcional à carga, qualquer que seja a lei de
deformação ou a forma das asperezas:

A ∝ Fc .

Combinando as duas equações anteriores, obtemos a proporcionalidade da força de atrito


com a força normal de carga.
Macroscopicamente, para derivar esta lei partiu-se de uma descrição estatística da
rugosidade da superfície para os dois corpos em contato. Microscopicamente, se usarmos
uma ponteira apropriada, em contato com a superfície a ser estudada, podemos esperar
atingir um conhecimento experimental dos fenômenos de atrito em função das forças
agindo no sistema e das áreas envolvidasescala nanométrica. A geometria oferecida pelo
AFM é idealmente apropriada para esta finalidade.

Figura 23: Ação das forças sobre o cantilever.

Além de medidas de força normal à superfície da amostra, por detecção da deflexão do


cantilever nesta direção, é então também possível estudar as forças laterais ou de atrito,
detectando a torção causada ao cantilever pela varredura. Na figura 23, mostram-se a
deflexão e a torção do cantilever.

Existem vários métodos de detecção, mas o procedimento mais utilizado atualmente é o


já explicado método de medição da variação de quantidade de luz que chega aos quatro
quadrantes do fotodetector.
Figura 24: Imagens de uma amostra padrão. Na parte superior topografia e
na inferior força lateral.

Na figura 24 mostram-se duas imagens feitas da mesma amostra, uma no modo de


topografia e a outra em força lateral. Nestas varreduras pode ser vista a grande diferença
que aparece nas bordas da amostra, ressaltadas pelo método de operação.
Stick-slip

Atrito em escala atômica foi observado por primeira vez com uma ponteira de tungstênio
varrendo uma superfície de grafite. Viu-se que o processo de deslizamento da ponteira
sobre a superfície não é em geral uniforme, mostrando um comportamento de stick-slip,
isto é, "cola-desliza". Este movimento é um dos grandes fatores de desgaste das superfícies.
O stick-slip pode ser irregular ou ter um comportamento periódico mas a força de atrito é
sempre maior na parte estática, isto é quando as duas superfícies estão coladas. Quando a
força restauradora do cantilever entortado se faz grande o suficiente para ultrapassar o
atrito estático, a ponteira começa a deslizar sobre a superfície, em incrementos discretos. O
deslizamento ocorre instantaneamente dentro da escala de tempo resolvida
experimentalmente de 200 µ s, enquanto que, entre um deslizamento e outro, a ponteira se
move solidária com a superfície. No caso da ponteira de tungstênio sobre grafite foi
observado que os deslizamentos mostram a mesma periodicidade espacial que a superfície
de grafite, levando à conclusão de que a estrutura superficial atômica influencia as
propriedades de atrito da interface ponteira-amostra.

Observações similares foram feitas em mica e viu-se que a força de atrito varia com a
periodicidade da camada hexagonal das unidades de SiO4. Os fenômenos de stick-slip
foram também estudados em simulações moleculares dinâmicas de um sistema ponteira-
substrato do mesmo material (silício), varrido um contra outro em condições de força
constante.

O coeficiente de atrito microscópico medido, entre a ponteira de tungstênio e a amostra


de grafite é da ordem de 0,01 e aumenta pouco quando se aumenta a força de carga. Este
comportamento, que tem uma relação não linear entre a força de atrito e a de carga, foi
explicado dentro da teoria de primeiros princípios para atrito em escala atômica, em 1990,
por Zhong e Tománek1.

Por outro lado, estudos teóricos recentes levam à conclusão de que, para uma dada força
de carga, o coeficiente de atrito e, portanto, também a força de atrito, dependem fortemente
do potencial de interação entre os dois materiais em contato e, situação ainda mais crítica,
dependem da constante intrínseca k de mola do cantilever. A mola efetiva deve ser
suficientemente macia para que não aconteça atrito por baixo de um valor crítico kcrit para
uma dada força de carga. Assim, a força de atrito medida depende dos parâmetros de
construção do equipamento de LFM. Entretanto, para uma dada constante de mola, a força
de atrito é nula, a menos que se exerça um mínimo de força de carga.

A figura 25 mostra um sistema básico de duas superfícies em contato e o circuito


mecânico equivalente. É importante salientar a diferença entre F e F0 , pois a força
detectada é F, e não a verdadeira força de atrito F0. Elas estão acopladas de forma tal que
dependem da construção mecânica do sistema como, por exemplo, as rodas de um carro,
que estão ligadas ao motor por um eixo. Na parte de cima da figura, o acoplamento se faz
via o material que suporta a superfície superior, o que pode ser assimilado a uma mola de
massa M e constante K, como se vê na parte inferior. A força F0 é gerada entre as
superfícies, mas é medida em outro lugar, como sendo F=(x-x0)K.

Figura 25: Esquema de duas superfícies se atritando.

O processo de stick-slip é da maior importância em tribologia pois, como já dissemos, ele


é o principal responsável por danos e desgaste em partes móveis. Este processo é mais
comum do que se pensa e a sua manifestação de maior destaque é a sonora com, por
exemplo, nas cordas de um violino, numa porta barulhenta ou mesmo num terremoto.

Na parte 1 da figura 26, vemos o modelo tradicional para este processo2 e que vale para
materiais cuja dureza elástica não é muito grande. Deslizamentos rápidos podem acontecer
sempre que uma aspereza em uma das superfícies passa pelo topo de uma aspereza sobre a
outra superfície.
Figura 26: Forças de atrito real (F0) e medida (F) e suas dependências com a velocidade V 0 na
superfície.

Como se mostra na figura, o comprimento do slip depende da altura da aspereza e de sua


inclinação, da velocidade do deslizamento e da condescendência elástica das superfícies.
Em todos os casos de movimento stick-slip, a velocidade V de varredura pode ser
constante, mas o movimento resultante nas superfícies dado pela velocidade V0, pode
apresentar grandes deslizamentos, como se mostra no gráfico interior da figura anterior.
Este tipo de stick-slip leva apenas a flutuações do tipo ruído, provenientes de imperfeições
nas superfícies e não de interação intrínseca entre as duas superfícies. Na realidade, em
nível atômico, as corrugações (atômicas) das superfícies podem dar como resultado um
movimento periódico de stick-slip que pode ser medido por AFM como já foi visto quando
discutimos a resolução atômica.
O segundo mecanismo, também clássico (ou tradicional) está representado na parte
inferior da figura 26. Ao contrário do anterior, o atrito depende da velocidade. Na figura,
mostra-se o deslocamento x0 da superfície, a uma velocidade V0=dx0/dt, onde há uma força
de atrito F medida em função do tempo t, para superfícies cuja força real de atrito é F 0, em
geral função de x0, V0 e t. No exemplo, a força de atrito real F0 cresce monotonamente (A),
permanece constante (B) ou decresce (C), em função de V0. Somente quando F0(V0) tem
uma inclinação negativa (caso C), o movimento resultante é do tipo stick-slip, caracterizado
por movimentos muito diferentes.

Este último é o tipo de stick-slip mais estudado e, até pouco tempo atrás, era considerado
o único mecanismo intrínseco. Se a força de atrito decresce com o aumento da velocidade
de deslizamento, a força Fs – necessária para iniciar o movimento – será maior que a força
Fk necessária para manter o movimento. Tal situação é o caso C da figura, onde a força de
atrito intrínseca F0 diminui com o aumento da velocidade de deslizamento V0. Como
resultado disto, a superfície que desliza (bloco M), o faz numa forma periódica, onde, a
cada ciclo, uma rápida aceleração é seguida de uma rápida desaceleração (curvas para x 0 e
V0 na figura). Quando a varredura continua a uma velocidade constante V, as superfícies
continuam se movendo em forma periódica, com paradas e recomeços bruscos, cujas
freqüência e amplitude dependem não só da função F0(V0) mas também da dureza K, da
massa M da parte em movimento e das condições iniciais em t=0. Mais precisamente, o
movimento entre as superfícies pode ser determinado resolvendo a seguinte equação
diferencial:

M ∂ 2x0/∂t2 = Fs = F0-F = F0 - (x0-x)K

ou M ∂ 2x0/∂t2 + (x0-x)K - F0 = 0 ,

onde F0=F0(x0,∂x0/∂t,t) é a força de atrito intrínseca, real, na junção das superfícies, F é a


força, medível, aplicada externamente sobre a mola e Fs=(F0-F) é a força sobre a massa M.
Para resolver a equação, devemos também conhecer as condições iniciais em t=0 e as
estacionárias a um tempo t finito. Por exemplo, neste sistema, x=0 para t<0, x=Vt para t>0,
com V=cte. (poderia também ser F=cte, ou quaisquer outras condições, dependendo do
sistema).

Um modelo de stick-slip mais recente é o mostrado na próxima figura 27 e apareceu


como resultado de simulações computacionais3. Quando o atrito acontece entre filmes
finos, eles se comportam como se sofressem uma transição de fase de primeira ordem entre
estados tipo sólido (estático) e tipo líquido (dinâmico) durante o deslizamento.
Figura 27: Modelo de transição de fase.

Pesquisadores sugerem que tal processo é responsável pelo comportamento stick-slip de


líquidos isotrópicos entre duas superfícies cristalinas sólidas. Assim, o stick-slip apareceria
como resultado de uma mudança brusca nas propriedades de fluidez de um filme numa
transição, em vez de causado por mudanças graduais ou contínuas que ocorrem segundo a
teoria clássica.

Na figura 27, vemos o modelo de "transição de fase", no qual um filme fino de líquido
"gela" e "derrete" alternativamente. Este filme é representado por moléculas esféricas
confinadas entre duas superfícies cristalinas sólidas. A diferença entre este e o modelo
tradicional é que aqui supõe-se que a força de atrito intrínseca F0 muda abruptamente na
transição, em vez de continuamente. Temos uma força de atrito "estática" Fs e uma
"cinética" Fk . O stick-slip resultante é então diferente. Por exemplo: os picos são mais
pontudos e o stick-slip pode desaparecer a uma certa velocidade crítica Vc , a partir da qual
o movimento continua normalmente. Este tipo de atrito é observado, em geral, entre
superfícies suaves, na presença de líquidos lubrificantes.

Resumindo, temos três modelos básicos de atrito onde aparece stick-slip (e que se aplicam
inclusive em modelos de terremotos, avalanches de areia, etc.):

Mecanismo para superfícies rugosas: o stick-slip é irregular e errático e vale para o


caso em que a dureza elástica do sistema não é muito grande. A amplitude do deslizamento
diminui com a velocidade V e a freqüência do stick-slip aumenta com ela.
Mecanismo de atrito dependente da velocidade: o stick-slip é regular e periódico e
depende da velocidade de varredura. A amplitude e a freqüência do deslizamento são
variáveis mas não há velocidade crítica. Neste modelo o stick-slip continua
indefinidamente a qualquer velocidade de deslizamento.

Mecanismo de transições de fase: o stick-slip é regular e periódico, a amplitude do


deslizamento independe de V, até que V=Vc e a sua freqüência cresce com V, até que
V=Vc. Para uma velocidade de varredura maior que a velocidade crítica, o stick-slip
desaparece bruscamente e o movimento continua numa forma suave. Esta velocidade crítica
é característica apenas deste modelo e o mecanismo aparece no atrito entre superfícies
suaves, em geral na presença de um lubrificante.

1. Zhong, W. and Tománek, D. Phys.Rev.Lett.64, 3054, 1990.

2. Rabinowicz,E. Friction and Wear of Materials; J. Wiley: NY, London, 1965; ch.4.

3. Gee,ML.; McGuiggan,P.M.; Israelachvili,J.N.; Homola,A.M. J.Chem.Phys. 93,1895, 1990.

Thompson,P.A.; Robbins,M.O. Science 250,792, 1990.

Robbins,M.O.; Thompson, P.A. Science 253,916, 1991.


Espectroscopia de Força

Queremos saber agora qual a informação que pode ser obtida a partir da dependência
com a distância das forças medidas. O estudo da relação entre força e distância chama-se
espectroscopia de força.

Espectroscopia de força local

Nesta espectroscopia, determina-se a curva de força em função da distância em um local


determinado sobre a superfície da amostra. Experimentalmente, mede-se a deflexão zc do
cantilever como função do movimento za da amostra na direção z, perpendicular à
superfície da amostra, obtendo-se assim um gráfico zc(za). A força F é então obtida
multiplicando a deflexão do cantilever pela constante de mola

F = k zc .

Desprezando deformações elásticas da amostra e da ponteira, em especial no regime de


contato, a distância s de interação entre a ponteira e a amostra, é dada por:

s = zc - za .

Portanto, os gráficos zc(za) medidos, podem ser diretamente traduzidos em curvas força-
distância.

Na figura 28, mostra-se um gráfico experimental de zc(za) , isto é, da aproximação


ponteira- amostra, para uma dada dependência F(s) mostrada na figura 2.

Figura 28: Deflexão do cantilever em função do movimento vertical da amostra.


Quando a amostra se aproxima da extremidade do cantilever, este se dobra na direção da
amostra (zc negativo) devido à força atrativa (sinal negativo).

No ponto 1, o gradiente da força atrativa supera a constante k do cantilever, o que leva a


uma instabilidade que resulta em um pulo ao contato, no ponto 2.

A maior deflexão do cantilever na direção para a frente no ponto 1, multiplicada pela


constante de mola, é a máxima força atrativa F at existente no sistema. Se a amostra continua
a ser movida na direção da ponteira até atingir uma força de carga F c predeterminada, o
cantilever sente as forças repulsivas do contato e se flexiona na direção contrária à anterior.

Se agora a direção do movimento da amostra é invertida, ou seja, a amostra se afasta da


ponteira, chega um momento em que a direção do movimento do cantilever também muda.
Nessa volta, no ponto 3, ocorre uma segunda instabilidade pois o gradiente de força
novamente iguala a constante efetiva de mola e a ponteira pula para fora do contato. O
ponto 3, portanto, corresponde à posição de máxima força F ad de adesão. Em geral, o
módulo da máxima força adesiva no ponto 3 é maior que o módulo da máxima força
atrativa no ponto 2.

A importância deste gráfico, ou igualmente, a importância das curvas F(s), reside no fato
de que o pesquisador pode fazer a imagem da amostra em um determinado ponto por ele
escolhido [ao longo da curva F(s)] conhecendo de antemão, e com razoável precisão, a
força aplicada durante a feitura da imagem. Esta informação é importante, pois as imagens
feitas com o microscópio de força podem depender da força de carga aplicada.

Além de determinar o ponto de contato com o propósito de fazer uma imagem, as curvas
de aproximação e de força versus distância fornecem outro tipo de informações de valor:

1. A máxima força atrativa Fat e a máxima força adesiva Fad podem ser localmente
determinadas.
2. A inclinação da curva depois que o contato foi feito, pode fornecer informação a
respeito das propriedades mecânicas locais, forças superficiais e geometria local da
ponteira e da amostra.
3. A quantidade de histerese na curva F(s) pode indicar que há uma resposta inelástica
no sistema ponteira-amostra.

Mas há também problemas. Infelizmente, nem sempre pode ser feita uma interpretação
única das curvas F(s), pelas seguintes razões:

1. Se os estudos são feitos em ar ambiente, podem aparecer instabilidades no


cantilever devido à formação de um menisco ao redor da ponteira, como resultado
da condensação por capilaridade, que empurra a ponteira contra a amostra. A
presença de forças de capilaridade adicionais complica consideravelmente a análise
quantitativa da interação ponteira-amostra. A influência das forças de capilaridade
pode ser mostrada comparando zc(za) obtidos em ar e água. Se o cantilever estiver
totalmente imerso na água, não há forças de capilaridade. Nestas condições, a
menor força de interação entre a ponteira e a amostra pode ser reduzida em duas
ordens de grandeza, se comparada com condições ambiente. Portanto, amostras
frágeis e moles que requerem forças de carga extremamente baixas para obter
imagens boas, devem ser estudadas sob líquido.
2. A histerese nas curvas F(s) pode não ser necessariamente resultado de deformações
plásticas e, sim, resultante de histerese e creep das cerâmicas piezelétricas.
3. A falta de conhecimento da geometria detalhada da ponteira freqüentemente impede
uma análise quantitativa das curvas F(s).

Apesar destas dificuldades de interpretação, as curvas F(s) medidas em atmosfera de


nitrogênio seco e filtrado têm fornecido informação de valor sobre as forças superficiais em
filmes moleculares. A análise das curvas pode também levar a uma estimativa da espessura
de filmes depositados sobre substratos sólidos. Mais ainda, os microscópios de força podem
ser utilizados para medir nanoindentação de alta sensibilidade usando o regime repulsivo da
curva F(s). Finalmente, como é possível escolher as cargas aplicadas de forma tal que sejam
muito menores que aquelas comumente usadas para medidores de dureza em indentação
convencional, os microscópios de força têm também um grande potencial para medidas de
nanodureza.

Como já dissemos, a partir das curvas de deflexão do cantilever em função da


aproximação da amostra, podemos determinar as curvas F(s), de força em função da
distância entre a ponteira e a superfície da amostra, para cada ponto. Então, querendo
estudar uma propriedade física em particular, extraída das curvas locais F(s), os dados
podem ser representados graficamente em função da localização na superfície, fornecendo
assim um mapa resolvido espacialmente para tal propriedade. Isto é feito muito bem com a
técnica de imagens por camadas que veremos na próxima seção.
Imagens por camadas

O método de camadas é uma forma de fazer imagens que mostra propriedades da


amostra do tipo adesão e condescendência elástica. É uma técnica de AFM de contato na
qual são feitas várias medidas da deflexão do cantilever em cada pixel da imagem. Cada
uma das medidas é precedida por um degrau de variação na distância ponteira-amostra.
Após cada degrau, é realizada uma medida, que é armazenada na memória. Quando todas
as medidas desejadas para um determinado pixel estiverem feitas, o processo é repetido
para um próximo pixel e assim sucessivamente para toda a área de varredura desejada.

Os dados tridimensionais resultantes podem ser pensados como um conjunto de


"camadas" de imagens. Cada camada horizontal é uma imagem representativa das medidas
feitas através da área varrida a uma altura z dada. Como são feitas muitas medidas em cada
pixel, o conjunto de dados pode também ser processado verticalmente para a obtenção da
curva de força-distância em cada pixel.

Fazer imagens por camadas permite registrar a deflexão do cantilever à medida em que
este se move sobre parte ou sobre toda a curva de força-distância, para cada pixel, em uma
imagem. A deflexão é monitorada para cada posição da camada e os dados de força e de
distância se armazenam para cada camada.

Há vários tipos de informação que podem ser derivados da curva força-distância.


Observando a figura 29, no segmento ab, a amostra e a ponteira não estão em contato, mas
a ponteira está se aproximando da amostra. Quando não há forças repulsivas ou atrativas de
longo alcance, não há informação.
Figura 29: Deflexão ideal do cantilever em função da sua posição vertical.

O segmento bc é o chamado "mergulho ao contato" e é resultante do puxão atrativo


sentido pelo cantilever. Quando se opera em ar, as forças capilares (provenientes da
camada de contaminação) são as mais importantes nesta atração e levam a que a ponteira e
a amostra entrem em contato. Entretanto, não devemos esquecer que há também nesta
atração contribuições provenientes de cargas elétricas e que as forças de van der Waals
estão sempre presentes nesta região.

O segmento cd representa o movimento para cima do cantilever, em resposta ao


incremento da voltagem no piezo z. O que está sendo registrado neste momento é a resposta
do sensor que mede o deslocamento do cantilever. A forma do segmento cd indica se a
amostra está deformando-se em resposta à força do cantilever e sua inclinação pode ser
utilizada para derivar informação sobre a dureza da superfície em estudo. O segmento não é
necessariamente uma linha reta. Variações na inclinação do segmento indicam uma
resposta diferente da amostra a diferentes forças de carga. Esta inclinação é a chave da
informação para estudos de dureza.

O segmento de corresponde ao segmento cd, invertido o movimento. Se o segmento de


ficar à direita do cd, isto pode significar que há histerese ou inclinação (bowing) induzida
por atrito do cantilever quando ele abandona a superfície. Se de ficar à esquerda de cd, a
diferença pode dar informação sobre a deformação elástica ou plástica, que tem uma
resposta em tempo mais lenta para a retirada da ponteira.
O segmento ef registra o movimento do cantilever a partir de sua posição de deflexão
neutra, enquanto ele é defletido para baixo (representando, portanto, as forças de adesão)
até que a força de restauração da mola dele se iguale à adesão.

O segmento fg mostra o pulo do cantilever para fora da amostra quando sua força excede
as adesivas. A força no ponto f é a força de adesão total entre a ponteira e a amostra. Esta
é a chave para a informação necessária a estudos de adesão. A quebra aguda no
comportamento no ponto f não é uma resposta universal. Se a interação de adesão é
viscosa, a ponteira não consegue deixar a superfície abruptamente e, portanto, irá produzir
uma resposta mais gradual e arredondada. No segmento gh a ponteira não mais está em
contato com a amostra e ambas estão se afastando.
Modulação de Força (z modulation)

Mapas espaciais de elasticidade superficial

Como alternativa para a determinação das curvas F(s) da força em função da distância
ponteira-amostra, em cada ponto pixel, foi introduzido um modo de modulação de força ou
FMM (force modulation microscopy) para estudar as variações espaciais na elasticidade
superficial local, em função das variações nas características de força/distância na amostra
durante a varredura. Este método espectroscópico é baseado na modulação da altura z da
amostra em uma quantidade fixa ∆ za. A aproximação da amostra resulta na deflexão do
cantilever. Se introduzirmos uma modulação, ele se curvará periodicamente, em uma
quantidade ∆ zc . Para uma dada força de carga aplicada, uma parte mole da amostra irá
deformar-se mais que uma parte dura. Conseqüentemente, o ∆ zc do cantilever será menor
sobre uma região mole da amostra. Fazendo a representação gráfica da grandeza
normalizada ∆ zc/∆ za em função da localização na superfície, pode ser obtido um mapa
espacial da sua elasticidade.

Para atingir um contraste razoável nas imagens de elasticidade da superfície, a constante


de mola do cantilever deve ser bem escolhida. Supondo que o material da ponteira seja
muito mais duro do que o da amostra, uma deflexão ∆ zc do cantilever, causada por um
movimento ∆ za da amostra, indicará uma deformação da superfície numa quantidade (∆ za
- ∆ zc). A resposta da superfície da amostra a uma variação de força ∆ F pode ser descrita
por uma constante de mola efetiva (da amostra) dada por

ka = ∆ F/(∆ za - ∆ zc) ,

onde ka seria a "medida" da resistência da amostra à força de carga e ∆ F a variação da


força normal. Então, quando a deformação é pequena (denominador da fórmula), temos um
ka grande, ou seja, a amostra comporta-se como dura. Como ∆ F = k ∆ zc , com k, constante
efetiva de mola do cantilever, obtém-se a seguinte relação

∆ za/∆ zc = (k/ka) + 1 .

Se a constante efetiva da mola do cantilever for escolhida muito menor que a constante
de mola efetiva da superfície da amostra (k<<ka), a grandeza normalizada ∆ zc/∆ za (razão
entre o ∆ zc que o cantilever se deforma devido à aproximação ∆ za da amostra e a medida
do movimento da amostra ∆ za) medida será sempre da ordem de 1, e assim, não
conseguiremos ver as variações espaciais de ka quando medirmos o valor ∆ zc/∆ za.
Portanto, uma escolha apropriada da constante de mola efetiva do cantilever dependerá da
constante de mola efetiva da amostra a ser estudada, ou seja, do que queremos ver. A figura
30 mostra uma comparação entre uma imagem topográfica e outra, tomada
simultaneamente com modulação de força. Para obter um grande contraste no "mapa" de
elasticidade superficial, se utilizou um cantilever com k=3000N/m, valor bem maior do que
aquele que normalmente se usa em força de contato.

Figura 30: Imagens de uma fibra de carbono e epoxi, em ar. Superior: Força constante; inferior:
Modulação de força.

Então, quando o modo de z-modulation é usado simultaneamente com topografia fornece


dados adicionais. Com ele é possível identificar diferenças na elasticidade ou dureza de
uma superfície já que ele utiliza justamente estas diferenças para melhor distinguir
pequenas diferenças topográficas devidas, por exemplo, a diferentes materiais que
compõem a amostra.

No modo de contato convencional, a ponteira é varrida sobre a amostra (ou vv.) com um
raster x-y. O loop de realimentação mantém a força constante e, conseqüentemente, a
deflexão do cantilever também se mantém constante. Na técnica de modulação de força, o
conjunto amostra-ponteira (pois estão em contato) é varrido com uma pequena oscilação
vertical (modulação z sobre o scanner ou usando um piezelétrico embaixo da amostra) bem
mais rápida que a varredura da superfície. A força sobre a amostra é modulada ao redor do
seu setpoint durante a varredura de modo tal que o valor médio da força sobre a amostra é
equivalente àquele do contato. No momento em que a ponteira entra em contato com a
amostra, uma superfície mais dura resistirá mais à oscilação e, assim, o cantilever sofrerá
uma torção maior. Dito de outra forma, sob a mesma força aplicada, uma área dura na
amostra irá se deformar menos que uma mole, isto é, as superfícies mais duras fazem maior
resistência à oscilação vertical e em conseqüência, curvam mais o cantilever.

