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BONFIM

SEBRAE-MG
Agosto a dezembro de 2008
FICHA TÉCNICA
2010 Sebrae-MG
Nenhuma parte ou o todo desta publicação poderá ser reproduzido – em qualquer meio ou forma, seja mecânico ou eletrônico, fotocópia,
gravação, etc. – nem apropriado ou estocado em sistema de banco de dados sem prévia autorização, por escrito, do Sebrae-MG.

Sebrae-MG
ROBERTO SIMÕES
Presidente do Conselho Deliberativo
AFONSO MARIA ROCHA
Diretor Superintendente
LUIZ MÁRCIO HADDAD PEREIRA SANTOS
Diretor Técnico
MATHEUS COTTA DE CARVALHO
Diretor de Operações

Unidade de Atendimento Coletivo – Comércio, Serviços e Artesanato Sebrae-MG


AGMAR ABDON CAMPOS
Gerente
MÔNICA STELA DE ALENCAR CASTRO
SAMIRA DE CARVALHO RIBEIRO

Macrorregião Norte Sebrae-MG


CLÁUDIO LUIZ DE SOUZA OLIVEIRA
Gerente

Microrregião de Diamantina
LUCIANA TEIXEIRA SILVA

Assessoria de Comunicação Sebrae-MG


LAURO DINIZ
Assessor
MÁRCIA DE PAULA DA FONSECA
FERNANDA ALMEIDA RUAS
DANIELA CORREIA LEMOS DE CARVALHO

Fundação de Arte de Ouro Preto – FAOP


ANA PACHECO
Presidente A492 Ambiente gastronômico no Vale: região do Vale do Jequitinhonha. / coordenação,
Maria Sonia Madureira de Pinho – Belo Horizonte: Sebrae-MG, 2010. 54 p.
MARIA SONIA MADUREIRA DE PINHO
Coordenação

Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM 1.Gastronomia – Vale do Jequitinhonha-MG I. Pinho, Maria Sonia
VIVIANE CRISTINA DE PAULA Madureira II .Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais.
Monitoria IV. Fundação de Arte de Ouro Preto – FAOP. V. Universidade Federal dos Vales
do Jequitinhonha e Mucuri.
PERFIL PUBLICIDADE
Projeto Gráfico
CDU: 641
TURISMO DE SABOR E TRADIÇÃO
A vida das pacatas localidades rurais de Minas Gerais, com paisagens pitorescas,
costumes e artes seculares, linguajar típico e o sabor inesquecível de alimentos
saudáveis, inspirou uma nova parceria do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro
e Pequenas Empresas – SEBRAE-MG e do Governo do Estado para estimular o
resgate da cidadania e o desenvolvimento econômico e social de comunidades
das diversas regiões mineiras. O programa Turismo Solidário criou roteiros para
despertar a imaginação e os sonhos dos visitantes, que viram protagonistas do
processo de valorização da sabedoria popular, das tradições, da arte e da cultura,
contribuindo para a melhoria da qualidade de vida da gente simples do interior.

A coleção Ambiente Gastronômico do Vale registra a história, o ambiente e o


saber culinário dos moradores de Alecrim, Bonfim, Capivari e Mendanha, distritos
do Jequitinhonha que já desenvolveram atividades de organização do turismo
receptivo familiar. Os quatro volumes foram produzidos com a participação das
comunidades, que buscaram, nos tradicionais cadernos de receitas preservados
e ampliados de geração em geração, as anotações pessoais sobre os pratos
mais saborosos e informações sobre remédios caseiros para diversos males. A
publicação também fala das rezadeiras e de bênçãos que a força da crendice
popular ainda prefere no lugar de modernos tratamentos médicos.

Na sua mais atualizada concepção, o turismo considera que a originalidade dos


destinos e a emoção que provocam são marcas indispensáveis à atração de
visitantes cansados da padronização mundial dos roteiros. Com esta coleção, o
SEBRAE-MG entende que, além de divulgar um inovador programa turístico que
possibilita a geração de emprego e renda, contribui para recuperar e preservar
a rica culinária de Minas. Os sabores e cheiros dos salgados, doces e quitandas
mineiros oferecem aos turistas, em singelas mesas de confraternização, o sonho e
a fantasia. E, nas conversas sobre habilidades e conhecimentos culturais, artísticos
e práticos, é possível reconhecer aquilo que, ao longo dos séculos, forjou o jeito
de ser do povo mineiro.

Roberto Simões
Presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae-MG
VIAGEM ÀS ORIGENS DE MINAS

O programa Turismo Solidário, uma iniciativa do Governo de Minas Gerais, foi elabo-
rado pela Secretaria de Estado Extraordinária para o Desenvolvimento dos Vales do
Jequitinhonha e Mucuri e do Norte de Minas – Sedvan em parceria com SEBRAE-MG
para realizar a ordenação turística de localidades atendidas pelo Estado nas três regiões,
fazendo do turismo instrumento de promoção do crescimento sustentável dessas
comunidades.

A proposta privilegia a valorização e divulgação do jeito de ser, da cultura popular e


das belezas naturais das comunidades. Os turistas solidários participam do cotidiano
das famílias que os hospedam e usufruem do aconchego dos lares, das conversas ani-
madas à mesa de refeições e dos sabores de alimentos dos quintais das casas, entre
muitos outros atrativos.

Possibilitando troca de conhecimentos e geração de renda às populações locais, o


programa significa esperança de vida melhor para centenas de famílias beneficiadas
pelo aumento do fluxo turístico e pela participação solidária dos turistas.

Os distritos de Mendanha (em Diamantina), Alecrim e Bonfim (em São Gonçalo do Rio
Preto) e Capivari (no Serro) já desenvolveram as atividades de organização dos recep-
tivos familiares e são os primeiros a ter suas receitas culinárias tradicionais registra-
das no catálogo Ambiente Gastronômico no Vale. Trata-se de mais uma contribuição
para divulgar e consolidar as ações do inovador programa, que desperta no turista
o interesse de participar do processo de transformação social e econômica regional,
estimulando a cidadania e a inclusão social.
A Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais sente-se honrada em dar conti-
nuidade a mais um trabalho de resgate do patrimônio do Estado, executado pela
Fundação de Arte de Ouro Preto – FAOP. A iniciativa confirma o importante papel
da entidade na recuperação e salvaguarda da cultura popular mineira.

O projeto Ambiente Gastronômico no Vale do Jequitinhonha apresenta um dos


maiores patrimônios do imaginário e dos fazeres do povo mineiro: a culinária.

O Vale do Jequitinhonha e sua rica gastronomia sintetizam os sabores e cheiros


de Minas Gerais a partir de suas receitas de doces, salgados e quitandas.

