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_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

1. Introdução

No âmbito da disciplina de Metodologias da Investigação em educação, foi


nos sugerido pela docente da mesma, elaborar um trabalho durante o ano
lectivo em que puséssemos em prática os conteúdos programáticos que a
própria disciplina assim o exigia.

Como o tema a investigar seria um tema da nossa escolha, resolvemos


fazer uma investigação no campo das necessidades educativas especiais,
nomeadamente sobre a patologia do autismo.

Este trabalho é constituído com uma primeira abordagem teórica sobre a


patologia em questão e só depois é que através do problema que pretendemos
analisar: como é que a Educadora comunica com a criança autista, utilizamos o
método da entrevista semi – estruturada para nos deslocarmos aos jardins-de-
infância e entrevistarmos as Educadoras que trabalham ou já trabalharam com
crianças que sofram desta patologia.
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2. CONCEITO

O Termo Autismo provém da palavra grega “autos” que significa “si


mesmo” “o próprio”. Foi esta a característica que Kanner e Asperger quiseram
destacar: a concentração do indivíduo sobre si mesmo e a sua grande
dificuldade em relacionar-se com as pessoas que o rodeiam.

O Autismo é uma grave perturbação do desenvolvimento global da


criança, caracterizada pela presença simultânea de uma tríade de
perturbações1.

 Perturbações da Integração Social, (ausência de condutas de afeição,


participação e reciprocidade social);

 Perturbações de Concentração, (dificuldades no domínio da


compreensão da linguagem e utilização de aptidões verbais, jogo imaginativo e
utilização de gestos);

 Perturbações da Imaginação, (comportamentos, interesses e


actividades repetitivas e estereotipadas; necessidade imperiosa da
imutabilidade resistindo à menor alteração do meio ambiente habitual);

Não é tarefa fácil definir o que é o Autismo; desde 1943 (quando Kanner o
fez pela primeira vez), já houve várias revisões do termo, baseadas em
múltiplas investigações)

2.1 Evolução Histórica

O termo Autismo foi introduzido pela primeira vez por Bleuler (1911), na
sua obra “Grupo de Esquizofrénicos”, para designar as doenças
esquizofrénicas adultas, a perda do contacto com a realidade e, resultante
disso, uma grande dificuldade em comunicar com o outro.

1
WING, L. – Autismo Infantil: Madrid: Santillana, 1982, pp. 19.
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Em 1943, Kanner publicou um artigo “Autistic Disturbance of Affective


Contact”2. Foi este autor que introduziu pela primeira vez o conceito Autismo
Infantil Precoce, e descreveu um quadro técnico diferente do de esquizofrenia
infantil. Esse artigo foi escrito com base nas observações por ele realizadas em
um grupo de onze crianças, (ocorrendo durante o 1º ano de vida,
eventualmente até durante o 1º semestre) que evidenciavam uma série de
sintomas invulgares mas semelhantes entre si. Esses traços comuns foram
sistematizados e identificados por Kanner, e com as seguintes características:

 Isolamento extremo: a atitude da criança é marcada pala sua indiferença


e o seu desinteresse total, tanto em relação às pessoas, como em relação ao
meio que o rodeia. Segundo o autor supra citado, esta falta de capacidade de
resposta social, parecia surgir muito cedo na vida destas crianças autistas.

 Resistência a qualquer mudança: Estas crianças ficavam extremamente


perturbadas por mudanças efectuadas na rotina ou no ambiente à sua volta.
Por exemplo, um percurso diferente para a escola ou uma colocação diferente
dos móveis, causava acessos de cólera, e a criança só se acalmava quando a
ordem que lhe era familiar fosse restabelecida.

 Excelente memória de rotina: as crianças observadas por Kanner


mostravam ser capazes de memorizar grandes quantidades de material, na
realidade, sem significado (por exemplo a página do índice de uma
enciclopédia), o que contratava fortemente com as suas aparentemente graves
dificuldades de aprendizagem.

 Ecolália Retardada: as crianças repetiam a linguagem que ouviam, mas


eram incapazes de usar linguagem para comunicar algo que estivesse para
além das suas necessidades imediatas. A ecolália explicaria provavelmente a
inversão dos pronomes referida por Kanner, ou seja, o facto das crianças

2
KANNER, L. – Follow up study of eleven Autistic Children Originally Reported in 1943: vol. 8, nº 2,
1978.
RIDEAU, A. – Psicologia Moderna, 400 dificuldades e problemas das crianças, perguntas e respostas:
Lisboa: Verbo, 1977.
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usarem “tu” quando se referiam a elas próprias e o “eu” para as outras


pessoas.

 Hipersensibilidade aos estímulos: Kanner reparou que muitas das


crianças por ele observadas reagiam fortemente a certos barulhos e objectos,
tais como, aspiradores, elevadores, e mesmo em relação ao vento. Algumas
evidenciavam também problemas alimentares ou manias por certos alimentos.

 Limitação na variedade da actividade espontânea: evidenciada nos


movimentos, verbalizações e interesses monótonos das crianças. Contudo,
Kanner pôde observar que as crianças que tinham uma boa relação com os
objectos, demonstrando frequentemente uma destreza surpreendente em fazê-
los girar ou na solução de quebra-cabeças.

 Boas potencialidades cognitivas: Kanner acreditava que, a invulgar


memória e destreza manifestadas por alguns destes casos, reflectiam uma
inteligência superior, apesar de em muitas das crianças terem sido
identificadas graves dificuldades de aprendizagem. Por outro lado, a ausência
de qualquer estigma físico na maior parte dos casos de autismo, provoca de
uma maneira geral, uma sensação de que estas crianças são inteligentes.
Kanner mencionou as “fisionomias inteligentes” destes casos e outros autores
têm descrito as crianças como invulgarmente bonitas.

 Kanner refere também um factor que lhe despertou a atenção: as


crianças que estudou eram oriundas de famílias inteligentes com alto nível
sócio-cultural (embora a amostra que ele utilizou seja, provavelmente, pouco
significativa). Ele descreveu também os pais destas crianças como pessoas
“frias”.

Mais tarde, em 1956, numa das suas publicações, Kanner isolou apenas
duas destas características, como sendo os elementos-chave do autismo: O
isolamento extremo destas crianças e a sua insistência obsessiva na
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prevenção da monotonia, considerando as restantes características como


secundárias.
Às características consideradas como elementos-chave para o autismo,
Kanner acrescentou: Comportamentos Ritualizados (as estereotipias) e
Perturbações Graves na Comunicação.

Em 1944, apenas um ano depois de Kanner ter publicado o seu influente


artigo, um médico austríaco, Hans Asperger, publicou uma dissertação relativa
à “Psicopatia Autista” na infância.

As descrições por ele apresentadas são surpreendentemente similares


em muitos aspectos às de Kanner. Ambos notaram o pobre contacto visual das
crianças, as suas estereotipias da palavra e do movimento, a sua acentuada
resistência à mudança e a existência de interesses especiais isolados
(frequentemente por objectos ou assuntos bizarros ou idiossincráticos). Kanner
e Asperger insistiam ainda em distinguir a perturbação por eles descrita da
esquizofrenia, com base em três traços: a melhoria em vez da deterioração nos
seus pacientes, a inexistência de alucinações e o facto de estas crianças
parecerem diferentes desde os primeiros anos de vida, em vez de
evidenciarem um declínio nas capacidades após um bom funcionamento inicial.
Finalmente, ambos acreditavam que tinham observado traços similares (de
afastamento ou incompetência sociais, prazer obsessivo na rotina e
perseguição de interesses especiais com consequente exclusão de todos os
outros), em relação aos pais de muitos dos seus doentes.

Apesar de todas estas similaridades, se acreditamos que Kanner e


Asperger estavam, a descrever o mesmo tipo de crianças, há três áreas nas
quais os seus relatos são discordantes; como refere Rutter et al3:

 A primeira área é a das capacidades linguísticas da criança. Kanner


relatou que 3 dos seus 11 doentes nunca chegaram a falar e que as outras
crianças não usavam a linguagem que possuíam para comunicar. Por outras
palavras, embora a fonologia e o vocabulário fossem frequentemente excentes,
3
RUTTER, M. et al – Autisme, une Réevaluation du concept et des Traitements: Paris: 1991, pp. 27.
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em nenhum caso, a linguagem servia para transmitir significado.


Contrariamente, Asperger relatou que todos os seus 4 casos falavam
fluentemente. Embora dois dos seus pacientes tivessem mostrado algum
atraso, em ambos os casos isso foi seguido de um rápido domínio da
linguagem. Além disso, Asperger reparou na sua “liberdade” e “originalidade”
no uso da linguagem e relatou que dois dos seus casos tinham tendência para
contar histórias “fantásticas”.

 A segunda área de discordância refere-se às “capacidades motoras” e


coordenação. Kanner, observou a falta de jeito em apenas um dos casos e
mencionou a destreza de quatro dos seus pacientes. Ele conclui que muitas
crianças eram um pouco desajeitadas na maneira de andar e na execução da
motricidade grossa, mas também que todas eram muito hábeis em termos de
coordenação muscular fina, tendo boas capacidades para fazer girar os
objectos. Por seu lado, Asperger descreveu todos os seus quatro pacientes
como sendo desajeitados e refere, pormenorizadamente os problemas por ele
evidenciados não só ao nível dos desportos escolares (motricidade grossa),
mas também a nível das competências motoras finas, como por exemplo
escrever.

 Por fim, a última área de discordância, diz respeito às capacidades de


aprendizagem da criança, Kanner acreditava que os seus pacientes tinham
melhor desempenho quando aprendiam de modo rotineiro, enquanto Asperger
acreditava que o desempenho era superior quando as crianças podiam
produzir espontaneamente.

Como resolver estas contradições? Podíamos simplesmente ignorar as


opiniões de Asperger no que diz respeito a estas três áreas e reter as de
Kanner, cuja vericidade actualmente esta “testada e comprovada” num grande
número de crianças autistas. Mas se nos agarrarmos de forma rígida a esta
definição de Autismo de Kanner (que apenas se baseia no estereótipo limitado
de casos por ele observados), estaríamos em risco de esquecer, por exemplo,
a pessoa autista que já não evita a interacção social, mas em vez disso, a
procura de forma inapropriada.
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Finalmente, se em relação ao tema da aprendizagem podemos aceitar


que Kanner e Asperger estão ambos correctos, no que diz respeito às áreas da
linguagem e das competências motoras é difícil alcançar um compromisso, o
que faz com que estas duas áreas se tenham tornado as questões-chave para
todos aqueles que pensam que Asperger estava a descrever um grupo de
crianças diferente do de Kanner.

Progressivamente, outras afecções próximas do Autismo descrito por


Kanner e por Asperger são reagrupadas sob o termo genérico de psicoses
infantis precoces. Elas têm em comum com o Autismo o facto de começarem
precocemente, durante os dois primeiros anos de vida, de ser marcadas por
uma perturbação profunda do contacto com o mundo exterior. Elas apenas se
diferenciam por certas particularidades clínicas.