A variação na amplitude da deflexão do cantilever é uma medida relativa da dureza da


amostra. A informação topográfica é coletada simultaneamente para comparação, já que a
feitura de imagens com modulação de força, é feita com uma modulação de freqüência
relativamente baixa, a qual é filtrada na saída dos dados de topografia durante a produção
da imagem por AFM normal. Assim, a força entre a ponteira e a amostra varia, permitindo
que a inclinação da curva força versus distância, isto é, o gradiente da força, seja calculado
a partir de dados ponto a ponto. Na figura 31, vemos como a amplitude do sinal cresce
quando a ponteira encontra uma região mais dura.

Figura 31: Esquema do princípio de modulação de força.

De acordo com o exposto temos as seguintes características de operação:

-A força é sempre repulsiva. O z do scanner é modulado para variar a força, mas sempre
dentro da região repulsiva. Neste modo devemos, como já foi dito, encontrar uma
otimização para o valor da constante de mola do cantilever, já que ele estará sendo utilizado
simultaneamente em força constante.

-A modulação do sistema cantilever-amostra é feita a aproximadamente 5 kHz, bem abaixo


da freqüência de ressonância do cantilever. Como a ponteira está sempre em contato com a
amostra, ela não vibra, mas impõe uma força oscilante sobre a superfície da amostra. Com
esta variação de força é possível medir a inclinação dF/ds da curva F(s) em cada ponto.
-O deslocamento do cantilever é utilizado não apenas para determinação da inclinação da
curva força/distância mas também para realização da topografia da superfície. O circuito
correspondente é mostrado na figura 32.

Figura 32: Realimentação e controle para topografia e dF/ds simultaneamente.

A modulação de força é utilizada como auxiliar na análise de imagens topográficas e


fornece também um aumento no contraste para superfícies nas quais há mudanças na
dureza da amostra e/ou bordas aguçadas. Ela é portanto muito útil para amostras nas quais
há mudanças de material, tais como vidros estriados, como se mostra na figura 33. Nela,
vemos as imagens de topografia, modulação de força e força lateral. Há uma região que
parece ser feita de um material diferente, possivelmente devido a contaminação, no canto
inferior direito. As duas últimas imagens mostram variações na superfície que não
aparecem na imagem topográfica.
Figura 33: Vidro estriado.

Note-se que esta técnica pode ser realizada de forma que o cantilever seja levantado da
superfície nos intervalos de tempo entre a aquisição de dados e durante a translação ao
próximo ponto a ser estudado. Tal modo de "contato intermitente" reduz os efeitos de
sujeira (que às vezes tornam as amostras pegajosas) que poderiam ocorrer em certos
materiais enquanto são varridos a contato contínuo. Isto foi aperfeiçoado ao que atualmente
chama-se Tapping Mode.
AC contato intermitente

Neste modo de operação o cantilever é obrigado a oscilar a uma freqüência próxima de


sua freqüência de ressonância enquanto é feita a varredura sobre a amostra. A ponteira é
aproximada da amostra até que ela comece a fazer contato intermitente (Tap) sobre a
superfície. Este modo tem a vantagem de permitir a feitura de imagens de amostras de
materiais que não aderem muito bem ao substrato pois com ele pode-se reduzir (e até
eliminar) a influência das forças laterais aplicadas à amostra operando em contato.

Ocontato intermitente causa diminuição da amplitude de oscilação como se mostra na


figura 34.

Figura 34: Variação da amplitude de oscilação em função da aproximação ponteira-amostra.

Figura 35: Curva da força sentida pelo cantilever quando da aproximação da amostra.
O cálculo dos efeitos de uma força externa sobre o movimento oscilatório do cantilever é
feito sabendo que ele se comporta como um oscilador harmônico clássico amortecido.
Suponhamos então que movemos a amostra na direção da ponteira, até que as forças de
interação comecem a produzir uma deflexão no cantilever. Vendo a figura 35, a equação
para o oscilador é:

F(z) + k(z0-z) = m (d2z/dt2) + (mω 0/Q)(dz/dt),

onde z é a distância ponteira-amostra, z0 é a posição do cantilever antes da interação, F(z) é


a força total que age sobre o cantilever e que é atrativa no começo (antes do contato) e k é a
constante do cantilever dada pela freqüência de ressonância ω 0 = 2π f0 = (k/m)1/2. O último
termo da equação é o amortecimento viscoso e depende do fator Q de qualidade do
cantilever. Resolvendo a equação para uma modulação periódica externa A cos(ω t), na
posição z0, a amplitude e a fase do movimento [em x = z-z0 = x0 cos(ω t-φ )] resultante da
ponteira, são dadas por

x0=A/{[1-(ω 2/ω 02)]-f’]2+(ω 2/ω 02Q2)}1/2

tgφ =(ω /Qω 0)/[1-(ω 2/ω 02)-f’] ,

onde f’=(1/k)[dF(z)/dz] é o gradiente da força de interação em unidades de k e A é a


amplitude de modulação aplicada no cantilever.

Longe da superfície f’=0 pois não há deflexão mas, perto dela, pode chegar a ser igual a 1
(isto é dF/dz=k). Se isto acontecer, o sistema torna-se instável e a ponteira "mergulha" ao
contato pois o cantilever não tem suficiente força restauradora para voltar. É por isso que
em não-contato usam-se cantilevers duros, com k entre 100 a 350 N/m.

Supondo que trabalhamos perto da freqüência de ressonância podemos pôr na equação ω


~ ω 0 e a amplitude será

x0(z) ≅ A/{(-f’)2+(1/Q2)}1/2=AQ/[Q2f’2+1].

Quando a ponteira está muito longe (∞ ) da amostra, f’(z)=0 pois não há deflexão e
portanto X∞(z) ≅ AQ.

Então, X0(perto) ≅ X∞ (longe)/[Q2f’2+1], mas este denominador é muito maior que 1 e,


portanto, a amplitude decresce com a aproximação ponteira-amostra como queríamos
mostrar.

Na figura 36, podemos ver um diagrama próprio para este modo de operação.
Figura 36: Esquema próprio para operar no modo tapping.

Com uma cerâmica piezelétrica colada ao cantilever, o nível de oscilação é posto por baixo
da amplitude livre de oscilação em ar.

O controlador é um sistema que realiza a realimentação ajustando a separação entre a


ponteira e a amostra para manter a amplitude de oscilação constante durante a varredura.
Como o contato com a amostra é apenas intermitente, a ponteira faz um atrito desprezível
sobre a amostra e, portanto, não há danos provenientes de forças laterais, o que é ótimo
para materiais biológicos. Além disso, a amplitude de oscilação é fixada suficientemente
alta (10-100 nm) de forma tal que quando a ponteira bater na superfície, o cantilever tenha
suficiente força restauradora (devida à deflexão) para impedir que a ponteira fique presa na
camada de contaminação (pelas forças de menisco ou eletrostáticas). A força da batida no
tapping é menor do que poderia ser imaginado, pois a amostra necessita apenas absorver a
energia adicional que o cantilever ganha durante cada ciclo. Com os cantilevers e as
freqüências utilizados normalmente para trabalhar em não-contato, consegue-se que a
variação da amplitude seja quase desprezível, isto é, da ordem de 0,01 nm, suficientemente
pequena para não produzir danos a uma grande variedade de amostras moles. Na Biologia,
o tapping em líquidos é o modo de operação mais utilizado.

A cada ciclo, a ponteira toca a amostra. As mudanças na amplitude e fase do cantilever


causadas por esta interação são utilizadas para produzir a imagem.

Como já foi dito, a amplitude da oscilação decai à medida em que a ponteira se aproxima
da amostra, e isto acontece mesmo levando em conta que existe um grande amortecimento
produzido pelo atrito viscoso.

A figura 371, é um gráfico da deflexão do cantilever em função do tempo, à medida em que


a amostra se aproxima da ponteira. No ponto A elas estão longe e a deflexão pico a pico é
da ordem de 20 nm. Quando começa a interação (ponto B), a amplitude decai
monotonamente até que a ponteira toca efetivamente a superfície (ponto C).
Figura 37 : Deflexão do cantilever em função do tempo de aproximação da ponteira.

Os danos causados nas amostras em uma varredura de tapping podem ser calculados pelo
trabalho feito durante o período de contato e pela energia dissipada sobre a amostra. Os
resultados são, de certa forma, intuitivos: as grandezas dependem fundamentalmente das
mudanças na amplitude de oscilação, da extremidade da ponteira e da dureza do cantilever.
Em conclusão, quanto mais fina é a ponteira e mais duro o cantilever, maiores são os danos
nas amostras.

1. Bustamante,C. and Keller,D. Physics Today. Dezember 1995, p32-38.


Ressonância de Baixa Amplitude

Neste modo, o cantilever oscila a sua freqüência de ressonância com baixa amplitude
(em geral, de 2 a 100 Å). A ponteira permanece dentro da camada de contaminação e a
produção de imagens pode ser feita em qualquer ponto sobre a curva de força (atrativa ou
eventualmente repulsiva). Ela é, em geral, feita na região atrativa. É possível operar este
modo tal que haja contato intermitente com a superfície, como já foi dito; este é o tapping
de nosso equipamento. Nele, o ajuste da altura é manual.

Figura 38: Ponteira ressonando. Superior: baixa amplitude; inferior: alta amplitude.

A força é atrativa e o cantilever duro ou semi-duro.

A oscilação é feita em ressonância (50-500 kHz) a baixa amplitude.

A realimentação se faz através da detecção de variações de deslocamento de fase ou


mudanças de amplitude.

A parte de cima da figura 38, mostra a ponteira ressonando a baixa amplitude dentro da
camada de contaminação.

Este modo é promissor para a realização de imagens de amostras que poderiam sofrer
danos causados pelas forças entre a ponteira e a amostra durante o modo de contato. As
imagens feitas neste modo dependem das forças provocadas pela camada de contaminação
e podem modificar-se quando a camada muda (isto é, devido a aquecimento da amostra,
variações na umidade, na forma da superfície, etc.).
Ressonâncias de grande amplitude (HAR)

Neste modo, o cantilever oscila a sua freqüência de ressonância, com amplitude muito
alta. A amplitude das oscilações é suficientemente grande para que a ponteira entre e saia
rapidamente da camada de contaminação. Em alguns casos, a ponteira pode entrar no
regime de contato (ou repulsivo) durante as oscilações.

A força é atrativa (ou eventualmente repulsiva). O cantilever é duro, pois um cantilever


mole iria "flamejar" sem controle a grande amplitude.

A oscilação em ressonância está dentro da faixa de 50-500 kHz, com amplitude de 100-
1.000 Å.

A realimentação é por deslocamento de fase ou variação de amplitude.

Devemos notar que, embora a condição de ressonância possa influenciar a qualidade da


imagem, isto não funciona assim obrigatoriamente. Uma feitura de imagem de alta
qualidade pode ser realizada acima ou abaixo da freqüência de ressonância do cantilever.
Na parte inferior da figura 38, mostra-se o cantilever oscilando rapidamente a grande
amplitude, neste modo de operação.

Em HAR, a imagem não é afetada pela camada de contaminação, pois a ponteira a


penetra rapidamente. Em condições extremas, a ponteira poderia realmente tocar a amostra.
Se isto acontecesse, é certo que devido à dureza do cantilever, ocorreriam danos na
superfície da amostra e também na ponteira.

Este modo pode ser usado para feitura de imagens de amostras muito macias ou de
amostras que não aderem muito bem ao substrato.
Modo AC Não-Contato

Vejamos, então, como se mede no modo que é realmente de não-contato, isto é, no qual a
ponteira não toca a superfície da amostra. Devemos salientar que neste caso a amostra deve
ter o mínimo possível de camada de contaminação pois se assim não for, corre-se o risco de
obter imagens muito distorcidas ou mesmo de fazer a imagem da camada.

Na microscopia de contato as forças interatômicas de curto alcance são estudadas


medindo as deflexões quase estáticas do cantilever que tem uma constante de mola
conhecida. Apesar de as forças de van der Waals de longo alcance estarem também
presentes no modo de contato, elas não contribuem para fazer a imagem em escala atômica.
Aumentando a separação entre a ponteira e a amostra para 10 a 100 nm, permanecem só as
forças de interação de longo alcance, isto é, as de van der Waals propriamente ditas,
eletrostáticas e forças dipolares magnéticas. Como a grandeza das forças de longo alcance,
para separações relativamente grandes é, em geral, bastante menor que aquela das forças
interatômicas de curto alcance, o método de detecção de força de interação no modo de
operação de não-contato é normalmente diferente do de contato. Obrigando o cantilever a
vibrar perto de sua freqüência de ressonância por meio de um piezelétrico, em vez de medir
as deflexões quase estáticas dele medem-se as variações na freqüência de ressonância que
resultam da interação das forças entre a ponteira e a amostra.

O método de detecção a.c. é mais sensível aos gradientes de força do que as próprias
forças de interação. A presença de um gradiente de força F’= ∂Fz/∂z, resulta numa
modificação da constante efetiva de mola do cantilever de acordo com

kef = k - F’ ,

onde k é a constante de mola do cantilever na ausência de interação ponteira-amostra1. Uma


força de interação com gradiente F’> 0 irá então "amaciar" a mola efetiva (kef < k) enquanto
uma interação com gradiente F’< 0 irá "endurecer" a mola efetiva (kef > k). A variação da
constante efetiva da mola causará por sua vez um deslocamento da freqüência de
ressonância ω do cantilever, de acordo com

ω = (kef/m)1/2 = [(k - F’)/m]1/2 = (k/m)1/2 ([1 - (F’/k)]1/2 = ω 0 x [1 - (F’/k)]1/2 ,

onde m é a massa efetiva e ω 0 é a freqüência de ressonância do cantilever em ausência de


um gradiente de força. Se F’ é pequeno comparado com k, a equação anterior pode ser
aproximada por

ω ≅ ω 0 [1 - (F’/2k)]

e, portanto,

∆ ω = ω - ω 0 ≅ - ω 0 F’/2k .
Um gradiente F’> 0 resultará, então, numa diminuição da freqüência de ressonância (ω
< ω 0), enquanto que uma força com F’< 0 aumentará a freqüência (ω > ω 0). Existem dois
métodos diferentes normalmente utilizados para medir o deslocamento da freqüência de
ressonância.

1. Os cantilevers usados no modo de não-contato têm em geral altas constantes de mola, da ordem de 10 a 100 N/m ou mais. Isto significa que
sobre a amostra será exercida uma grande força de carga se a ponteira entrar em contato com ela. Portanto, o contato deve ser evitado para não
prejudicar nem a amostra nem a ponteira.
Gradiente de força constante

No método de detecção da inclinação o cantilever é movimentado por um elemento


piezelétrico a uma amplitude típica da ordem de 1 a 10 nm, a uma freqüência fixa, perto da
freqüência de ressonância. A variação da amplitude ou o deslocamento de fase da vibração,
resultante da interação ponteira amostra, mede-se com um sensor de deflexão (em geral um
interferômetro ótico) e um amplificador lock-in. Um loop de realimentação ajusta a
separação entre a ponteira e a amostra mantendo sempre um gradiente de força constante.

Gradiente de força variável

Na detecção por modulação de freqüência (FM) a amplitude de oscilação do cantilever é


mantida por um loop de realimentação, usando o sinal do sensor de deflexão. As mudanças
na freqüência de oscilação, resultantes da variação do gradiente de força, são diretamente
medidas por um contador de freqüência ou um discriminador de FM. O equipamento do
laboratório de Nanoscopia do CBPF não tem possibilides de fazer este tipo de medida.

Para cantilevers com k pequeno, o mínimo gradiente de força detectável está


determinado pela amplitude de vibração térmica do cantilever. Esta amplitude de rms pode
ser derivada do teorema de equipartição:

(k/2) <(∆ z)2> = kBT/2 ;

[<(∆ z)2>]1/2 = (kBT/k)1/2

onde T é a temperatura e kB a constante de Boltzman. Para uma constante de mola de 1


N/m, a menor amplitude de vibração térmica medível à temperatura ambiente, resulta
aproximadamente 0,6 Å.

Para o método de detecção por FM, o mínimo gradiente de força detectável F’min é dado
por

F’min = (1/A)(4k kB TB/ω 0Q)1/2 ,

onde A é a amplitude rms da oscilação do cantilever, Q é o fator de qualidade do cantilever


e B é a largura de banda de detecção. Para atingir a mais alta sensibilidade de detecção
possível para uma dada amplitude de oscilação A e uma dada largura de banda de detecção
B, da equação anterior podem ser deduzidas as seguintes regras gerais.

1. O cantilever deveria ter uma constante k pequena e uma alta freqüência de


ressonância ω 0. Isto requer uma minimização da massa e, portanto, do tamanho do
cantilever, resultando na necessidade de um método de microfabricação.
2. É desejável um grande valor de Q para o cantilever, que com a microfabricação é
fácil de atingir, se os cantilevers são utilizados em vácuo, onde podem ser atingidos
valores de Q da ordem de 104 ou maiores.
3. São preferíveis, medidas a baixas temperaturas.

À temperatura ambiente, o mínimo gradiente de força detectável, resulta da ordem de 10-


4
a 10-5 N/m. Supondo uma lei de forças inversamente proporcional ao quadrado da
distância e com sinal negativo, temos

F(s)= sF’(s)/2.

Para uma separação ponteira-amostra s = 10 nm (100 nm), um gradiente de força F’= 10-4
N/m (10-5 N/m) corresponderá a uma força de 5 x 10-13 N. Usando um cantilever com k = 1
N/m, esta força causará uma deflexão estática de apenas 5x10 -3 Å, que será difícil de
detectar com a maioria dos sensores de deflexão, ou seja, não influirá na detecção. Isto
mostra que o método de detecção ac baseado na vibração do cantilever oferece uma
vantagem significativa em relação à sensibilidade de detecção, se comparado com as
medições das deflexões quase estáticas do cantilever, quando se estudam forças de longo
alcance.
Resolução em não-contato

Neste modo, a resolução espacial depende das dimensões da ponteira e da distância


entre a ponteira e a amostra. É bom estudar a melhor situação possível, isto é, a resolução
obtida usando uma ponteira "infinitamente" fina e uma amostra pontual, na região atrativa
das forças de van der Waals. O que realmente é medido em não-contato é o gradiente da
força na direção perpendicular à superfície da amostra. Na figura 39 vemos um modelo
ideal para esta situação. Se a extremidade da ponteira fina está a uma altura h acima da
superfície, o gradiente da força a uma distância lateral r do ponto a ser explorado é1

∂F(r,h)/∂z = -( λ Η / π 2δ 1δ 2 h7) {[6 − (r/h) 2]/[(r/h)2+ 1]9/2}

onde δ 1 e δ 2 são as densidades da ponteira e da amostra, λ é o número de átomos por


unidade de comprimento da ponteira e Η é a constante de Hamaker, que depende das
propriedades de refração e dielétricas da ponteira e da amostra e também do meio que as
rodeia.

Figura 39: Ponteira fina sobre amostra pontual.

Definindo a resolução como duas vezes a distância r à qual a força de interação cai à
metade do máximo, a expressão anterior prediz que a resolução melhor no modo de não-
contato é r = 0,8h. Então, para ter uma resolução de 10 a 20Å, uma ponteira bem aguda
deve ser varrida a uma altura de 12 a 24Å (r = 0, 8h = 10 a 20Å ⇒ h = 12-25Å). Então, com
uma ponteira ideal e condições ideais de fazer a imagem (sem ruído e com alta
sensibilidade) a resolução no modo de não-contato é limitada, em última instância, pela
medida da distância ponteira-amostra.
1. Bustamante, C. and Keller, D. Physics Today. Dezember 1995, p.32-38.
Microscopia de força de van der Waals

Se a ponteira e a amostra estão limpas, são eletricamente neutras e não são magnéticas,
as forças de van der Waals são a única fonte de interação entre elas, no regime de não-
contato. As forças de van der Waals, em geral atrativas e de longo alcance, podem ser
detectadas para uma separação ponteira-amostra de até 100 nm ou mais, e podem ser
usadas – como em geral são – no modo de não-contato, para perfilar amostras moles sem
danificar a superfície de, por exemplo, materiais biológicos, para os que as forças de carga
não podem ultrapassar os 10-11 N. A resolução espacial atingível com microscopia de van
der Waals depende criticamente da geometria da ponteira e da separação entre ela e a
amostra. Como regra geral, para resolver no plano (x,y) estruturas de uma medida lateral a,
o raio efetivo da ponteira R e a separação ponteira-amostra s, devem ser menores que a. A
grandeza das forças de van der Waals não está apenas determinada por R e s mas também
pela permissividade dielétrica da ponteira, da amostra e do meio pois, como vimos, estas
forças dependem da polarização das moléculas. A imersão em líquidos polares, reduz em
muito as forças de van der Waals e pode causar também uma transição das forças de
interação, de atrativas para repulsivas.

Da teoria das forças de van der Waals1, pode ser deduzido que,

1. As forças de van der Waals medidas em vácuo, são sempre atrativas.


2. Se a amostra e a ponteira são feitas do mesmo material, as forças de van der Waals
são sempre atrativas, não dependendo do meio. Entretanto, podem tornar-se
repulsivas quando os materiais são diferentes, mas somente se o meio tem um índice
de refração efetivo nm entre o da ponteira np e o da amostra na , isto é, np < nm < na ou
na < nm < np . Em particular, com uma escolha apropriada do meio de imersão, as
forças de van der Waals podem ser reduzidas em mais de duas ordens de grandeza,
para pequenas separações ponteira-amostra, o que é desejável para fazer imagens de
amostras moles e delicadas. A camada de contaminação também pode ter influência
significativa nas medidas destas forças, dependendo da separação ponteira-amostra.
Uma contaminação de pequeno tamanho na superfície, pode dominar a interação
van der Waals levando inclusive a mudanças de sinal das forças.
3. As forças medidas se mantêm as mesmas quando se trocam os materiais da ponteira
e a amostra.
4. Os contornos de força constante medidos por microscopia de força de não-contato
não necessariamente correspondem à topografia das superfícies, mas sim a perfis de
resposta dielétrica constante. Portanto, a microscopia de força van der Waals tem o
potencial de fornecer informação sobre a resposta dielétrica de vários meios, em
função de suas constantes de Hamaker.

O desenvolvimento de microscopias de força de não-contato, com uma melhor


sensibilidade de detecção de força, irá incentivar as pesquisas sobre a interação ponteira-
amostra do tipo van der Waals de longo alcance, incluindo efeitos retardatários.
Sobre este tema, tem um trabalho pioneiro, de Jeffrey L. Hutter e John Bechloefer, do
Departamento de Física da Universidade Simon Fraser de Burnaby, na Columbia Britânica
(Canadá)2. Nele os autores conseguem medir forças de van der Waals por AFM e eliminá-
las, por imersão em um líquido.

1. Hartman Phys.Rev. B 42, 1541, 1990.

2. J.Appl.Phys. 73 (9), 1993.


"Artefatos" em SPM

Um microscópio ideal geraria uma imagem direta da superfície de uma amostra tal que
as medidas feitas seriam uma reprodução aumentada e exata dela. Como o SPM aumenta
em três dimensões, um SPM ideal forneceria medidas exatas em todas as direções. Chama-
se "artefato" a qualquer alteração na imagem de uma superfície, seja ela resultante da
interpretação da medida ou do equipamento utilizado. Todas as técnicas analíticas contêm
artefatos. Historicamente, à medida que as técnicas de um aparelho são desenvolvidas e
melhoradas, os artefatos são melhor compreendidos e minimizados fazendo modificações
no aparelho, na metodologia de utilização ou na interpretação dos dados. Se os artefatos
não são entendidos, os dados não podem ser interpretados corretamente, levando a
conseqüências indesejáveis tais como incapacidade de avaliação do verdadeiro desempenho
do instrumento ou uso indevido de resultados analíticos. Quando os artefatos são bem
entendidos, os dados de SPM podem ser interpretados corretamente e a informação obtida
usada com segurança.

A procedência dos artefatos é diversa: as cerâmicas piezelétricas se utilizam, como já


dissemos, para gerar e controlar o movimento dos scanners. A diferença entre o
desempenho ideal e real destes materiais é muito importante para o microscópio, não só em
termos de design, mas também de interpretação de imagens. No caso ideal, uma cerâmica
se deforma de uma maneira linear quando se aplica uma voltagem ou ainda quando se
aumenta ou diminui esta voltagem. Na prática, o comportamento não é esse e a cerâmica
não ideal tem um comportamento não linear devido principalmente a creep e histerese.