A gastronomia do Jequitinhonha sinaliza o significado de ser mineiro, além de re-


velar símbolos da identidade cultural do Estado. Neste livro, a FAOP convida todos
a explorar, desvendar e absorver esse grande mistério.

Paulo Brant
Secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais
O PROGRAMA TURISMO SOLIDÁRIO
O programa Turismo Solidário foi criado para possibilitar a inclusão social de popu-
lações carentes a partir da dinamização da economia de municípios que integram
a área de atuação do Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas
Gerais – Idene, órgão vinculado à Secretaria de Estado Extraordinária para o Desen-
volvimento dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri e do Norte de Minas – Sedvan.

A proposta resultou da constatação de que a cadeia produtiva da atividade turísti-


ca, envolvendo mais de 50 setores da economia, abre amplas possibilidades de de-
senvolvimento para as comunidades locais, pois induz novos empreendimentos, cria
postos de trabalho, aumenta a circulação de riquezas, distribui renda de forma mais
democrática e combate à miséria e à fome.

O programa estimula o aumento do número de turistas solidários aptos a transferir


habilidades, conhecimentos ou interesses e a participar como protagonistas do pro-
cesso de transformação do Estado. Simultaneamente, identifica as pessoas dispostas
a aprender e a melhorar suas perspectivas de vida.

O que se pretende é despertar no turista solidário o sentimento humanista de se tor-


nar um voluntário e agente direto de mudanças na região. A sociedade organizada
agrega valor às ações solidárias dos visitantes, incentivando a cultura de cooperação,
o resgate da cidadania, a valorização da identidade cultural das comunidades e a pre-
servação do meio ambiente.

Paralelamente à possibilidade de aumento da renda e aos avanços sociais das popu-


lações locais é importante destacar que o turista solidário poderá usufruir das belezas
naturais e culturais da área do programa, o que fomentará a cultura da paz. O alcance
desses objetivos pelas comunidades contempladas depende do sucesso de ações e
esforços coletivos.

Elbe Brandão
Secretária de Estado Extraordinária para o Desenvolvimento dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri e do
Norte de Minas – Sedvan
RECEITAS DE ARTE E CULINÁRIA
A Fundação de Arte de Ouro Preto – FAOP, órgão vinculado à Secretaria de Estado de
Cultura de Minas Gerais, consolida-se como instituição de referência na preservação do
patrimônio mineiro, confirmando sua vocação de valorizar a multiplicidade cultural, com
ações de reconhecimento, resgate e preservação dos saberes e fazeres dos lugares que
tornam tão ricas, generosas e atraentes as terras e as tradições mineiras.

Em mais uma parceria entre a FAOP e o SEBRAE-MG, o projeto Ambiente Gastronômico


no Vale do Jequitinhonha propõe o mapeamento dos sabores e hábitos alimentares dos
vales do Jequitinhonha e Mucuri e do Norte de Minas para desvendar uma das mais sig-
nificativas tradições mineiras: a arte da culinária.

O projeto reabilita uma epifania de sabores, guiado pela tradição oral e por personagens
característicos da cultura do Estado. Do processo de investigação em Diamantina, São
Gonçalo do Rio Preto e Serro, participam quatro distritos do Jequitinhonha - Alecrim, Bon-
fim, Capivari e Mendanha –, tendo as comunidades locais como participantes ativas, fios
condutores da pesquisa e grandes responsáveis pelos resultados alcançados.

A receptividade das famílias resultou num levantamento valioso de dados sobre a tradi-
ção da mesa, os atributos do alimento e as funções do ambiente da refeição, permitindo
a elaboração dos cadernos de receitas regionais.

O comprometimento dos colaboradores locais na compilação e registro de próprio pu-


nho de receitas de salgados, doces, remédios e quitandas, indicou o caminho editorial
da reprodução dos textos que, por si só, pintam os cenários das regiões em que foram
escritos. O leitor encontrará nas páginas desses Cadernos não somente receitas gastro-
nômicas locais e regionais, mas a expectativa de suas populações de valorizar sua cultura,
divulgando e preservando tradições e costumes.

Capturar a essência do Vale do Jequitinhonha através de suas quitandas, doces, salgados,


receitas, hábitos e diversidade de paladares, possibilita à FAOP o orgulho de adicionar
tempero à preservação do sabor de Minas e de divulgar o resultado de um trabalho que
representa mais um passo na consolidação da política de valorização e preservação do
patrimônio cultural do Estado.

Ana Pacheco
Presidente da Fundação de Arte de Ouro Preto – FAOP
TURISMO COM ORIGINALIDADE E EMOÇÃO
Buscando consolidar e evidenciar os destinos turísticos que fazem parte do Programa
Turismo Solidário, este trabalho busca resgatar aspectos importantes das tradições
e costumes associados à gastronomia, presentes nas localidades de Mendanha, Ale-
crim, Bonfim e Capivari, no Vale do Jequitinhonha.

A participação espontânea dos moradores das comunidades e o compartilhamento


de suas histórias e receitas foram imprescindíveis para garantir a riqueza dos resul-
tados desta pesquisa, que propiciou o registro de diversos pratos da culinária local.
Além de incentivar a reutilização de algumas receitas pouco valorizadas pelos mora-
dores locais, este resgate possibilita ofertar uma alimentação genuinamente tradi-
cional aos turistas solidários, interessados em conhecer as peculiaridades da região.
Dessa forma, os saberes locais são incorporados como atrativos a serem disponibiliza-
dos aos visitantes, contribuindo para o maior convívio entre as famílias e os turistas,
além de possibilitar o incremento de renda da população dessas comunidades.

A culinária faz parte da riqueza cultural e histórica de Minas Gerais. Em 1817, viajando
pelo Brasil, o francês Auguste de Saint-Hilaire observou a recepção hospitaleira e a
mesa farta dos mineiros. Ele escreveu importantes livros sobre costumes e paisagens
do país. Em um deles, destaca que o mineiro come bem e come certo, pois tem o
hábito de “produzir” a cesta básica em sua própria casa. Cria porco e frango, cultiva
verduras, legumes e milho, faz o pão e o queijo e preserva a informação culinária de
mãe para filha. Tradições que transformaram a gastronomia em atrativo turístico.