Assim, em 1957, Mahler4, descreveu a Psicose Simbiótica, da qual se


esforçou em precisar as particularidades:

 O inicio durante o curso do segundo ano de vida, precedente de uma


fase normal do desenvolvimento, sobretudo marcado por uma
hipersensibilidade aos estímulos sensoriais e por quaisquer perturbações no
sono.

 A sua aparição em certos momento-chave do desenvolvimento,


implicam o abandono da fusão simbiótica com a sua mãe e o desabrochamento
do sentimento de individualização.

A Psicose Simbiótica é também clinicamente marcada por uma angústia


constante de aniquilação. Ela inaugura-se pela aparição de uma brusca
desorganização da personalidade, com uma perda marcada de certas funções,
uma deterioração da linguagem, a aparição de sintomas psicóticos. Mais tarde,
M. Mahler reconhecerá a existência de combinações e de formas de passagem
possíveis entre os dois tipos de organização, autística e simbiótica.

4
MAHLER, M. – Psychose Infantile: Paris: Payot, 1973, pp. 36.
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Os trabalhos sucessivos realizados a partir dos anos 60, foram inúmeros


e de autores diversos, que contribuíram e contribuem para a científica do
síndroma autista. É o caso dos estudos de O’Gormam (1967) onde definiu
componentes para o diagnóstico do autismo; de Rutter, Bartak e Newwman
(1971), que estudaram intensivamente o autismo infantil nos seus aspectos
descritivos e explicativos, matizando os critérios de diagnóstico que definem o
síndroma.

Posteriormente, em 1977, a psicanalista inglesa Tustin5, descreve três


tipos de autismo:

 Autismo Primário Anormal, que é o prolongamento do Autismo Primário


Normal. Verifica-se particularmente em casos de carência afectiva grave, e é
caracterizada pelo facto de não existir por parte do bebé uma verdadeira
diferenciação entre o seu corpo e o da mãe, nem uma verdadeira delimitação
da sua superfície corporal.

 Autismo Secundário Enclausurado, este tipo aproxima-se bastante do


Autismo Infantil descrito por Kanner. A criança parece construir uma espécie de
concha em torno de seu ego (algo de impenetrável). A fuga ao contacto físico é
extrema. Neste tipo de autismo, não se verifica a falta de distinção entre o EU e
o NÃO-EU (como sucedia no Autismo Primário Anormal). Pelo contrário,
verifica-se uma grande apreciação em relação a essa diferença.

 Autismo Secundário Regressivo, caracteriza-se por uma regressão


protectora em face ao terror experimentado perante o NÃO-EU (o
desconhecido). O quadro clínico deste Autismo Secundário Regressivo
aproxima-se do da Esquizofrenia Infantil.

Em 1978, Rutter et al6 e Schopler7, consideram o Autismo Infantil como


uma perturbação das competências comunicativas, cognitivas e linguísticas.

5
TUSTIN, F. – Autismo e Psicose Infantil: Rio de Janeiro: Imago Editora, 1975, pp. 59.
6
RUTTER, M. et al – Autisme, une Réevaluation... pp. 12.
7
SCHOPLER, E. – Stratégies Educatives de L’Autisme: Paris: Masson, 1988, pp. 25.
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Baron-Cohen8 introduziu em 1988 a famosa “Teoria da Mente”, que


explica que a alteração fundamental da criança autista, consiste na falta de
capacidade de meta-representação (permite atribuir a outras pessoas estados
mentais diferentes do dele, a partir dos quais é possível explicar e prever a
conduta de outra pessoa).

Até os dias de hoje, muitos foram os investigadores que fizeram estudos


nesta patologia, não só de comparação entre as outras, mas investigando
novos aspectos intrínsecos ao autismo, como é o caso, por exemplo da
etiologia.

2.2. Níveis de Explicação

Para responder à questão “O que é o Autismo”, existem três níveis de


explicação que devem ser distintos, pois cada um deles tem um papel diferente
na compreensão do Autismo.

2.2.1 Nível Biológico

Durante muito tempo acreditou-se que o Autismo era uma perturbação


funcional e não orgânica, uma vez que não existem quaisquer provas directas
de anormalidades celebrais. Bettelheim9 formulou a teoria da “mãe-frigorifíco”
que se baseava na crença de que as crianças se tornavam autistas como
resposta desadaptada a um ambiente ameaçador e pouco afectuoso (mito
psicogénico). Esta ideia foi posteriormente retomada por Kanner que acreditava
ter observado suaves traços autistas, tais como afastamento e dificuldades
sociais, nos pais das crianças por ele observadas. No entanto, inicialmente,
Kanner tinha interpretado estas peculiaridades como sendo sinais de uma
componente genética no Autismo. Ao contrário desta interpretação de Kanner
que se provou ser correcta, nenhuma prova surgiu a apoiar as explicações
psicogénicas. Hoje em dia sabe-se, indubitavelmente, que o autismo tem uma
causa biológica e é consequência de uma disfunção orgânica.

8
BARON-COHEN, S. et al – Perspectives from autism: Oxford University Press, 1993, pp. 47.
9
BETTELHEIM, B. – La Forteresse Vide: Paris: Gallimard, 1974, pp. 67.
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2.2.1.1 Evidências de uma causa Orgânica

Num estudo recente, Steffenburg, descobriu que quase 90% da sua


amostra (constituída por 35 crianças autistas e 17 crianças semelhantes a
autista) evidenciava algumas provas de danos ou disfunções cerebrais.

Uma indicação de que uma lesão cerebral pode estar na base do Autismo
é a elevada incidência de epilepsia nas crianças autistas (cerca de 1/3 dos
adolescentes autistas têm epilepsia). Outra indicação reside na tendência
manifesta para que deficiência mental geral acompanhe o autismo: cerca de
3/4 das pessoas com autismo são também deficientes mentais (QI < 70) e
sempre que se observam grupos de pessoas com QI progressivamente mais
baixo, a incidência de Autismo aumenta. Além disso, mesmo em crianças
autistas cuja realização nos testes de inteligência está acima do atraso mental,
encontra-se uma incidência elevada de sinais neurológicos. Isto poderia ser
facilmente explicado por um modelo em que o autismo resultasse de uma lesão
num mecanismo ou região circunscrita do cérebro.

Embora ainda não tenham sido feitas descobertas claras e universais


acerca do lugar da lesão ou da natureza precisa do mecanismo neurológico
destruído no Autismo, é possível confiar que tem uma causa primária ao nível
do cérebro.

2.2.1.2 Possíveis Causas Biológicas

2.2.1.2.1 Causas genéricas e influências pré e peri natais

Há fortes evidências da existência de uma componente genética no


autismo, embora o papel dos genes da criança esteja longe de ser claro. O
autismo é duas vezes mais comum nos rapazes que nas raparigas, Lotter 10, e
esta razão aumenta para 5:1 no extremo de elevada capacidade do espectro

10
LOTTER, V. – Epidemiology of Autistic Conditions in Young children, in Soc. Psychiat: 1967, pp. 54.
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do Autismo. Schopler11. Nesta perturbação, a “carga familiar” é significativa: o


Autismo é 50 vezes mais frequente nos irmãos de pessoas autistas do que na
população em geral. Os irmãos de autistas que não são, eles próprios autistas,
manifestam uma incidência muito maior de outros défices cognitivos, tais como
perturbações da linguagem e défices sociais, M. Rutter12.

Rutter descobriu que nos casos em que os gémeos monozigóticos eram


discordantes para o Autismo (isto é, quando apenas um gémeo era afectado),
frequentemente o gémeo com autismo era o que tinha tido um parto mais difícil
(atraso no parto ou na respiração ou convulsões neonatais). A presença de
factores peri-natais adversas sugere (mas não prova) que pode ter-se
produzido um dado cerebral.

Recentemente, Szatmari e Jones discutiram os tipos de herança que


podem estar envolvidos no Autismo. Eles concluíram que os casos de autismo
podem ser divididos em três grupos etiológicos:

 exógenos (causados por factores externos, tais como acidentes pré-


natais)

 autossómicos recessivos (transportado pelos cromossomas não-


sexuais, mas que apenas se manifestam quando expressos em dose dupla,
isto é herdado por ambos os pais)

 ligado ao cromossoma X (transportados no cromossoma feminino)

2.2.1.2.2 Possíveis Zonas de Lesão Cerebral

Ainda não há acordo acerca da área ou mecanismo do cérebro que está


afectada no Autismo. Até hoje, diferentes regiões cerebrais têm sido sugeridas
como sendo o local da lesão: o cerebelo (envolvido na coordenação motora), e
o sistema límbico (envolvido na regulação das emoções).

11
SCHOPLER, E. – Stratégies Educatives... pp. 58.
12
RUTTER, M. et al – Autisme, une Réevalution... pp. 34.
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Os estudos de autópsias que geralmente envolviam um número pequeno


de sujeitos, pareciam fornecer alguma comprovação da existência de
anormalidades no cerebelo, como por exemplo reduções significativas na
densidade das células de purkinje, quando comparada com o de indivíduos
normais do grupo de controlo.

Bauman e Kemper a 1985, num estudo de caso único de um homem


autista com grave deficiência mental, descobriram (em comparação com um
sujeito masculino normal da mesma idade) que havia anormalidades no
hipocampo, parte da amígdala e cerebelo. Contudo, existe a possibilidade de
que os estudos da autópsia tenham indicado anormalidades no cérebro, que
estão associados não com o autismo em si, mas com a deficiência mental.

A procura da área do cérebro que está danificada no autismo, é


susceptível de ser grandemente facilitada no futuro, pelo desenvolvimento de
técnicas de imagens cerebrais cada vez mais avançadas.

2.2.2 Nível Cognitivo

O autismo é caracterizado por uma tríade de défices: na socialização,


comunicação e imaginação. Contudo, cada uma destas áreas é, ela própria,
composta por uma variedade de comportamento que assentam em
mecanismos cognitivos diferentes e emergem em diferentes momentos do
desenvolvimento normal. A tarefa das teorias cognitivas do Autismo é explicar
o padrão específico de défices e capacidades preservadas dentro destas três
áreas.

2.2.2.1 A explicação da Teoria da Mente

Existe uma teoria psicológica que, nos últimos 50 anos, tem vindo a
despertar grande interesse e que tem provado ser extremamente bem sucedida
na predição e explicação dos traços universais e específicos do Autismo.
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Frith13, Leslie14 e Baron-Cohen15, sugeriram que a tríade de défices


comportamentais no Autismo resulta de um défice na capacidade humana
fundamental de “ler a mente”. As crianças normais possuem, desde
aproximadamente os 4 anos, capacidade de compreender (embora
implicitamente) que as pessoas têm desejos e crenças acerca do mundo e que
são estes estados mentais que determinam o comportamento.