Devemos lembrar que uma cerâmica piezelétrica é em geral feita basicamente de PZT
(chumbo, titânio e zircônio) em pó, pressionado até obter um bloco sólido policristalino e
depois sinterizado. Os dipolos naturais ficam distribuídos aleatoriamente. Durante o poling,
aplica-se uma voltagem de contínua e um aquecimento a aproximadamente 2000C. Em
algumas horas, a maioria dos dipolos estão alinhados. Quando isto acontece, a cerâmica é
então resfriada para fixar os dipolos no estado alinhado. Se a cerâmica é aquecida a mais de
150 0C começa a se despolarizar. Isto não deve ser esquecido quando se quer operar a altas
temperaturas pois nesses casos, os scanners devem ser muito bem isolados termicamente.
Histerese

Trata-se, como já mencionamos, de um tipo de comportamento não linear, no qual, a


resposta resultante numa deformação mecânica da cerâmica é retardada em relação à
esperada de acordo com a voltagem aplicada. Ainda mais, quando se aplica uma voltagem
variável, a cerâmica em geral não volta a seu comprimento original. Isto depende muito da
natureza do material piezelétrico e da estrutura da cerâmica.

A histerese produz-se devido a que se gasta energia para inverter os dipolos durante uma
mudança de campo elétrico.

Figura 40: Loop de histerese.

Na figura 40 a área do loop representa a energia dissipada dentro do material em forma de


calor.

Para não-ferroelétricos, o resultado do gráfico D (deslocamento dielétrico) versus E


(campo aplicado) é uma reta, enquanto que para ferroelétricos, gera-se um loop. A
polarização P é uma medida real do grau de ferroeletricidade e o D/E do loop é uma medida
dela. Cerâmicas "duras" que têm pontos de Curie (temperatura de inversão, por cima da
qual o material não é mais polar) altos, têm menos histerese que as cerâmicas macias e
conjuntos de várias cerâmicas feitas de pó prensado têm menos histerese que uma cerâmica
maciça.

Para fazer um gráfico de um loop de histerese em função da voltagem aplicada no


scanner vamos supor que começamos com V=0 e aumentamos a voltagem até algum valor
finito. Na figura 41 mostra-se a extensão da cerâmica em função desta voltagem aplicada.
Figura 41: Extensão e contração da cerâmica em função da voltagem aplicada.

A curva é do tipo da anterior, onde os caminhos de ida e volta não são coincidentes.

A histerese mede-se como a razão entre a máxima divergência entre as curvas e a


máxima extensão que a voltagem produz no scanner, isto é, ∆ y/yMax e ela pode ser até
maior do que 20%.

Para entender melhor isto, voltemos ao funcionamento geral do sistema de varredura. O


AFM é provisto de uma eletrônica para o scanner, que permite uma varredura sempre no
mesmo sentido, como se mostra na figura 42 ou ainda ida e volta. No primeiro caso, o
scanner se move na primeira linha de esquerda à direita, até atingir a extensão da varredura
proposta, faz um passo na direção

Figura 42: Movimento de um scanner durante uma varredura de SPM.

perpendicular, volta e varre a segunda linha na mesma direção anterior. Desce e volta
novamente, etc. Isto significa que não há varredura numa das direções horizontais (no caso
da figura, de direita para esquerda). No segundo caso, o movimento é o mesmo, mas a
varredura é feita também de direita para esquerda.
A varredura vertical é chamada lenta e a horizontal rápida. O espaço entre os pontos nos
quais se faz a aquisição de dados, chama-se medida do passo. Esta medida é determinada
pela medida total da varredura do scanner e pelo número de pontos de dados por linha. A
medida da varredura é variável, dependendo dos scanners, desde alguns ângstroms até
pouco mais de 100 µ m e de 100 a 1000 pontos por linha. O número de linhas varridas em
geral é igual ao número de pontos por linha. Quando os dados são adquiridos sempre na
mesma direção, são minimizados os erros introduzidos por histerese no plano (x,y).

A histerese na direção perpendicular z causa perfis distorcidos. Se, por exemplo, temos
um degrau na amostra, a imagem será como mostrado na figura 43.

Figura 43: Imagem de um degrau distorcida pela histerese.

Quando o scanner está subindo na direção z, é requerida certa voltagem para contraí-lo.
Quando ele desce o degrau, o scanner deve esticar-se. Se voltarmos à figura de histerese,
veremos que a voltagem para esticar o scanner é maior que para contraí-lo na mesma
extensão. Então, se produz o erro.
Creep

Este é um efeito pelo qual uma cerâmica continua a deformar-se depois de uma rápida
variação de voltagem, como se mostra na figura 44, e é devido a um reordenamento de
domínios.

Este efeito também é mais pronunciado em cerâmicas macias e maciças. Há também um


excesso (overshoot) no deslocamento depois da aplicação da voltagem, seguido de uma
"ressonância" (ringing) da cerâmica.

Figura 44 : Deformação das cerâmicas com o tempo, em função da voltagem aplicada.

Vejamos como isto se traduz em função das imagens. Quando se aplica no material
piezelétrico uma voltagem, ele não muda de dimensões imediatamente. A mudança ocorre
em dois passos: o primeiro acontece em menos de milisegundos e o segundo em muito mais
tempo. Na figura 45, esse segundo passo é o indicado por ∆ xc e define o creep
propriamente dito.
Figura 45 : Creep de um scanner.

Quantitativamente o creep é a razão entre a segunda variação dimensional e a primeira,


isto é ∆ xc/∆ x. O creep é expresso como uma percentagem e geralmente dado em função
do intervalo de tempo característico TCR durante o qual ocorre. Valores típicos são de 1 a
20% em tempos que variam de 10 a 100 segundos.

O tempo gasto para fazer a varredura coloca o movimento lateral do scanner na parte
curvada do gráfico da resposta na figura anterior. Como resultado disto, duas varreduras
feitas a diferentes velocidades irão mostrar diferentes medidas se houver creep.

Outro efeito do creep no plano (x,y) é que ele pode interferir na localização de uma parte
da amostra quando se quer fazer um zoom. Querendo por exemplo caracterizar um defeito
sobre uma amostra, em geral se começa por fazer uma ampla varredura para localizar esse
defeito.

Figura 46 : Creep na direção z.

A seguir, se faz uma varredura de maior resolução, com o defeito centrado nela. Para fazer
este zoom, o microscópio aplica uma voltagem visando mover o scanner até a posição
desejada. Devido a essa voltagem, se houver creep, pode-se perder a localização do defeito
(isto chama-se drift).
Na direção z, os efeitos do creep podem ser vistos na figura 46.

Quando a ponteira passa sobre o degrau, de baixo para cima, o scanner sofre uma
contração com a voltagem aplicada, que corresponde à altura total do degrau. Entretanto,
nos próximos segundos, o scanner continua a se contrair lentamente a medida que acontece
o creep. Para manter a ponteira em contato com a amostra o sistema deve aplicar uma
voltagem na direção contrária para compensar o creep. Quando a ponteira percorre o
degrau de cima para baixo, ocorre a mesma coisa. O scanner se dilata para se acomodar ao
degrau, e depois continua a "se arrastar" (creep): novamente o sistema deverá aplicar uma
voltagem na direção oposta, para manter o contato.
Envelhecimento

O coeficiente de expansão dos materiais piezelétricos varia exponencialmente com o


tempo de utilização. Na figura 47 está graficado o envelhecimento de um scanner para as
duas possibilidades de uso: alta e baixa utilização.

Figura 47: Envelhecimento do scanner, com o uso e inativo.

A razão de envelhecimento é medida pela mudança no coeficiente de expansão por


tempo. Quando o scanner não está sendo usado, o envelhecimento das cerâmicas pode
produzir com o tempo uma diminuição nos coeficientes de expansão laterais e, portanto,
um erro nas medidas de comprimento obtidas das imagens de SPM.

Quando um scanner é usado regularmente, a deformação atingida para uma dada


voltagem aumenta lentamente, com o uso e com o tempo.

Estes dois fenômenos são parte do mesmo processo. Lembrando que as cerâmicas são
conglomerados policristalinos, cada um dos pequenos cristais que compõe o scanner tem
seu próprio momento dipolar. A aplicação repetida de uma voltagem na mesma direção, tal
como é a voltagem aplicada durante a varredura, causa um alinhamento progressivo dos
dipolos ao longo do eixo do scanner. O valor da deformação atingida para uma dada
voltagem depende de quantos dipolos estão alinhados. Então, quanto mais o scanner é
utilizado, mais ele irá se deformar. Por outra parte, se o scanner não se utiliza, os
momentos dipolares dos cristais gradualmente voltarão a sua orientação aleatória. Como
resultado disto, só alguns dipolos contribuem para a deformação.

Quando se compra um scanner, ele está recém polarizado, ou seja, foi posto quase ao
máximo de sua capacidade de deformação. A dependência dela com o tempo e com o uso
significa exatamente que o scanner irá se deformar em forma diferente que quando foi
calibrado por primeira vez. Como resultado disto, quando se faz uma medida sobre uma
imagem, os valores das dimensões laterais e verticais podem estar errados.
Acoplamento cruzado

Este termo, mais conhecido por cross talk, refere-se à tendência que existe nos
movimentos em x e y de terem uma componente espúria do movimento em z, como se
mostra na figura 48.

Figura 48: Movimento do scanner com acoplamento cruzado.

Este movimento é bastante complexo e provém de diferentes fontes. Por exemplo, da não
uniformidade do campo elétrico ao longo do scanner. O efeito de interferência dos
movimentos em diferentes direções não é constante e tem uma expressão tensorial. O maior
efeito é geométrico e se produz devido à maneira em que o scanner é construído, em forma
tripoide ou tubular.

O movimento em x e y do tubular é produzido quando um dos seus lados se encolhe e o


outro se expande. Como resultado disto, o scanner varre em arco e não num plano. A
voltagem aplicada para mover um tubo ao longo dos eixos x e y, isto é, paralelo à superfície
da amostra, deve fazer que o scanner se estique ou se contraia ao longo do eixo z, isto é,
perpendicularmente à amostra, pois é necessário manter a ponteira em contato com a
amostra.

Num tripoide, desenhado na forma de três barras perpendiculares, também há cross talk
devido a que essas três barras estão coladas juntas, em uma das extremidade do scanner.
Quando a barra x se deforma causa uma rotação nas barras y e z.

O acoplamento cruzado num SPM pode resultar em que uma superfície seja vista em
forma de bacia, em vez de plana, como mostra a figura 49, para o caso de um degrau.
Figura 49: Efeitos do acoplamento cruzado sobre um degrau.

Para interpretar esta figura, devemos lembrar que uma imagem de SPM é adquirida a
partir da voltagem necessária para compensar a curvatura gerada pelo arco do scanner. A
forma de bacia pode nem sempre ser muito evidente pois o background curvado pode ser
retirado processando a imagem por software. A melhor forma de determinar se o scanner
tem cross talk é usar uma amostra com um raio de curvatura conhecido (por exemplo uma
lente).

A imagem de um degrau, com todas estas deformações, poderia parecer com a mostrada
na figura 50.

Figura 50: Efeitos de histerese, creep e cross talk sobre um degrau.

Tradicionalmente o comportamento não linear dos piezelétricos tem sido contornado


usando software. Atualmente existem também soluções por hardware as quais praticamente
eliminam os problemas em vez de corrigi-los. O melhor é usar os dois métodos em
conjunto.
Como acabar com a falta de linearidade das cerâmicas

Técnicas de loop aberto e fechado

A falta de linearidade nos piezelétricos pode ser minimizada de diversas maneiras. Na


técnica chamada de loop aberto o sistema de SPM é programado de forma tal que o
comportamento não linear das cerâmicas é corrigido por meio de software, seja durante a
varredura, seja após a aquisição da imagem. Existem vários métodos de loop aberto. O mais
simples é usar voltagens não lineares sobre as cerâmicas dos scanners. O efeito é causar um
deslocamento das cerâmicas tornando-as aproximadamente lineares com o tempo, assim
como conseguir uma conseqüente varredura também linear. Este método já é conhecido e
usado há muito tempo mas tem a desvantagem de que deve ser feita uma correção diferente
para cada tamanho e/ou ângulo de varredura, inclusive para cada velocidade de varredura.
Outro método é corrigir a imagem após a sua aquisição, medindo uma amostra conhecida e
calculando os parâmetros que dariam uma imagem "verdadeira". Usando os mesmos
parâmetros de varredura sobre uma amostra desconhecida, o computador os usaria para
corrigir a imagem.

As soluções por software são simples e relativamente fáceis de serem implementadas. A


principal desvantagem delas é que só corrigem parcialmente a falta de linearidade. Existem
soluções por hardware utilizando um controle externo com sensores. Estes métodos são
muito eficazes e com eles a falta de linearidade é reduzida a menos de 1%.

Na técnica do loop fechado usa-se um sensor para medir o movimento real do scanner e
levar a cerâmica a produzir deslocamentos lineares dele. Os métodos normalmente usados
para correção por loop fechado incluem correção ótica, isto é, uma luz passa através de
uma fenda montada sobre o scanner, e é medida em um fotodetector de duas seções. O
sinal do fotodetector é proporcional ao movimento do scanner.

Há também soluções que incluem medidas de capacitância, nas quais placas


capacitoras são postas sobre o scanner e numa posição perto dele. Quando o scanner se
move, a variação da capacitância entre essas duas placas é medida e relacionada com o
deslocamento do scanner.

Por último, usam-se medidas com medidores de esforço (strain gauge) que são
montados nas cerâmicas x, y e z do scanner. Quando as cerâmicas se deformam para fazer
a varredura, os medidores fornecem um sinal que é proporcional ao deslocamento. Este
sinal é usado para produzir movimentos lineares do raster piezelétrico.

Scanners.

Os scanners de SPM são desenhados para diferentes amplitudes máximas de varredura.


A amplitude apropriada é escolhida dependendo da medida do que se quer ver. Como já
dissemos, existem diferentes tipos de scanners. Os mais comuns são os tripoides e os
tubulares. Os tripoides consistem justamente na montagem de três cerâmicas piezelétricas
nessa geometria, num arranjo ortogonal. Na figura 51 vemos dois tipos de scanners.

Os instrumentos TopoMetrix têm uma versão modificada da forma tripoide, com um


acoplamento mecânico entre as cerâmicas x, y e z. O piezo z é controlado separadamente
dos outros e não está limitado pelas dimensões físicas das cerâmicas x e y. O desenho do
tripoide modificado tem as seguintes vantagens:

Tamanho compacto. Com um scanner compacto podem ser varridas grandes áreas devido
ao efeito do suporte mecânico das cerâmicas x e y, que empurra para cima o ponto pivot
que segura a cerâmica z.

Figura 51 A: Scanner tripoide

Figura 51B: Scanner tubular.


Movimento simples. A amostra traça uma figura circular previsível enquanto é varrida. A
distorção resultante, ou "bowing" (inclinação) para fora do plano da amostra é
relativamente pequena e fácil de corrigir.

Tempo de resposta. As cerâmicas juntas deste design têm uma resposta temporal muito
rápida. Isto permite velocidades de varreduras mais rápidas, as quais minimizam os efeitos
não lineares.

Dureza mecânica. O design básico do scanner tripoide, combinado com suas medidas
compactas, resulta em uma estrutura mecânica extremamente dura, que é essencial para o
controle dos pequenos movimentos de um SPM.

Desacoplamento do eixo z (das amplitudes de varredura x e y). Já que se utilizam


diferentes cerâmicas para varrer o eixo z e o plano (x,y), a falta de linearidade dos
piezelétricos, produzida pelo raster x, não distorce os movimentos em y e/ou em z. Os três
piezos separados também permitem que a amplitude em z seja independente da extensão da
varredura no plano (x,y).

Os scanners tubo operam por deformação do próprio tubo. Os movimentos na direção z


são feitos por estiramento e na direção x e y por deformação. Em um tubo há eletrodos para
o movimento em x e em y (ver figura 51B) colocados ao redor da parte externa dele. Para
dobrar o tubo na direção x, se energiza a cerâmica +x para dilatar um lado dele. A cerâmica
-x é contraída. Isto causa a deformação do tubo na direção x. O mesmo princípio é usado
para gerar movimento na direção y. Estes dois movimentos são proporcionais à voltagem
aplicada e ao quadrado do comprimento do tubo. O movimento na direção z é gerado por
energização de um eletrodo localizado no centro do tubo. O resultado é um estiramento do
tubo como um todo, que é proporcional ao comprimento do tubo e à voltagem aplicada.

As vantagens de um scanner tubo são:

Desenho simples. Como os movimentos nas três direções são controlados individualmente,
o desenho é muito simples.

Rigidez. Outra vantagem é que a estrutura tubular é rígida devido ao próprio design.

Linearidade. Ele é muito linear em pequenas amplitudes de varredura.

Entretanto, o tubo tem diversas desvantagens:

Ele deve ser grande em tamanho, para varrer grandes amplitudes, já que, quanto maior a
varredura requerida, maior deve ser o tubo. Isto resulta numa menor estabilidade mecânica,
se compararmos com a do tripoide.

Movimento muito grande fora do plano. Quando a amplitude da varredura é muito


grande, a torção do tubo causa movimentos relativamente grandes fora do plano da
amostra. A grandeza e o aspecto desta distorção variam com a amplitude da varredura.
Movimento complexo. O movimento de torção do tubo é relativamente complexo se o
compararmos com o arco simples de um tripoide. A correção às distorções de curvatura
quando o tubo se move nas direções x e y, tais como bowing fora do plano da amostra, é
difícil.

Amplitude em z limitada. A amplitude de movimento na direção z é proporcional ao


comprimento do tubo, enquanto que as amplitudes em x e y são proporcionais ao quadrado
do comprimento. Como resultado disto o scanner pode não ter suficiente amplitude na
direção z como para medir grandes alturas. Este problema é mais agudo quando a amostra
não está colocada exatamente perpendicular ao tubo.

Resposta temporal. Os tubos são feitos de cerâmicas maciças as quais têm uma resposta
temporal relativamente lenta. Em particular, isto é mais notável quando se fazem grandes
varreduras, pois nelas, são necessárias grandes variações de voltagem sobre as cerâmicas e
isto é um fator de não linearidade. Inclusive, para rotar a direção de varredura requerem-se
mudanças rápidas de voltagem que resultam em varreduras não lineares.
Como identificar os defeitos introduzidos pelos scanners

Os artefatos devidos aos scanners podem ser identificados pelas distorções que eles
produzem no plano (x,y) e na vertical (z).

Distorções horizontais

1. Não linearidade intrínseca. Há várias manifestações da não linearidade de um


piezelétrico no plano horizontal. A mais notável é aquela pela qual as linhas que são
retas na amostra aparecem curvas na imagem. Para testar isto no plano (x,y) é só
fazer a imagem de uma grade de calibração.
2. Histerese. O sintoma é que quando se fazem varreduras em diferentes direções
aparecem deslocamentos diferentes nas imagens da mesma estrutura. Para testar isto
só é necessário fazer varreduras do mesmo lugar em sentidos diferentes. Se as
imagens não são idênticas, há histerese.
3. Creep. O sintoma é que quando se muda de região para fazer uma segunda
varredura, a imagem parece se mover durante algum tempo, até adquirir uma
posição fixa. Isto se deve a que o scanner precisa de um tempo para relaxar. Para
testar isto, deve ser feita uma varredura sobre algum ponto reconhecível, se possível
numa esquina da imagem. Tirando uma segunda imagem dez vezes menor (isto é,
aumentando 10 vezes a magnificação) na região onde está o ponto, se houver creep,
o sistema não centrará exatamente o ponto, mas fazendo repetidas varreduras sobre
ele, acabaremos com o ponto centrado, indicando que o scanner atingiu sua posição
de equilíbrio.
4. Envelhecimento. O sintoma é que a calibração lateral muda com o tempo. O teste é
provar a estabilidade das medidas laterais com o tempo, usando uma grade de
espaçamento conhecido.
5. Cross talk entre as cerâmicas x e y, resulta em que, linhas horizontais e verticais
que deveriam aparecer perpendiculares, vêem-se com ângulos diferentes ou
aparecem superfícies curvas, onde pensamos ter superfícies planas. O teste
novamente é usar uma amostra padrão para observar a deformação.

Comentário: Como o SPM gera dados quantitativos, a qualidade deles estará em relação
direta com uma boa calibração do sistema que gera esses dados.

Distorções verticais

Os dados na direção vertical z estão sujeitos a alguns dos mesmos artefatos que no plano
(x,y). Entretanto, o design básico do scanner (tubo ou tripoide) é de maior importância
neste caso.

1. Não linearidade intrínseca. Se suspeitarmos da introdução de erros no valor das


alturas medidas, também existem grades padrão, como para o plano, com alturas
bem determinadas.
2. Histerese. Os sintomas são que as inclinações das paredes laterais das amostras,
irão depender de se o scanner está se movendo para cima ou para abaixo. Um teste
para identificar isto seria medir um degrau e comparar as inclinações das bordas.
3. Creep. Pode ser visto em varreduras rápidas e amplas em altura. Um grande degrau
é exemplo disto: o cume de uma parede profunda aparecerá inclinado mostrando um
decaimento exponencial devido a que a cerâmica continua a se distorcer depois que
já se chegou ao topo. O teste para saber se isto está acontecendo é fazer uma
imagem de um degrau de características conhecidas.
4. Envelhecimento. O sintoma é que a calibração da altura muda com o tempo. Para
testar, é necessário estudar a estabilidade com o tempo das medidas em altura,
usando amostras de altura conhecida.

Podemos resumir todos estes artefatos na figura 52.

Figura 52: Perfil de um degrau mostrando histerese, creep e cross talk só na direção z.

Vendo a figura, a histerese causa inclinações diferentes nas paredes quando se varre para
acima ou para abaixo, devido a que as voltagem requeridas para isto são diferentes para a
contração e a dilatação. O creep causa o decaimento exponencial que por sua vez resulta
em que o lado esquerdo do topo do degrau apareça mais alto que o direito. O acoplamento
cruzado acrescenta curvatura a todo o perfil.

Bowing. Uma distorção vertical comum é a inclinação que ocorre devido a que o scanner
se move fora do plano da amostra durante a varredura. Isto acontece por dois fatores: a
geometria do scanner e o ângulo entre a ponteira e a amostra.

Artefatos dinâmicos. As cerâmicas têm uma amplitude fisicamente limitada. Se a altura


das rugosidades excede esta medida em z, devido à inclinação, a dobras ou mesmo ao
tamanho da superfície, os dados coletados não terão sentido e isto aparecerá como um
ponto aplanado (flat spot) sobre a amostra.

Calibração. Como no caso horizontal, as medidas verticais estão sujeitas a erros de


calibração e para evitá-los existem critérios e provas padrão de calibração tanto vertical
quanto horizontal.
Artefatos de ponteira/cantilever

As imagens de SPM são uma combinação do feitio da ponteira e da amostra. Então, é


importante que seja usada a ponteira apropriada à imagem que se quer obter. Diferentes
geometrias de ponteiras são usadas para obter diferentes tipos de imagens, mas se a
ponteira é mais aguda que a corrugação a ser vista teremos, em geral, uma imagem real da
amostra. Entretanto, se a ponteira não consegue delinear as rugosidades da amostra por elas
serem mais finas, teremos a chamada convolução da ponteira. A interação entre a
geometria da ponteira e a superfície da amostra pode ser esquematizada como se mostra na
figura 53.

Figura 53: Imagem dependente do feitio da ponteira.

Os artefatos devidos à ponteira resultam em geral de uma escolha errada dela em relação
à amostra que se quer ver.

Distorções de amostras com degraus ou côncavas. Quando se tenta fazer


imagens de uma superfície com inclinações muito pronunciadas, a geometria da ponteira é
importantíssima, como pode ser visto da figura anterior. Uma ponteira de grande raio
começará a interagir com as irregularidades da superfície bem antes de que o eixo central
da ponteira alcance elas. Assim que a ponteira começa a interagir, ela traça uma figura
arredondada e não uma borda aguda. Se usarmos uma ponteira piramidal, por exemplo,
para ver um degrau, a imagem dele irá aparecer como tendo um ângulo, igual ao ângulo da
ponteira, como se mostra na figura 54.
Figura 54: Imagem influenciada pelo ângulo da ponteira.

Então, para fazer imagens deste tipo de amostras, o aspect ratio é crítico. Quanto maior o
aspect ratio, mais perto da real superfície estará a imagem obtida.

Distorções de amostras convexas. Quando fazemos a imagem de uma estrutura


convexa, uma ponteira bem aguda na extremidade terá um grande efeito na largura da
imagem. Uma ponteira de grande raio começará a interagir com a superfície bem antes do
que o eixo central da ponteira alcance a amostra. Então, a imagem será mais larga que a
real, como se mostra na figura 55.

Figura 55: Imagem alargada pelo grande raio da ponteira.

Note-se que a altura da amostra será medida corretamente, independente da geometria da


ponteira.

Assimetria da ponteira. Se a ponteira não for uniforme, também produzirá artefatos na


imagem. Por exemplo, uma ponteira piramidal com paredes de 450 em todos os lados fará
que rugosidades profundas na amostra pareçam ter 450 nos dois lados. Se as rugosidades da
amostra forem muito maiores que a ponteira, isto não acontecerá, como se mostra na figura
56.
Figura 56: Na parte superior vê-se a imagem distorcida pelo ângulo da ponteira. Na parte inferior, a
imagem é correta.

Entretanto, se a ponteira tiver um lado perpendicular à amostra, a aparência desta será de


profundidade em um dos lados e de 450 no outro, como vemos na figura 57.