Agmar Abdon Campos


Unidade de Atendimento Coletivo – Comércio, Serviços e Artesanato Sebrae-MG
SUMÁRIO
Gastronomia: ambiente de cultura .............................................. 14 Sucos........................................................................................... 34
Suco de abacaxi ........................................................................... 34
História de Bonfim ..................................................................... 17 Suco de amora ............................................................................. 34
Suco de berduega ....................................................................... 34
Ambiente .................................................................................... 19 Suco de chapéu-de-couro ........................................................... 34
Suco de couve ............................................................................. 34
Receitas salgadas....................................................................... 21 Suco de folha de abacate............................................................. 34
Carne ........................................................................................... 21 Suco de folha de laranja .............................................................. 34
Carne inteira ................................................................................ 21 Suco de laranja ............................................................................ 34
Frango assado ............................................................................. 21 Suco de limão .............................................................................. 34
Frango assado na lata de cerveja ................................................. 22 Suco de maracujá ........................................................................ 34
Farinha de andu (carajé) .............................................................. 22 Suco de picão .............................................................................. 34
Farofa de andu verde ................................................................... 22
Prasta ........................................................................................... 22 Vinho e vinagre .......................................................................... 36
Muscela ....................................................................................... 23 Vinagre de jabuticaba .................................................................. 36
Queijo mineiro ............................................................................. 23 Vinho de uva................................................................................ 36
Requeijão..................................................................................... 24
Outras receitas ........................................................................... 37
Receitas doces............................................................................ 27 Azeite de mamona ...................................................................... 37
Cuscuz (fubá de moinho)............................................................. 27 Sabão caseiro............................................................................... 37
Curau ........................................................................................... 27
Doce de laranja-da-terra .............................................................. 28 Colheita de mel .......................................................................... 39
Mingau de fubá ........................................................................... 28 Como coletar o mel ..................................................................... 39
Pamonha ..................................................................................... 28 Própolis........................................................................................ 40
Sonho .......................................................................................... 29
Rapadura simples ........................................................................ 29 Hábitos e costumes ................................................................... 42
Rapadura temperada ................................................................... 29 Benzedeiras e benzeções............................................................. 43
Garrafada ..................................................................................... 48
Quitandas ................................................................................... 31 Chá caseiro para bronquite ......................................................... 49
Brevidade .................................................................................... 31
Bolo de mandioca........................................................................ 31 Grupo de participantes e colaboradores ................................. 52
Pão caseiro................................................................................... 32
Pão de ló ...................................................................................... 32 Posfácio ...................................................................................... 53
Biscoito de goma com rapadura .................................................. 33
Broa de fubá ................................................................................ 33 Referências ................................................................................. 53
GASTRONOMIA: AMBIENTE DE CULTURA

O projeto Ambiente Gastronômico no Vale, iniciativa do Sebrae-MG, convidou


moradores do Vale do Jequitinhonha, mapeados pelo Programa Turismo Solidá-
rio/SEDVAN-IDENE, a sentar em torno da mesa para trocar receitas da rica culiná-
ria local e compartilhar os saberes e fazeres da região. A pesquisa percorreu as
localidades de Alecrim, Bonfim, Capivari e Mendanha durante os cinco meses de
duração do trabalho, iniciado em agosto de 2008.

Para nós participantes, esse foi um emocionante processo de resgate da memória


gustativa, olfativa e, principalmente, afetiva dos lugares e das pessoas que nos
acolheram e com quem convivemos estreitamente. Pura história de Minas, me-
tamorfoseada em quitandas, salgados, doces, garrafadas e infusões. O resultado
você vai conhecer agora: são receitas de vida e de fé.

Gastronomia é cotidiano e é cultura. É engenho e é arte. Os pratos nutrem o cor-


po, a convivência nutre a alma. O relacionamento com as mulheres pesquisadas
determinou nossa estratégia de trabalho. A culinária mineira é marcada pela orali-
dade, com receitas transmitidas verbalmente através de gerações. Ainda assim, o
caderno de receitas é percebido como um verdadeiro patrimônio familiar, sinô-
nimo de pertencimento e de vivências compartilhadas. Com base nessa constata-
ção, incorporamos às pesquisas o conceito de caderno de receitas, que se tornou
o elo entre as mulheres e as suas comunidades, entre pesquisador e pesquisados.
A principal missão foi expandir o olhar das envolvidas – de dentro de casa para
fora dela, do familiar para o social.

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A alquimia dos encontros transformou intenção em ação. Munidas de seus cader-
nos, as mulheres tornaram-se as protagonistas do resgate da sua cultura, de suas
tradições, dos seus rituais, escrevendo a própria história por meio das receitas de
suas famílias e do seu território. Na riqueza do convívio, em conversas e trocas,
revelaram-se os hábitos do cultivar, do colher e as diferentes maneiras de criar e
recriar o alimento.
As experiências do campo trouxeram respostas inusitadas. Na observação dos
usos e costumes, a revelação da expressiva mobilidade das ervas e “matos”. A hor-
ta que se apresenta como elementar no cotidiano, do cultivo aos cuidados de
preservação das ervas nativas, em seu ciclo de vida possui funções diferenciadas
que se interconectam, dependendo da missão: podem servir para benzer ou para
temperar.

Práticas que nesta oportunidade se apresentam reunidas aqui, na forma de um


caderno de receitas escrito a muitas mãos, com a generosidade e a sabedoria de
muitas gerações. A elas, todo o meu carinho e o meu profundo respeito.

Maria Sonia Madureira de Pinho


Coordenação de Projeto

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HISTÓRIA DE BONFIM

O distrito de Bonfim, no Alto Jequitinhonha, teve início em meados do século


XVIII, quando tropeiros de Minas Novas passavam às margens do Córrego do
Coito, a caminho de Diamantina, e ali paravam para descansar. A comunidade se
desenvolveu a partir da instalação de uma fábrica de ferro, que deixou apenas
vestígios no local.

De sua arquitetura original, destacam-se a Igreja do Senhor do Bonfim e a casa do


bispo dom João Antônio dos Santos. Restam algumas edificações coloniais, mas a
maior parte é de estilo moderno. Na região, há as microbacias dos córregos Estiva,
Jacuba e do Coito.

Artesanalmente, a comunidade produz bonecas de pano, tecidos, balaios, forros


de taquara e cortinas de peti. Também fabrica farinha de mandioca e rapadura.
Na cultura, são preservados os grupos folclóricos, com suas danças tradicionais,
e também se repetem anualmente as tradicionais festas religiosas do Senhor do
Bonfim, de São João Batista e de São Vicente de Paula.

População – 255 habitantes


Sede – São Gonçalo do Rio Preto
Distância de Bonfim a São Gonçalo do Rio Preto – 18km
Acesso a São Gonçalo do Rio Preto – estrada de terra
Infraestrutura – telefonia fixa, água de nascente e energia elétrica

Fonte de pesquisa: banco de informações do Programa Turismo Solidário

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AMBIENTE
Cotidiano

Café da manhã
Horário: depende dos maridos e filhos, mas não varia muito – entre 5h e 5h30.
Refeição: bolos de fubá e farinha de trigo (às vezes, acrescentam cenoura, abóbora e
outras misturas), biscoito de goma com sal e café preto com açúcar ou chá. Também
pode ser servido um mexido, aproveitando as sobras das refeições do dia anterior.