A explicação da “Teoria da Mente” do Autismo sugere que as pessoas


autistas não possuem esta capacidade de pensar dos pensamentos, estando
assim perturbadas em certas competências sociais, comunicativas e
imaginativas.

Esta teoria surgiu com a observação de que as crianças autistas não


tomavam espontaneamente parte no jogo da simulação e foi pensada, não
como uma teoria consciente, mas como um mecanismo cognitivo inato que
permite um tipo especial de representação - a representação de estados
mentais.

O poder desta teoria reside no facto das suas predições serem


suficientemente específicas e de grande alcance para se ajustarem no quadro
clínico do Autismo. Em particular ela pode explicar não apenas as deficiências
do Autismo, mas também a preservação de algumas funções.

Apesar de tudo, esta teoria não consegue explicar tudo, há ainda muitos
puzzles que permanecem por resolver.

2.2.3 Nível Comportamental

Desde as descrições de Kanner e Asperger, o Autismo tem vindo a ser


descrito com base no comportamento. Como já foi referido, para Kanner
(1978), os sintomas essenciais que definem o Autismo eram a “solidão
extrema” e o “desejo obsessivo de preservação da monotonia”. Embora muitas
13
FRITH, U. – L’Enigme de L’Autism: Paris: Masson, 1992, pp. 23.
14
LESLIE, A. – The Origins of Theory of Mind, in Psychologial Review: 1987, pp. 41.
15
BARON-COHEN, S. et al – Perspectives... pp. 72.
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das crianças com Autismo de hoje se adaptam ao quadro por ele traçado, o
diagnóstico do Autismo tem-se modificado à medida que mais conhecimentos
se adquirem acerca desta perturbação.

Vários estudos têm demonstrado que os problemas de socialização,


comunicação e imaginação são necessários e suficientes para aprender muito
de comportamento que se provou ser específico e universal.

2.2.3.1 Défice Qualitativo da Interacção Social Recíproca

O défice de interacção social recíproca pode revelar-se de muitas


maneiras. Na criança muito pequena pode haver nítida falta de consciência /
compreensão da existência ou sentimentos dos outros.

Uma característica considerada típica das pessoas com autismo, é o facto


de evitarem o contacto visual.

A criança parece ser incapaz de corresponder ao amor e à afeição com a


intensidade esperada. Verifica igualmente uma incapacidade de fazer amigos
da mesma idade.

Para pessoas com Autismo, o mundo das emoções é uma terra


desconhecida. Segundo Attwood16, os sentimentos da criança autista são
expressos através de um amplificador estereofónico defeituoso. Enquanto
alguns sentimentos, tais como a frustração e o aborrecimento se exprimem
apenas no volume máximo usando simplesmente o botão para ligar e desligar,
outros, tais como a afeição, a consolação, o embaraço, exprimem-se no
volume mínimo e implicam uma apreciação ou reconhecimento dos
sentimentos e pensamentos dos outros.

As pessoas autistas são capazes de responder de forma diferente a


diferentes pessoas e a diferentes tipos de aproximação. Muitas das crianças

16
ATTWOOD, T. - Why do Cris do That?: London: 1993, pp. 67.
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autistas manifestam comportamentos de procura de proximidade, embora de


forma inapropriada, para obter atenção social.

2.2.3.2 Défice Qualitativo Verbal e Não-Verbal e da Actividade


Imaginativa

O leque de deficiência na Comunicação no espectro autista é enorme.


Alguns dos problemas de linguagem que surgem como específicos do Autismo
são: a falta ou atraso no desenvolvimento da fala; o fracasso na resposta à fala
dos outros; o uso estereotipado e repetitivo da linguagem (ecolália); a inversão
de pronomes (dizendo “tu” em vez de “eu”), o uso idiossincrático das palavras e
o aparecimento de neologismos, o fracasso em iniciar ou manter uma
conversação normal; as anormalidades na prosódia; as dificuldades
semânticas/ conceptuais; a comunicação não verbal anormal.

Mas nem todas as áreas da linguagem estão afectadas no Autismo. Um


exemplo disso são as crianças que falam normalmente exibindo uma fonologia
e gramática razoavelmente normais.

Em relação à imaginação, as crianças autistas evidenciam uma


surpreendente escassez/ ausência de jogo de simulação espontâneo (jogo de
faz de conta) ou “jogo simbólico”, em relação à sua idade mental.

2.3. CARACTERÍSTICAS DO AUTISMO

Nos últimos anos, as diferentes investigações levadas a cabo têm


permitido gerar consenso entre os diversos autores sobre o facto de que o
Autismo é o resultado de uma alteração do desenvolvimento cognitivo 17
alteração esta que esta que tem origem no cérebro que tem como
consequências, alterações ao nível da linguagem e da comunicação assim
como uma série de emocionais e de conduta18.
17
WING, L. - Autismo.... pp. 23.
18
BARON-COHEN, S. et al - Perspectives... pp. 34.
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Estes aspectos apresentam-se em diferentes graus de gravidade e as


características que compõem o síndroma aparecem, em cada criança, jovem
ou adulto, em proporções tão diferentes que, por vezes, se torna difícil pensar
que as pessoas abrangidas pelo “espectro” do autismo têm algo em comum.

Já Lorna Wing19 definiu o Autismo como um “contínuo” de características


organizadas segundo quatros áreas básicas, partindo dos aspectos mais
graves para os menos graves. No quadro 1 reproduzimos o “contínuo de
características autistas” de Wing, adaptado por Riviere20.

Quadro 1 – Contínuo de características autistas

Deficiências das Deficiências das Deficiências das Formas

19
RIVIERE, A. - Necessidades educativas especiais y aprendizage escolar: Madrid: Alianza Editorial,
1994, pp. 317.
20
RIVIERE, A. – Necessidades educativas... pp. 318.
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competências de competências competências repetitivas de


reconhecimento de comunicação de imaginação e actividade
social social compreensão
social
1.- Nas formas 1.- Ausência de 1.- Ausência 1.- Predomínio de
mais profundas: motivação completa de condutas
isolamento e comunicativa. imitação estereotipadas( b
indiferença significativa e de alanceio, abanar
perante os outros, 2.- Expressão jogo de ficção. as mãos, fascínio
especialmente apenas de desejo por estímulos
pelas outras se outras formas 2.- Presença de sensoriais
crianças. Falta de comunicativas. imitação mas sem simples, etc.)
interesse por compreensão real
aspectos 3.- Expressão de do significado da 2.- Movimentos
puramente sociais comentários acção realizada. repetitivos mais
da interacção, factuais – para Falta de jogo de complexos de
mesmo que além dos desejos ficção carácter ritual (ex:
gostem do – que não fazem espontâneo. ordenar objectos);
contacto físico ou parte de um rituais mais
de receber intercâmbio social 3.- complexos (ex.:
gratificações das e são irrelevantes Representação ouvir com fascínio
outras pessoas. no contexto. estereotipada e e de forma ritual
repetitiva de um certas obras
2.- Não 4.- Emprego de certo papel (ex: musicais).
estabelece uma linguagem personagem da Vinculação
contactos sociais elaborada, mas televisão), sem intensa e
espontaneamente, sem implicações variação nem inexplicável a
mas aceita numa conversão empatia. certos objectivos.
passivamente as reciproca.
tentativas de Presença de 4.- Em pessoas 3.- Insistência em
aproximação das perguntas mais velhas e realizar certas
outras pessoas. repetitivas e com mais sequências de
longos capacidades acções (ex: rituais
3.- As crianças monólogos sem existe uma certa para dormir,
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estabelecem ter em conta o noção de que seguir certos


contactos sociais interlocutor. “algo sucede” na percursos).
espontâneos, mas mente dos outros,
de uma forma mas sem 4.- Preocupação
mais estranha, compreender o obsessiva por
muito vinculada que é. certos conteúdos
aos seus rituais e intelectuais (ex:
preocupações 5.- Certa características de
obsessivas. Falta habilidade para certos animais).
de interesse pelas compreender
ideias e sentimentos dos
sentimentos dos outros, mas mais
outros. Existe um a um nível
caracter unilateral intelectual que
na relação. empático e
emocional.
4.- As formas
mais leves
costumam
encontrar-se em
adultos que na
infância tiveram
uma deficiência
social severa mas
que foram
capazes de fazer
bons progressos.
Têm uma pobre
compreensão das
regras de
interacção social e
pouca
sensibilidade em
relação aos
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

outros. Parecem
ter aprendido as
regras de relação
e contacto social
de uma forma
intelectual e não
“vital”.

Ao longo dos seus estudos, L. Wing21, fez uma recolha de descrições de


pessoas que se sujeitaram a estudos clínicos e experimentais sobre o Autismo.
Nestes estudos verificou que existe um conjunto de anomalias e
características, em termos de comportamentos observáveis que foram
classificados e divididos em deficiências básicas, capacidades especiais e
anomalias de conduta secundárias22.

É também, importante referir as características comportamentais


observáveis pois, torna-se mais fácil não só compreender melhor os aspectos
referidos no quadro 1 como também conhecer condutas que, fazendo parte do
conjunto de características do Autismo, nele não são abordadas como, por

21
WING, L. – Autismo... pp. 51.
22
WING, L. – Autismo... pp. 40.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

exemplo: “Anomalias da função autónoma, controlo vestibular e


desenvolvimento físico”23.

No quadro 2 são referidas essas características definidas por Wing24. Para


a elaboração deste quadro recorremos, também, ao capítulo “El desarrolho y la
education del niño autista” de Angel Riviere25.