Figura 57: Imagem devida à diferente inclinação das paredes da ponteira.

Flexão da ponteira. Quando se usam ponteiras compridas e agudas, elas podem


flexionar-se numa rugosidade mais pronunciada. A imagem parecerá menos profunda do
que a superfície realmente é, como se mostra na figura 58.

Figura 58: Imagem devida à flexão da ponteira.

Outra ocorrência possível é produzida quando uma ponteira muito fina entra numa parede
mais pronunciada. Neste caso, a ponteira pode torcer-se no momento em que toca a borda
da parede. Se isto acontecer, o cantilever se flexiona mais do que deveria. Na imagem,
aparece como se tivesse um canal ou uma fenda, na base da parede. Isto pode ser eliminado
ajustando os parâmetros de realimentação da varredura, varrendo a velocidades menores ou
numa direção diferente.

Cantilever backlash. Quando a velocidade de varredura é nos dois sentidos e muito


rápida, o cantilever pode sofrer uma flexão violenta (backlash) no momento em que a
ponteira muda de direção e começa a varrer outra linha. Isto pode resultar em artefatos que,
entretanto, não aparecem se não levarmos em conta a imagem das bordas da amostra.

Reprodutibilidade da ponteira. Como as imagens de SPM dependem da ponteira


utilizada para fazê-las, com a finalidade de que os resultados sejam reproduzíveis, as
ponteiras também devem sê-lo. Isto é muito importante especialmente quando se trata de
aplicações na metrologia. Os resultados analíticos devem ser interpretados com o
entendimento do que acontece quando se muda de ponteira.

Contaminação. Se a ponteira está contaminada, por exemplo, com fiapos de uma


amostra, a imagem não será a verdadeira. Em alguns casos, observa-se um "riscado" ao
longo da direção de varredura; em outros, a contaminação pode até melhorar a imagem. Por
exemplo, como já foi mencionado, quando se faz resolução atômica em grafite, a ponteira
pode pegar uma lasca e produzir interação entre os átomos da lasca de carbono presa à
ponteira e os da amostra, o que melhora a resolução.

Ponteira dupla. Um dos problemas críticos em relação à ponteira é saber determinar qual
a parte dela que interage com a superfície. Às vezes, pode ocorrer que a ponteira fique com
duas extremidades ou corrugações na ponta. Neste caso, a imagem resultante terá dois
cumes correspondendo apenas a uma superfície, como se mostra na figura 59. As bordas
laterais das corrugações, tampouco serão bem reproduzidas já que, sobre a parede esquerda,
descendo o topo da corrugação, fará contato a extremidade esquerda da ponteira dupla e
sobre a parte à direita do vale da corrugação, o contato será feito pela extremidade direita
da ponteira.

Figura 59: Imagem distorcida pela extremidade dupla da ponteira.

Ângulo ponteira-amostra. Se o ângulo entre o eixo perpendicular ao plano da amostra e


o eixo vertical da ponteira for diferente de zero, a imagem será distorcida e poderá parecer
que um lado da amostra é mais alto que outro. Então, é necessário que a ponteira esteja
estritamente perpendicular à superfície da amostra.
Artefatos provenientes da mecânica do aparelho e do design da
eletrônica

Vibração. Como já dissemos, o controle das vibrações é muito importante pois se elas
existirem entre a ponteira e a amostra não poderemos obter uma realimentação estável, o
que resultará em oscilações com a freqüência das vibrações e, por exemplo, poderíamos
confundir átomos com simples vibrações. Isto pode ser diferenciado variando a velocidade,
a amplitude e o ângulo da varredura e observando as mudanças correspondentes na
imagem.

Instabilidade térmica. Mudanças na temperatura podem causar expansão ou contração


térmica dos componentes mecânicos do aparelho. Isto introduzirá movimentos entre a
ponteira e a amostra que resultarão em artefatos. Para evitar isto, é só estabelecer uma
temperatura estável no ambiente e mantê-la durante a experiência.

Controle de realimentação. Se o loop de realimentação não for otimizado poderemos


obter imagens nas quais irão aparecer ondulações, ruído ou outros artefatos. A otimização
da realimentação é necessária para medir corretamente rugosidade e para obter boas
imagens de coisas aguçadas. Quando a realimentação não estiver funcionando bem, a saída
do sensor não será o valor correspondente à corrugação e a voltagem aplicada às cerâmicas
não irá corresponder à real topografia da superfície.

Nível de ruído do instrumento. O ruído da fonte de alimentação do SPM introduz


ruído nas voltagens aplicadas às cerâmicas. Como o ruído é também uma voltagem, ele é
convertido em movimento mecânico pelas cerâmicas, e irá aparecer na imagem resultante
como se fosse um sinal correspondente a corrugação. Este efeito é mais notável em
superfícies mais lisas.
Artefatos resultantes da manipulação de dados

As técnicas usadas para melhorar as imagens de SPM podem também distorcer os dados
e levar a interpretações erradas.

Correção de inclinação e de nível. A menos que o aparelho de SPM incorpore um


mecanismo computacional de controle de nivelamento da amostra, ela ficará inclinada em
relação ao plano x,y do scanner. Em muitos casos, a inclinação será muito grande em
relação à medida da parte da amostra da qual se quer fazer a imagem. Este problema pode
ser facilmente corrigido ajustando o plano da amostra com um software apropriado.

Filtro passa-banda. Esta técnica é usada às vezes para remover alguns tipos específicos
de freqüência . Pode ser feito em dados previamente adquiridos, mas alguns instrumentos
fazem a filtragem durante a aquisição, de forma tal que os dados armazenados já estão
processados e a fila de dados não filtrados não é acessível para inspeção.

Fast Fourier Transform (FFT). A transformada de Fourier (TF) de uma imagem de


SPM é apropriada para amostras que têm um aspecto periódico. Ela é utilizada para
eliminar freqüências periódicas diferentes daquelas da periodicidade da amostra e que
introduzem ruído coerente. Mas a TF pode também introduzir artefatos se não for usada
corretamente, especialmente em amostras de aspecto aperiódico. Isto acontece pois a TF
utiliza um algoritmo baseado em funções periódicas. Entretanto, os dados obtidos podem
conter diversos componentes de freqüências que não têm uma relação inteira com o período
básico da TF e portanto podem ser automaticamente considerados erros e apagados da
imagem.

A TF é uma das ferramentas matemáticas mais importantes no processamento e análise de


imagens. Foi inventada por Jean-Baptiste Fourier em 1807 e tem sido usada para muitas
aplicações. Em função da matemática numérica, podemos dizer que seu grande boom só se
manifestou a partir de 1965 quando Cooley e Tukey1 criaram um algoritmo para usar com
computadores, chamado Fast Fourier Transform (FFT), ou seja, transformada de Fourier
rápida. Este algoritmo reduz consideravelmente a quantidade necessária de operações
matemáticas. A TF decompõe uma função F(r) em componentes do número de onda k ou
da freqüência f. A decomposição chama-se espectro da função. A TF no plano é dada pela
seguinte equação:

V(k) = (1/2π ) ∫ F(r) e-ik.r dr,

onde os limites de integração são ± ∞ . Tanto a função quanto a sua transformada, contêm
a mesma informação e a última pode ser considerada como uma representação diferente da
primeira. A TF inversa é definida por

F(r) = (1/2π ) ∫ V(k) e ik.r dk ,


onde os limites de integração são também ± ∞ .

Lidando com cálculos discretos, a integral transforma-se na seguinte soma (no plano)

V(kx,ky)= (XY)-1/2 ∑ ∑ F(x,y) {cos[(kxx/X)+(kyy/Y)] + sen[(kxx/X)+(kyy/Y)]},

F(x,y) = (XY)-1/2 ∑ ∑ V(kxx,kyy) × exp{i[(kxx/X)+(kyy/Y)]},

onde as primeiras somas são sobre y=0 até y=Y-1 e as segundas sobre x=0 até x=X-1,
sendo X e Y os limites da imagem . As soluções da FFT levam em conta as propriedades
específicas das funções a serem transformadas como, por exemplo, que uma imagem
contém apenas dados reais. Portanto, a função entrada para a FFT é real e não complexa.
Neste caso, pode ser usada a FHT, ou Fast Hartley Transform, para calcular o espectro de
uma imagem. Existe uma relação simples entre a FFT e a FHT. A diferença fundamental é
que esta última só trabalha com dados de entrada e saída reais.

As transformadas de Fourier são usadas para filtrar em geral imagens de estruturas


periódicas. Erros sistemáticos e/ou perturbações podem ser corrigidos com transformadas
que correspondem a uma multiplicação complexa no espaço de Fourier (domínio da
freqüência ou dos k) onde a TF da imagem é uma componente e a outra é a assim chamada
função transferida. De acordo com as propriedades desta última função podemos distinguir
diferentes tipos de filtros. Quando a supressão é de números de onda pequenos (altas
freqüências), estamos utilizando um filtro passa-baixos. Um filtro passa-altos suprime
grandes números de onda (baixas freqüências). A combinação de ambos é um filtro passa-
banda. Mas é necessário ter cuidado, pois o uso indevido de um filtro passa-banda,
dependendo da amostra, pode fazer aparecer um artefato mostrando na imagem uma
periodicidade não existente.

Mesmo assim, a TF de uma imagem é muito utilizada, pois de ela pode ser obtida
praticamente toda a informação contida na imagem espacial e que, em condições normais,
não é trivialmente visível. Em particular, isto é verdade para amostras com estruturas
periódicas, pois com uma TF de suas imagens, é mais fácil ver e caracterizar suas
propriedades de simetria e suas constantes de rede.

"Amaciante". Os algoritmos para "suavizar" a aparência das imagens podem também


introduzir artefatos, pois eles operam fazendo a média dos dados, com o que podem ser
perdidos detalhes da amostra. Isto é, as imagens são "suavizadas" calculando a média
pesada de cada valor de z nelas.

Sombreamento. O sombreamento utiliza-se com freqüência para ressaltar o contraste em


z. Esta técnica, pela qual uma fonte de luz simulada é aplicada na imagem da amostra, é
particularmente importante devido à resolução muito alta que é possível obter no eixo
vertical. Como a extensão no plano é maior que a resolução vertical, pode ser difícil
visualizar pequenos detalhes verticais tais como grãos superficiais, sem sombrear a
amostra. O sombreamento realça as variações na direção z, mas ele deve ser bem entendido
para evitar más interpretações dos dados. É também importante saber a direção na qual está
sendo iluminada a imagem para poder determinar sem ambigüidade se as rugosidades que
aparecem são para acima ou por debaixo do plano da amostra.

Aumentos em x, y e z, independentes. Uma das coisas importantes das técnicas de


SPM é a habilidade para aumentar o contraste em z das imagens, mas isto também pode
resultar em imagens enganosas. Como a magnificação em z pode ser representada
independentemente daquelas em x e y, as alturas poderiam ser exageradas. Então, é
essencial que os instrumentos de SPM sejam bem desenhados para não introduzir artefatos
mecânicos (ou manuais) e mais, as ferramentas em forma de softwares, devem ser usadas
em forma apropriada para que isto não aconteça. É então essencial o conhecimento tanto do
instrumento quanto das ferramentas que ele tem para não produzir modificações
indesejáveis nos dados adquiridos.

1. J.W.Cooley and J.W. Tukey: An algorithm for machine calculation of complex Fourier series, Mathematics of Computation (1965).
Artefatos criados pelas amostras

Contaminação. Fora as considerações já feitas sobre a contaminação das ponteiras, a


contaminação das amostras também pode introduzir artefatos mas isto é mais provável em
STM onde uma camada de contaminantes isolantes, podem acabar com a imagem.

Partículas sobre a superfície da amostra. Partículas perdidas sobre a superfície da


amostra podem causar artefatos quando se trabalha no modo de contato, já que elas podem
ficar presas à ponteira causando um listrado na imagem, proveniente de um risco na
amostra. Também pode se apresentar o efeito de parecer que a imagem pula, à medida que
as partículas se colam ou se soltam da ponteira. Isto pode ser reduzido ou eliminado usando
alternativamente outro modo de operação e, principalmente, só trabalhando com amostras
muito bem limpas.

Curvatura. Se a amostra tem curvatura, especialmente combinada com uma certa


inclinação, isto irá certamente produzir artefatos. Se esta combinação ultrapassar a
amplitude da varredura em z, a porção da amostra que fique fora do alcance, não aparecerá
na imagem. Ainda mais, se a curvatura for maior do que a medida da superfície que se quer
ver - grãos, por exemplo - eles podem não aparecer na imagem a menos que se use
sombreamento ou algum outro recurso para aumentar o contraste.

Maciez. No modo de operação em contato podem aparecer artefatos devidos à deformação


de uma amostra mole causada pela ponteira. Isto aparece como um listrado na amostra, ou
ainda, a amostra pode parecer mais baixa do que realmente é. Este artefato pode ser
reduzido ou eliminado, diminuindo a força aplicada ou usando outros modos de operação
como já foi dito.

Adesão ponteira-amostra. Durante uma varredura em contato, a ponteira e a amostra


podem ficar coladas. Esta adesão também pode resultar em artefatos, pois ela provoca uma
torção indevida no cantilever à medida que as rugosidades vão sendo varridas. Este tipo de
artefato pode ser aproveitado para obter informação (como já mencionado anteriormente)
sobre o tipo de ligação entre a ponteira e a amostra. Ainda mais, se a ponteira estiver
revestida de algum material que seletivamente tenha uma ligação com alguma área em
particular da amostra, este fenômeno pode ser usado para identificar justamente essa área.

Corrugações mais profundas que o comprimento de ponteira. Este efeito


proveniente de uma escolha não boa da ponteira, já foi mencionado como artefato de
ponteira, mas cabe lembrar que, se existir na amostra uma cavidade mais profunda que a
ponteira, o cantilever pode bater na borda da corrugação de forma tal que o que aparece na
imagem tem a ver com a forma da ponteira e não com a corrugação da amostra, como já
vimos. Uma boa preparação e caracterização prévia da amostra é essencial para que isto
não ocorra.
Conclusões. A microscopia de varredura por sonda é uma técnica poderosa que fornece
um tipo de informação que não pode ser conseguida com nenhuma outra técnica similar. É
por isso que torna-se essencial o entendimento da instrumentação para fazer uma correta
interpretação das imagens. Os softwares existentes são fundamentais nisto, mas o critério e
a prudência do pesquisador na interpretação dos dados é essencial para obter imagens
representativas e de qualidade confiável.

Sempre que houver dúvidas sobre o aparecimento de artefatos numa imagem, as


seguintes operações devem ser realizadas:

1. Repetir a varredura para ver se a segunda imagem é igual à primeira.


2. Fazer uma nova imagem com uma direção de varredura diferente à primeira.
3. Mudar a amplitude da varredura para ter certeza de que a calibração das escalas é
correta.
4. Rotar a amostra e fazer outra imagem. Com este procedimento é possível distinguir
se há convolução entre a ponteira e a amostra.
5. No caso em que a imagem mostre uma superfície periódica ou quase periódica,
mudar a velocidade de varredura e fazer outra imagem. Com isto consegue-se
distinguir se a superfície é realmente periódica como parece ou é apenas um artefato
o que se está vendo.
Nanotribologia

O termo tribologia é relativamente novo e refere-se ao estudo de todas as propriedades de


materiais que têm a ver com interação de interfaces em movimento relativo. Estas
propriedades em geral são diferentes quando se trata de materiais de tamanhos
macroscópico e microscópico.

Com a invenção dos microscópios de força, tornaram-se possíveis o estudo e a análise de


superfícies em escala atômica, seja de materiais cristalinos, amorfos ou de sistemas
orgânicos.

Atrito, lubrificação, desgaste resultante de asperezas microscópicas e adesão, são


fenômenos do dia a dia provenientes do movimento relativo de duas superfícies, que podem
ser medidos com um nanoscópio, assim como dureza, rigidez e rugosidade, como vimos
anteriormente para o caso específico do atrito.

Com o AFM podemos estudar todo tipo de propriedades mecânicas de superfícies. A


importância da invenção do AFM para medidas de tribologia, reside em que ele tem a
sensibilidade necessária para permitir a aplicação de forças fracas o suficiente para não
produzir o deslocamento de átomos de sua posição, durante o contato. Neste contexto, é
bom sempre ter em mente a ordem de grandeza da força que pode levar a ruptura das
uniões químicas.
Dureza

As pesquisas sobre dureza em filmes ultrafinos, isto é, da ordem de 10 a 30 nm, são de


interesse no que se refere a recobrimento com camadas de proteção, para aumentar a
durabilidade, por exemplo, de discos magnéticos. Macroscopicamente, a dureza está
determinada pela carga normal aplicada, dividida pela área superficial. Isto é o chamado
número de dureza de Rockwell ou de Vickers. Também pode ser definida pela carga
normal aplicada dividida pela área de contato projetada, entre o indentador e a amostra. Isto
é o chamado número de dureza de Knoop ou de Berkovich1.

A ponteira, para indentar, deve penetrar apenas o 10% da espessura do filme para evitar
qualquer influência do substrato. Para camadas de proteção de espessura da ordem de 30nm
esta regra é muito importante pois se ela não for seguida, corre-se o risco de estar medindo
camadas internas da amostra e substrato.

As medidas de dureza em filmes ultra finos em escala micrométrica requerem aparelhos


muito sensíveis pois a dureza do material não é só determinada pela grandeza das forças
interatômicas, mas também pelos mecanismos de deformação utilizados. O valor da dureza
pode variar também com os espaços vazios que o material possa ter, com as impurezas,
defeitos, textura, etc. A dureza intrínseca de filmes ultra finos pode ser medida
corretamente só depois de uma exaustiva avaliação das influências da própria indentação e
do substrato. A ponteira usada para indentar deve não apenas penetrar na amostra alguns
nanômetros, como também realizá-lo de uma forma que seja completamente reproduzível.
Isto requer um controle de carga bastante rigoroso. A caracterização da dureza de filmes de
menos de 100 nm só pode ser feita com um aparelho do tipo do AFM, já que com ele se
tem a possibilidade de medir a área indentada diretamente. Conhecendo a constante de
mola do cantilever e o movimento em z da amostra, temos a carga aplicada. O quociente
entre a carga aplicada e a área de indentação, determina a dureza da amostra. Dentro deste
contexto se pode medir ainda rigidez, definida como a força de carga dividida pela
profundidade da penetração. As dimensões utilizadas para dureza são GPa (Pascal =
Newtons/m2) e as de rigidez N/m.

Os componentes importantes na técnica de medir dureza são os sensores de força e a


ponteira, a qual deve possuir uma geometria apropriada para indentação e uma dureza
maior que a da amostra a ser estudada. Por exemplo, para indentar filmes metálicos, as
ponteiras de silício são recobertas com carbono ou, em geral, com compostos contendo
diamante. Na prática utilizam-se indentadores piramidais Berkovich de três lados, que
possuem a vantagem de ter extremidade bem aguçada, ou Vickers, de quatro lados, que são
mais resistentes em relação aos danos provenientes da força de carga , ou ainda, ponteiras
esféricas, que têm uma distribuição de stress mais uniforme.

Outro elemento que é muito importante nestas experiências é o sistema de


posicionamento e localização pois, uma vez indentada a amostra, é necessário achar
exatamente o local da indentação para fazer a varredura. Uma técnica muito utilizada é
fazer muitas indentações iguais em diversos locais da amostra para não ter o problema de
localização. Na figura 60 vemos os componentes do nanoindentador e o cálculo da
profundidade p de penetração, em função da deflexão d do cantilever e do deslocamento z
do piezo: p=z-d. As forças de carga utilizadas neste tipo de experiência são da ordem 0,1 a
10 mN dependendo do material a ser estudado.

Figura 60: Nanoindentador.

As próximas três figuras, 61, 62 e 63 mostram as imagens feitas em nosso laboratório, da


indentação de filmes e do perfil do buraco produzido.
Figura 61: Indentação de um substrato de Silício. Ezquerda, imagem bidimensional; direita,

imagem tridimensional e embaixo, imagem tridimensional invertida.


Figura 62: Indentação de um filme composto de 80% de carbono e 20% de hidrogênio. Perfil do furo.

Figura 63: Indentação do mesmo filme de carbono e hidrogênio da figura anterior. Imagens do furo
normal e invertido.
1. B.Bhushan: Tribology and Mechanics of Magnetic Storage Devices. Springer, Berlin, Heidelberg,
Rugosidade

Até recentemente, a indústria não tinha dado muita atenção à microrugosidade.


Atualmente, o seu controle tornou-se importante devido ao necessário incremento da
qualidade dos materiais. Em 1990, com a aparição do AFM, começaram as medições de
nanorugosidade em silício. Uma das experiências mais correntes hoje em dia é medir a
variação da rugosidade com a temperatura1.

Os nanoscópios já tem um software apropriado para estas medições. Ele funciona da


seguinte maneira: feita a imagem da superfície a ser medida, define-se uma média
aritmética Z como a soma de todos os valores da altura nessa direção, dividida pelo número
N de pontos utilizados no perfil:

<Z> = (1/N) ∑ Zi

onde a soma é de i=0 até N. O parâmetro mais freqüentemente utilizado para a rugosidade é
o Ra: média aritmética dos desvios em altura do valor médio acima. Este valor é dado por

Ra = (1/N)∑ | Zi - <Z>| ,

onde a soma é de i=1 até N.

Considerando a estatística de alturas máximas dos picos, definem-se os parâmetros Rp e


Rt. Rp é a altura máxima do perfil acima da linha média e Rt é a altura máxima do pico ao
vale, no perfil.

Rp = Zmax - <Z> e Rt = Zmax - Zmin.

O perfil como um todo, pode ser melhor representado pelos valores médios das grandezas
anteriores:

<Rp> = (1/Y) ∑ Rpi ; <Rt> = (1/Y) ∑ Rti,

sendo as somas de i=1 até Y. O algoritmo do software para as medidas de perfis de


superfícies deste tipo, utiliza o valor Y=20, que leva em conta os 20 pontos mais altos do
perfil.

1. R.Prioli, S.I.Zanette, A.O.Caride, M.Lacerda, F.L.Freire. Diamond and Related Materials, 8 (6), p. 933 (1999).
Nanotecnologia

Com o desenvolvimento da microeletrônica nos defrontamos cada vez mais com


estruturas em escalas por baixo de 100nm. A transição da microtecnologia (dimensões
laterais de 0,1 a 100 µ m) para a nanotecnologia (dimensões laterais de 0,1 a 100nm)
requer a habilidade de fabricar estruturas menores, assim como a capacidade de exploração
e aplicação de fenômenos físicos novos que acontecem em escalas nanométricas. Algumas
coisas interessantes dentro deste contexto são:

1. -Nanoposicionamento e nanocontrol de processos.


2. -Mecanismos de nanoprecisão.
3. -Descobrimento e/ou fabricação de superfícies super lisas.
4. -Fabricação de estruturas em escalas nanométricas.
5. -Análise das estruturas nessa escala.
6. -Entendimento das propriedades físicas da matéria em escala nanométrica.
7. -Por último, é essencial conseguir uma relação clara entre o mundo macroscópico e
o nanoscópico.

Como vimos no decorrer de estas notas, a maioria dos itens acima relacionados, já são
realidade, graças às técnicas de SPM. Os instrumentos de varredura por sonda permitem a
fabricação e manipulação de estruturas em escalas nanométricas podemdo-se até construir
uma estrutura por arrumação de átomos. Ainda mais, a nanotecnologia é versátil o
suficiente como para que, com pequenas modificações, seja aplicável a diferentes tipos de
problemas.

Estudo e Fabricação de estruturas em escala nanométrica. O primeiro item que


deve ser levado em conta é a não destruição da amostra em estudo. Para isto, como já
vimos, as forças de interação devem ser mantidas dentro do valor apropriado, e isto é feito
por ajuste dos parâmetros experimentais. Quando aumentamos a interação ponteira-amostra
por cima destes valores limites, obtemos como resultado modificações locais, em geral
sobre a superfície da amostra. São estas modificações (indesejáveis durante uma operação
normal de feitura de imagens), que permitem a fabricação de pequenas estruturas em escala
nanométrica.

Para trabalhar especificamente em nanoindentação, é necessário conseguir distinguir o


que se está indentando ou "escrevendo" sobre a superfície. Para isto, a primeira condição é
que ela seja extremamente lisa, o que quer dizer que ela deve ter rugosidade
consideravelmente menor que a indentação. Neste contexto, o substrato é muito importante.
Ele deve ser em geral feito de materiais em camadas (para obter uma clivagem apropriada).
Por exemplo, utilizam-se como substratos, grafite, mica, óxidos de cobre em camadas,
semicondutores (Si, Ge) ou metais monocristalinos (Au, Pt, Ni) preparados em condições
de ultra alto vácuo, filmes metálicos finos (Au sobre mica), materiais amorfos
(semicondutores ou metais) depois de removido o óxido da superfície, etc.
Em um processo de indentação, são parâmetros importantes, a medida das estruturas
escritas, o erro no processo de escrita, a velocidade da escrita e as condições ambientais
durante o processo, que podem afetar a estabilidade da escrita.