Almoço
Horário: entre 10h e 11h.
Refeição: couve com torresmo, angu, abóbora, chuchu, macarrão. Às vezes, tem tro-
peiro.

Lanche da tarde
Horário: entre 13h e 14h.
Refeição: inhame, mandioca, cuscuz, angu doce e sucos de espinafre, de flor de cha-
péu-de-couro, de abacate ou de couve, todos à base de laranja ou limão.

Frutas da comunidade
Acerola, caju, abacaxi (nas redondezas), manga, jabuticaba, amora, uva e ameixas ver-
melha e amarela.

Doces de frutas
Laranja-da-terra, mamão, goiaba (pastoso), toranja (semelhante à cidra) e limão.

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RECEITAS SALGADAS

Carne
Por Matilde Serafim Santos
Modo de fazer:
primeiro, recorte o lombo. Depois chuche toda a carne e ponha os temperos:
sal e alho, folhas verdes de todo tipo, alfavaquinha, louro, pimenta e um pouco
de cachaça com cebola e salsa. Deixe de molho até o dia seguinte. Coloque
para cozinhar numa vasilha aberta, até apertar na gordura.
“Desculpe a simplicidade.”

Carne inteira
Por Matilde Serafim Santos
Modo de fazer:
tempere o lombo com toucinho, alfavaca, quitoco, cebolinha e salsa.
Deixe descansar de um dia para o outro. Ponha para assar ou cozinhar,
até corar bem.

Dicas: quando a carne é de boi, use água; se for de porco, só suando ela cozinha.

Frango assado
Por Maria Alda
Modo de fazer:
mate o frango, tire as penas e limpe. Abra por baixo (faça uma cruz), retire as
tripas, o bico e a goela, para dobrar o pescoço. Lave com água temperada com
sal, alho, alfavaquinha e outras ervas a gosto, até endurecer. Ponha para assar
no forno ou faça na panela. Use o fígado e o sangue para fazer a farofa.

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Frango assado na lata de cerveja
Por Maria Alda Moreira
Modo de fazer:
limpar o frango pelo oveiro, perfurar toda a carcaça e temperar por dentro,
deixando na vinha d’alho, em um saco de plástico, de um dia para o outro, a
fim de que a cerveja da lata penetre na carne. No dia seguinte, jogue a lata de
cerveja fora, ponha o frango num tabuleiro com batatas ao redor e asse no
forno até dourar.

Farinha de andu (carajé)


Por Vivência Vieira dos Santos, relatada por Kátia, sua neta
Modo de fazer:
seque no sol o andu colhido seco. O andu verde serve para fazer a farofa. So-
que os grãos bem secos até virar farinha. Use para misturar à comida ou para
fazer bolinho de ovo.

Farofa de andu verde


Por Kátia Aparecida dos Santos Araújo
Modo de fazer:
ponha o andu verde para ferver, como se fosse feijão. (Tire a primeira água,
porque é muito quente para quem tem problemas renais (essa água estimula
as galinhas poedeiras). Complete o cozimento, deixando o caldo secar. Mistu-
re ovos cozidos, toucinho, linguiça e pele de porco. Depois, refogue o andu na
gordura de porco e adicione os outros ingredientes, acrescentando farinha de
mandioca e deixando a farofa mais pastosa. Coloque também couve picada
bem fininha e já cozida.

Prasta
Por Vivência Vieira dos Santos, relatada por Kátia, sua neta
Modo de fazer:
bata o ovo e coloque leite ou água, açúcar e farinha de trigo com fermento.
Abra a massa com as mãos úmidas de óleo no formato que quiser (rosa, cora-
ção etc.). Pode ser salgado ou doce. Se usar água, fica duro e tem que acres-
centar mais ovo.

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Muscela
Por Maria Helena Alves dos Santos
Modo de fazer:
tempere sangue de porco com salsa, quitoco, alfavaca, outras folhas verdes,
sal com alho, louro e pimenta-malagueta (pimenta-do-reino é muito quente).
Escolha tripas do intestino grosso, encha-as até o meio com o sangue tem-
perado e pequenos pedaços de toucinho sem pele e coloque na água para
ferver. Enquanto estiver fervendo, faça vários furos na tripa, com espinho de
laranja. Concluído o cozimento, guarde a muscela em uma vasilha tampada.
Quando quiser comer, corte e frite os pedaços.
“Eu gosto de pedaços, tem gente que prefere rodelas.”

Queijo mineiro
Por Kayto Georg dos Santos
Ingredientes:
10 litros de leite
1 colher de sopa de coalho
1 colher de sopa de sal grosso

Modo de fazer:
coloque o coalho no leite e deixe durante 30 minutos. Retire a massa já coa-
lhada e ponha na forma, em cima de um escorredor. Vá apertando até a massa
ficar enxuta. Na massa enformada, coloque meia colher de sopa de sal grosso
por cima, separando as pechas salgadas umas das outras. Deixe na forma por
24 horas. Caso queira o queijo mais curado, deixe no sol e no sereno.

Rendimento: um queijo

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Requeijão
Por Lenice Mariano Chaves Santos

Ingredientes:
15 litros de leite
1 colher de sopa de sal
2 copos de leite
vinagre

Modo de fazer:
deixe o leite azedar por dois dias em uma vasilha avinagrada. No terceiro dia,
retire toda a manteiga e ponha a massa para ferventar por seis minutos. Coe
em um saco de pano, deixando a massa limpa e bem seca. Em porções de cin-
co litros, volte com a massa ao fogo por cinco minutos. Coe novamente. Frite
a manteiga retirada da massa, até ficar dourada, mexendo sempre. Coloque
uma colher de sopa de sal fino. Cozinhe com mais dois copos de leite e amas-
se até soltar da panela. Ponha a massa numa forma e pode servir quente ou
esperar esfriar.

Dicas: não é aconselhável mulher menstruada preparar o requeijão, porque a


massa não dá ponto. Evitar fazer no período de lua minguante, pois a mas-
sa não cresce.

Rendimento: um requeijão

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RECEITAS DOCES

Cuscuz (fubá de moinho)


Receita Coletiva
Modo de fazer:
molhar o fubá com leite, temperar com sal, manteiga, erva-doce e rapadu-
ra grossa (em pedacinhos é melhor). Misturar bem. Numa forma untada com
gordura ou forrada de folhas ou palma, despeje a massa e cozinhe em banho-
maria, com a água até o meio da panela, rebocada com angu ou a própria
mistura. Sirva quente.