Quadro2.- Características comportamentais do autismo

DEFICIÊNCIAS BÁSICAS
a) Linguagem falada
 Problemas de compreensão da linguagem:
 Anomalias no uso da linguagem:
 Ausência total da linguagem (mutismo) ou
naqueles que falam:
 Ecolália imediata
 Ecolália retardada
 Uso repetitivo, estereotipado e rígido de
palavras e frases
Problemas que
 Imaturidade na estrutura gramatical da
afectam a
linguagem espontânea (não imitativa)
linguagem e a
 Alteração na sequência de letras e palavras
comunicação
 Fraco controlo do tom, volume e entoação da voz
 Problemas de pronúncia
b) Linguagem e comunicação não verbal
 Fraca compreensão da informação transmitida
por gestos, mímica, expressão facial, postura do corpo,
entoação vocal.
 Carência de uso de gestos, mímica, expressão
facial, postura do corpo e entoação vocal para transmitir
informações.
23
WING, L. Autismo... pp. 69.
24
WING, L. Autismo... pp. 67 -70.
25
RIVIERE, A. - El desarrollo y la aducación del niño autista: Madrid: Alianza Editorial, 1994. pp. 190-
226.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Reacções  Reacções anormais aos sons.


anormais a  Reacções anormais aos estímulos visuais.
experiências  Reacções anormais à dor e ao frio.
sensoriais
 Reacções anormais ao facto de ser tocado.
(indiferença,
 Reacções paradoxais às sensações.
perturbação,
fascínio)
 Uso de campos visuais periféricos em vez de
centrais (Olhar de canto de olho).
 Olhar as pessoas e as coisas de uma forma fugaz
Anomalias na
em vez de o fazer de forma continuada.
inspecção e
 Olhar “através” das pessoas e “não para as
contacto visual
pessoas”.
 Olhar para as pessoas muito fixamente e demasiado
tempo (crianças mais velhas).
 Dificuldade em imitar movimentos.
Problemas de
 Confundir esquerda – direita, em cima – em baixo, e
imitação motora
à frente – atrás.
 Saltar, agitar os braços e pernas, balançar e fazer
trejeitos.
 Modo especial de caminhar: em bicos de pés, com
um movimento como se levasse molas debaixo dos pés e
Problemas de sem mover adequadamente os braços.
controlo motor  Adaptação de uma postura estranha, na posição de
pé, com a cabeça inclinada, os braços reflectidos nos
cotovelos e mãos pendentes ao nível do punho.
 Os movimentos globais ou finos podem ser
desajeitados nalgumas crianças.
Anomalias da  Padrões erráticos de sono e resistência aos efeitos
função de sedativos e hipnóticos.
autónoma,  Regimes erráticos de comida e bebidas incluindo
controlo um consumo de grandes quantidades de líquidos.
vestibular e  Ausência de tonturas depois de dar voltas sobre si
desenvolvimento mesmo.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

 Imaturidade no aspecto geral e invulgar simetria


facial.
físico
 Atraso na aquisição de padrões de autonomia,
cuidado consigo próprio e controlo de esfíncteres.
DESTREZAS ESPECIAIS
Destreza que  Estas destrezas incluem a música, a aritmética,
não implica o uso montar e desmontar objectos mecânicos ou eléctricos,
da linguagem ajustar peças de puzzles ou jogos de construção.
Tipo de memória  Capacidade de armazenar dados durante longos
pouco usual períodos de tempo na forma exacta em que foram
experimentados pela primeira vez.
PROBLEMAS DE CONDUTA SECUNDÁRIOS
Aparente
isolamento e
indiferença
perante os
outros,
especialmente
perante as outras
crianças.
Forte resistência
à mudança,
apego a objectos
e rotinas, ou
interesse
repetitivo por
certos temas.
Reacções  Ausência de medo, ausência de noção de perigo em
emocionais situações perigosas, mas reacções de certos pânicos
inadequadas. relativamente a objectos ou situações inofensivas.
 Rir, chorar ou gritar sem razão aparente.
 Rir quando outra criança se aleija ou a mãe chora.
Falta de  Falta de capacidade para jogos imaginativos e
imaginação. actividades criativas.
 Prestar atenção a aspectos mínimos ou triviais das
pessoas ou dos objectos, em vez de os olhar como um
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

todo.
 Concentração em actividades repetitivas,
movimentos estereotipados, auto-lesões, etc.
Conduta  Birras.
socialmente  Gritar em público.
imatura e difícil.  Morder ou pontapear pessoas.
 Hábitos socialmente inaceitáveis (ex: deitar-se para
o chão, descalçar-se em momentos inapropriados, pegar
em comida do prato dos outros, etc.)

Existem, entre os vários investigadores, um grande consenso acerca das


características comportamentais mais comuns do Autismo. Contudo, quase
nenhuma criança autista apresenta todos os sintomas. Cada criança é diferente
das outras, não só pela gravidade das diversas alterações, como também pela
diferente combinação de comportamentos, pelos estilos de actuação e pela
personalidade de cada uma.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.4. ETIOLOGIA

2.4.1 Teorias Psicogénicas

Desde 1943, altura em que o síndroma do Autismo foi identificado, que se


tem procurado encontrar as causas que explicam a problemática.

Entre os anos 40 e 60, vigoraram as teorias psicogénicas segundo as


quais as crianças são normais no momento do nascimento, mas uma série de
factores familiares adversos provocam o aparecimento do autismo26.

Consideram-se factores adversos27:


 A personalidade anómala dos pais: frios, coléricos, rígidos;
 Pais com quociente intelectual elevado e de classe social
superior; mais interessados nas suas carreiras profissionais;
 Interacção anormal entre pais e filhos;
 Stress e acontecimentos traumáticos na vida da criança.

As teorias psicogénicas, baseadas nas interpretações psicanalistas do


desenvolvimento infantil, carecem de provas científicas, sendo mesmo alvo de
duras críticas por parte de conceituados investigadores como Schopler,
Andrews e Strupp. Como reacção a estas teorias são efectuados a partir dos
anos 60, vários estudos que vêm provar que o autismo é uma alteração do
desenvolvimento que pode afectar crianças de todo os tipos de famílias e
culturas28.

As alterações manifestadas pelos pais, por exemplo, depressões


reactivas, resultam do facto de terem de lidar de uma forma muito desgastante
com os comportamentos desviantes dos filhos.

26
BERNARDO, T.; MARTIN, C. – Necessidades Educativas Especiales: Ediciones Aljibe, 1993, pp. 35.
27
BERNARDO, T.; MARTIN, C. – Necessidades Educativas... pp. 39 - 43.
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 50 - 58.
28
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 74.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Como diz Poliano, existe uma confusão entre causas e consequências: os


problemas de vinculação entre pais e filhos devem ser considerados antes
como um efeito do autismo e não como a sua causa29.

Crianças criadas em instituições, sem oportunidade de estabelecerem


uma relação estável com nenhum adulto, não correm o risco de desenvolver
um quadro de autismo, ainda que, eventualmente, possam apresentar
problemas de personalidade30.

Crianças que sofreram graves privações sociais e físicas como Kasper


Hauser, Genie; encontradas em 197031 e os gémeos encontrados na
Checoslováquia 197232, embora apresentassem alguns problemas, como
alterações no desenvolvimento da linguagem, não tinham autismo.
As causas do autismo são de origem biológica33.

Embora as teorias psicogénicas estejam já ultrapassadas, existe ainda a


crença, nomeadamente entre profissionais de educação, de que nelas residem
as primeiras causas do autismo, o que tem contribuído para provocar
sentimentos de culpa e recriminação por parte dos pais34. Pensamos que, se já
é difícil para os pais educar uma criança com graves problemas de
desenvolvimento e de comportamento, os sentimentos de culpa apenas
poderão contribuir para agudizar os problemas entre eles. Gostaríamos, pois,
de reforçar a ideia de Uta Frith35: considerar que uma criança se torna autista
pelo facto de não ter sido amada suficientemente pelos pais não passa de um
mito. Mito, esse, que em nossa opinião, é urgente derrubar.

29
BERNARDO, T. - MARTIN, C. – Necessidades Educativas... pp. 60.
30
WING, L. – Autismo... pp. 62.
31
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 76.
32
WING, L. – Autismo... pp. 86.
33
BARON-COHEN, S. et al – Perspectives... pp. 75.
34
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 77.
35
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 77.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.4.2 Teorias Biológicas

Como já referimos antes, a ideia que actualmente produz maior consenso


entre os investigadores é de que o autismo tem origem em causas biológicas
ainda que, em cerca de 2/3 das crianças não seja possível determinar a causa
da sua perturbação. Frith36 considera que existe, não uma cadeia de causas:
um conjunto de factores provocam danos no sistema nervoso o que, por sua
vez, pode produzir alterações no desenvolvimento de sistemas cerebrais
específicos, relacionadas com os processos mentais superiores (linguagem,
atenção, memória).

Segundo Frith37, é neste momento que se produz o autismo.


De acordo com vários autores38, os factores responsáveis podem ser de
ordem:
 Genes defeituosos;
 Anomalias cromossómicas (síndroma do X-frágil);
 Anomalias metabólicas (fenilcetonina e outras);
 Infecções víricas (rubéola fetal e outras doenças durante o
período pré ou pós-natal provocadas por citomegalovírus,
toxoplasmose, sifilis, etc.);
 Disfunção imunitária;
 Anóxia devido a problemas pré ou peri-natal;
 Todos estes factores são igualmente responsáveis pelo
aparecimento de várias problemáticas, o que pode explicar,
segundo Frith, o facto da maioria dos casos de autismo.

Mas o facto de existir Autismo puro, (sem deficiências associadas)


embora raro, leva autores como Wing39 e Frith40 a supor que existem zonas
muito específicas no cérebro que, sendo afectadas, lhe dão origem.

36
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 79.
37
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 79.
38
FRITH, U. – Autismo: Hacia una... pp. 81 - 88.
BERNARDO, T.; MARTIN, C. - Necessidades Educativas... pp. 57 - 63.
39
WING, L. – Autismo... pp. 83.
40
FRITH, U. - Autismo: Hacia una... pp. 80.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Todavia, o estado actual das investigações não permite saber qual a


localização e natureza dessas zonas específicas pelo que alguns elos da
“cadeia de causas” são ainda desconhecidos.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.5 A EDUCAÇÃO DA CRIANÇA AUTISTA

Não existe actualmente processos para tratar as alterações subjacentes


ao Autismo41. De acordo com vários investigadores, o tratamento mais eficaz
para compensar os défices do Autismo é a educação.42 Não se trata de “um
atalho secreto para a normalidade”43, mas sim de um processo cujos objectivos
são, em termos gerais, iguais aos que se propõem para todas as crianças:
desenvolver ao máximo as suas potencialidades, promover um equilíbrio
pessoal, o mais harmonioso possível, fomentar o bem-estar emocional e
proporcionar à criança um mundo humano pleno de relações significativas.

Antes de elaborar um programa de intervenção para crianças autistas é


necessário ter em conta que existe uma variabilidade tanto no que respeita ao
desenvolvimento como ao tipo de condutas características. Será, pois
necessário proceder a uma avaliação rigorosa das capacidades, das alterações
funcionais e dos problemas de conduta.44

2.5.1 Avaliação

A avaliação na criança autista é, tal como para as crianças com


Necessidades Educativas Especiais, a componente indispensável de um
processo educativo eficaz45.

O ideal seria que esta avaliação fosse por uma equipa multidisciplinar
formada por um neuro-pediatra, um psicólogo, um professor ou educador, um
terapeuta de fala, um assistente social e os pais.