Quando se faz litografia com feixe de elétrons, utilizam-se filmes resistentes aos elétrons,
como por exemplo PMMA (polimetilmetacrilato) que é isolante. Os elétrons de alta energia
penetram vários micrômetros no substrato sólido dos filmes, gerando "chuveiros" de
elétrons secundários que se espalham no volume e que "escrevem" em regiões não
desejadas na experiência.

Na litografia por STM utilizam-se elétrons de baixa energia e portanto não é necessário o
uso de filmes resistentes. Com o AFM o problema mencionado também não se apresenta
pois não há corrente envolvida no processo.

Modificações mecânicas das superfícies. Usando as forças de interação ponteira-


amostra podemos fazer modificações superficiais locais por STM ou por AFM.
Dependendo do valor da força aplicada e do modo de operação, as modificações podem ser
desde escala submicrométrica até escala atômica.

Varrendo a ponteira no modo de contato, podem ser desenhadas linhas de largura


submicrométrica sobre a amostra, apenas furando a superfície. Também podem ser feitos
pontos sobre a amostra. Tudo isto com muita precisão já que o AFM permite a medição e o
controle direto da força de interação ponteira-amostra. A primeira vez que isto foi feito 1, foi
por remoção local de um filme de fosfato de octadecil (C18P) previamente depositado sobre
mica. Isto foi realizado aumentando acima de 10-6N a força aplicada enquanto se fazia a
varredura. A resolução lateral do processo de escrita é da ordem de 10nm.

1. Albrech, T.R. Ph.D. Thesis, Stanford University, Standford, California.


Elasticidade e Plasticidade

Em 1992(1) foram desenhadas linhas de 70 nm de largura e 10 nm de profundidade sobre


um substrato policarbonado. Nessa experiência, a força aplicada usando um cantilever de
Si3N4 foi posta acima de 5x10-8 N. Assim, foi estudado o limite de deformação plástica
local da amostra, que depende da geometria da ponteira e das propriedades de elasticidade e
plasticidade do substrato policarbonado.

Na figura 64 mostra-se o comportamento em resposta à indentação, de duas amostras


ideais.

Na parte superior, a indentação é de um material elástico ideal e a figura mostra o


incremento da carga sobre a amostra em função da profundidade de penetração. Não há
histerese na curva, nem quando se volta a carga nula, com a retração do indentador. Isto
não acontece com um material plástico ideal, como se mostra na parte inferior. As curvas
para aumento e diminuição da carga, não são coincidentes.

Figura 64: Curvas de indentação para um material idealmente elástico (parte superior) e plástico
(parte inferior).
O comportamento dos materiais reais é uma mistura de ambas respostas anteriores. As
propriedades elasto-plásticas podem ser determinadas diretamente das curvas de carga e
descarga.

A geometria do indentador determina a dependência funcional da curva de carga para


materiais elásticos. Na figura anterior, a carga tem uma dependência com o quadrado da
profundidade de penetração. Isto acontece em geral com indentadores cônicos. Existem
trabalhos(2) estudando as soluções para a dependência funcional entre a carga e a
penetração, para indentadores de geometrias diversas. Por exemplo, para um indentador
esférico e pequenas profundidades de penetração, a carga é proporcional à potência 3/2 da
profundidade e para um indentador cilíndrico, com extremidade plana, a dependência
funcional da carga é linear com a profundidade.

O módulo de elasticidade E*, diretamente proporcional ao módulo de Young E, pode ser


determinado a partir da curva de indentação para um material elástico. Entretanto, como a
maioria dos materiais são elasto-plásticos, E deve ser calculado a partir da contribuição
elástica na curva. Por exemplo, para uma ponteira com extremidade esférica de raio R
(suposta de deformação desprezível) e supondo uma amostra de propriedades elásticas
homogêneas e isotrópicas(3) , a penetração em função da carga é p3 = α Fc2. Neste caso, α
=9π 2/16 E*2R, onde E*= π E/(1-ν 2) e ν é o quociente de Poisson.

A dureza pode ser também determinada das curvas, sem considerar a parte elástica, como
a máxima carga dividida pela área projetada de contato entre o indentador e a amostra, após
a amostra ter-se recuperado elasticamente.

Antes de janeiro de 1989, alguns autores reportaram ter feito indentadores em


laboratório, com resolução em força de 100 nN mas, o melhor sem dúvidas, é o reportado
por Burnham e Colton(4), usando, é claro, um AFM, com uma resolução de força de 1 nN e
de profundidade de 0,02 nm.

Nessa experiência, os parâmetros medidos são os que determinam as propriedades elasto-


plásticas, isto é, módulo de elasticidade, rigidez, dureza, as forças superficiais associadas à
interação ponteira-amostra e a força adesiva, isto é, a força adicional necessária para
separar duas superfícies depois de elas terem entrado em contato. A grandeza das forças de
adesão depende das propriedades dos materiais, tanto da ponteira quanto da amostra, assim
como do material da interface.

Mede-se ainda, força de carga em função da profundidade de penetração ou em função


da posição da amostra.

As forças de superfície são extremamente importantes nos contatos nanoscópicos. O


primeiro que acontece quando duas superfícies entram em contato é uma deformação
elástica. As forças de interação ponteira-amostra são determinadas na forma convencional,
medindo a deflexão do cantilever. Força nula é definida como a posição de cantilever
quando a amostra está muito longe. Força positiva sobre a amostra é definida quando o
cantilever é curvado para acima, e negativa quando ele se curva na direção da amostra. A
posição nula para a amostra é definida como a voltagem de realimentação necessária para
pôr o cantilever na sua posição zero, ou de repouso. A posição da amostra é negativa
quando ela se encontra suficientemente longe do cantilever e positiva logo após ela ter
puxado o cantilever e tê-lo feito abandonar sua posição de equilíbrio. A profundidade de
penetração p é definida, como já dissemos anteriormente, como a diferença entre a
distância za que se moveu a amostra, e o deslocamento zp sofrido pela ponteira. Foi
escolhida uma ponteira de extremidade cônica, feita de arame de tungstênio de 0,25 mm de
diâmetro, pois o tungstênio tem um alto módulo de elasticidade: 420 GPa. Assim, se
consegue minimizar a deformação da ponteira durante a indentação. Uma imagem feita por
SEM mostrou que o raio de curvatura da ponteira tinha entre 100 e 200 nm, e o ângulo era
da ordem de 100. Esta ponteira foi moldada separadamente e colada ao tungstênio com
pintura de prata. Isto permite mudar a extremidade dissolvendo a pintura em metanol. O
instrumento foi operado em ar e em condições ambiente. Para minimizar os efeitos do
ambiente, as amostras foram escolhidas por serem bastante inertes: grafite altamente
orientado, ouro, e borracha. Também foi levado em conta que as amostras deveriam ter
comportamentos característicos de materiais plásticos e elásticos. O grafite e a borracha são
elásticos e o ouro, plástico. Antes da experiência, o grafite foi esfoliado com fita adesiva e
o ouro preparado com produtos químicos. A borracha não sofreu nenhuma preparação.

Os resultados da nanoindentação são mostrados na figura 65.


Figura 65: Profundidade da indentação. (a) Material elástico; (b) Material plástico.

Na parte superior, estão as curvas para os materiais elásticos. Vê-se que a borracha se
comporta quase idealmente. As forças aumentam linearmente com a profundidade da
indentação até uma carga de 1,1 µ N. Nesse ponto, o indentador penetrou 450 nm na
superfície da amostra. O grafite também mostra um comportamento linear. A uma
profundidade máxima de penetração de 85 nm, a carga é de 4,2 µ N. Entretanto, há um
pouco de histerese quando a carga diminui e a ponteira fica a aproximadamente 12 nm a
força nula. Isto normalmente seria interpretado como a profundidade plástica. Todavia,
como depois de várias indentações, os resultados são os mesmos, os autores acham que a
histerese é devida à adesão entre a ponteira e o grafite, inclusive porque o grafite e a
ponteira interagem muito fortemente via forças de superfície.

Como não se conhece exatamente a forma da ponteira e como a carga varia linearmente
com a profundidade de penetração, se supõe que a indentação é melhor descrita pela
solução de Sneddon correspondente a um indentador rígido, cilíndrico e de extremidade
plana, teoricamente não adesivo. A relação para tal é dada por
F = 2Erp/(1-v2),

onde F é a força de carga aplicada, r o raio da área de contato e p a profundidade da


penetração.

O raio da área de contato na superfície é desconhecido e portanto supõe-se que seja igual
ao raio da ponteira. Então, usando um r de 100 nm e valores de v de 0,45 e 0,30 para a
borracha e o grafite respectivamente, o valor de E calculado resulta 10 MPa para a borracha
e 225 MPa para o grafite. Apesar de que na literatura não foram achados valores reportados
para o módulo de borracha e grafite comuns, como os usados na experiência, existem
valores reportados de 0,35 a 21 MPa para borracha de isoprene e de 3,5 a 28 GPa para
grafites carbônicos e industriais(5).

Note-se a diferença de valores; isto pode ser explicado pensando que os valores
reportados em 1979 não foram obtidos com experiências nanométricas, sendo esta mais
uma evidência de que, como já dissemos, o comportamento dos materiais em escala
nanométrica, em geral, difere daquele macroscópico.

Na parte inferior da figura 65 vemos que as curvas de carga e descarga para uma folha
grossa de ouro se comportam como aquelas correspondentes a um material plástico ideal.
Para uma força de 20,3 µ N a penetração é 103 nm. Não há componente elástica na
descarga. Usando 100 nm para o raio da ponteira, visando estimar o raio da área de contato,
a dureza calculada é 0,65 GPa. O valor aceito para o bulk é 0,5 GPa. Todavia, já foi
mostrado(6) que para pequenas áreas de contato, a dureza aparente é maior que os valores
do bulk. Deve levar-se em conta sempre que as forças reais que agem nesta experiência
podem ser maiores que as reportadas pois o contato ponteira-amostra pode mudar a rigidez
do sistema.

Uma limitação nas medidas tradicionais de indentação é a necessidade de fazer a imagem


da superfície após a indentação, com o objetivo de determinar a área do material deformado
plasticamente. Isto não acontece com o AFM pois a profundidade de indentação pode ser
medida diretamente e, mais ainda, a imagem pode ser feita sem problemas, como foi
mostrado anteriormente (ver figuras 61 a 63).

Devido a que a folha de ouro é plástica, os autores não conseguiram fazer a imagem com
contato sem causar danos na superfície, mas a do grafite foi feita, conseguindo-se resolução
atômica, inclusive com altas cargas de até 10 µ N. Com este valor de força o grafite se
deforma em até 200 nm.

Antes da ponteira tocar a amostra, o cantilever é atraído pelas forças de superfície. A


interação pode ser bem entendida dos diagramas de força (ou aqui neste caso, energia
potencial) que já conhecemos. O cantilever, pela lei de Hooke, terá um potencial dado por
U1=(1/2)kz2. O potencial da interação ponteira-amostra é U2 e tem termos atrativos e
repulsivos tal que apresenta um mínimo de potencial perto da superfície da amostra (à
distância aproximada de um átomo). O potencial total do sistema ponteira-amostra é
Ut=U1+U2. Como uma bola colocada no fundo de um poço, a ponteira ficará em um
mínimo do potencial de interação total. Esse mínimo mudará em função da distância de
interação.

As figuras 66 e 67 mostram duas interações diferentes entre ponteira e amostra, sendo


que a primeira representa um potencial de interação superficial forte e a segunda um fraco.
A interação ponteira-amostra U2 é representada por um potencial atrativo mais um
repulsivo (forte na primeira figura) da forma -α /(z-a)2 + β (z-a)3; a(t) representa a
separação ponteira-amostra em função do tempo e α e β são parâmetros que controlam a
relativa força dos potenciais.

Figura 66: Energia potencial de interação forte entre a ponteira e a amostra.

Na parte (a) da figura 66, Ut tem três extremos locais na distância entre a posição de
repouso do cantilever e a superfície da amostra. A ponteira ficará perto do z=0 até que o
máximo em Ut desapareça como acontece na parte (b). Quando a curvatura (segunda
derivada de Ut em relação a z) perto do máximo de Ut se torne positiva, haverá apenas um
mínimo em Ut. Neste ponto, o cantilever se move bruscamente tal que a ponteira fica na
profundidade do mínimo perto da amostra (parte (c) ). O efeito total das forças fortes sobre
o cantilever é que elas fazem-no pular para o contato quando a amostra se aproxima. O
comportamento inverso é esperado quando a amostra se retrai, mas ele acontece a um valor
diferente de a(t).

Figura 67: Energia potencial de interação fraca entre ponteira e amostra.

Na figura 67, o processo é o mesmo que o anterior, mas o potencial de interação U2 é


fraco.
Neste caso, Ut só tem um extremo ao longo da distância de interação. Quando a(t)
decresce, o mínimo de Ut se move suave e continuamente perto da superfície. A ponteira
entra e sai (deslizando) do contato.

Na figura 68 mostram-se exemplos de como a ponteira entra e sai do contato. A força


associada com a interação ponteira-amostra é representada em função da posição da
amostra. Os números dados para a posição da amostra não são as separações reais da
ponteira. Essa separação não é conhecida exatamente pois haverá uma quantidade pequena,
desconhecida, de deformação elástica da superfície, quando a ponteira faz contato.

A força nula é definida na posição de repouso do cantilever, quando não há interação


detectável. A posição zero da amostra é aquela que devolve o cantilever à sua posição de
repouso. A medida que a amostra se aproxima e começa a entrar na região atrativa, o
cantilever se move na direção da amostra (força negativa). No contato, o cantilever inverte
a direção de deflexão. A amostra continua a mover-se para a frente, empurrando o
cantilever para atrás. A amostra tem então uma carga positiva aplicada sobre sua superfície.
É deste quadrante no gráfico, que são feitas as curvas de carga/descarga para a indentação.
Quando a direção da amostra é invertida, a carga sobre ela vai diminuindo até que se
quebra o contato.
Figura 68: Força associada à interação da ponteira de tungstênio. (a) Com grafite; (b) Com ouro.

Na parte (a) mostra-se a interação entre a ponteira de tungstênio e a superfície de grafite.


Quando a amostra e a ponteira se aproximam, a ponteira pula ao contato. A inclinação da
curva correspondente ao pulo na parte (a) desta figura 68 e nas partes (a) e (b) da próxima
69 (que é a mesma anterior, mas para pequenas cargas, devidas apenas a forças superficiais
e não provocadas) é atribuída a uma constante de tempo finita do sistema de controle de
realimentação.

Figura 69: Força associada à interação da ponteira. (a) e (b) com grafite; (c) com ouro.

A curva de carga para grafite, semelhante àquelas ideais, é linear e elástica. Não há
histerese quando diminuímos a carga, até o ponto em que é feito o contato inicial. Quando
se sai do contato, a ponteira está mais longe da amostra que quando estava prestes a entrar
em contato. A força adicional necessária para romper o contato é atribuída a adesão e a
forças superficiais entre a ponteira e a amostra.

Na parte (b) da figura 68, mostra-se a interação ponteira-amostra, entre uma ponteira de
tungstênio e um filme de ouro evaporado sobre vidro, de 100 nm de espessura. Nela vemos
que neste caso, a ponteira "desliza" ao contato. As curvas de carga e descarga não são
lineares e há uma parte plástica. Mais ainda, há evidências de adesão. O comportamento
elasto-plástico da amostra de filme difere um pouco dos resultados reportados para o bulk
na parte (b) da figura 65. A diferença consiste em que poderia haver alguma recuperação
elástica devida à utilização de vidro como substrato. Como já dissemos, o substrato pode
causar efeitos indesejáveis quando a penetração é maior que o 10%.

A maior diferença entre as partes (a) e (b) da figura 68, está na região atrativa. No caso do
grafite, a ponteira pula ao contato e desliza para fora dele. No ouro, a ponteira desliza para
dentro e para fora do contato. A distância à qual as forças superficiais são observáveis é
também muito diferente para os dois casos. Isto pode ser explicado com um modelo
apropriado de interação.

Comparando as figuras 66 e 67, para potencial U2 forte a ponteira não apenas pula ao
contato, mas se move uma distância maior em z que para o potencial U 2 fraco. As escalas
utilizadas nas figuras para U e z foram escolhidas representativas de uma ponteira de raio
de curvatura de 100 nm. A ponteira utilizada para os dados mostrados na figura 68 era de
maior tamanho, mas não pôde ser caracterizada.

O deslocamento do piezelétrico da amostra pode ser controlado o suficiente como para não
aplicar carga ou aplicar cargas muito pequenas. Na região atrativa, a interação ponteira-
amostra é devida somente a forças superficiais. O cantilever não contribui com carga
nenhuma e, portanto, não há danos na amostra. Na figura 69 se mostra a interação da
ponteira de tungstênio com a superfície de grafite, para uma carga muito pequena sobre a
amostra. Comparando a parte (a) dela, com a parte (a) da figura 68, vemos que, ainda que a
forma da curva na região atrativa é praticamente a mesma, as distâncias para as quais a
ponteira pula ao contato ou sai dele, são muito diferentes.

A ponteira utilizada na experiência mostrada na figura 69(a) era de muito menor


tamanho que a outra (a interação atrativa deve ser menor, quanto menor é o tamanho da
ponteira).

A idéia agora é desenvolver um modelo simples para as forças de superfície, que considere
o comportamento do cantilever na região atrativa e o valor da distância Dj à qual seria
razoável que ele pulasse ao contato. Em primeira aproximação, a parte repulsiva do
potencial, não será levada em consideração. Se a ponteira é considerada esférica e a
superfície plana, então, a parte atrativa do potencial de interação ponteira-amostra pode ser
expressada por(7)

Ua = - HR/6D,
onde R é o raio da esfera, D é a distância entre a esfera e a superfície e H é a constante de
Hamaker que, como já foi dito, está relacionada com a densidade dos materiais, a interação
dipolar e o meio no qual estão os materiais. Para a maioria dos sólidos, o valor de H varia
entre 0,4 e 4x10-9 joules.

A equação anterior pode ser usada para estimar H para o sistema grafite-tungstênio, em ar,
à temperatura ambiente. Fazendo a primeira derivada do potencial em relação à distância,
temos que a força superficial é dada por

F = -dUa/dD = -HR/6D2.

A deflexão do cantilever em direção à amostra é uma medida direta da força atrativa e é


dada por -kzt . Na superfície da amostra, com R=100 nm, D=0,2 nm, k=50 N/m e z t=2,7
nm, H resulta 3,2x10-19 J. O cantilever pulará na amostra se a curvatura de Ua exceder a de
U1 ou, em outras palavras, se o gradiente da força de Ua, excede o gradiente de U1. Ambos
são a segunda derivada do potencial em relação à distância e representam o ponto no qual o
potencial total tem só um mínimo (ver figura 66(b)). Fazendo a segunda derivada da
equação anterior, obtemos

d2Ua/dD2 = -HR/3D3,

onde o valor desta segunda derivada deve ser no mínimo -50 N/m para que o cantilever
pule. Com os valores utilizados, calcula-se que o pulo dá-se à distância Dj=0,6 nm.

Apesar de se entender o porquê da ponteira pular ao contato, como se mostra na figura


69(a), a figura 66 indica que ela também deveria sair pulando do contato quando a retração
da amostra atingir um certo valor suficiente para isso. Na verdade, pode haver quatro tipos
de comportamentos diferentes. Eles são: pulo para dentro e para fora do contato,
deslizamento para fora e para dentro, deslizamento para dentro, pulo para fora e vv. Os dois
primeiros são explicados com a ajuda das figuras 66 e 67. O deslizamento para dentro, pulo
para fora, foi observado somente depois da aplicação de uma carga muito grande sobre o
material. Nesse caso, a deformação da amostra, ou a adesão, possivelmente agem para fazer
crescer o potencial de interação criando o comportamento de pular para fora. O pulo dentro,
deslizamento fora, foi observado somente em grafite. O potencial de interação forte causa o
pulo. Se as forças de superfície são suficientemente grandes como para deformar a amostra,
quando o suporte dela é retraído, a superfície pode deformar-se tal que permaneça próxima
à ponteira. Ou seja, a superfície do grafite se expande para manter a forte interação
ponteira-amostra. A deformação elástica do grafite induzida pelas forças de interação entre
a ponteira e a superfície, foi usada para explicar as corrugações gigantes que aparecem em
algumas imagens de grafite feitas com STM.

A força que age sobre a superfície é -HR/6D2. Quando a ponteira está a 5 nm acima da
superfície, a força calculada é de 0,2 nN e a 0,2 nm é de 133 nN. A rigidez da superfície do
grafite pode ser estimada tomando a primeira derivada da força em relação à penetração:
dF/dp = 2Er/(1-v2) que resulta em um valor da ordem de 50 N/m. Supondo que a amostra
tem uma constante de mola desse valor, a deformação da superfície causada por uma força
de 0,2 nN será 0,2 nN/50(N/m) ≅ 0,004 nm. Uma força de 133 nN deforma a amostra em
2,7 nm. Vemos portanto que, para as interações ponteira-amostra a distâncias atômicas, a
deformação da superfície de grafite pode ser significativa. Então, à medida que a amostra é
afastada, a sua superfície se deforma, tentando seguir o cantilever na direção de sua posição
de repouso, após o que, pode ocorrer eventualmente que a amostra se separe da ponteira e o
cantilever pule uma pequena distância, até a sua posição de repouso. Na figura 69(a) vemos
que isto acontece quando a amostra está na posição perto de -60 nm e, na figura 68(a) ,
perto de -150 nm.

O pulo ao contato e o deslizamento para fora em grafite é reproduzível: a aproximação


da ponteira é a mesma para centos de tentativas. De fato, o comportamento pode ser visto
até depois de ser aplicada uma carga muito pequena, ou ainda sem carga. Portanto, a
modificação no comportamento da ponteira, deve ser via forças de superfície.

Um bom controle da posição da amostra permite estudar o regime de forças de carga


muito pequenas. Vejamos agora a parte da curva da figura 69(a), exatamente onde a
ponteira entra em contato com a superfície. Isto mostra-se novamente na figura 69(b) para
grafite, onde a deflexão do cantilever, depois de fazer contato, é menor que 0,25 nm. Na
parte (c) da figura 69 vê-se a mesma coisa para o ouro. Nela, a força de carga é totalmente
proveniente de forças superficiais já que o cantilever é flexionado na direção da amostra.

As partes (b) e (c) da figura 69, podem ser interpretadas como as curvas de indentação da
figura 65, levando-se em conta que o eixo x é nelas a posição da amostra em vez da
profundidade de penetração. A limpeza na superfície da amostra não foi controlada nesta
experiência, mas espera-se que a força adesiva dependa não apenas da preparação da
amostra como também das condições ambientais.

Considerações gerais:

-A resolução em força destas curvas é menor que 1 nN.

-A figura 69(b) mostra o grafite como sendo praticamente elástico. A força necessária para
começar a separar a ponteira da amostra depois que foi retirada a carga de 11 nN, é de 2 nN
(adesão).

-Na figura 69(c) , a ponteira interage com ouro de uma forma elasto-plástica. Após a
aplicação de uma força de carga de 4 nN (que corresponde a uma variação na deflexão do
cantilever de 0,08 nm para um nível de ruído de 0,01 nm) é necessário adicionar 10 nN
para começar a separar a ponteira da amostra. Esta força necessária, maior para o ouro, se
deve provavelmente a mudanças causadas tanto por plasticidade quanto por adesão.

1. Jung,T.A.,Moser,A.,Hug,H.J.,Brodbeck,D.,Hofer,R.,Hidber,H.R. and Scharz,U.D.


(1992).Ultramicroscopy 42-44,1446.
2. I.N.Sneddon, Int.J.Eng.Sci.3,47 (1965)
3. M.Radmacher, R.W.Tillmann, M.Fritz, H.E.Gaub. Science 257, 1900 (1992).
4. N.A.Burnham and R.J.Colton,J.Vac.Sci.Technol.A, vol7,N.4 (1989)
5. Mater. Eng. 90(6), C120 (1979).
6. M.D.Pashley,J.B.Pethica,and D.Tabor,Wear 100,7 (1984)
7. Yu.N.Moiseev,V.M.Mostepanenko,V.I.Panov,andI.Yu.Sokolov,Phys.Lett.A 132, 354 (1988).
Microscopia de Força ELetrostática (EFM)

Um microscópio para detectar força elétrica, ou EFM (electrostatic force microscope) é


uma modificação do microscópio de força atômica utilizado no modo de operação de não-
contato. Com ele pode-se estudar a distribuição de cargas elétricas sobre uma superfície,
determinar o sinal dessas cargas, medir capacitâncias, etc.

