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Artigo Original

Imagem corporal nos transtornos


alimentares
Body Image in Eating Disorders

CAROLINA JABUR SAIKALI1 Resumo


CAMILA SALIBA SOUBHIA1 Os autores fazem uma breve revisão da imagem corporal nos transtornos
BIANCA MESSINA S CALFARO1 alimentares.
TÁKI ATHANÁSSIOS CORDÁS1
Palavras-chave: Imagem corporal, transtornos alimentares.

Abstract
The authors present a brief review of body image in eating disorders.

Keywords: Body image, eating disorders.

Introdução • Subjetivo, que envolve aspectos como satisfação


com a aparência, o nível de preocupação e ansie-
Para Schilder (1994), a imagem corporal é a figura de dade a ela associada;
nosso próprio corpo que formamos em nossa mente, ou • Comportamental, que focaliza as situações
seja, o modo pelo qual o corpo se nos apresenta. evitadas pelo indivíduo por experimentar descon-
Segundo Thompson (1996), o conceito de imagem forto associado à aparência corporal.
corporal envolve três componentes: Para McNamara (2002), crenças culturais
• Perceptivo, que se relaciona com a precisão da determinam normas sociais na relação com o corpo
percepção da própria aparência física, envolvendo humano. Práticas de embelezamento, manipulação e
uma estimativa do tamanho corporal e do peso; mutilação, fazem do corpo um terreno de significados

Recebido: 02/09/2004 - Aceito: 15/09/2004


1 Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital
das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). São Paulo. SP.
Brasil.
Endereço para correspondência: AMBULIM – Rua Dr. Ovideo Pires de Campos, 785 – 2º andar
– 05403-010 – São Paulo – SP – e-mail: ambulim@hcnet.usp.br – Fone: (11) 3069-6975.

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simbólicos. Mudanças artificiais em seu formato do Distorção da imagem corporal na anorexia


corpo, tamanho e aparência são comuns em todas as
sociedades e têm uma importante função social. Elas nervosa e bulimia nervosa
comunicam a informação sobre a posição social do
A anorexia nervosa e a bulimia nervosa são transtor-
indivíduo e, muitas vezes, demonstram um sinal de
nos alimentares caracterizados por um padrão de
mudança em seu status social.
comportamento alimentar gravemente perturbado, um
De acordo com Adams (1977), percebe-se que o
controle patológico do peso corporal e por distúrbios da
mundo social, claramente, discrimina os indivíduos não-
percepção do formato corporal. Está presente, na
atraentes, numa série de situações cotidianas impor-
anorexia nervosa, um inexplicável medo de ganhar peso
tantes. Pessoas julgadas pelos padrões vigentes como
ou de tornar-se obeso, mesmo estando abaixo do peso,
atraentes parecem receber mais suporte e encorajamento
ou mais intensamente, uma supervalorização da forma
no desenvolvimento de repertórios cognitivos socialmente
corporal como um todo ou de suas partes, classicamente
seguros e competentes, assim, indivíduos tidos como não-
descrito como distorção da imagem corporal.
atraentes, estão mais sujeitos a encontrar ambientes
Russell (2002) descreveu a bulimia nervosa como
sociais que variam do não-responsivo ao rejeitador e que
uma urgência poderosa e irresistível de comer demais,
desencorajam o desenvolvimento de habilidades sociais
comportamentos compensatórios conseqüentes, tais
e de um autoconceito favorável.
como vômitos, uso inadequado de laxantes e diuréticos
Segundo Stice (2002), sociólogos têm proposto dois
e exercícios físicos abusivos acompanhados de um
processos que promovem atitudes e comportamentos:
medo mórbido de tornar-se obeso.
reforço social e a modelagem. O reforço social refere-se
Bruch (1962) desenvolveu a primeira teoria
ao processo por meio do qual pessoas internalizam
sistemática a respeito de problemas de imagem corporal
atitudes e comportam-se mediante aprovação dos outros.
nos transtornos alimentares, sendo que esta distorção
Como exemplo, um adolescente pode querer seguir uma
da imagem corporal é um dos três fatores necessários ao
dieta caso perceba que a mídia glorifica o corpo esbelto
desenvolvimento da anorexia. Mais ainda, afirma que
e magro e critica as pessoas com excesso de peso.
este era o aspecto mais importante do transtorno e
A modelagem refere-se ao processo em que o
também notou que a melhora dos sintomas da anorexia
individuo observa comportamentos de outros e os imi-
poderia ser temporária se não houvesse uma mudança
ta. A sociedade pode ser um modelo de preocupações
corretiva na imagem corporal.
com as medidas corporais, dietas excessivas,
De acordo com Bruch (1962), mais alarmante do
comportamentos não-saudáveis de controle de peso e,
que a má nutrição em si na anorexia nervosa é sua
em última análise, compulsões alimentares.
associação com a distorção da imagem corporal que,
entre outros fatores, apresenta-se como uma ausência
Influências da mídia na insatisfação e de preocupação com a magreza, mesmo quando esta
distúrbios da imagem corporal já está em um estágio bem avançado.
Conclui Bruch (1973) que, nesta distorção, incluem-
Para Stice (2002), existem evidências que dão suporte se os seguintes distúrbios: da consciência cognitiva do
de que a mídia promove distúrbios da imagem corporal próprio corpo, consciência das sensações corporais, senso
e alimentar. Análises têm estabelecido que modelos, de controle sobre as funções corporais e razões afetivas
atrizes e outros ícones femininos vêm se tornando mais para a realidade da configuração corporal.
magras ao longo das décadas. Indivíduos com trans- Segundo Cash e Deagle (1997), o distúrbio da
tornos alimentares sentem-se pressionados em demasia imagem corporal é um sintoma nuclear dos transtornos
pela mídia para serem magros e reportam terem apren- alimentares, caracterizado por uma auto-avaliação dos
dido técnicas não-saudáveis de controle de peso (indução indivíduos que sofrem desse transtorno, influenciada
de vômitos, exercícios físicos rigorosos, dietas drásticas) pela experiência com seu peso e forma corporal.
através desse veículo. Distorções cognitivas relacionadas à avaliação do
Em estudo realizado nas ilhas Fiji, Becker et al. corpo, comuns em indivíduos com transtornos
(2002) avaliou o impacto da exposição das adolescentes alimentares, incluem: pensamento dicotômico – o
à televisão e conseqüentes atitudes e comportamentos indivíduo pensa em extremos com relação à sua
alimentares desses indivíduos. O estudo foi dividido aparência ou é muito crítico em relação a ela;
em duas etapas, a primeira em 1995 e a segunda em comparação injusta – quando o indivíduo compara sua
1998, já com três anos de exposição à televisão. Os aparência com padrões extremos; atenção seletiva –
resultados mostraram que os indicadores de focaliza um aspecto da aparência e erro cognitivo, o
transtorno alimentar foram significantemente mais indivíduo acredita que os outros pensam como ele em
prevalentes após 1998, demonstrando também maior relação à sua aparência.
interesse em perda de peso, sugerindo um impacto Dentre os vários instrumentos para avaliação da
negativo da mídia. imagem corporal, um dos mais utilizados é o Body Shape

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Questionnaire (BSQ), de amplo uso em estudos com popu- psiquiátricos como transtorno dismórfico corporal, delírios
lações clínicas e não-clínicas (Cooper et al., 1987). somáticos, transexualismo, depressão, esquizofrenia e
Embora uma insatisfação ou distorção da imagem obesidade, é nos transtornos alimentares que seu papel
corporal possa estar presente em outros quadros sintomatológico e prognóstico é mais relevante.

Referências bibliográficas

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