A equipa multidisciplinar teria como função fazer uma recolha exaustiva


de informações acerca da criança, que incluíssem aspectos médicos, nível de
funcionamento intelectual, funcionamento nas diferentes áreas de

41
FRITH, U. - Autismo: Hacia una... pp. 249.
42
RIVIERE, A. - El desarrollo y la aducación… pp. 114.
43
FRITH, U. - Autismo: Hacia una... pp. 250.
44
WING, L. - Autismo… pp. 102.
45
CORREIA, L.M. - Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas classes regulares: Porto
Editora, 1997. pp. 15.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

desenvolvimento, comportamento da criança em diferentes contextos, assim


como, as necesidades e prioridades da família e o seu estilo de vida. 46

2.5.2 Papel do educador

De todos os profissionais que prestam atendimento à criança é o


professor, como refere o autor supracitado, que passa mais tempo com ele,
pelo que está numa situação vantajosa para observar o comportamento da
criança.47
“Muitas vezes o professor / educador não está
integrado numa equipa multidisciplinar, cabendo-lhe
a ele uma boa parte da tarefa de recolha de
informações”

WING, L. Autismo Infantil. Aspectos médicos y educativos. Santillana, Madrid, 1982.


pp.143

Para isso poderá contar com o auxílio de alguns instrumentos, tais como:

 A CARS (Childhool Autism Rating Scale) – trata-se de uma escala


de avaliação elaborada por Schopler, Reichler e Renner em 1971,
para identificar criança com Autismo e para as distinguir de outras
crianças com problemas de desenvolvimento que não têm autismo.
É composta por 15 itens comportamentais (relação com as
pessoas, imitação, resposta emocional, movimentos do corpo,
utilização de objectos, adaptação à mudança, resposta visual,
resposta ao som, resposta ao paladar, cheiro e tacto, medo ou
ansiedade, comunicação verbal, comunicação não verbal, nível de
actividade, nível de consistência da resposta intelectual, impressão
global). Cada item tem uma pontuação de 1 a 4 e a pontuação
geral da escala vai permitir classificar a criança como “não-autista”,
“autista ligeiro ou moderado” e “autista severo”.

46
SCHOPLER, E, et al - Teaching strategies for Parents and Professionals: Texas: 1980. pp. 45-53.
47
WING, L. Autismo... pp. 78-93.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

A CARS foi desenvolvida partindo do conceito do Autismo como um


“contínuo de alterações”, pelo que as pontuações da escala também
representam um contínuo.
Para estes autores, a utilização desta escala é apenas o início de uma
avaliação individualizada, pelo que será necessário recorrer a outros
instrumentos para avaliar outros aspectos da criança, como linguagem, o
comportamento ou outras funções:

 O Questionário Estandardizado de Avaliação, elaborado por Wing –


este instrumento está especialmente adaptado para crianças com
problemas cognitivos, perceptivos e de linguagem, tal como se
apresentam no autismo e permite fazer observações de dois tipos:
o nível alcançado pela criança tendo em conta um desenvolvimento
normal e os desvios a esse mesmo desenvolvimento, tal como a
ecolália, a intensa resistência à mudança e comportamentos
inadequados.48

 Os currículos utilizados para educação de crianças com Deficiência


Mental49, são instrumentos que nos podem orientar na observação
da criança de acordo com as diferentes áreas de funcionamento.
Não devemos esquecer que na maioria dos casos de Autismo está
associado a Deficiência Mental.50

 O Inventário Ecológico de Vieira e Pereira permite obter


informações detalhadas sobre o desempenho das crianças nos
diferentes contextos (casa, escola, comunidade); utilizando este
instrumento pode-se ficar com uma ideia exacta sobre os
comportamentos que a criança apresenta, como os realiza (que
materiais utiliza, que ajudas necessita), porquê ou para quê os
realiza, onde, quando e com que frequência os apresenta.51

4810
WING, L. Autismo… pp. 93-95.
49
VIEIRA, F.D. e PEREIRA, M.C. - A educação das pessoas com deficiência mental: Fundação
Calouste Gulbenkian, Serviço de Educação, 1996. pp. 34 - 38.
50
RIVIERE, A. - El desarrollo y la aducación del niño autista: Madrid: Alianza Editorial, 1994. pp. 301.
51
VIEIRA, F.D. e PEREIRA, M.C. - A educação das pessoas… pp. 32.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Para além destes instrumentos, o professor / educador poderá ainda


utilizar escalas de desenvolvimento, que ajudam a determinar objectivos
educativos, assim como questionários e entrevistas aos pais. Estes poderão
fornecer informações importantes acerca do funcionamento da criança no meio
familiar, dos seus interesses e preferências. Também podem informar o
professor / educador acerca das preocupações, prioridades e desejos dos pais
no que respeita à educação dos filhos, assim como o tipo de cooperação que
poderão prestar.

2.5.3 O envolvimento dos Pais

O processo educativo é fortemente valorizado se houver uma estreita


colaboração entre a escola e a família. Os professores contribuem com a sua
formação, os seus estudos e a experiência de trabalho e os pais contribuem
com o conhecimento específico que têm do seu filho e situação familiar.52
Dado que as crianças autistas têm muitas dificuldades de generalização é
muito importante que os pais colaborem não só na avaliação e elaboração de
um programa individualizado mas também na concretização deste no meio
familiar, sobretudo nos aspectos ligados à comunicação, autonomia e
comportamentos inadequados.

Muitas vezes esta colaboração não se torna fácil pois os pais têm
sentimentos de desilusão e de culpa e não compreendem o que se passa com
o seu filho, por isso os primeiros contactos são de primordial importância: o
professor / educador deve transmitir reconhecimento por tudo o que os pais
fazem pelos filhos, mesmo que as vezes nos pareça inadequado, e valorizar o
papel que têm como pais; deve também ajudar os pais a compreender os
comportamentos e necessidades educativas dos seus filhos.

Os pais são as pessoas que passam mais tempo com as crianças, por
isso, para alem de a conhecer melhor, também são capazes, muitas vezes, de
desenvolver as suas próprias técnicas de ensino e de educação, pelo que será
52
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

muito salutar uma estreita colaboração entre pais e profissionais, baseada num
espírito de confiança, de partilha e respeito mútuo.

2.5.4 O Papel do Psicólogo

Como já referimos, o professor / educador tem um papel importantíssimo


na avaliação da criança autista. Não podemos esquecer, no entanto, que essa
avaliação só ficará completa com informações de carácter clínico e
psicológico.53

Os resultados obtidos pelo psicólogo através da utilização de testes


estandardizados (Ex.: WISC-R, Matrizes Progressivas de Raven, etc.)
constituem uma informação importante no que respeita ao funcionamento
intelectual, aos comportamentos adaptativos e permitem, ainda, detectar
capacidades que por vezes se encontram camufladas pela gravidade das
alterações ou por uma educação pouco adequada.54

Através de avaliações psicológicas é possível predizer o êxito dos


programas educativos, assim como de que forma as pessoas com Autismo se
adaptarão ao longo da sua vida.55

2.5.5 Programação

2.5.5.1 Dificuldades do processo de aprendizagem

Ao planear um programa educativo para uma criança autista é necessário


ter em conta um conjunto de dificuldades que podem pôr entraves à eficácia de
todo o processo.
Rutter, citado por Bernardo e Martin, agrupa em quatro áreas as
dificuldades de aprendizagem geradas pelo autismo:
53
WING, L. - Autismo… pp. 73.
54
WING, L. - Autismo… pp. 125 - 202.
55
FRITH, U. - Autismo... pp. 30 - 35.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

 Dificuldades de atenção;

Dificuldade em dirigir a atenção por si próprio;

Presença de comportamentos que perturbam a atenção, tais como


fixar, rir, chorar, etc.;

Atenção hiperselectiva (tendência para prestar atenção apenas a


aspectos ou pormenores não relevantes dos ambientes ou das
tarefas);

Dificuldade em perceber contingências (dificuldade em reconhecer a


relação espácio-temporal entre acontecimentos).

 Grandes dificuldades em generalizar as aprendizagens a


diferentes ambientes;

 A aprendizagem faz-se por vezes de uma forma mecânica;


a criança não compreende o significado do que aprendeu;

 Pouca resistência à frustação e às dificuldades em


aprender algo; segundo Riviere56, os erros repetidos podem
provocar um aumento de negativismo, alterações de
comportamentpo e desmotivação.

A este conjunto de dificuldades devemos ainda acrescentar os problemas


de compreensão da linguagem (compreensão literal da linguagem, surdez, etc.)
e dificuldades de imitação.57

2.5.5.2 Objectivos

56
RIVIERE, A. - El desarrollo y la aducación… pp. 320.
57
WING, L. - Autismo… pp. 87.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Para implementar um programa educativo devemos ter em conta as


dificuldades de aprendizagem de cada criança e por isso este programa tem de
ser individualizado e elaborado de acordo com o estilo de aprendizagem da
criança, e as necessidades da família e da escola.

O processo educativo da criança autista deve processar-se sempre tendo


em conta o meio menos restrito possível, por isso, será necessário, respeitar as
seguintes prioridades:

 prevenir situações que podem pôr em risco a vida da criança:


correr para uma estrada movimentada, comer substâncias tóxicas,
comportamentos auto-destrutivos e comportamentos agressivos em
relação aos outros; será necessário um programa de modificação de
comportamento e uma adaptação ou modificação dos ambientes e
situações de risco;

 ter em conta situações que põem em risco a estabilidade da vida


familiar: acessos de raiva, birras persistentes, dificuldades de sono,
preferências alimentares estranhas, maus hábitos à mesa, maus hábitos
de higiene, barulhos estranhos contínuos, excessiva interferência com os
irmãos e os seus objectos, etc. embora seja preferível que a criança viva
no seio da sua família, há situações demasiado graves em que as
adaptações e as tentativas de modificação de comportamento não são
eficazes, sendo necessário recorrer a instituições residenciais;

 os programas de educação terão tanto mais sucesso quanto maior


fora comunicação entre a escola e a família. Pais e professores devem
discutir francamente os limites que consideram aceitáveis para os
comportamentos e juntar esforços para que o ensino de tarefas e
adaptação social tenham êxito.

 a adaptação da criança à comunidade é tão importante como a sua


adaptação à escola e à casa; deve-se pois proporcionar o acesso à escola
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

regular onde possa ter experiências com crianças ditas “normais”, assim
como promover visitas a amigos e familiares, idas às compras, a
espectáculos, etc.

A educação da criança autista tem, segundo S. Elgar 58 os seguintes


objectivos gerais:

1.- Comportar-se de acordo com as normas socialmente aceites;

2.- Adquirir o máximo de independência possível;

3.- Aumentar a sua compreensão da linguagem;

4.- Adquirir hábitos de trabalho e aumentar a sua capacidade de


concentração e aplicação;

5.- Jogar e ocupar o tempo livre de forma adequada.