Dicas: se quiser, forre o fubá com lasquinhas de queijo curado. Caso misture fun-
cho, cozinhe a planta em banho-maria, pode ser também cozido na água de
banho-maria bem abafada.

Curau
Por Maria Helena Alves dos Santos
Modo de fazer:
apanhe espigas médias de milho verde, nem muito mole e nem muito dura.
Tire a palha, rale a espiga, lave e jogue a água fora, bem rápido para não sair
a goma. Lave com leite, para sair a goma, e passe numa peneira para obter o
mingau. Coloque uma pitada de sal, açúcar ou rapadura e canela em pó, se
gostar. Leve ao fogo, mexendo a panela sem parar, da direita para a esquerda
e vive-versa, para não esturrar (queimar o fundo). Para verificar o ponto, colo-
que um pouco do mingau num prato e, se não coalhar e nem tiver gosto de
milho cru, está cozido.

Dica: se usar três espigas novas (verdes), tem que misturar duas mais velhas para en-
durecer o mingau.

Consumir quente ou frio (em fatias, é melhor frio).

27
Doce de laranja-da-terra
Por Maria Alda Moreira
Modo de fazer:
tire o sumo das laranjas, descascando as frutas com cascas bem fininhas. Corte
em cruz, remova os bagaços e ponha as laranjas de molho por oito dias, tro-
cando a água diariamente. Depois, ferva as frutas, deixe esfriar e lave em água
fria. Faça uma calda bem grossa de rapadura ou açúcar queimado, com canela
e cravo, se gostar. Quando a calda estiver em ponto de espelho, misture as
laranjas e deixe esfriar para servir o doce.

Mingau de fubá
Por Maria Helena Alves dos Santos
Modo de fazer:
desmanche o fubá com leite, misture um pouco de sal, açúcar ou rapadura e
queijo ralado ou em pedaços, ponha tudo na panela e mexa até engrossar e
cozinhar.

Dicas: pode misturar também um pouco de manteiga. Ou ainda fazer uma espécie de
gemada, batendo a gema com garfo para colocar no mingau. Se usar ovo, não
ponha manteiga.

Consumir preferencialmente à noite.

Pamonha
Por Maria Flor de Maio
Modo de fazer:
ralar o milho verde, temperar com sal e enrolar na própria palha. Cozinhar na
água só por alguns minutos. Servir quente.

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Sonho
Por Raimundo Nonato dos Santos
Modo de fazer:
misture fubá de moinho com leite ou água, açúcar, ovo, sal, canela e cravo mo-
ídos e erva-doce, numa vasilha. Enrole os bolinhos com as mãos passadas na
farinha de trigo e frite no óleo quente ou na gordura de porco. Use a escuma-
deira para tirar os bolinhos da panela e colocá-los em guardanapo de papel,
para puxar a gordura. Servir com café ou leite.
“Não é muito comum a gente fazer sonhos. Quando tem gente de fora, costu-
mamos fazer. Sonho parece um bolo de fubá, mas é frito.”

Rapadura simples
Por Raimundo Nonato dos Santos
Modo de fazer:
moa a cana-de-açúcar para obter a garapa. Ferva a garapa em um tacho de
cobre até engrossar (está no ponto se o caldo virar uma bala quando posto
em água fria). Acrescente cascas de mutamba socadas para tirar seu líquido
ou carrapicho. A mutamba limpa a garapa e é preciso passar a escumadeira
no tacho para tirar toda a espuma suja. Deixe o caldo engrossar por mais uma
hora. Está pronta a rapadura, para ser posta em formas e secar.

Rapadura temperada
Por Raimundo Nonato dos Santos
Modo de fazer:
quase o mesmo processo da rapadura simples, só muda na hora de botar nas
formas. Antes, ponha a rapadura na masseira, bata e misture canela,
erva-doce, sal, cravo, gergelim ou o tempero que preferir.

Dica: guarde a rapadura em lugar quente. Se estiver chovendo, enrole em palha de


banana ou de milho (mais quente) para conservar a rapadura.

Tipos de rapadura: clara e morena, depende do terreno de plantio da cana. Em solo are-
noso, dá rapadura igual a açúcar (não fica maciça); em terreno de var-
gem, dá “rapadura de cerâmica”, que derrete com frio ou chuva.

“Aqui em Bonfim tem fábrica de rapadura. Eu acho rapadura melhor que doce.”

29
QUITANDAS

Brevidade
Por Maria Alda Moreira
Ingredientes:
1kg de goma ou polvilho
1 dúzia de ovos
1 garrafa de água
1 colher de chá de sal
1 pitada de erva-doce
1 lata de óleo

Modo de fazer:
escalde a goma ou o polvilho com água fervente. Misture, deixe esfriar e amas-
se bem, acrescentando os ovos, o óleo e a erva-doce. Depois de bem amassa-
do, espalhe em forminhas untadas com óleo. Leve ao forno não muito quente.

Bolo de mandioca
Por Maria Balleina dos Santos
Ingredientes:
1kg de mandioca
12 gemas de ovos
½kg de manteiga
½kg de açúcar

Modo de fazer:
rale a mandioca, lave, torça em um pano e esfarele numa vasilha. Refogue e
misture bem no açúcar. Coloque os ovos e a manteiga e bata até ficar no pon-
to. Despeje numa forma untada com manteiga e asse em forno com tempera-
tura média. Quando o bolo ficar rosado, tire do forno, deixe esfriar e sirva.

31
Pão caseiro
Por Isolina
Ingredientes:
3kg de farinha de trigo
3 colheres de fermento
3 colheres de açúcar
3 copos de água morna

Tempero:
½ dúzia de ovos
½kg de açúcar
1 colherinha de sal
250g de manteiga
½ lata de óleo

Modo de fazer:
misture todos os ingredientes, menos o fermento, e deixe crescer por 20 mi-
nutos. Despeje em uma vasilha e adicione um copo de água morna. Na vasilha
com o fermento, coloque um pouco de farinha de trigo para fazer uma espécie
de mingau. Misture todos os ingredientes do tempero, acrescente a farinha de
trigo e amasse. Ponha farinha de trigo nas mãos e na vasilha para que a mas-
sa fique solta. Faça uma bolinha e coloque num copo de água: se ela boiar, a
massa está pronta para assar. Para enrolar, corte a massa em pedaços e abra
com uma garrafa sobre uma tábua com farinha de trigo. Derreta a manteiga e
passe na massa aberta para ficar amarela. Não há tempo certo para assar, mas
não se descuide, pois o pão pode queimar.

Pão de ló
Por Maria Alda Moreira
Modo de fazer:
ponha quatro claras de ovos num prato e bata até ficar bem grosso. Misture
as gemas e continue batendo para engrossar. Adicione açúcar ou rapadura,
bicarbonato, uma pitada de sal e outra de canela em pó. Despeje a massa em
forma untada com óleo e leve ao forno brando.