Quando duas superfícies entram em contato, em geral trocam cargas e, se depois se


separam, ficam carregadas com cargas opostas. Isto se observa nos eventos mais
corriqueiros do dia a dia, como em partículas de gelo das nuvens, a sola de sapato no
carpete e as partículas de toner nas copiadoras e impressoras eletrofotográficas. Apesar
disto, os fenômenos de triboeletrificação estão ainda por serem bem explicados. A
eletrificação por contato é classificada em três categorias: contato metal-metal, metal-
isolante e isolante-isolante. No contato metal-metal, que é o único que se conhece bem, foi
mostrado que há corrente de elétrons até que os dois níveis de Fermi(1) se equilibrem. As
outras duas categorias não têm sido até agora bem entendidas e há dados conflitantes, como
por exemplo, que no contato metal-isolante com vários metais, a carga do isolante só
depende do último metal utilizado para o contato. Outras opiniões, mantêm a idéia de que o
isolante acumula a carga de cada contato, para cada metal independentemente.
Identificando os sítios de carga com resolução atômica, isto pode ser melhor entendido.

1. Maior nível de energia ocupado à temperatura zero.


Detecção de cargas

A microscopia de força eletrostática permite pesquisar as propriedades elétricas na


superfície da amostra. O princípio é simples: considerando o sistema amostra-cantilever, se
houver alguma carga na superfície, ela induzirá outra igual e de sentido contrário numa
ponteira metálica. Isto terá como conseqüência que, uma força atrativa, proporcional à
carga (e inversamente proporcional ao quadrado da distância) faça o cantilever sofrer uma
deflexão no sentido da superfície, como se houvesse um buraco nela. Fazendo diversas
varreduras, por exemplo por camadas, o que significa a diferentes distâncias ponteira-
amostra, podemos determinar se trata-se realmente de topografia ou de carga já que a força
elétrica é dominante para distâncias entre 30 e 300nm.

A experiência de detecção de cargas na superfície foi feita por primeira vez por Martin et
al(1) da IBM de NY, no final de 1987 e depois por Stern et al(2) em 1988 e por Terris et
al(3) em 1989.

Aplica-se uma voltagem bias de alterna, V0 sen(ω 2t) entre a ponteira e um eletrodo
localizado embaixo da amostra dielétrica. A voltagem de alterna produz uma carga de
oscilação Qe sobre o eletrodo, e uma carga igual e de sinal contrário sobre a ponteira. Uma
carga estática local Qs sobre a superfície da amostra induzirá adicionalmente uma carga
imagem igual e de sinal contrário sobre a ponteira, tal que a carga total sobre ela seja Qt = -
(Qe + Qs) . Supondo um modelo simples de carga pontual, Terris et al derivaram uma
expressão para a força resultante entre a ponteira e o eletrodo e, conseqüentemente, para o
gradiente de força que é medido experimentalmente. Devemos lembrar que no modo de
não-contato, medimos gradientes: variação da amplitude a gradiente de força constante ou
variação do gradiente de força devida à mudança da freqüência de oscilação do cantilever
(FM).

1. Appl. Phys. Lett 52 (13), 1988.


2. Appl.Phys.Lett. 53 (26), 1988.
3. Phys.Rev.Lett.63 (24), 1989.
Deposição de cargas e detecção de forças

Vejamos primeiro como se carregam as amostras utilizadas.

Amostras isolantes tais como de PMMA (polimetil metacrilato), limpo com solvente, ou
de monocristais de safira, ou outras, podem ser carregadas in situ, isto é, aplicando à
ponteira um pulso de alta voltagem (tipicamente 100 volts durante alguns mili-segundos) o
que produz uma descarga localizada com uma voltagem limiar determinada pelo potencial
de quebra do ar para uma geometria particular ponteira-amostra. O sinal da carga
superficial depositada está determinado pela polaridade do pulso de voltagem.

Já com a superfície carregada, como resultado da interação atrativa entre a carga


superficial local e a carga imagem induzida sobre a ponteira, o gradiente de força varia
(cresce) a medida que a ponteira se aproxima da superfície carregada. Monitorando a
voltagem de realimentação e mantendo a ponteira aterrada, varre-se a amostra,
conseguindo-se a imagem dos contornos do gradiente de força constante.

Neste sistema há três contribuições ao gradiente de força: 1) a força eletrostática sobre a


ponteira devida à distribuição de cargas na superfície; 2) a força eletrostática devida à
voltagem aplicada entre a ponteira e o eletrodo embaixo da amostra; 3) a força de van der
Waals entre a ponteira e a amostra. Então, se a superfície não estiver carregada e não se
aplica a voltagem no eletrodo, a ponteira só detectará o gradiente da força atrativa de van
der Waals. Entretanto, com uma carga na superfície, o gradiente da força aumentará à
medida que a ponteira varrer a região carregada pois haverá uma interação atrativa entre a
carga da superfície e a carga induzida na ponteira. O aumento do gradiente da força causará
uma retração da amostra (como se houvesse uma rugosidade) através do sistema de
realimentação, programado para manter esse gradiente constante.

Figura 70: Contornos de gradiente de força constante.


Fazendo uma varredura de linha sobre a região carregada, isto aparecerá na imagem como
uma "lombada" sobre a região carregada, ou ainda, fazendo a imagem bidimensional,
aparecerá um ponto brilhante. Isto pode ser visto na figura 70, que mostra os contornos de
gradiente de força tomados a intervalos de três minutos no centro de uma região de carga
depositada sobre PMMA e, no quadro interno, a imagem bidimensional.

A altura inicial do pico corresponde a um aumento de 0,5 µ m na separação ponteira-


amostra, medida a partir da região sem carga onde se inicia a varredura. Na figura se
observa que o contraste decai com o tempo, dando assim evidência da mobilidade da carga
superficial. A constante de tempo de decaimento depende criticamente do tipo de isolante
que foi carregado para a experiência.

O decaimento das cargas neste estudo nanoscópico é muito mais rápido que o das
experiências macroscópicas feitas nos mesmos materiais. Isto é mais uma evidência de que
os mecanismos em nível nanoscópico são em princípio bastante diferentes de aqueles em
nível macroscópico.

Usando um EFM de alta sensibilidade é possível monitorar o decaimento de carga,


inclusive com resolução monoeletrônica3 . Após o depósito de cargas sobre filmes isolantes
de Si3N4, por aplicação de um pulso de voltagem na ponteira, foi observada uma
"escalinata" descontínua no gráfico do sinal de força em função do tempo, mostrando assim
uma resolução de portadores de carga como se vê na figura 71.

Figura 71: Força em função do tempo, para dois decaimentos de carga2 .

Nela temos a representação gráfica da força em função do tempo para um filme de Si3N4
carregado positivamente, de espessura de 20 nm. Mostram-se dois exemplos de
decaimentos sucessivos da força, que têm praticamente a mesma forma. A distância entre a
ponteira e a superfície é de 25 nm (no limite de detecção de cargas) e o raio da ponteira é de
40± 20 nm. O campo elétrico aplicado é E = (1,5± 0,4)x108 V/m. Para os dois exemplos, a
voltagem de descarga foi de +8V. Os decaimentos das cargas parecem descontínuos,
apresentando platôs. O eixo f = F1/eE é uma escala para o tamanho esperado de um degrau
resultante do decaimento de um portador de carga no campo E. ∆ f é a medida do degrau e
não é constante pois depende da posição relativa entre as cargas e a extremidade da
ponteira. No final da curva (a) há um degrau marcado com uma seta, o qual parece subir em
vez de descer. Aparentemente isto não é devido ao campo elétrico, pois tais degraus
aparecem também sem excitação, e experimentalmente vê-se que a altura do degrau
diminui se aumentarmos a distância entre a ponteira e a amostra. Uma causa possível desta
anomalia pode ser atividade térmica.

Como alternativa à técnica de pulsos para carregar superficial e localmente uma amostra, a
ponteira e a superfície podem ser postas em contato enquanto são aplicados alguns volts
sobre a primeira. O sinal da carga superficial depositada é determinado pela polaridade da
voltagem aplicada à ponteira e, quanto maior a voltagem, mais carga é transferida. Por
outra parte, a quantidade de carga transferida é quase independente do tempo de contato
entre a ponteira e a amostra e do número de contatos feitos.

Figura 72: Imagem de cinco regiões de cargas, três positivas e duas negativas1.

Na figura 72 vemos o resultado desta experiência: é a imagem da carga de 5 regiões de


cargas depositadas, três positivas (regiões brancas) e duas negativas (pretas) sobre
superfícies policarbonadas.

1. Appl. Phys. Lett 52 (13), 1988.


2. Appl.Phys.Lett. 53 (26), 1988.
3. Schonenberg and Alvarado. Phys.Rev.Lett. 65 (25), 1990.
Triboeletrificação. Cargas de polarização

O EFM pode também ser usado para estudar eletrificação de contato ou


triboeletrificação, na qual a superfície é tribocarregada pondo a ponteira em contato sem
aplicar uma voltagem externa (isto também foi feito por Terris et al no trabalho
mencionado anteriormente). Após tribocarregar uma superfície de PMMA com uma
ponteira de Ni, foram achadas também regiões de cargas tanto positivas quanto negativas,
ainda que o sinal predominante da carga depositada era positivo, de acordo com medidas
macroscópicas, feitas usando um voltímetro eletrostático. A transferência de carga bipolar
foi inesperada e evidencia o potencial do EFM para estudar aspectos microscópicos da
eletrificação de contato.

Outro importante campo de aplicação do EFM é a feitura direta de imagens no espaço


real dos domínios e das paredes dos domínios em ferroelétricos. A carga de polarização
superficial σ p associada à polarização ferroelétrica P induz uma carga imagem Qt sobre a
ponteira. Quando a ponteira passa sobre a parede do domínio, a polarização P muda de
sinal e passa por zero. A variação espacial resultante da interação da força eletrostática
entre a carga de polarização superficial e a carga imagem induzida sobre a ponteira, pode
ser detectada por EFM. Na figura 73 mostra-se a varredura de uma linha do sinal de carga
através de uma parede de um domínio ferroelétrico em Gd2(MoO4)3, feita com um
microscópio de força atômica, modificado para medir a parte elétrica.

Figura 73: Varredura de uma linha do sinal de carga através da parede de um domínio ferroelétrico
(Saurenbach,F. and Terris, B.O.1).

Como era esperado, o sinal da carga muda quando a ponteira passa sobre a parede do
domínio ferroelétrico. A largura da transição do sinal da carga através da parede do
domínio é principalmente determinada pela separação ponteira-superfície e pelo tamanho
da ponteira mais do que pela largura intrínseca da parede do domínio ferroelétrico, que se
espera que seja de dimensões atômicas. De qualquer forma, com refinamentos da técnica de
EFM, é possível investigar mais detalhadamente a distribuição espacial das cargas de
polarização e os campos elétricos nas superfícies ferroelétricas.

Nosso nanoscópio, vem provisto de uma ponteira revestida de platina, com o propósito
de que os campos eletrostáticos na superfície da amostra, interajam também com a ponteira.
Como já foi dito, a região em que as forças eletrostáticas dominam, é aquela determinada
por uma distância ponteira-amostra de 30 e 300 nm, mas a imagem gerada pelo EFM
incluirá sempre (ou quase sempre) um componente não eletrostático proveniente das forças
de van der Waals que, é bom lembrar, dominam totalmente para distâncias menores que 10
nm e se sentem até 100 nm. Como dissemos, o software de EFM permite a medida
simultânea e independente da imagem topográfica e dos campos elétricos na superfície da
amostra. Para cada dado correspondente a um ponto na imagem, faz-se uma medida
topográfica bem perto da superfície, estabelecendo contato nela ou oscilando o cantilever.
Após isto, a ponteira é retraída para a região na qual as forças elétricas são dominantes.
Usando este método, são adquiridos dados topográficos e de forças eletrostáticas na mesma
varredura, e a informação sobre o gradiente de força pode ser obtida a diversas alturas em
relação à superfície (camadas).

1. Appl.Phys.56, 1703 (1990)


Distribuição espacial de cargas. Medidas de capacitância

Na seguinte experiência feita em 1989 por Terris et al (1) faz-se a imagem da


distribuição espacial de cargas proveniente de um contato único. A técnica usada, seria,
com alguns refinamentos, teoricamente capaz de fazer a imagem de uma única carga, assim
como de localizar os sítios das cargas. O aparelho utilizado tem o circuito mostrado na
figura 74. O método é diferente do utilizado no microscópio comercial da TopoMetrix, já
que, tendo um lock-in a mais no circuito, não é necessário utilizar o método de operação
por camadas.

Figura 74: Diagrama de um microscópio de força para EFM.

A ponteira utilizada é feita de um arame de Ni tratado quimicamente para aguçá-lo,


dobrado a 900 para fazer a extremidade. A constante de mola deste cantilever é da ordem de
0,2 N/m e a sua freqüência de ressonância, da ordem de 25 kHz.

À medida que a ponteira varre a superfície, haverá mudanças no gradiente de força entre a
ponteira e a superfície, que por sua vez irão modificar a constante efetiva da mola do
cantilever, mudando assim sua freqüência de ressonância e sua amplitude de oscilação. A
mudança da amplitude de oscilação do cantilever é detectada usando o primeiro
amplificador lock-in e o sensor ótico. O loop de realimentação ajusta a distância ponteira-
amostra como resposta a esta variação da amplitude, mantendo o gradiente de força a um
valor constante.

Este método de fazer imagens responde muito bem a cargas e pode distinguir o sinal delas
com apenas uma varredura linear.

Aplica-se uma voltagem de alterna, V0 sen(ω 2t), entre a ponteira e um eletrodo localizado
sob a amostra dielétrica, obtendo-se assim uma força eletrostática adicional entre a ponteira
e a amostra, sendo que ω 1 >> ω 2 > ω , onde ω é a freqüência de resposta do loop de
realimentação e ω 1 é a freqüência de oscilação do cantilever, justo por cima de sua
ressonância. O valor desta freqüência deve estar sempre acima do valor de ressonância para
evitar que a ponteira bata na superfície. Isto se deve a que, como já vimos, a presença de
um gradiente de força f ' modifica o k do cantilever, e se f ' = k, como a freqüência de
ressonância varia segundo ω 0' = ω 0 (1− f '/k)½ , o cantilever pára de ressonar. Também
por este motivo, atualmente só se utilizam cantilevers duros para os quais nunca f ' = k .

A voltagem de alterna induz uma carga oscilante sobre o eletrodo, de valor Qe = CV0
sen(ω 2t), sendo C a capacitância entre a ponteira e o eletrodo. Assim, é induzida uma carga
sobre a ponteira, de igual valor e de sinal contrário. Se houver cargas estáticas locais Qs
sobre a superfície da amostra, elas também irão induzir sobre a ponteira cargas imagens
iguais, e de sinal contrário. Portanto, a carga total sobre a ponteira será

Qt = -(Qs + Qe).

Para calcular a força sobre a ponteira, supõe-se que a força ponteira-superfície é devida a
cargas pontuais e que a força ponteira-eletrodo é como a de um capacitor. Então, a força
eletrostática sobre a ponteira, pode ser aproximada por

Fz ≈ (QsQt/4π ε 0z2) + (1/2)[V02 sen2(ω 2t)] (∂C/∂z) ,

onde z é a distância entre a ponteira e a superfície. Temos então que o gradiente de força é
dado por:

F’≡ ∂Fz/∂z = (1/2) [V02 sen2(ω 2t)](∂ 2C/∂z2) +

+ (1/2π ε 0z2) QsV0 sen(ω 2t) [(C/z) - (1/2)(∂C/∂z)] + Qs2/2π ε 0z3 .

Se a superfície não estiver carregada, Qs=0 e só o termo em seno quadrado não é nulo;
neste caso, o gradiente de força oscilará a 2ω 2. Esta oscilação do gradiente de força fará
que a oscilação da ponteira a ω 1 seja modulada a 2ω 2.

Para superfícies carregadas, o gradiente de força tem um termo em sen(ω 2t) e então ω 1
será modulada a ω 2. O sinal desta freqüência (chamado "sinal de carga") é detectado na
saída do amplificador lock-in no loop de realimentação com o segundo amplificador lock-
in. A fase do sinal detectado indicará o sinal da carga. Para verificar isto, foram feitas
imagens de microregiões de cargas positivas e negativas depositadas intencionalmente
sobre uma superfície policarbonada. Para obter esta carga, foi aplicada uma voltagem na
ponteira, após o que, fez-se contato com a superfície. Assim foram depositadas cargas de
ambas polaridades, sendo que o sinal da carga está determinado pela polaridade da
voltagem aplicada.

Nas imagens, as cargas positivas aparecem em branco e as negativas em preto como já foi
mostrado na figura 72.

A técnica de fazer imagens de cargas foi usada também para estudar eletrificação metal-
isolante, por contato: a superfície é tribocarregada aproximando-a lentamente da ponteira,
permitindo que as forças de van der Waals atrativas, puxem a ponteira para a superfície.
Neste caso, não foi aplicada nenhuma voltagem à ponteira. O próximo passo foi retrair a
ponteira e utilizá-la para fazer a imagem da carga resultante depositada. O tempo de contato
foi da ordem de alguns segundos e a superfície era PMMA de 1 mm de espessura. Tudo foi
realizado à temperatura ambiente e condições ambiente de laboratório. O PMMA é da
qualidade de disco ótico e dele foi removida a capa plástica protetora justo antes de pô-lo
no microscópio. A voltagem de ac usada para fazer a imagem foi de 8 volts p-p. Após a
ponteira tocar a superfície, na imagem de carga foi vista uma região carregada de 10 µ m
de diâmetro, contendo cargas positivas e negativas, de um tamanho muito maior do que a
área de contato esperada. Tanto a área carregada quanto os detalhes da distribuição de
cargas variam de amostra para amostra, sendo que algumas amostras só apresentam cargas
de um sinal. Isto pode ser devido à camada de contaminação de água, que é diferente para
cada amostra, já que as experiências foram feitas em ar. O sinal predominante observado
para a carga é positivo, o que está de acordo com as medidas feitas com um voltímetro
eletrostático sobre o próprio PMMA, depois de ser contatado com um pedaço de arame de
Ni do qual foi feita a ponteira. Os diagramas de cargas mudam com o tempo, sendo que as
variações para as regiões positivas e negativas, têm taxas de decaimento diferentes. Depois
de alguns dias as cargas desaparecem.

A teoria "especulativa" para explicar a fonte do esquema bipolar das cargas, é a seguinte: a
transferência bipolar de cargas poderia ser possível se houvesse simultaneamente estados
donor e acceptor sobre a superfície. Entretanto, isto não explicaria a extensão espacial da
carga. Se a condutividade da superfície é suficientemente alta para permitir um
espalhamento da carga, então deveria ser esperada uma recombinação da carga, o que
dificultaria a compreensão da observação de carga bipolar. Uma explicação alternativa é
que poderia haver uma quebra elétrica perto da ponteira quando ela se separa da superfície.
Isto tenderia a descarregar a superfície, mas poderia também resultar no efeito contrário, de
forma tal que as áreas de cargas de duas polarizações, permaneçam. Este processo poderia
ser dependente da densidade de carga inicial, da taxa de retração da ponteira e da forma
exata dela.

A deposição e permanência de carga bipolar era desconhecida até a publicação do trabalho


de Terris et al.

Outra experiência realizada neste campo é a seguinte. Fazendo contato com uma esfera
metálica em vários pontos da superfície de um polímero foi estudada a variação ponto a
ponto da carga depositada no polímero. Foi achada uma ampla distribuição de níveis de
carga, em geral bipolar.

Nas imagens de carga da superfície de PMMA, depois de feito um contato com uma
ponteira de Ni, as regiões de cargas aparecem muito maiores que a resolução lateral do
instrumento (locais da ordem de 5 µ m) e portanto é necessário produzir regiões de cargas
menores. Para tal, bombardeia-se a superfície com pequenas partículas isolantes. Isto foi
feito sobre uma superfície de Si, com seu óxido original. Ela foi bombardeada com esferas
de poliestereno de 0,3 µ m de diâmetro. Obtiveram-se pontos de cargas com menos de 0,2
µ m. A correspondente imagem da voltagem de realimentação indica que as esferas não
aderem à superfície.
Quantas cargas podem ser detectadas? Usando o método de camadas, foi estimado um
limite de detecção de aproximadamente 100 cargas eletrônicas a uma altura de varredura de
500 Å. Com o segundo lock-in foi estimada uma sensibilidade maior em, pelo menos, uma
ordem de grandeza. Ela pode ser calculada aplicando uma voltagem de contínua entre um
substrato condutor e a ponteira do microscópio. A mínima voltagem de dc detectável
resultou ser de 0,02 V. Ela pode ser convertida a uma carga equivalente a partir da
capacitância entre a ponteira e a amostra.

Para calcular a capacitância, supõe-se uma esfera de raio R sobre um plano metálico, cuja
capacitância é dada por

C = 4π ε 0 R senhα ∑ (senh nα )-1 ,

onde a soma é de n=1 até infinito, α = cosh-1(L/R) e L = R + z é a distância da superfície


ao centro da esfera carregada. Os dois parâmetros, R e z, foram achados igualando o
gradiente de força correspondente a esta capacitância, com o gradiente de força medido no
microscópio. O gradiente de força medido foi representado graficamente como função de z,
para dois valores de voltagem aplicada. Na figura 75 mostra-se o gradiente de força,
normalizado ao quadrado da voltagem de dc, e representado em função da distância
ponteira-amostra.

Figura 75: Gradiente de força normalizado a V2 de dc em função de distância ponteira-amostra1.

A figura mostra os dados para duas voltagens, 2 e 5 Volts; as linhas que ligam os pontos
são apenas para visualizar melhor as curvas. A linha sólida é o gradiente de força calculado
a partir de um modelo de capacitância entre uma esfera e um plano. Como é esperado para
este tipo de capacitor, o gradiente de força varia como o quadrado da voltagem.
O gradiente de força foi determinado a partir do deslocamento δ f da freqüência, de acordo
com F’= 2k δ f/f0 , onde f0 é a freqüência de ressonância da ponteira. A constante k do
cantilever foi calculada de sua geometria, resultando 0,2 N/m. O melhor ajuste dos dados
foi obtido para um raio de ponteira de 1.500 ± 500 Å, que está em bom acordo com as
estimativas feitas das medidas por SEM. Foi acrescentada uma distância de 900 ± 300 Å
correspondente ao espaço entre a ponteira e a amostra(2). Usando estes parâmetros de
ajuste, e uma distância entre a ponteira e a amostra de 500 Å, foi calculada uma
capacitância entre elas de 2,26 x 10-17 F. Então, a mínima voltagem de dc detectável, que é
de 0,02 V, corresponde a uma carga equivalente de 3 ± 1,5 elétrons. Poderia ser
conseguida maior sensibilidade, varrendo mais perto da amostra, ou seja, em princípio,
poderia ser detectado até um elétron!

Então, com o EFM podemos também medir capacitâncias com alta resolução graças à alta
sensibilidade com que o aparelho faz imagens das propriedades elétricas superficiais de
uma amostra, detectando forças eletrostáticas da ordem de 10-10N.

A mínima capacitância detectável é de 8x10-22F. Isto foi mostrado em 1987 por Martin et al
, na mesma experiência de detecção de cargas, usando uma ponteira de tungstênio
posicionada a 50Å da superfície de uma amostra de Si e detectando as forças de van der
Waals.

Quando se aplica uma voltagem à ponteira, aparece uma força devida à capacitância que
depende da separação ponteira-amostra, e que é dada por

f = (½)V2 ∂ C/∂z.

Mede-se então C detectando a variação da amplitude de oscilação em função de z, através


do gradiente f’.

A sensibilidade destas medidas deve-se a que o AFM pode detectar um gradiente de força
de até 3x10-16 N/m, que corresponde a uma segunda derivada mínima detectável dada por
∂ 2Cm/∂z2 = 2f’min/V2. Em um capacitor de placas paralelas, de área A e constante dielétrica
ε , o gradiente de força é dado por f’ = C3V2/(ε A)2. Então, resolvendo a equação para a
mínima capacitância detectável, temos

Cmin= {f’min(ε A/V)2}1/3 .

Para um modelo de uma esfera e um plano condutor, chega-se à mesma expressão da


capacitância em função da distância z, sendo que z deve ser muito maior que o diâmetro da
ponteira. Temos então a mesma fórmula anterior, bastando substituir A pela área do
hemisfério que é a extremidade da ponteira. Valores típicos desta experiência são: área =
(0,1 µ m)2; ε /ε 0 = 1 e V = 25 V de bias, com os quais estima-se uma sensibilidade de
medição de capacitância (para as medidas feitas com dc) de 4x10-20 F, correspondendo a
uma distância ponteira-amostra tão grande como 2,5 µ m.
A sensibilidade de detecção da capacitância com as medidas dadas é de 4x10-20F.

Um método mais conveniente para medir a capacitância entre a ponteira e a amostra é


aplicar uma voltagem de alterna de freqüência ω 1 à ponteira, e detectar a oscilação
induzida. A distância z nesta experiência, fixa pela realimentação, foi ajustada mudando o
set point, que determina a amplitude de oscilação à freqüência de ressonância ω 0,
aumentando a estabilidade da medida.

A experiência foi realizada com uma voltagem de 2,5 V p-p na ponteira, a uma freqüência
de 40 kHz, bem por baixo da primeira ressonância (109 kHz). A amplitude de vibração
induzida variou de 0,1 a 5 Å, com k = 19 N/m para o cantilever.