A definição individualizada dos objectivos deve ter como base:

 um conhecimento, o mais preciso e profundo, sobre a


natureza do autismo e sobre as características específicas da criança
para quem se está a programar;

 ter como ponto de referência os padrões de desenvolvimento


normal;

 ter uma visão realista sobre as possibilidades de


desenvolvimento da criança;

58
WING, L. - Autismo… pp. 137 - 178.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

 fazer uma análise realista sobre os ambientes em que se vai


realizar o processo educativo.593

Resumindo, os objectivos devem estar de acordo com um contexto


evolutivo mas, ao mesmo tempo, ser suficientemente realistas de modo a
facilitar a adaptação da criança ao seu meio ambiente. 60 Uma boa definição de
objectivos individuais implica, pois, que estejam de acordo com a avaliação
feita previamente, que sejam funcionais (respeitem as necessidades do aluno e
dos seus contextos de vida), que estejam de acordo com a idade cronológica
do aluno, que promovam o seu bem estar físico e emocional e que sejam
desejados pelos alunos e pelos pais.61 Estes objectivos devem estar também
de acordo com a Carta dos Direitos das Pessoas com Autismo62 para que se
possa prevenir o mais possível a violência sobre as pessoas com Autismo e o
seu desenvolvimento

A – O Direito da pessoa com autismo a um diagnóstico e avaliação


livre de preconceitos e ideias preconcebidas (Direito nº2 da Carta dos
Direitos das Pessoas com Autismo).

O diagnóstico deve ser feito o mais precocemente possível. É difícil fazer


um diagnóstico ao autismo antes dos 3 anos e deve-se ser cauteloso ao fazer
um diagnóstico precoce pelo risco que se corre deste ser falso. É no entanto
possível identificar a presença de perturbações da relação com o outro, da
comunicação e da imaginação em crianças muito pequenas. O CHAT
(Checklist for Autism in Tolders) de Baron-Choen e outros, tem-se revelado um
instrumento muito útil para um despiste precoce, podendo ser utilizado na
avaliação da criança aos 18 meses. Nesta idade deverão ser pesquisados os
seguintes sinais de alarme: 1) ausência de interesse social, 2) ausência de jogo
social, 3) ausência de jogo de faz de conta, 4) ausência de apontar proto-
declarativo, ou seja, apontar para mostrar ou partilhar interesse por alguma
coisa, 5) ausência de atenção partilhada. Se dois ou mais destes sinais estão
596
RIVIERE, A. - El desarrollo y la aducación… pp. 234.
27
RIVIERE, A. - El desarrollo y la aducación… pp. 235 – 236.
60

61
VIEIRA, F.D. e PEREIRA, M.C. – A educação das pessoas… pp. 43 - 48.
62
Carta dos Direitos da Pessoa com Autismo: Autisme-Europe. (Anexo ...
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

presentes teremos um forte indicador da existência de uma perturbação da


relação e de um diagnóstico de autismo.
As crianças que apresentem uma perturbação autista devem ser sempre
sujeitas a uma avaliação médica, para despiste de alguma doença orgânica
que possa estar associada. C Gillberg e M. Coleman (1992), encontraram uma
doença orgânica associada em 35% das crianças com autismo. O importante
deste diagnóstico precoce não é o diagnóstico em si mas a possibilidade de
iniciar-se uma intervenção precoce e um atendimento adequado às
necessidades daquela criança.

B – Direito a uma educação adequada, acessível e em plena


liberdade (Direito nº 3 da Carta dos Direitos das Pessoas com Autismo.

O autismo é uma perturbação pervasiva do desenvolvimento, ou seja,


uma perturbação global com alterações qualitativas de várias áreas de
desenvolvimento (comunicação, desenvolvimento social e imaginação). A
maior parte das pessoas com autismo irá necessitar de uma educação e de um
atendimento especializado durante toda a vida.

A criança com autismo tem direito a receber uma educação especializada,


que inclua a participação activa da família, que tenha em conta a
especificidade, dificuldades e potencialidades de cada criança. É necessário
proceder a uma avaliação rigorosa da criança, enquadrada no seu contexto
sócio-familiar e proceder À elaboração de um programa de intervenção
individualizado.

As opções disponíveis no sistema educativo deveriam incluir tanto a


possibilidade de frequentar o ensino regular integrado numa classe regular ou
uma classe especial com a possibilidade de frequentar uma escola
especializada. Em qualquer dos casos, os educadores deverão conhecer e
considerar as necessidades específicas da criança com autismo e da sua
família. Os pais e outros membros da família devem ser parceiros activamente
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

implicados no programa educativo. A experiência tem demonstrado os


benefícios da sua colaboração activa.

Objectivos da intervenção psicopedagógica:

Favorecer o desenvolvimento da comunicação verbal e não-verbal, da


compreensão social, das competências sociais e cognitivas.

Favorecer a aquisição de competências funcionais, que possam ser


utilizadas em diferentes contextos.

Manter uma abordagem normativa, ecológica, que assegure às pessoas


com autismo um estilo de vida o mais próximo possível das pessoas não
deficientes da mesma idade. A escolha das actividades escolares, das
actividades lúdicas e mesmo o funcionamento das instituições especializadas
deve reflectir este estado de espírito.

Ajustar os objectivos em função da idade. Na idade pré-escolar promover


o desenvolvimento global da criança. Na idade escolar fazer a adaptação do
curriculum escolar. Na adolescência é necessário perspectivar o futuro, a vida
social e comunitária e a transição para a vida adulta.

▪ Pré-escola: promover o desenvolvimento global.


▪ Idade escolar: implementação de um currículo adaptado.
▪ Adolescência: planeamento da vida futura, da vida em comunidade e
transição para a idade adulta.

C – Direito a ser educado no ambiente o menos restritivo possível, a


participar e beneficiar da cultura, recreação e desporto. (Direito nº12 da
Carta dos Direitos das Pessoas com Autismo).

A luta contra o isolamento da pessoa com autismo, isolamento em si


própria, na família ou na instituição é um dos meios de prevenir os maus tratos
(num ambiente aberto, os maus tratos serão mais visíveis e por isso haverá
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

menos possibilidade de ocorrerem e serão também mais facilmente


denunciados e controlados).

D – Direito a igual acesso e uso das facilidades, serviços e actividades da


comunidade (Direito nº13 da Carta de Direitos das Pessoas com Autismo).

A maior parte das pessoas com autismo necessitarão de suporte e


encorajamento para serem independentes, fazerem valer os seus direitos e
assumirem as suas responsabilidades.

Embora nem sempre seja evidente, as pessoas com autismo preocupam-


se com a sua aparência, as suas capacidades, os seus sucessos de
independência, à semelhança do que se passa com os outros. Quando bem
sucedidas ganham maior confiança e dignidade.

E – Direito de não ser sujeito a mau uso ou abuso farmacológico (Direito


nº18 da Carta dos Direitos das Pessoas com Autismo).

Não há medicação específica para o autismo. A medicação pode ser


utilizada para ajudar a controlar sintomas como a agitação, a irritabilidade, a
auto ou hetero-agressividade, a depressão ou a insónia mas não para curar o
autismo.
A decisão de manter, suspender ou alterara a dose ministrada deve
fundamentar-se numa rigorosa avaliação.

F – Direito a um trabalho digno e à formação profissional (Direito nº10 da


Carta dos Direitos das Pessoas com Autismo).

A formação profissional e o trabalho devem ter em conta as capacidades


e os interesses da pessoa com autismo.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

As pessoas com autismo, devem ter a oportunidade de tentar diferentes


tarefas, e de ter diferentes experiências de trabalho. Só quando têm
experiências de trabalho diversificadas podem optar.
As pessoas com autismo, por causa das suas dificuldades, devem ser
muito ajudadas ao desempenhar tarefas relevantes. Devem ser feitos esforços
para ensinar e encorajar a tentar novas tarefas que podem, por vezes, à
primeira vista, aparecer como um desafio e ultrapassar as suas capacidades.

G – Direito da pessoa com autismo a ter relações sexuais ou outras,


incluindo o casamento, sem exploração nem coacção (Direito nº10 da
carta dos Direitos das Pessoas com Autismo).

Como qualquer outro cidadão, tem direito a ter relações sexuais e ao


casamento, sem exploração nem coacção.

Deve ter direito adequado aconselhamento, incluindo o direito à


informação acerca dos meios anticonceptivos.

H – Direito a aconselhamento e cuidados de saúde física e mental e vida


espiritual (direito nº9 da Carta dos Direitos da Pessoa com Autismo).

Isto inclui a prestação de tratamentos adequados e administração de


medicação no interesse do paciente, com todas as medidas de protecção.

As pessoas com autismo estão sujeitas ao mesmo tipo de doenças que os


outros, e porque têm dificuldades ou são incapazes de se queixar ou exprimem
o mau estar de forma inadequada (ex.: instabilidade, agressividade), a família e
prestadores de cuidados devem estar particularmente atentos aos problemas
de saúde. Devem ser realizados exames médicos periódicos, tendo o cuidado
de registar os resultados dessas observações. Quando algum problema é
identificado, deve ser tratado, com particular atenção aos efeitos desejáveis ou
indesejáveis da medicação usada.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

I – Direito a ser implicado nas decisões que dizem respeito ao seu futuro
(Direito nº4 da Carta dos Direitos de Pessoas com Autismo).
Os desejos das pessoas com autismo devem ser, sempre que possível
conhecidos e respeitado. Não devemos poupar-nos a esforços para tentar
explicar as opções existentes, mesmo que seja um processo demorado e não
estejamos seguros de que a pessoa com autismo as vai compreender. Nunca
deverá tentar-se obter uma determinada resposta por omissão de detalhes
importantes.

J – Direito a não sofrer negligência ou mau trato físico (Direito nº 17 da


Carta de Direitos da Pessoa com Autismo).

O uso da violência conduz a uma crescente violência, a vítima de hoje


será o agressor de amanhã. O uso de meios físicos ou farmacológicos para
controlo dos comportamentos de auto ou de hetero-agressividade surgidos
nesse contexto poderiam integrar um novo ciclo de violência.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.6 Características da Criança Autista (0 a 6 anos)

O diagnóstico do autismo faz-se agora cada vez mais cedo.

Apesar de não existir um parâmetro infalível para diagnosticar o autismo,


pois o síndroma varia um pouco de paciente para paciente. Existem sempre
sinais centrais, tal como, déficit na interacção social recíproca, déficit da
linguagem e na comunicação. Embora sempre se verifiquem, podem ser
discretos na primeira infância.

2.6.1 Desenvolvimento senso – motor

2.6.1.1 Atraso de Desenvolvimento

O atraso do desenvolvimento psicomotor acontece muitas vezes, pode


detectar-se um desfasamento na elevação e manutenção da cabeça, na
posição sentada e na marcha. 63

2.6.1.2 Problemas no sono

A criança fica acordada muito tempo ou acorda durante a noite, varia


muito de criança para criança. A criança pode ficar longas horas com os olhos
abertos sem se manifestar.64

2.6.1.3 Problemas da alimentação

Estas perturbações são muito comuns e também podem ser muito


precoces. Por exemplo, a criança está muito passiva no momento da mamada
e não apresenta reacções de sucção.