32
Biscoito de goma com rapadura
Por Maria Flor de Maio
Modo de fazer:
raspe meia rapadura em um quilo de goma e misture uma pitada de sal e uma
colherinha de canela em pó. Soque tudo no pilão e passe em peneira grossa.
Numa vasilha, coloque essa mistura, uma xícara de óleo, seis ovos e sal até
ficar no ponto de enrolar. Faça os biscoitos em forma de argola, ponha num
tabuleiro untado com óleo e asse em forno brando, por 10 minutos. Deixe es-
friar, não abafe e sirva os biscoitos.

Broa de fubá
Por Maria Flor de Maio
Modo de fazer:
ponha metade de uma rapadura em meio litro de água para derreter no fogo,
fazendo um melado. Deixe esfriar e adicione a clara em neve de seis ovos, meia
xícara de óleo, uma pitada de sal e meia colherinha de cravo em pó. Acrescente
um quilo de fubá, misture bem e leve ao forno quente, deixe por 30 minutos. Ao
tirar do forno, abafe a broa com um pano para a massa ficar fofa. Corte em fatias
para servir.

33
SUCOS
Por Raimundo de Jesus e Kayto Georg dos Santos
Suco de abacaxi
Suco de amora
Suco de berduega
Suco de chapéu-de-couro
Suco de couve
Suco de folha de abacate
Suco de folha de laranja
Suco de laranja
Suco de limão
Suco de maracujá
Suco de picão

Modo de fazer:
sempre feitos com produtos das hortas e pomares de Bonfim, a receita básica
dos sucos é a seguinte: maior quantidade de fruta para um pouco de água; se
preferir, troque a água por leite.

34
VINHO E VINAGRE
Vinagre de jabuticaba
Por Luzia
Modo de fazer:
amasse com as mãos as jabuticabas maduras numa vasilha (se quiser vinagre
branco, é preciso tirar as cascas). Tampe e deixe azedar por três ou quatro dias.
Escorra e coe com um pano, diretamente nos vidros. Acrescente algumas bo-
linhas de angu, que purificam o vinagre. Tampe com sabugo de milho.

Vinho de uva
Por Luzia
Modo de fazer:
apanhe uvas maduras e esprema numa vasilha com as mãos (se quiser vinho
branco, tem que tirar as cascas). Tampe e deixe azedar por três ou quatro dias.
Coe o caldo em um pano, diretamente nos vidros, adicionando água, cachaça
e açúcar. Tampe com sabugo de milho.

36
OUTRAS RECEITAS
Azeite de mamona
Por Luzia
Modo de fazer:
seque sementes de mamona ao sol e torre numa panela. Soque no pilão e
jogue na água quente, mexendo até o azeite começar a aparecer. A borra vai
secando e o azeite sobe. Enquanto estiver borbulhando, ainda tem água e o
azeite não está pronto. Com uma colher, verifique o ponto do azeite, é quando
está na hora de engarrafar.

Recomendação de Maria Flor de Maio: “mexer sempre na mesma direção, com o mes-
mo pau (haste) de mamona”.

Sabão caseiro
Por Luzia
Ingredientes:
4 latas de sebo (medida - lata de óleo)
1kg de soda cáustica
4 latas de água (medida - lata de óleo)

Modo de fazer:
misturar os ingredientes com a água já quente, em uma bacia. Deixar esfriar e
cortar com uma faca, em pedaços quadrados.

Rendimento: 36 pedaços de sabão

37
COLHEITA DE MEL
Depoimento de Antônio Silva
“Fiz cursos em Turmalina e Rio Preto. Faz-se a colheita com roupa própria, adequada.
Colhe-se o enxame no mato, captura e coloca na caixa. No mato, onde há cupim e
pau, dá para saber que tem abelha por causa da zoeira que fazem. Depois que o mel
é tirado das colmeias, a abelha não ataca. A gente leva o núcleo (caixa menor para
colocar abelhas), põe a tampa e fica um buraco de milímetros (uma fresta) para sair e
entrar. Elas mesmas vedam, com três ou quatro dias. Quando tem plantação de cana
por perto, o mel fica mais açucarado. Os colhedores caminham até 6km e a busca é à
noite. A gente arrancha durante o dia, num processo de adaptação, antes de buscar as
abelhas. À noite é melhor, porque elas não estão voando.

De 15 em 15 dias, é feita a revisão da caixa, pois a fabricação de mel não para. A gente
limpa, tira a cera e coloca 10 quadros na caixa. Na melgueira é a mesma proporção
(com a roupa). Enquanto o enxame não toma conta da caixa toda, não é posta a mel-
gueira (caixa por cima). Quando tiramos a melgueira do mato para fazer a apuração
do mel algumas abelhas acompanham, parece que na esperança de recuperar sua
produção. Cera violada pode ser usada para acelerar a produção das abelhas. Se en-
tram formigas ou água de chuva nas caixas ou ocorre algum imprevisto, o enxame
foge. Não se pode colher mel em dias chuvosos: ele azeda.”

Como coletar o mel


“Tire um quadro da melgueira e limpe com o garfo específico, retirando a “casca” que
fica por cima do mel (opérculo). Ponha o quadro na vertical, em uma centrífuga (na
região, há uma da associação dos pequenos produtores de mel de São Gonçalo do
Rio Preto). Depois, passe na peneira. Feita a colheita, coloque o mel no decantador,
por 48 horas, para limpar. Cada litro equivale a cerca de 1,4kg. A seguir, engarrafe,
colocando o rótulo da associação e o nome do produtor, com validade de dois anos
para consumo. A casa de colheita precisa ficar a pelo 1km de distância de localidades,
por causa do risco de ataque das abelhas.”

39
Própolis
Por Antônio Silva
“É originado na vedação da beirada da caixa do enxame de abelhas, dos fundos e dos
quadros. O própolis é a cera que as abelhas produzem para fechar a caixa. Recolhido
e pesado, mistura-se de 250g a 300g em cada um litro de álcool de cereais (tipo pró-
prio, não pode ser usado o álcool comum). Agite duas vezes ao dia, durante 20 dias,
deixe por mais 20 dias sem mexer. Passados os 40 dias, coar em um pano. Quanto
mais própolis, mais brando fica o paladar (menos amargo). O própolis é indicado para
o tratamento de males da garganta e gripes. Algumas pessoas usam em ferimentos,
mas não é aconselhável. Pessoas diabéticas não podem usar de jeito nenhum. É me-
lhor tomar com leite ou café.”

40
HÁBITOS E COSTUMES

“A comunidade planta feijão; compra sal, macarrão...”