Capacitâncias muito pequenas podem ser detectadas, escolhendo a freqüência ω 1 da


voltagem de bias no valor de ressonância da ponteira (mas diferente daquela usada no loop
de realimentação), aumentando assim a amplitude de oscilação induzida [através de Q, já
que ∆ z(ω 1) = (F/k)Q]. A menor oscilação detectável está limitada pela excitação térmica
do cantilever que causa movimento. Para um cantilever de Si, com k = 2,5 N/m, ω 1 = 35
MHz e Q = 200, a mínima capacitância detectável em uma largura de banda de 1Hz, à
temperatura ambiente, é de 8x10-22 F. Esta sensibilidade é realmente muito boa. Para ambos
métodos de detecção, por dc e ac, o sinal depende somente da parte da capacitância que
varia com o espaço entre ponteira e amostra, mas o método de corrente alternada tem a
vantagem de fornecer medidas independentes e simultâneas da capacitância e da topografia.

1. Phys.Rev.Lett.63 (24), 1989.


2. O espaço adicional entre a ponteira e a amostra pode provir de pelo menos duas fontes: a primeira é
um reflexo do fato de que a ponteira é mais um paraboloide do que uma esfera. Então, devido à
natureza alongada da ponteira, o centro das cargas seria deslocado da superfície da amostra. Em
segundo lugar, a posição da ponteira relativa à superfície da amostra é determinada movendo a
amostra até que a ponteira faça contato e portanto nesse momento a amplitude de oscilação a ω 1 vai
a zero. Qualquer deflexão estática do cantilever não é então contada, o que pode resultar numa
subestimação da verdadeira distância.
Detecção de Ferroeletricidade

A ferroeletricidade foi descoberta em sal de Rochelle por J.Valasek 1 em 1921; este


material perde suas propriedades ferroelétricas se a sua composição é levemente
modificada; então, foi deixada de lado e tomada apenas como uma curiosidade. A
ferroeletricidade ocorre numa grande variedade de materiais, a saber: nas cerâmicas
policristalinas de estruturas do tipo da perovskita como, por exemplo, cristais de LiNbO 3 e
LiTaO3. A perovskita tem uma estrutura ABO3, onde A é mono ou divalente e B é um metal
tetra ou pentavalente. Os átomos de A são as esquinas de um célula cúbica, da qual os
átomos de B estão no centro e os de oxigênio estão no centro das faces. Como os átomos de
B estão fechados em um octaedro O6, esta estrutura é chamada também BO6. Quando a
estrutura cúbica é perfeita não se observa ferroeletricidade. É o caso da perovskita SrTiO 3.
Entretanto, quando a estrutura ABO3 é feita de átomos ionizados, um campo elétrico irá
produzir um deslocamento destes íons, o que dará lugar a um momento elétrico. Então, este
efeito irá aumentar o deslocamento total e portanto a suscetibilidade elétrica ε = χ r – 1.

A origem dos domínios ferroelétricos – que nada mais são que uma
arrumação ou nucleação de dipolos em clusters – não é bem conhecida. Isto também
acontece com a estrutura dos domínios e a forma de mudança de orientação dos dipolos nas
vizinhanças das paredes que separam os domínios. Supõe-se que a separação de cargas se
deva a forças químicas.

Da orientação da polarização nos materiais ferroelétricos dependem várias


propriedades físicas deles, tais como, a inversão da polarização, a piezoeletricidade, os
efeitos eletro-ópticos e a histerese nas características da relação D/E e que tem a ver com a
memória que o material guarda sobre sua polarização anterior quando variamos o campo
externo aplicado visando mudar essa direção da polarização.

1 Phys.Rev.15, 537 (1920); Phys.Rev.17, 475 (1921).


O interesse nos materiais ferroelétricos nos últimos anos é devido à
possibilidade de mudar a orientação da polarização estática o que os torna muito apreciados
para aplicações em equipamentos eletrônicos como transdutores eletro-químicos, eletro-
ópticos e acústicos2.

Tradicionalmente a estrutura de domínios ferroelétricos tem sido estudada por


microscopia óptica de polarização3, etching da superfície4, decoração da superfície por
deposição5 ou por evaporação a vácuo6 e microscopia eletrônica7. Os primeiros três
métodos têm baixa resolução (~1µ m) e causam modificações ou danos à superfície da
amostra. A observação direta dos domínios já foi feita com microscópio eletrônico de
varredura, SEM (scanning electronic microscope) e com microscópio eletrônico de
transmissão TEM (transmission electronic microscope) cujas resoluções são
nanométricas. Porém, esses equipamentos têm a desvantagem de que o feixe de elétrons
utilizado afeta a carga da amostra, na maioria das vezes modificando-a. Ainda mais, a
preparação da amostra não é muito rápida nem fácil de ser feita. Finalmente, exceção feita à
microscopia de polarização, todos esses métodos para estudo de superfícies têm de ser
operados no vácuo tornando os experimentos mais caros e difíceis.

2 Ver por exemplo “Ferroelectric Transducers and Sensors” de J.M.Herbert, Gordon e


Breach. N.Y., 1982.

3 T. Mitsui and J.Furuichi, Phys. Rev. 90, 193 (1953).

4 J. A. Hetano and W. J. Merz, Phys. Rev 98, 409 (1955).

5 G. L. Pearson and W. L. Feldman, J. Phys. Chem. Solids, 9, 28 (1959).

6 G.I.Distler, V.P. Konstantinova, Y. M. Gerasimov and G. A. Tolmacheva, Nature, 218,


762 (1968)

7 D. Hesse and K. P. Meyer, “Electron Microscopy in Solid State Physics”, p. 496-531. Ed.
H. Bethge and J. Heydenreich (Elsevier, Amsterdam, 1987).
A microscopia de força atômica (AFM)– junto com suas variantes de força elétrica
(EFM) e força lateral (LFM)– é um instrumento promissor para estudo em escala
microscópica de superfícies carregadas e estrutura de domínios de materiais ferroelétricos
sem qualquer dano à superfície, com alta resolução das imagens e fácil preparação das
amostras, permitindo a repetição da experiência exatamente nas mesmas condições.

Já no século XVIII sabia-se que os cristais de certos minerais geravam cargas elétricas
quando aquecidos. Isto chama-se piroeletricidade e é a propriedade apresentada por certos
materiais de ter polarização espontânea dependente da temperatura. Em 1880, os irmãos
Jacques e Pierre Curie descobriram outro fenômeno relacionado com a piroeletricidade.
Eles mostraram que certos cristais eram capazes de gerar cargas elétricas quando
submetidos a stress mecânico. Este efeito é a piezoeletricidade, ou criação de eletricidade
como resultado de uma pressão mecânica. A inversa da piezoeletricidade é a criação de
uma distorção mecânica em um cristal, pela aplicação de um campo elétrico.

Os Curie mostraram que o quartzo e o sal de Rochelle (tetrahidrato tartrato de sódio


e potásio) eram piezelétricos, mas muitos outros materiais têm esta propriedade.

A temperatura e/ou a pressão determinam a fase estrutural de um cristal. Em geral, a


altas temperaturas um cristal é mais simétrico. A ferroeletricidade é um dos efeitos
causados pela assimetria de um material, portanto, ela está estreitamente ligada à
cristalografia.

A compreensão do conceito de piezoeletricidade nos sólidos começa com a


compreensão da estrutura interna do material. Um cristal tem uma composição química
definida, cujos átomos são obrigados a ocupar posições na estrutura repetitiva que constitui
uma rede. A menor unidade repetitiva da rede é chamada de célula unitária e a simetria
específica dela determina se é possível existir piezoeletricidade no cristal.

Os cristais ferroelétricos possuem eixos polares com polarização espontânea, isto é,


momento dipolar por unidade de volume, que pode ser mudada pela aplicação de um
campo elétrico externo.

Pela sua estrutura cristalina os materiais podem ser divididos em centro-simétricos e


não centro-simétricos. Eles se enquadram, de acordo com suas simetrias, dentro dos 32
grupos cristalográficos existentes. Dentre eles, 11 têm centro de simetria e 21 não são
centro-simétricos, condição necessária para que o cristal seja piezelétrico. Desses 21, 20
caracterizam materiais piezelétricos. Dez deles são piroelétricos e outros 10 não o são.
Dentre os 10 piroelétricos há ferroelétricos e não ferroelétricos.

Os materiais ferroelétricos mais populares têm a estrutura da perovskita, isto é,


ABO3, onde A é um cation metálico grande e B é um cation metálico pequeno. Exemplos
disto são BaTiO3, BaSrTiO3 (BST), PbTiO3 (PT) e PbTixZr1xO3 (PZT).

Como vimos, a polarização espontânea é proveniente de uma pequena


deformação da rede cúbica, quando produzida abaixo da uma temperatura característica do
material, chamada temperatura de Curie T c . A ferroeletricidade usualmente desaparece
acima desta temperatura de transição e o material se torna paraelétrico.

Um cristal ferroelétrico tem geralmente uma estrutura de domínios ou regiões


dentro das quais a polarização é toda na mesma direção. Entretanto, em domínios
adjacentes às polarizações mostram diferentes direções. A polarização total de um cristal
dependerá então das diferentes polarizações dentro dos domínios. Se a polarização dentro
dos domínios for igual a pares, em direções diferentes e medirmos as cargas sobre eletrodos
cobrindo os limites do material, teremos uma material aparentemente não polarizado, já que
o resultado da medida será nulo.

Aplicando um campo elétrico é possível mover as paredes dos domínios


modificando o tamanho e a forma das regiões mas o movimento das paredes em alguns
ferroelétricos não é simples. Por exemplo, no titanato de bário a largura característica dos
domínios é de 10-4 a 10-2 cm e a espessura dos limites entre domínios pode ser de uma
constante de rede. Este material tem normalmente paredes de 1800, o que significa que as
regiões vizinhas têm polarizações opostas. Quando da aplicação de um campo, a parede não
se move perpendicularmente a ela mesma como um todo mas sim em forma diversa, com
um movimento que parece por passos ao longo da parede, o que é resultado de uma
nucleação repetida por flutuações térmicas. Ou seja, a forma de nucleação é o fator que
controla a propagação da parede.

Curva de Polarização × Campo Aplicado


O nome ferroelétrico foi adotado porque a relação entre a polarização P e o campo
elétrico E destes materiais é muito similar à relação entre B e H dos materiais
ferromagnéticos, que também possuem uma temperatura de Curie e têm estrutura interna de
domínios, no caso, magnéticos.

Uma curva de polarização por campo aplicado, é a mais importante medida que
pode ser feita sobre um material ferroelétrico para se caracterizar seu comportamento
elétrico.

Uma quantidade considerável de informação pode ser obtida de uma curva de


histerese. Comparando curvas de diferentes materiais podemos observar se o material
apresenta memória ou não; um valor elevado na polarização permanente revela uma
elevada polarizabilidade interna, tensão, acoplamento eletromecânico e atividade eletro-
óptica; para um dado material, a variação do campo coercitivo Ec, isto é, o campo
necessário para anular a polarização, é uma indicação do tamanho dos grãos de um dado
material, isto é, menor E c significa maior tamanho de grão e maior E c menor tamanho de
grão.
Loop de histerese

Em este gráfico, P nonlin é a polarização, Psat é a polarização de saturação (a polarização


que corresponde à máxima contribuição do momento dipolar) e PRem é a polarização
remanescente (polarização que fica após a anulação do campo elétrico).

Aplicações

Similarmente à maioria dos materiais, o sucesso da aplicação prática das cerâmicas


piezelétricas e dos filmes piroelétricos, ferroelétricos, eletrotrictivos e eletro-ópticos é
altamente dependente da facilidade com que eles podem ser adaptados a dispositivos. Sua
simplicidade, tamanho compacto, baixo custo e alta utilidade são algumas das suas
características. Sempre haverá uma demanda para este tipo de dispositivos. É certo que a
indústria tenderá a utilizar dispositivos em forma de filmes ferroelétricos devido à sua
estrutura compatível com a tecnologia de silício, a sua fácil fabricação e baixo custo para
integração.
Devido a um largo número de aplicações, as cerâmicas ferroelétricas estão
associadas a muitos dispositivos e tem havido um aumento na tendência de aplicação de
alguns destes materiais na forma de filmes finos. Além da vantagens óbvias, como tamanho
menor e maior integração com a tecnologia de circuitos integrados, os filmes ferroelétricos
oferecem benefícios adicionais como menor voltagem de operação, maior velocidade, e a
possibilidade de se fabricar uma única micro estrutura. Igualmente importante, é o fato que
muitos materiais que são difíceis, se não impossíveis de fabricar como cerâmicas densas,
são fáceis de fabricar como filmes. Além disso, a temperatura de sintetização dos filmes é
centenas de graus celsius menor que para materiais volumosos, e isto pode ser um fator
decisivo para uma aplicação bem sucedida.

Neste capítulo, mostramos que o AFM na modalidade EFM pode detectar com muita
exatidão forças elétricas, cargas e capacitâncias muito pequenas. Esta sensibilidade pode
também ser usada para fazer imagens de mudanças na constante dielétrica da amostra. As
medidas de ferroeletricidade têm inúmeras aplicações, tanto na indústria quanto na física
básica.
Microscopia de Força Magnética (MFM)

A técnica de detecção de força magnética realiza-se com outra variante do microscópio


de força atômica.

Para amostra e ponteira magnéticas, quando a ponteira se aproxima da superfície da


amostra dentro de uma distância de 10 a 500 nm, é possível perceber a interação magnética
da ponteira com o campo que emana da amostra. A interação dipolar magnética é de longo
alcance e detecta-se usando o método de ac, ou seja, mede-se gradiente de força. Portanto,
também para um MFM (magnetic force microscope) o método operacional é não-contato e
o circuito é basicamente o mesmo que aquele do EFM.

Como as forças magnéticas (Fmag) podem ser atrativas ou repulsivas, podem ocorrer
problemas com a estabilidade do sistema de realimentação no modo de não-contato e a
ponteira pode bater na superfície. Para solucionar isto, se requer uma força atrativa
adicional Fservo, chamada força "servo", cuja grandeza aumente quando a ponteira se
aproxime da superfície da amostra. As forças de van der Waals de curto alcance, que estão
sempre presentes, poderiam servir como forças servo, mas às vezes não funcionam, talvez
devido à condensação de líquidos entre a ponteira e a amostra. Entretanto, o problema é
resolvido introduzindo uma força eletrostática atrativa adicional controlável Fel induzida
pela aplicação de um potencial de bias da ordem de 1 a 10 V entre a ponteira e a amostra.
Desta forma, a força aumenta com a diminuição da distância entre a ponteira e a amostra. O
gradiente total de força F’, medido pelo método de detecção de ac, é dado pelo gradiente da
força que age sobre o cantilever:

F’ = F’mag + F’servo = F’mag + F’vdW + F’el .

Então, contornos de gradiente de força constante podem refletir não apenas contraste
magnético mas também depender da dependência em z de F’servo.

Devido à natureza de longo alcance das forças dipolares magnéticas, uma característica
clara do contraste magnético é o seu aumento com o aumento da separação entre a ponteira
e a amostra, como se mostra na figura 76 publicada em 1988 por Martin et al1.
Figura 76: Varredura de linha em MFM ao longo de um domínio simples para várias distâncias
ponteira-amostra.

Este gráfico foi obtido varrendo uma linha sobre um domínio magnético circular. Vê-se
que as mudanças medidas no sinal z correspondem a deslocamentos ponteira-amostra de até
500Å (escala das ordenadas). O deslocamento é muito grande se comparado com a deflexão
estática estimada para o cantilever. Isto se deve à força magnética que age sobre a ponteira.
Assim, pode-se concluir que a ponteira segue essencialmente linhas de gradiente de força
constante. Na figura temos estas linhas com os valores dos gradientes estimados a partir de
um gráfico experimental de força e gradiente de força, em função da distância ponteira-
amostra para regiões dentro e fora do domínio magnético circular da amostra estudada, que
é um filme fino de TbFe sobre o qual os domínios foram "escritos" usando um laser em
combinação com um campo magnético.

Nota-se também da figura 76 que, como já dissemos, as variações no gradiente de força


são maiores para espaçamento maior entre a ponteira e a amostra, o que resulta num
contraste maior. Entretanto, este aumento no contraste é às custas da diminuição da
resolução espacial (diminuição do contraste topográfico) e da relação sinal-ruído, já que o
gradiente de força se torna cada vez menor. Devemos salientar que para o segundo maior
contraste, o valor de F’ é duas vezes maior que para o primeiro. Mas justamente isto serve
para distinguir, medindo a diferentes distâncias, a parte topográfica da parte magnética.
Valores típicos são: de 20 a 50 nm para topografia e 100nm para força magnética.

O problema não está resolvido se pensarmos que para atingir alta resolução em uma
imagem magnética, o campo que emana da amostra deve ser medido a distâncias perto da
superfície (da ordem de 20 nm).

A separação completa dos contrastes magnético e topográfico é hoje conseguida, fazendo


medidas da força e sua derivada simultaneamente. Já em 1990, Schonenberger et al 2 foram
bem sucedidos nesta experiência usando um cantilever de k=1N/m, com o qual
conseguiram detectar forças magnéticas de 10-11N. A derivada F’ da força de interação com
relação à normal à superfície, foi medida modulando a posição da amostra a uma
freqüência dada, que também foi usada para controlar a distância d entre a ponteira e a
amostra.

Da expressão anterior para o gradiente de força, e desprezando a força de van der Waals,
temos,

F’(d) = F’servo(d) + F’mag(d) = K (a)

onde K é um valor de referência constante, ajustado pelo experimentador.

A força coulombiana pode ser expressa na forma

Fc(d) = Fservo = A/d k,


onde A e k são constantes que, só para superfícies idealmente planas, independem da
posição lateral (x,y). Para pequenas distâncias entre a ponteira e a amostra, a força sobre o
cantilever é dominada pelo termo coulombiano. Isto se deve simplesmente a que a força
coulombiana tende a divergir para pequenas distâncias de interação, enquanto a força
magnética atinge um valor finito perto de superfície, pois a magnetização só pode mudar
sobre um comprimento finito, por exemplo, a largura da parede de um domínio. Isto se
mostra esquematicamente na figura 77 onde estão representadas as forças magnéticas e
coulombianas, em função da distância.

Figura 77: Forças coulombiana e magnética em função da distância ponteira-superfície.

Então, a força magnética tem um limite superior (Fmag)max e os gradientes de força


magnética envolvidos são da ordem de (Fmag)max/λ , sendo λ um comprimento
característico que, por exemplo, no caso de uma trilha magnética, é a largura dos bits
escritos nela.

Como F’mag(d) na equação (a) é apenas uma pequena correção, define-se uma distância
de referência d0, usando o gradiente da força coulombiana:

F’c(d0) = K.

As variações em distância ∆ z = d - d0, devidas a mudanças ∆ F’mag na derivada da força


magnética, são dadas por

∆ z = d0 ∆ F’mag/[kF’c(d0)] (b).

Para mostrar isto, tomamos Fc = A/zk . Então,


F’c)z=d = -kA/zk+1)z=d = -(k/d0) Fc(d0),
0 0

mas

F’c + F’mag = K donde F’mag = K – F’c ,

ou ∆ F’mag/∆ z = -∆ F’c/∆ z,

ou ainda,

∆ F’mag/∆ z = (∆ /∆ z)[(k/d0)Fc] == (k/d0)(∆ Fc/∆ z) = (k/d0)F’c ,

donde vem a expressão (b) para ∆ z.

O ∆ z diminui para pequenas distâncias devido ao grande aumento da derivada da força


coulombiana F’c(d0). Então, o contraste observado à distância d medida, é governado pela
força coulombiana a pequenas distâncias, e reflete só a parte topográfica (e dielétrica).

A força total, a uma distância experimental d, pode ser agora escrita como

F(d) = Fmag(d) + Fc(d0) + F’c(d0)∆ z,

onde os dois últimos termos são Fc(d).

Estima-se que para esta experiência o último termo é menor que 10-11N e pode ser
desprezado perante Fmag(d0)]max que é da ordem de 2x10-10N.

Então, uma boa aproximação para a força é

F(d) = Fmag(d) + Fc(d0), (c)

onde Fc(d0) é constante (só para superfícies idealmente planas) e representa a topografia
sempre presente.

O primeiro termo é a topografia magnética, que domina as deflexões do cantilever.


Portanto, a força medida sempre irá refletir em certo grau a topografia. É esperado que este
efeito seja pronunciado sobre áreas que têm uma grande rugosidade local, em particular,
nas vizinhanças de degraus sobre a superfície. Entretanto, a experiência mostra que o
contraste magnético [na equação (c)] domina as variações locais da força de Coulomb.

Resumindo, a força magnética é medida via deflexão estática do cantilever, isto é,


fazendo a média sobre a freqüência de modulação, enquanto que a topografia da superfície
é feita por meio do deslocamento da amostra requerido para satisfazer a equação (a).

A técnica apresentada consegue detectar a força de interação e sua derivada.


Usando a força coulombiana para estabilizar a distância ponteira-amostra tem-se nas
mãos um outro parâmetro a ser usado nas medições, que é a voltagem aplicada entre a
ponteira e a amostra. Como alternativa, os autores propõem uma outra técnica que permite
a separação total dos efeitos magnéticos e topográficos. Em vez de usar F’ para controlar a
distância média, a voltagem de bias aplicada é modulada de forma tal que VT = V0 +
V1cos(ω t). A força Coulombiana é proporcional ao quadrado da voltagem

Fc(d) = V2 A(d),

onde A(d) depende apenas de fatores geométricos. Esta força causa uma oscilação do
cantilever à freqüência do segundo harmônico 2ω , como já foi visto para EFM. A
amplitude desta oscilação pode ser utilizada no loop de realimentação, para controlar a
distância entre a ponteira e a amostra, mantendo-a a uma força (média) coulombiana
constante. Então, as deflexões do cantilever irão refletir somente as forças de van der Waals
e as magnéticas.

O movimento do piezo na direção z, necessário para manter constante esta amplitude de


oscilação, leva à obtenção de um sinal topográfico, pois, como sabemos, os contornos de
força eletrostática constante são quase equivalentes aos contornos de separação constante
ponteira-amostra. Simultaneamente, a força de dc pode ser medida detectando as deflexões
quase estáticas do cantilever. As variações espaciais desta força são principalmente devidas
a variações espaciais na interação magnética, pois a ponteira segue a superfície da amostra
a uma distância aproximadamente constante.

Os autores conseguem com isto uma completa separação das forças topográficas e
magnéticas, independentemente da distância média à qual trabalham.

No mesmo ano de 1990, poucos meses depois do referido trabalho, Rugar et al 3


publicaram um trabalho onde fazem o mesmo tipo de medidas, de uma maneira mais
prática, isto é, eles têm duas saídas no microscópio. O circuito correspondente é similar ao
da figura 74 de EFM, com as seguintes características. Não tem um segundo lock-in mas,
em seu lugar está a primeira saída, logo após o primeiro lock-in, antes da servo eletrônica.
A segunda saída é depois da eletrônica, antes de voltar ao scanner z para fazer a
realimentação. Não existe o eletrodo embaixo da amostra e portanto não se aplica uma
voltagem de alterna nesse lugar. Se utiliza a velocidade de varredura para separar as
interações.

Se a varredura for rápida o suficiente para que a realimentação não possa responder às
variações na derivada da força, a informação é tirada diretamente da primeira saída,
medindo as variações na derivada da força. Neste modo, a altura sobre a amostra
permanece praticamente constante e, portanto, F'servo = cte. para uma superfície lisa e
homogênea. Então, o contraste obtido para a imagem se deve a F'mag e independe do tipo de
F'servo .

Se a varredura é suficientemente lenta de forma tal que o loop do servo tem tempo
suficiente para responder completamente a mudanças na derivada da força, então o sinal de
informação é tirado da segunda saída e se medem contornos de gradiente de força
constante. Neste modo, F'servo depende de z. Se F'mag ~ F'servo , a resposta de z a F'mag não é
linear se F'servo(z) não for linear. Portanto, o contraste magnético é complicado. Estes efeitos
não lineares podem resultar em imagens assimétricas para forças magnéticas de sinais
opostos. A resposta do microscópio pode ser linearizada fazendo F'servo maior que F'mag
aplicando, por exemplo, uma voltagem maior entre a ponteira e a amostra. Assim, F' mag será
uma pequena perturbação em relação à derivada total da força e a variação em z, resultante
da variação na derivada da força magnética, será pequena comparada com a distância
ponteira-amostra.

As velocidades de varreduras utilizadas, variam entre 0,2 e 2 linhas por segundo.

A variedade de propriedades a serem estudadas com um MFM é muito grande. No nosso


laboratório esta técnica já foi utilizada para investigar a estrutura magnética de amostras
contendo essencialmente aço, envelhecidas por aplicação de um processo térmico que
produz uma decomposição do material. Como conseqüência, aparecem algumas
propriedades magnéticas nas amostras e delas estudamos a sua estrutura. Foi então
desenvolvido um modelo teórico para descrever esta estrutura das imagens, explicar a
resposta magnética e ainda interpretar a topografia obtida4.