Mais tarde, pode manifestar resistência a certas modificações, tais como


a passagem à alimentação sólida.
63
NORMAN, A. S. – Psicologia Educacional: Lisboa: Mecgraw – Hill, 1993, pp. 67.
64
NORMAN, A. S. – Psicologia… pp. 67.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Esta criança pode manifestar preferências por uma gama muito restrita de
alimentos ou de certas marcas, e as escolhas dos produtos, identifica quer pelo
gosto ou então pela embalagem.

Pode manifestar rejeição, não só por determinados alimentos, mas


também por determinados objectos, tais como talheres.65

2.6.1.4 Problemas com hábitos de higiene

Existem frequentemente problemas com o trânsito intestinal, tal como


diarreia ou obstipação, devido aos hábitos alimentares pouco saudáveis,
devido também aos medos relativos à casa de banho, tal como, puxar o
autoclismo.66

2.6.1.5 Problemas motores

Anomalias discretas no plano da postura e da coordenação podem ser


frequentemente detectados67.

2.6.1.6 Problemas dos sentidos

Marcantes antes dos 6 anos. Perturbações em todas as modalidades


sensoriais. Por exemplo, evitar o contacto.68

2.6.2 Desenvolvimento da Linguagem e da Comunicação

65
NORMAN, A. S. – Psicologia… pp. 68.
66
NORMAN, A. S. – Psicologia… pp. 68.
67
NORMAN, A. S. – Psicologia… pp. 69.
68
NORMAN, A. S. – Psicologia… pp. 69.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.6.2.1 Em relação à linguagem

Nota-se uma ausência ou redução das vocalizações, ausência de ligação


entre os gritos e as situações. Carácter particular dos gritos, os pais aprendem
a descodificá-los mas o seu valor expressivo é muito específico.

A criança autista tem um atraso na linguagem, quer a nível do stock


verbal, quer do nível da construção de frases.

A sua linguagem comporta anomalias, nomeadamente, ecolalia imediata


ou diferida, uso idiossincrático das palavras e expressões, anomalias da
prosódia.

Nota-se um atraso intelectual mas é a utilização da linguagem em


contexto social que se torna mais evidente.

2.6.2.2 Em relação à comunicação não verbal

A criança é geralmente passiva, têm dificuldade em captar o olhar.


Há uma ausência de relação com o adulto, tipo, a criança não estende os
braços para ser agarrada ou para responder a outra solicitação do adulto.
Quando esta criança se encontra no colo do adulto, põe-se em posições
bizarras, evita o contacto ou então, agarra com força para manter o contacto a
todo o custo. As mímicas faciais são pobres

2.7 Desenvolvimento das interacções sociais

2.7.1 Desenvolvimento das primeiras relações interpessoais

Ausência de envolvimento da criança autista.

O comportamento visual tem uma função reguladora que permite à


criança modular o seu grau de atenção, controlando o nível de estimulação, e
os adultos têm tendência a para diminuir os estímulos quando a criança desvia
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

o olhar. Pode assim haver um empobrecimento das estimulações devido aos


comportamentos de evitar contacto por parte da criança.

A criança tem uma menor participação nos primeiros jogos interactivos


(por volta 6 meses). Há um atraso em seguir um objecto quando o adulto lhe
aponta o objecto.69

2.7.2 Comportamento de vinculação

Não se pode afirmar que as crianças autistas são completamente


indiferentes às pessoas que os rodeiam. Pois verifica-se interacção com as
pessoas conhecidas, por exemplo, os pais.

Podem apresentar reacções de desagrado em relação à separação (mas


em muitas crianças autistas isto não se verifica).
Embora esta vinculação se manifeste de maneira atípica, o
comportamento destas crianças não se manifestam por procurar conforto e
“mimos” junto dos pais, mas sim por variadas formas, tais como a indiferença
social ou reacções excessivas de se agarrarem de uma forma violenta70.

2.7.3 Desenvolvimento dos jogos sociais

As anomalias no contacto social são mais discretas nos primeiros tempos


de vida, acentuando-se mais entre os 2-3 anos e os 5-6 anos. Pois é aqui que
a criança tem um confronto com a vida colectiva num contexto escolar.

A criança autista geralmente não entra em interacção com os seus pares,


ou seja, não há olhar, não há aproximação, não há interesse pelos objectos ou
situações de jogo, etc.
69
RIDEAU, A. – Psicologia Moderna, 400 dificuldades e problemas das crianças: Lisboa: Verbo, 1977.
70
STOPPARD, M. – Os primeiros anos do seu filho. Como descobrir e desenvolver as potencialidades
das crianças: Editora Civilização, 2001, pp. 169-170.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Observam-se antes, reacções violentas sempre que os outros tentam


entrar na actividade que a criança autista está empenhada.

Quando existem comportamentos sociais são preferencialmente


orientados para o adulto conhecido. Na Creche ou no Jardim-de-infância, a
criança mostra-se muitas vezes dependente desse adulto, sem que possa
entrar em interacção com os seus pares.

2.7.4 Desenvolvimento cognitivo

Não existe coordenação das acções coordenadas para um fim.


O pensamento simbólico não se verifica, geralmente no autista.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.8 Tratamento

Não há cura para o Autismo. Pode-se sim ajudar a que as pessoas com
Autismo tenham uma melhor qualidade de vida.

Os objectivos de um tratamento a estes doentes passam por promover, o


desenvolvimento social e comunitário, ensinar competências adaptativas e
treinar funções cognitivas de modo a aumentar a flexibilidade, tratar dos
problemas de comportamento e emocionais que interferem com o
desenvolvimento, apoiar e informar as famílias e os profissionais implicados.

Um plano de tratamento deve ser individualizado, dada a grande


diversidade desta patologia. Os pais, a família, a escola devem estar
implicados no tratamento, deve ser estabelecida uma hierarquia de prioridades,
deve haver um equilíbrio entre as necessidades individuais, as prioridades
familiares e os recursos disponíveis, como também deve ser estabelecido um
horário de sessões adequado às necessidades actuais da pessoa com
autismo.

2.8.1 Alguns Modos de Tratamento

2.8.1.1 Programas Educativos

 Serviços, tal como escolas especiais, escolas de integração, tratamento em


centros de dia, casas de apoio para feriados e férias. Poderão ser aplicados certos
esquemas de modificação do comportamento, nomeadamente, terapia da fala e
linguagem e terapia ocupacional e física.

2.8.1.2 Apoio Familiar

 Família, pelo apoio psicológico, formação aos pais e apoio farmacológico, este
apoio consiste para diminuir os problemas ligados com a agressão, a obsessão,
tiques, ansiedade, mudanças de humor, hiperactividade, etc.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

 Através da massagem a criança é ensinada a descontrair-se, a massagem


ajuda a criança autista a ligarem-se pelo toque.

 Abraçar a criança mesmo que ela lhe seja indiferente, com o tempo ela vai
obtendo confiança.

 Ao falar, fazer também gestos ao mesmo tempo.

 A Psicoterapia é indicada para a criança autista, mas também para toda a


família71.

2.8.2 Idade e Evolução do Tratamento

2.8.2.1 Na Primeira Infância

 Depois de diagnosticado os pais precisam de informação, bem como há


uma necessidade de apoio aos pais através de programas de apoio familiar
(algo raramente disponível na maior parte dos países europeus).

 As famílias destes doentes desempenham um papel crucial para a


promoção da comunicação e o desenvolvimento das capacidades sociais da
criança autista.

 Deve ser dado a estas crianças especial atenção em todos os momentos


rotineiros da vida, tal como dar de comer, ir à casa de banho, dormir, etc.

71
STOPPARD, M. – Os primeiros anos do seu filho. Como descobrir e desenvolver as
potencialidades das crianças: Editora Civilização, 2001. pp. 166.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.8.2.2 Idade Escolar:

 O ideal é estas crianças terem um curriculum educativo adequado, com


adaptações personalizadas, visto as características destas crianças serem
muito diversificadas.

 O mais indicado é o formar profissionais que compreendam o autismo.

2.8.2.3 Adolescência e Idade Adulta:

 Aqui o plano de tratamento deve ser muito bem orientado para a


participação do autista na vida normal da comunidade.

 O tratamento deve englobar as possibilidades ocupacionais desde


centros de dia, empregos protegidos, necessidades de educação contínua
e apoio permanente para permitir a vida da comunidade.

 À medida que as pessoas com autismo envelhecem, as suas


necessidades especiais de apoio não desaparecem e deve ser mantido
um plano adequado à idade.

As famílias devem acompanhar sempre o autista através dos mais


variados serviços, tais como, apoio financeiro adequado, aconselhamento
legal, informação e referência a serviços especializados, associações de pais,
etc. Infelizmente, poucas famílias na Europa têm livre acesso a estes tipos de
serviços mínimos. Mas também é importante o papel da comunidade, a
capacitar as famílias a lidarem com as dificuldades colocadas pelo autismo72.

Todos nós precisamos de uma sociedade acolhedora e que reconheça os


direitos das pessoas que sofrem desta patologia, tal como nos diz a Carta dos
Direitos das Pessoas com Autismo.
72
STOPPARD, M. – Os primeiros anos do seu filho. Como descobrir e desenvolver as
potencialidades das crianças: Editora Civilização, 2001, pp. 167.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

2.9 A comunicação da educadora com a criança autista

As competências a nível da comunicação e da linguagem têm um papel


decisivo e fundamental na capacidade de o indivíduo funcionar em sociedade.
O desenvolvimento da comunicação e linguagem nas crianças com autismo
não é comparável como se o desenvolvimento se processasse normalmente.
As dificuldades não se centram a nível da fala, mas da comunicação. É muito
raro em crianças com autismo, capazes de apontarem para o que querem ou
para partilharem o interesse por determinado acontecimento, virem ter com os
pais ou com a educadora para mostrarem alguma novidade.

Uma das formas de a educadora lidar com crianças que sofram desta
patologia é através do impacto da comunicação aumentativa (comunicação de
apoio ou a ajuda) e da comunicação alternativa (qualquer forma de
comunicação distinta da fala e utilizada por uma pessoa em contextos de
comunicação cara a cara).72 Por isso, a educadora no processo de
comunicação com a criança autista deverá recorrer a signos gráfico/gestual,
recorrer frequentemente a imagens para que a comunicação entre ela e a
criança autista seja cada vez mais eficaz. Torna –se necessário também que
os estilos comunicativos e formas de comunicação usadas com a criança nas
diversas situações sejam semelhantes de modo a haver coerência. É
fundamental escolher as actividades em que a criança se envolva com maior
prazer e que sejam as mais relevantes para si, em que seja mais fácil atingir o
objectivo e que impliquem, preferencialmente, a interacção com pares.