“Produzem para consumir; na época em que a plantação é mais difícil, compram


macarrão.”

“Criam galinhas e porcos.”

“Quando estão com muita pressa, fazem o macarrão com caldo refogado em água
temperada com salsa, cebolinha...”

“As mulheres costumam levar almoço para os maridos na marmita, ou em uma


panelinha.”

“Se o local de serviço for perto, levam salada; mas, se já saem com a marmita de
manhã, não dá para levar salada.”

“Quase que não usam sobremesa, comem quando dá vontade.”

“Ninguém mais tem hábito de tomar café depois do almoço, antigamente tinham.”

“Comida especial de festa: frango assado na lata (sentado).”

“Os jovens não participam da cozinha, participam do reinado.”

42
Benzedeiras e benzeções

Bonfim tem cinco benzedeiras:


Maria Alda Moreira, Maria Flor de Maio, Maria Louriana Alves, Luíza Ferreira Barbosa e
Ordália Assunção Santos, com idades entre 50 e 70 anos.

Aprenderam a benzer com parentes, maridos, vizinhos ou amigos.

Bênçãos: quebranto, carne quebrada, sol na cabeça, impigem, cobreiro, hemorragia,


irisipela, para matar bernes, ventre-virado, queimaduras e fogo no mato.

“Os médicos não usam nada de benzer, tudo tem que ter remédio.”
(Raimundo de Jesus)

“A gente não cobra nada para benzer. Tem gente que fala que nós somos feiticeiras.”
(Maria Alda)

“Tudo que fizer tem que ter fé.”


(Raimundo de Jesus)

Cobreiro
Por Maria Alda Moreira
Indicada contra machucão, gripe e queimadura.

Quando o cobreiro é usado para queimadura, não se fala “passa azeite que cura”, mas
“passa santos óleos”.

Reza: caule de mamona, vai cortando, pergunta, o que sente? Cobreiro brabo, corta a
cabeça e corta a cabeça e corta o rabo e joga no lixo.

43
Impigem
Por Maria Alda Moreira
“Ao levantar de manhã, em jejum, sem conversar com ninguém, pegue três ramos de
arruda, de vassourinha-doce ou outros ramos ou ervas da região.
Depois de benzer-se, pegue o primeiro ramo e circule no local da doença, rezando: em-
pinja raliugem que fizestes a que, assim como hoje eu não comi e nem bebi já fui em
pinque e já vim, você também não merece aqui. Amém. Repita as mesmas palavras
mais duas vezes, usando os outros ramos.”

Espinhela caída
Por Maria Alda Moreira
“Barquinha, barquinha de Santa Maria, Santa Maria Virgem que navega no mar e nos
ares, seis vezes seu desembarcar, assim como ela navega no mar e nos ares sem de-
sembarcar, assim como Jesus Cristo vestiu e revestiu para celebrar missa no altar e
assim como o anjo São Gabriel desceu do céu para te visitar, a minha arca e minha
espinhela vão chegar no lugar.”

“Reze um pai-nosso e uma ave-maria.”

Hemorragia
Por Maria Alda Moreira
“Reze o credo até chegar à expressão ‘está sentado’, que deve ser trocada por ‘está
parado’. Quando estancar o sangue, complete a oração.”

Hemorragia
Por Luíza Ferreira Barbosa
“Sangue para na veia
Como Jesus parou na ceia.
Sangue fica em ti
Como Jesus ficou em si.
Sangue fica no horto
Como Jesus ficou morto.”

“Reze um pai-nosso e uma ave-maria para santo de devoção.”

44
Erisipela
Por Maria Alda Moreira
“Zipe, zipela que deu no tutano. Zipe, zipela que deu no osso. Zipe, zipela que deu na
carne. Zipe, zipela que deu no sangue. Zipe, zipela que deu na pele, vai para a onda
do mar, para a pedra central para nunca mais voltar.

Reze uma oração ao santo de devoção do doente. Benza com um ramo na água, for-
mando uma cruz.

Faz-se a benzenção quando há dor. Quando o local fica preto, a dor está no tutano e
pode passar para o osso, a carne, o sangue e a pele”, explica Maria Alda Moreira.

“Se não benzer o local, fica aleijado, tem que amputar.”

Mãe do corpo
Por Maria Alda Moreira
“Mãe do corpo é um deslocamento pós-parto.

Faça uma cruz no local da dor, dizendo estas palavras: Pai, Filho, Espírito Santo, com
três missas de Natal, mal de dez, procura seu lugar.

Reze uma oração ao santo de sua devoção.”

Emplastro
Por Maria Alda Moreira

“Três de resguardo, banhava a mulher com os adjuntos (junta de horta), porque, com
o exercício do corpo (a força para ter o bebê), saía tudo do lugar. Então juntava os
adjuntos com azeite em pano e enrolava na barriga.”

Quebranto
Por Maria Alda Moreira
“Fale o nome da pessoa e reze: eu vou te benzer em nome do Pai, do Filho e do Espí-
rito Santo. Se for quebranto, ventre-virado, mau-olhado, inveja, ódio será curado com
o poder da Santíssima Trindade, que é o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Amém.”

45
Quebranto
Por Luíza Ferreira Barbosa
“Para benzer quebranto, fale o nome da criança e diga: eu te benzo de quebranto e
mau-olhado, que em ti foram colocados. Esteja retirado em nome de Deus Pai, Deus
Filho e Espírito Santo. Amém, Amém, Amém.”

Ventre-virado e quebranto
Por Maria Alda Moreira
“Deite a pessoa de bruços, no colo. Vá juntando a palma da mão direita, passando
por cima do braço e levando até o meio da coluna; agora, o pé esquerdo, levando
até o meio da coluna; depois, a mão esquerda com o pé direito, cruzando no meio
da coluna; a seguir, junte de um lado e outro da barriga, levando até o meio da co-
luna. Junte a testa com uma das mãos, das nádegas à coluna, mantendo a pessoa
de bruços. Agora, junte os pés com os dedos, com as juntas bem unidas, levando ao
alto, para fazer três cruzes e dar três palmadinhas nas solas dos pés.

Ponha uma das mãos sobre a coluna e a outra a jumbá os pés, dobrando os joelhos
até as nádegas da pessoa para dar três balanço.

Sente a pessoa no colo, cruzando os braços, o direito por cima do esquerdo, puxan-
do com as mãos e dando três balanços. Finalmente, volte a juntar os pés, para veri-
ficar se uma perna não está maior que a outra. Se estiverem do mesmo tamanho, a
pessoa não está com o ventre-virado.”