1. Appl.Phys.Lett. 52, 244 (1988).

2. J.Appl.Phys. 67, 7278 (1990).

3.J.Appl.Phys. 68 (3), 1169-1183 (1990).

4. Klimchitskaya, Prioli, Zanette, Caride, Acselrad, Kalashnikov, Silva, Simão. Surface Review and Letters, 6 (1) (1999).
Características dos sensores de força magnética

Os sensores de força para MFM devem preencher vários requisitos no que se refere às suas
propriedades magnéticas1.

 A extensão espacial do volume efetivo da ponteira magnética deve ser o menor


possível com a finalidade de minimizar a extensão espacial da interação de longo
alcance dipolar magnética entre a ponteira e a amostra e maximizar a resolução
espacial em MFM.
 O campo magnético que emana da ponteira deve ser pequeno e confinado
espacialmente, para minimizar influências não desejadas sobre a magnetização da
amostra e maximizar a resolução espacial.
 É desejável um grande momento magnético total para medir grandes forças, pois
assim teremos melhor sensibilidade de força magnética.
 São importantes uma grande anisotropia magnética e uma grande coercitividade
para minimizar a influência do campo magnético que emana da amostra, sobre a
magnetização da ponteira.
 Os sensores de força devem ser magneticamente bem definidos para permitir uma
interpretação quantitativa dos dados de MFM.

Alguns destes pontos não podem ser otimizados simultaneamente. Por exemplo, deve ser
feita uma boa escolha entre um pequeno volume magnético efetivo da ponteira e uma alta
sensibilidade de força magnética. Para uma força mínima detectável de aproximadamente
10-12 N, à temperatura ambiente, o raio do volume magnético efetivo da ponteira deve ser
tipicamente maior que 6 nm.

Atualmente, a técnica de recobrimento da ponteira magnética está sendo aplicada a


cantilevers de silício microfabricados, podendo assim ser escolhido tanto o material com o
que eles são recobertos, quanto o tamanho da camada. Em geral, o resultado é que a
magnetização está predominantemente alinhada ao longo da ponteira, de acordo com o
esperado teoricamente com base na forte anisotropia da ponteira devido à sua forma. Para
ponteiras de Ni não magnetizadas intencionalmente, encontrou-se que os últimos 20 µ m
têm um domínio magnético simples. O comprimento deste domínio pode ser aumentado
magnetizando a ponteira num campo magnético forte o que aumenta a grandeza do campo
magnético que emana justo da extremidade da ponteira.

O comprimento de um domínio depende também do material da ponteira e espera-se, por


exemplo, que seja muito menor para Co do que para Ni. De qualquer forma, como o
microscópio detecta interação dipolo-dipolo, várias aproximações são possíveis,
dependendo do modelo da ponteira e da amostra a ser estudada. Em geral, supõe-se
idealmente que a amostra é de material magnético duro, tal que a sua magnetização não seja
afetada pela interação com o campo da ponteira. Isto é uma boa aproximação para, por
exemplo, discos magnéticos, mas não serve para materiais magnéticos moles.
Outra aproximação utilizada é supor que a ponteira está magnetizada uniformemente na
direção de seu eixo e também que a sua magnetização não é afetada pelo campo que emana
da amostra. Rugar et al2 fazem também um estudo sobre a influência da geometria não
simétrica da ponteira e da orientação não paralela do cantilever em relação a amostra.

1.Grüter, P. Tese de Doutoramento, Universidade de Basileia, Suiça, 1989.

2. J.Appl.Phys. 68 (3), 1169-1183 (1990).


Teoria de MFM

Esta seção e as próximas duas correspondem em grande parte à matéria apresentada na


seção 2.7 do livro de R. Wiesendanger1.

Um MFM no modo de não-contato é sensível à interação magnetostática dipolo-dipolo


entre a ponteira e a amostra. A força magnética total que age sobre a ponteira na direção z é
a resultante da soma das forças entre cada dipolo da ponteira e cada um da amostra. Isto
pode ser escrito como

F(z) = ∫ d3r1 ∫ d3r2 fz(r1- r2) ,

onde a primeira integral é sobre a ponteira, a segunda sobre a amostra e fz(r) é a interação
entre dois dipolos magnéticos m1 e m2 a uma distância r = r1- r2 :

fz(r) = (µ 0/4π ) (∂/∂ z){[3(r.m1)(r.m2)/r5] - [(m1.m2)/r3]}.

Alternativamente, o campo magnético Ba(r) produzido pela amostra, e que tem uma
distribuição de magnetização M(r), pode ser determinado antes de calcular a força

F = ∇ (m.Ba),

somada sobre todos os dipolos m da ponteira.

A resposta de MFM pode ser calculada analítica ou numericamente, dadas as


distribuições de magnetização da ponteira e da amostra. O problema que se apresenta é que,
em geral, nem uma nem outra são conhecidas. Pode ocorrer também que elas variem
durante o processo de aproximação. Isto complica bastante a interpretação dos dados2.
Ainda mais, espera-se uma perturbação significativa das estruturas magnéticas da ponteira e
da amostra quando os campos magnéticos Hs, externos aos materiais, excedem os campos
anisotrópicos Hk:

Hs(amostra) > Hk(ponteira)

Hs(ponteira) > Hk (amostra).

Perto de uma superfície, o campo pode ser uma fração significativa da magnetização de
saturação Ms. Levando em conta isto, Hartmann3, estabeleceu os seguintes critérios como
vínculos limite para uma operação não destrutiva de MFM:

µ 0Hk(amostra)/Ms(ponteira) ≥ 1

µ 0Hk(ponteira)/Ms(amostra) ≥ 1.
As condições para uma operação não destrutiva de MFM podem ser alcançadas mais
facilmente para materiais magnéticos duros com grandes campos anisotrópicos, enquanto
que, para materiais magnéticos moles, tal como uma liga de Ni-Fe (permalloy), as variações
na estrutura magnética induzidas pela interação ponteira-amostra podem ser diretamente
observadas durante uma operação de MFM onde a distância entre a ponteira e a amostra é
menor que 100 nm (ver Mamin et al4).

Para reduzir o campo que sai da ponteira na posição da amostra, a separação entre a
ponteira e a superfície deve ser aumentada, mas isto leva a uma diminuição da resolução
espacial em MFM. Uma vantagem significativa dos sensores de força mais novos, que têm
uma fina camada de filme magnético sobre um material não magnético, comparados com as
ponteiras de arame de materiais magnéticos, é que, nestes mais modernos, o campo que
emana deles cai muito mais rapidamente com a distância, permitindo assim um estudo não
destrutivo de materiais magnéticos moles, inclusive para separações ponteira-superfície
relativamente pequenas. Assim, pode ser obtida alta resolução espacial5.

Como alternativa para resolver os problemas associados a grandes campos que emanam
da ponteira, foi proposto usar ponteiras paramagnéticas, com altas suscetibilidades, como
por exemplo Gd perto de sua temperatura de Curie.

Supondo que todas as condições de operação não destrutiva em MFM estão satisfeitas,
devemos entender a que excitação responde um MFM. É claro que o contraste observado
nas imagens de MFM depende fundamentalmente da grandeza do domínio magnético na
extremidade da ponteira. Se o comprimento do domínio efetivo na extremidade da ponteira
é suficientemente pequeno comparado com a extensão do campo que vem da superfície, a
ponteira pode ser bem aproximada por um dipolo pontual com um momento magnético
total m. Neste caso, a força que age sobre a ponteira no campo Ba que sai da amostra é dado
por

F(dipolo) = ∇ (m.Ba) = (m.∇ ) Ba,

onde foi suposta a ausência de correntes (∇ × B = 0). Portanto, no limite de dipolo


pontual, as imagens de MFM estão muito mais relacionadas à distribuição espacial do
gradiente do campo magnético que emana da amostra do que ao próprio campo. Da
equação anterior também é claro que a componente do gradiente do campo que sondamos
com a ponteira, depende da orientação do momento da própria ponteira. Como já foi dito, a
direção da magnetização está predominantemente alinhada com a direção do eixo da
ponteira, devido à anisotropia do feitio. Portanto, o ângulo de inclinação da ponteira em
relação à superfície da amostra, determina qual componente do gradiente do campo que
emana da amostra é a que está sendo pega pela sonda.

Consideremos agora o outro caso limite de um longo domínio magnético na extremidade


da ponteira. Neste caso, só a porção frontal do domínio da ponteira interage efetivamente
com o campo que emana da amostra, levando a uma resposta de monopolo devida à carga
magnética qm localizada na extremidade da ponteira. A força magnética medida está então
diretamente relacionada com o campo que emana da amostra:
F(monopolo) = qm Ba,

e as imagens de MFM refletem a distribuição espacial de Ba.

Experimentalmente, acha-se que algumas ponteiras, por exemplo as de Co, agem


efetivamente como ponteiras de dipolo pontual e sondam o gradiente de campo que emana
da amostra, enquanto outras, como por exemplo as de Ni ou Fe agem como ponteiras de
monopolo e sondam diretamente o campo que emana da superfície. Portanto, o contraste
observado nas imagens de MFM pode depender fortemente do sensor. Pode inclusive
ocorrer uma transição da resposta de dipolo para a de monopolo quando se aumenta a
separação entre a ponteira e a superfície.

1. Scanning Probe Microscopy and Spectroscopy, Method and Applications, Cambridge University Press, NY, 1994. Part One, Chapter 2.

2. J.J.Sáenz, N.Garcia and J.C.Slonczewski. Appl.Phys.Lett. 53 (15), 1449-1451 (1988).

3. J.Appl.Phys. 64, 1561 (1988).

4. Appl.Phys.Lett. 57, 1820 (1990).

5. Grütter et al. Appl.Phys.Lett. 57, 1820 (1990).


Resolução espacial em MFM

Como já dissemos, a resposta medida de MFM é devida à interação da ponteira magnética


com o campo que emana da amostra. Portanto, a resolução espacial alcançada, depende
tanto das propriedades da ponteira quanto da distribuição do campo. Inclusive, para uma
ponteira dipolar pontual e um objeto dipolar pontual sobre a superfície da amostra, a
largura medida da distribuição do campo será finita e da ordem da separação ponteira-
amostra. Portanto, o primeiro requisito para ter uma alta resolução espacial em MFM é
operar com a ponteira tão perto quanto possível da superfície da amostra. A mínima
distância ponteira-amostra está determinada por várias limitações experimentais:

 1. Para o método de detecção de a.c. normalmente usado na microscopia de força


de não-contato, requer-se uma amplitude de oscilação mínima do cantilever,
tipicamente da ordem de 1 a 10 nm. A separação ponteira-amostra obviamente deve
ser escolhida maior que esta amplitude.

2. Se a derivada da força atrativa se torna muito grande para pequenas separações,


excedendo a constante de mola do cantilever, podem ocorrer instabilidades não
desejadas. Os cantilevers mais duros permitem operar o MFM a pequenas
separações, mas às custas de reduzir a sensibilidade.

3. A influência perturbadora do campo que emana da ponteira, pode tornar-se muito


grande para pequenas separações, levando a uma operação destrutiva.

Para uma dada distância ponteira-amostra, a resolução espacial alcançável em MFM


depende criticamente do feitio e da estrutura magnética da ponteira. Em princípio, o
volume efetivo da ponteira deve ser tão pequeno quanto possível, pois a máxima resolução
que pode ser alcançada é da ordem do raio do volume efetivo da ponteira magnética e isto é
sempre válido, para qualquer distância entre a ponteira e a amostra. Uma ponteira de
multidomínio pode resultar em estrutura fina adicional nos traços de MFM, o que complica
a interpretação dos dados. Uma ponteira ideal deveria ser uma pequena partícula
ferromagnética de domínio único colada na extremidade de um cantilever não magnético.
Contudo, o tamanho mínimo do volume efetivo da ponteira magnética está determinado
pela sensibilidade de detecção da força, ou do gradiente da força.

O limite teórico de resolução em MFM para operações em condições ambiente está entre 5
e 10 nm, mas a resolução real é da ordem de 50 a 100 nm.

Melhoras significativas na resolução espacial, visando o nível atômico, só podem ser


alcançadas sondando forças magnéticas de intercâmbio de curto alcance e não forças
dipolares magnéticas de longo alcance. As forças de intercâmbio podem ser estudadas por
microscopia de contato, mas sempre em ultra alto vácuo, usando ponteiras e superfícies
muito limpas
Comparação do MFM com outras técnicas

Uma das grandes vantagens do MFM é que ele não requer uma preparação sofisticada da
amostra. A microscopia de força magnética em não-contato pode até ser feita na presença
de camadas de contaminação em condições ambiente, e não é necessário revestir as
amostras com material magnético.

A ponteira de MFM sonda o campo que emana da amostra ou o seu gradiente, que é a
grandeza interessante em relação à caracterização dos meios magnéticos. Por outra parte, a
informação sobre a distribuição da magnetização da amostra, incluindo a sua grandeza e
direção, não pode ser extraída diretamente dos dados de MFM e requer que se façam
simulações da resposta de MFM para os casos em que os parâmetros de entrada (feitio e
estrutura magnética da ponteira) não são conhecidos, como acontece com freqüência.

A resolução espacial alcançada em MFM de não-contato é da ordem de 10 a 100 nm,


dependendo da ponteira e também da amostra.

Existem diversas técnicas de fazer imagens magnéticas, algumas delas já bem


estabelecidas, outras, em desenvolvimento.

 1. A técnica de Bitter foi introduzida faz muito tempo, mais precisamente em


1931, por F.Bitter, no trabalho publicado no Phys. Rev. 38 desse ano (p.1903). Este
método é baseado no estudo da localização de pequenas partículas magnéticas que
se aglomeram em regiões de fortes gradientes de campo, ou seja, nas paredes dos
domínios. A distribuição das partículas magnéticas quando estudada por
microscopia ótica, eletrônica ou de STM reflete a distribuição do campo magnético
que emana da superfície da amostra. A resolução espacial está limitada pelo
tamanho finito das partículas magnéticas e pela resolução do microscópio usado
para o estudo. As partículas magnéticas usadas na técnica de Bitter e a ponteira que
se utiliza em MFM respondem às mesmas forças. Entretanto, o MFM emprega
apenas uma "partícula" como sonda, a uma distância finita da superfície da amostra,
introduzindo assim menor perturbação na estrutura magnética da amostra. Ainda
mais, as forças sentidas pela sonda de MFM são medidas diretamente, fato que
fornece informação adicional a respeito do campo que emana da amostra, sempre
que o estado de magnetização da ponteira seja conhecido.

2. A microscopia de Kerr é baseada na iluminação da amostra magnética com luz


linearmente polarizada. Como conseqüência dos efeitos magneto-óticos, a
polarização rota e a quantidade de rotação produzida por estes efeitos, está
diretamente relacionada à magnetização da amostra. A resolução espacial está
limitada pelo comprimento de onda da luz utilizada. Esta microscopia é a técnica
ideal para combinar com MFM: primeiro, a microscopia de Kerr é uma técnica
complementar pois ela é diretamente sensível à distribuição da magnetização na
amostra; segundo, devido ao seu grande campo de visão, a microscopia Kerr
permite posicionar a ponteira de MFM com relação à configuração das paredes dos
domínios da amostra in situ após o que, os estudos com MFM podem cobrir escalas
além da resolução ótica do método Kerr. No CBPF já existe em pleno
funcionamento um laboratório para estudo do efeito Kerr.

3. A microscopia de Lorentz é baseada na influência da força de Lorentz sobre a


trajetória de um elétron num microscópio eletrônico. As amostras são afinadas e
depois vistas num microscópio eletrônico de transmissão (TEM) de contraste de
fase. Pode ser alcançada uma resolução espacial da ordem de 10 nm. Entretanto, é
importante ter em mente que as técnicas baseadas nos estudos por TEM, tais como a
microscopia de Lorentz ou a holografia eletrônica, resultam numa informação
magnética que é uma média sobre toda a trajetória dos elétrons quando eles
atravessam a amostra.

4. A microscopia eletrônica de varredura com análise de polarização (SEMPA) é baseada


no fato de que os elétrons secundários emitidos pela superfície de uma amostra
ferromagnética possuem uma polarização de spin proporcional à magnetização da
superfície da amostra, e orientada com ela. Analisando a polarização dos elétrons
secundários, enquanto se monitora o feixe focalizado de elétrons primários, é então possível
obter informação espacial resolvida, a respeito da grandeza e direção da magnetização da
superfície. A resolução espacial alcançada é da ordem de algumas dezenas de nanômetros.
Como os elétrons secundários analisados se originam em uma camada da superfície de
apenas alguns nanômetros de espessura, o SEMPA é uma técnica que depende muito da
superfície. Também ela só opera em condições de ultra alto vácuo, e requer superfícies de
amostras muito bem preparadas, livres de contaminantes não magnéticos. Normalmente
leva muito tempo obter uma imagem de grande contraste e alta resolução devido à falta de
eficiência na coleta e análise dos elétrons secundários.

Em resumo, enquanto várias técnicas de fazer imagens magnéticas podem oferecer uma
resolução espacial da ordem de 10 a 100 nm, claramente elas podem ser distinguidas de
acordo com as propriedades da amostra a ser estudada como, por exemplo, a distribuição
superficial de magnetização ou os campos magnéticos que emanam da amostra. As técnicas
acima relacionadas diferem também significativamente em relação aos requisitos
necessários à preparação das amostras e do ambiente experimental. Em conclusão, a

escolha da técnica depende exclusivamente do estudo que se quer realizar .


Miscelâneas sobre SPM

Nestas notas de aula nos referimos apenas a algumas das muitas aplicações de um
microscópio de força atômica e sua utilização nos modos tradicionais de contato e não-
contato. As variações de um AFM aqui abordadas foram o FFM para medidas de atrito, o
EFM para medidas elétricas e o MFM para medidas magnéticas.

Se adicionarmos um pequeno sensor de temperatura à ponteira de um AFM, teremos um


SThM, ou scanning thermal microscope. Um sensor térmico pode ser construído com um
pequeno resistor cuja resistência depende da temperatura. Quando o cantilever varre a
superfície, as propriedades térmicas dela mudam a resistência do metal da sonda. Esta
variação é monitorada com uma ponte de Wheatstone. Então, com um SThM podemos
estudar simultaneamente, no modo de contato, as imagens topográfica e térmica de uma
amostra.

As variantes para um STM são ainda mais numerosas. Vinte anos após a invenção do
STM, as modificações introduzidas nele, visando a investigação de uma ampla gama de
propriedades da matéria, são muitas.

No princípio destas notas, falamos do SNOM. Dissemos que, como é bem sabido, a
resolução espacial atingida na microscopia ótica clássica está limitada pela difração a
aproximadamente a metade do comprimento de onda da luz utilizada. Este limite aparece
devido a que as ondas eletromagnéticas que interagem com um objeto do qual queremos
fazer a imagem são sempre difratadas em dois componentes: as ondas propagadas com
freqüências espaciais baixas, isto é, menores que a metade do comprimento de onda da luz
incidente e as ondas evanescentes, de altas freqüências espaciais, isto é, maiores que a
metade do referido comprimento de onda. A ótica clássica não trabalha com ondas
evanescentes, já que estas permanecem confinadas a distâncias menores que o comprimento
de onda da luz incidente, ou seja, ao chamado campo próximo. O SNOM é justamente uma
modificação do STM, onde se utiliza uma fibra ótica como ponteira, para sondar este
campo próximo, e onde a luz refletida pela amostra substitui a corrente de tunelamento.

O PSTM1 ou photon scanning tunneling microscope é uma modificação do SNOM


tradicional e, portanto, do STM feita para investigar superfícies dielétricas que não são
acessíveis por STM ou SEM devido a efeitos de cargas. Este microscópio consegue fazer
imagens tanto de topografia quanto de variações espaciais das propriedades óticas das
amostras tais como não homogeneidade no índice de refração. O aparelho é capaz de
fornecer a informação com uma resolução espacial melhor que aquela da micro
espectroscopia Raman. Como ponteira, se utiliza uma fibra ótica cujo raio é da ordem de
100 nm e que sonda o campo evanescente sobre a amostra dielétrica; este campo é
produzido por um feixe de luz incidente por baixo da amostra e refletido internamente. Há
tunelamento de fótons da amostra para a extremidade da ponteira enquanto se faz a
varredura. A detecção é realizada por um fotomultiplicador acoplado na outra extremidade
da fibra.
O SPNM2 ou scanning plasmon near-field microscope é outra modificação do SNOM com
a qual se espera detectar e identificar moléculas adsorvidas na superfície da amostra. Usa-se
um feixe de laser para excitar os plasmons superficiais que geram um campo próximo
ótico, sondado pela ponteira. Como detector se utiliza um foto diodo conseguindo-se
resoluções espaciais muito altas nas imagens óticas.

O SNAM3 ou scanning near-field acoustic microscope é uma modificação do STM, que


utiliza ondas acústicas. Ele é capaz de fazer imagens de topografia de superfícies não
condutoras usando como oscilador um diapasão de alto Q, sendo que uma de suas pernas é
utilizada como ponteira. Conseguem-se resoluções laterais de 1 µ m e verticais de
aproximadamente 10 nm.

O SNTM ou scanning near-field thermal microscope é uma modificação de um STM para


medir variações de temperatura. A interação térmica entre uma ponteira e uma amostra
pode ser usada para fazer contornos de superfícies tanto eletricamente condutoras quanto
isolantes. Devido aos diversos tipos de transferência de calor que se apresentam na
natureza, os métodos para medir a temperatura, são necessariamente diferentes. Um dos
aparelhos utilizados para fazer esse tipo de imagens ligadas à transferência de calor é o
STHP4 ou scanning thermal profiler que consiste em uma sonda térmica de campo
próximo, operada em não-contato, que é um termopar em miniatura aquecido
propositadamente para produzir uma diferença de temperatura entre a ponteira e a amostra.
Quando a sonda se aproxima da amostra, a sua temperatura diminui como resultado do
acoplamento térmico. A mínima variação detectável é menor que 0,1 mK. Um aparelho
alternativo é um TT5 ou tunneling thermometer que utiliza uma ponteira de STM como
termopar, operando com a corrente de tunelamento e medindo o gradiente local do
potencial químico da amostra em relação à temperatura.

Como resultado destes esquemas de trabalho, nasceram o SOAM6 ou scanning optical


absortion microscope e o SCPM7 ou scanning chemical-potential microscope. O primeiro
mede variações locais na temperatura de filmes finos, como resultado de variações na
absorção da radiação de um laser. A mínima diferença de temperatura detectável é da
ordem de 0,01 0K. O segundo microscópio mede variações de uma voltagem termoeléctrica
gerada por um gradiente de temperatura provocado na amostra. Conseguiram-se detectar
até sinais com variações locais em escala atômica.

O SCAM8 ou scanning capacitance microscope é utilizado para medir capacitância. A


superfície é sondada por uma ponteira eletrodo a uma distância de alguns nanômetros. Em
primeira aproximação, a capacitância é inversamente proporcional à distância entre a
ponteira e a amostra, dependência esta que se utiliza para controlar a altura. Mas,
efetivamente, a capacitância depende das geometrias da ponteira e da amostra, assim como
das constantes dielétricas delas e do meio. É por isto que o SCAM se utiliza também para
estudar variações espaciais nas propriedades dielétricas dentro ou através de camadas
isolantes.

Em conclusão, com estes exemplos, vemos que são muitas as variações possíveis nos
equipamentos e muitas as propriedades a serem medidas com eles. Na literatura sobre o
tema, que se resume fundamentalmente a trabalhos publicados em revistas especializadas,
podemos encontrar muitas outras modificações de um SPM– seja ele STM ou AFM – que
vêm sendo realizadas de acordo com o tipo de propriedade que se quer investigar.

1. Reddik, Warmack and Ferrell. Phys.Rev. B 39, 767 (1989).

2. Specht, Pedarnig, Heckl and Hänsch. Phys.Rev.Lett. 68, 476 (1992).

3. Guethner, Fisher and Dransfeld. Appl.Phys. B 48, 89 (1989).

4. Williams and Wickramasinghe. Appl.Phys.Lett. 49, 1587 (1986).

5. Weaver, Walpita and Wickramasinghe. Nature 342, 783 (1989).

6. Referência 5.

7. Williams and Wickramasinghe. Nature 344, 317 (1990).

8. Matey and Blanc. J.Appl.Phys. 57, 1437 (1985).


Sistema de Unidades

Sistema
grandeza símbolo unidades CGS
Internacional

107 erg
2 -2
energia Joule J kg m s
=6,24x1018eV

força Newton N kg m s-2 105 dinas

potência Watt W kg m2 s-3 W

9,87x10-6 atm
pressão Pascal Pa N m-2
= 10 dinas/cm2

carga Coulomb C As 2,9976x109 esu


elétrica

potencial Volt V J C-1 V


elétrico

campo elétrico
Volt/metro V/m V m-1 10-2V/cm

fração 1018 1015 1012 109 106 103

símbolo E P T G M k

nome Exa Peta Tera Gega Mega Kilo

fração 10-3 10-6 10-9 10-12 10-15 10-18

símbolo m µ n p f a

nome mili Micro nano pico emto atto

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