Depois de escolhido o vocabulário, de acordo com os gostos e hábitos da


criança, há que seleccionar o modo de comunicação a usar para cada um. Por
exemplo, para se referir a um objecto específico será preferível em princípio o
recurso a um signo gráfico, enquanto que para a realização de comandos mais
imediatos, como por exemplo informar que acabou, pedir para fazer chichi, ou
pedir ajuda, um signo gestual será mais eficaz. Mas como cada caso é um

72
Cregan,A; Jones, P, Sign & symbol communication for mentally handicapped people: British Library,
1986. pp. 86 - 130.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

caso, torna –se necessário um trabalho de equipa (família, equipa terapêutica,


educadores).

Algumas estratégias que o educador poderá utilizar são, por exemplo, não
dar ajuda antes da criança mostrar de que necessita, o educador deverá
informar da actividade de colagem e em vez da cola, estar no seu lugar papel,
o seu brinquedo preferido estar guardado dentro de uma caixa difícil de abrir, e
para isso, a criança vai ter de pedir ajuda, na hora da refeição poderão ser
ensinadas, demonstradas diferentes funções comunicativas (exemplo: pedir,
rejeitar, comentar). Isto tudo tem como objectivos, desenvolver uma
comunicação social espontânea, com uma estrutura o mais flexível possível,
dar á criança um leque de estratégias vasto para conseguir expressar as suas
intenções.73

Adquirir competências comunicativas nestas crianças é muito mais do que


melhorar o repertório verbal oral, é fundamentalmente melhorar aspectos da
comunicação social, de modo a que a criança saiba como iniciar interacções,
seja através de palavras ou de outras formas de comunicação.

73
Cregan,A; Jones, P, Sign & symbol communication for mentally handicapped people: British Library,
1986. pp. 86-130.
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

3. Definição da Metodologia de Investigação

Ao longo deste estudo, tentamos abordar o modo como o Educador


deve comunicar com a criança autista e por isso, decidimos investigar como é
que isso acontecia na prática. Como tal a nossa pergunta de partida é:

Como o Educador Comunica com a Criança Autista.

De forma a responder a esta pergunta, pareceu-nos pertinente levar a


cabo uma investigação que terá um método de estudo, o qual passaremos a
identificar.

3.1 Método de Análise Qualitativo

Para a nossa investigação escolhemos efectuar como metodologia o


método qualitativo. Para isso, escolhemos cinco Educadoras de jardins de
infância diferentes para a realização de entrevistas semi – estruturadas.
Através destas entrevistas temos como objectivo perceber como é que o
educador consegue comunicar com crianças que sofram desta patologia.

3.2 Instrumentos para Recolha de Dados

De forma a realizar este estudo utilizamos para a realização do nosso


trabalho, baseado no método qualitativo, que terá como instrumento de recolha
a entrevista. Como tal utilizaremos como instrumento um guião semi-
estruturado de entrevista e um gravador para recolha do método qualitativo.

Apresentação e discussão dos resultados


_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

Das Educadoras que entrevistamos, apenas uma delas no presente não se encontra
a trabalhar com alguma criança autista, mas no entanto, tinha trabalhado durante um ano
com uma criança que sofreu desta patologia. Também das cinco crianças que as
Educadoras trabalham ou trabalharam tinham idades compreendidas entre os três e os
seis anos, sendo duas delas do sexo feminino e três do sexo masculino. Pelo menos
duas das Educadoras já trabalham há mais de cinco anos com crianças autistas.

De uma forma geral, todas as educadoras entrevistadas têm certos cuidados dos na
relação da evolução da criança autista com quem trabalham. É uma relação de carinho e
de observação para verificar os centros de interesse que necessitam de ser mais
trabalhados na criança. É uma relação individualizada que vai desde o intercâmbio entre
educadoras e familiares, respeitando acima de tudo a evolução que a criança vai
apresentando.

Em relação às rotinas diárias, depende muito da evolução da criança autista em


questão, por exemplo, uma das crianças, segundo a educadora: “ apesar de não
comunicar totalmente acompanha por breves minutos certas actividades a realizar na
sala de jardim”. Outra das crianças precisa que a educadora lhe incuta a rotina através
da modelagem com os outros colegas e assim vai fazendo as coisas através da repetição.
Outra forma que outras educadoras utilizam para comunicar à criança as suas rotinas
diárias é através da verbalização e também exemplificando lentamente à criança o que a
educadora pretende que ela faça.

No que diz respeito à actividade que o autista terá que desempenhar. Aqui as
educadoras variam um pouco na maneira como comunicam à criança, apesar que a
maior parte delas, verbalizam e mostram a actividade antes de pedirem à criança autista
que a realize. Outra das educadoras costuma interagir com os pais para saber a melhor
forma de indicar a actividade à criança.

Em relação às brincadeiras, a maior parte das crianças autistas participa nelas


ainda que brevemente, por exemplo, há uma menina que gosta muito de balões e dá
beijinhos às pessoas, um outro menino acaba por ter uma participação só de observação
apesar de quando a educadora o chama para participar, por exemplo, numa canção de
roda, ele participa mas desmotiva muito facilmente. A maior parte das educadoras” Dá
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

um tempo à criança autista” e respeita-a se ela não quer participar em alguma


brincadeira. Uma das educadoras entrevistadas utiliza a forma gradual de comunicar
com as crianças, ou seja, repetindo com a criança toda a brincadeira até que a criança
com o tempo ganhe confiança e interaja com o grupo, nem que seja por breves minutos.

Quando há uma recusa de participação nas actividades, a educadora, a maior parte


das vezes, aceita a recusa porque a insistência ou o tentar motivar pode gerar
agressividade. Uma das educadoras deu um exemplo da sua atitude nestas situações: “
Quando ... quando a menina se porta mal tenho, uma cadeira, para onde ela vai, embora
faça birras só sai de lá quando está calma.

Em relação aos apoios humanos e logísticos, todas as educadoras foram unanimes


na resposta de que eram usados apoios humanos. Quanto à terapia da fala a maior parte
destas crianças já passou ou está a passar por este processo terapêutico. Num dos casos,
a mãe tirou a menina da terapia porque ela fazia birras, noutro dos casos, verificou-se
que a terapia não era solução. Apesar, de um diferente caso, em que a criança continua
na terapia juntamente com o apoio de outro técnico, uma Psicopedagoga. Um dos
meninos como gosta muito de natação, pois relaxa-o, é acompanhado por um Professor
de natação. Num dos casos a educadora em questão era na altura estagiária e por isso
não estava ao corrente dos apoios que esta criança tinha, apenas sabia que tinha.

Para chamar a atenção do menino/menina, uma das educadoras respondeu que tem
imagens afixadas na sala com determinadas expressões faciais, e sempre que se justifica
uma chamada de atenção, positiva ou negativa dentro da sala, a educadora aponta-lhe
para as imagens. Outra das educadoras apenas ralha quando quer chamar à atenção a
criança. Uma outra, chama a atenção, por exemplo, quando a criança não faz ou não
quer fazer algo porque lhe tiram um objecto, ele acaba por agredir algum colega, nesta
situação a educadora com calma diz-lhe: “ Não se bate, o menino está triste” e ele fica
sensibilizado e até consegue acalmar porque é preciso dar tempo e deixá-lo manifestar a
agressividade para que a situação não piore. Numa das salas visitadas existe um espaço
para a criança autista se acalmar, chamado de “Time-out” e sempre que a educadora tem
que fazer uma chamada de atenção a criança vai para lá e só sai quando estiver pronta
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

para se portar bem. Neste mesmo jardim quando a fúria é tal, a educadora encosta-o à
parede com os braços cruzados para o imobilizar, pois corre-se o risco de eles se
magoarem ou de magoarem outras pessoas.

A maior parte destas crianças não consegue ser autónoma na realização das
actividades básicas, tal como ir à casa de banho, vestir-se lavar-se e pentear-se. Em
alguns casos a educadora dá uma pequena ajuda, faz antecipadamente para que a criança
perceba o que deve fazer, quando não é possível que a criança faça sozinha a educadora
ajuda verbalizando todos os passos da acção.

Todas as educadoras acharam peremptório a criança autista relacionar-se dentro da


sala de jardim com outras crianças ditas normais, acima de tudo porque o autista pode
copiar atitudes, comportamentos idênticos às crianças que não têm qualquer tipo de
problemas, pois as outras crianças servem-lhe de modelos de comportamento social,
moral etc..

A maior dos pais colabora com a educadora para que se favoreça um


desenvolvimento mais eficaz destas crianças. Existem pais que relatam à educadora
certos actos de autonomia que conseguiram trabalhar em casa com os filhos, no entanto,
alguns pais contrariam todo o processo levado a cabo pela educadora fazendo muitas
vezes com que a criança regrida, por exemplo, uma menina que já fazia certos
movimentos, tal como levar a colher à boca quando comia iogurte, quando regressou de
férias de natal já não conseguia elaborar essa acção porque a mãe não se preocupou em
dar continuidade ao que se fez no jardim de infância.

Todas as Educadoras demonstraram ter uma atenção mais pormenorizada e


individualizada, sempre que possível com estas crianças, para que consigam contribuir
com um apoio assertório na evolução das mesmas. Apoiando –as com muita paciência e
respeitando as dificuldades que cada uma tem. Também se notou uma preocupação
acrescida no que respeita á comunicação com estas crianças, no sentido de integrarem a
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

criança autista no grupo, na sala com as outras crianças não autistas, o de a relacionarem
com os adultos da Instituição. E é verificado, na maior parte dos casos, intercâmbio de
informação entre a Educadora e os pais da criança autista para que a comunicação se dê
de um modo mais eficaz.

Conclusão

O autismo manifesta-se simultaneamente em três domínios variando a


gravidade e as características de indivíduo para indivíduo. Os domínios são:
dificuldade na interacção, ou seja, tendência para o isolamento, défice na
partilha e nas expressões de emoções, no contacto ocular e relação com o
outro; limitação na comunicação verbal e não verbal, ou seja, ausência ou
perturbação de linguagem, utilização estereotipada ou repetitiva da linguagem,
falta de jogo simbólico ou gestos interactivos; restrição de interesse e
actividades, ou seja, tendência para a repetição de certas actividades e rotinas,
tolerando mal a mudança.

Concluímos que não há cura para o autismo mas têm-se feito progressos
na investigação e aplicação de medidas de prevenção para quem sofre desta
patologia. Cada vez mais o diagnóstico e intervenção precoce assumem uma
importância primordial na evolução e integração dos autistas na sociedade civil.

Em contexto de jardim de infância a educadora tem um papel fundamental


na educação da criança autista, pois cada vez mais se verifica que as
_______________________________Como o educador comunica com a criança autista

educadoras que lidam com este tipo de crianças tentam manter-se informadas
e cultivadas sobre espectro do autismo.

Devido a este tipo de crianças terem um défice na sua interacção social,


estão muito ligadas à educadora e manifestam-se negativamente sempre que
há um elemento novo, por isso o papel da educadora é muito importante na
evolução e no dia a dia da criança autista.

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