46
Ventre-virado, quebranto e mau-olhado
Por Maria Alda Moreira
“Para benzer ventre-virado, quebranto e mau-olhado, pegue a criança no colo, use o
rosário ou uma folha de erva verde (arruda, por exemplo) e reze esta oração: foi Deus
que te pôs no mundo, foi Deus que te abençoou. Deus vai tirar todo mal que em seu
corpo entrou. Quebranto, inveja, mau-olhado e ventre-virado vão ser curados com os
poderes de Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo.”

Ventre-virado
Por Luíza Ferreira Barbosa
“Para benzer ventre-virado, coloque a pessoa de bruços e junte o pé direito ao braço
esquerdo e o pé esquerdo ao braço direito, fazendo uma cruz.
Faça o sinal da cruz três vezes”.

Sintomas de quebranto: febre, moleza no corpo, má digestão, falta de apetite e “testa


salgada”.

Maria Helena Alves dos Santos explica que é preciso “levar a língua na testa da crian-
ça, para saber se está salgada. É que só crianças têm quebranto e ventre-virado.”

Queimadura
Por Luíza Ferreira Barbosa
“A reza de Nossa Senhora: Nossa Senhora saiu e deixou seu filho. Quando chegou,
achou-o queimado. Reze um pai-nosso e uma ave-maria, usando um ramo verde para
aspergir água fria no queimado.”

47
Garrafada
Por Maria Lauriana Alves

Com 55 anos de idade, tem 20 de atividades, tendo aprendido tudo que sabe com
uma mulher bem idosa, chamada Carolina.

O que é uma garrafada?


“É um remédio que mistura ervas e raízes do campo, feito com cachaça ou vinho bran-
co. É apropriado para mulheres, após o parto ou para moças com corrimento.

Trata-se de uma mistura de manjerona, artemija, erva-cidreira, raiz de capela, hortelã,


marcilica, rosa-branca, alfazema, raiz de salsa, raiz de alface-rosca, raiz de trançagem,
ribalho, magnésia, canela, raíz de arruda, etc.”

Dosagem recomendada: uma colher de sopa, três vezes ao dia.


Não tem contraindicações.

Alerta: não pode ser tomada na gravidez.

“Faço essa garrafada em minha cozinha. Deixo temperada por 10 dias.”

Água de flor
Por Rosamundi
Depoimento de Luzia, sua filha

Modo de fazer:
debaixo de um pé de laranja, na época da floração (setembro a outubro), re-
colher, em um pano limpo, as flores que caírem, pôr ao sol para secar e, em
seguida, levar para o alambique. Colocar água na panela do alambique e des-
pejar as flores secas. Ferver a mistura para que o suor das flores escorra e caia
na vasilha, como cachaça. Depois, é só engarrafar.

Indicada para dor de lado, falta de ar e dor no coração.

Dosagem: tomar pequenas doses.

48
Chá caseiro para bronquite
Por Zilda C. Araújo de Jesus
Modo de fazer:
ferver um copo de água com um dente de alho amassado. Acrescentar três
colheres de sopa de mel e suco de meio limão.

Dosagem: tomar uma colher de chá de uma em uma hora ou quando tossir.

Simpatia: bater nas costas com a mão em forma de concha, de baixo para cima, três
vezes ao dia, durante cinco minutos.

49
GRUPO DE PARTICIPANTES E COLABORADORES
Antônio Silva Araújo

Douglas Araújo

Emerson Thiago Santos

Kátia Aparecida dos Santos Araújo

Kayto Georg dos Santos

Lenice Mariano Chaves Santos

Maria Alda Moreira

Maria Amélia Araújo Silva

Maria Aparecida Ferreira Souza

Maria Flor de Maio

Maria Helena Alves dos Santos

Maria Judite da Silva Santos

Matildes Serafim Santos

Raimundo Nonato dos Santos

Rosenilda de Fátima Alves

Zélia Consolação de Paula

Zilda C. Araújo de Jesus

Zulmira Vidal

52
POSFÁCIO
Esta pesquisa foi feita no campo, com a comunidade e os grupos da localidade, con-
tando com plena e decisiva colaboração de todos os participantes.

Também livros e publicações sobre o tema serviram como alimento, acompanha-


mento e fontes de conhecimento, estudos e pesquisas.

REFERÊNCIAS
STRONG, Roy. O banquete. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.

COMER bem, Dona Benta – 1001 receitas de bons pratos. 49ª ed. São Paulo: Compa-
nhia Editora Nacional, 1963.

SIMON, François. Comer é um sentimento. São Paulo: Senac, 2006.

CARNEIRO, Henrique. Comida e sociedade – uma história da alimentação. Rio de


Janeiro: Campus, 2003.

CULINÁRIA da Vovó Rina. São Paulo: Formar, v.1-3.

CORREIA, M. P. Dicionário das plantas úteis do Brasil e das exóticas cultivadas. Rio de
Janeiro: Ministério da Agricultura, 1975, v.6.

ZURLO, Cida; BRANDÃO, Mitzi. As ervas comestíveis: descrição ilustração e receitas. Rio
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BRILLAT-SAVARIN, Jean. A fisiologia do gosto. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

MONTANARI, Massimo. A fome e a abundância: história da alimentação na Europa.


3ª ed. Bauru: EDUSC, 2003.

53
CAMARGO, Maria Thereza Lemos Arruda. Medicina popular – Aspectos metodológi-
cos para pesquisa – garrafada. São Paulo: Almed, 1985.

ARAÚJO, Alceu Maynard. Medicina rústica. São Paulo: Brasiliana, 1977.

FERRI, Mário Guimarães. Plantas do Brasil: espécies do cerrado. São Paulo: Edgard
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AZEVEDO, Téo. Plantas medicinais, benzeduras e simpatias. São Paulo: Global, 1987.

CONCEIÇÃO, Moacir. As plantas medicinais no ano 2000. São Paulo: Tão, 1982.

HAMILTON, Cherie Yvonne. Os sabores da lusofonia. São Paulo: Senac, 2005.

KURLANSKY, Mark. Sal, uma história do mundo. São Paulo: Senac, 2004.

JACOB, Heinrich Eduard. Seis mil anos de pão. São Paulo: Nova Alexandria, 2003.

LAINETTI, Ricardo; BRITO Nei R. S. A saúde pelas plantas e ervas do mundo inteiro.
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LIMA, Cláudia. Tachos e panelas: historiografia da alimentação brasileira. Recife:


Autora, 1999.

Anais do XXXII Congresso Nacional de Botânica – UFOP, 1986.

54
SEBRAE-MG

Agosto a dezembro de 2008


ISBN 978-85-86428-67-8

Av. Barão Homem de Melo, 329


Nova Granada – BH – CEP 30431-285 – Tel.: 0800 570 0800
www.sebraemg.com.br

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