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Mônica Mourai
Design e/é Arte.
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Este texto já foi discutido/ apresentado em minha tese de doutorado e agora é
apresentado de forma ampliada como resultado de minhas pesquisas e da vivência no
campo do ensino em design.
a abertura de horizontes. Especialmente nestes tempos pós-modernos ou hiper-
modernos, como defende Lipovetsky (2005).
Vamos nos remeter a alguns importantes autores que trazem esta discussão a tona
e evidenciam as relações entre arte e design.
Segundo o filósofo Vilém Flusser (1999) o design e a arte são derivados da arte e
da ciência e este “cruzamento fertilizado” leva a complementação criativa destas
duas áreas.
Enquanto o designer Bruno Munari (1993), no final dos anos de 1980, relacionava
tanto a arte quanto o design como ofícios. Neste sentido, acreditava que o design
deveria ser remetido à idéia de arte, onde o designer restabelecia o contato entre a
arte e o público, entre a arte viva, e o seu destinatário/observador/usuário. Uma
arte integrada a vida, rompendo com a separação de coisas belas para admirar (por
exemplo: uma pintura) e coisas feias (por exemplo: um eletrodoméstico) para
utilizar. Podemos perceber que para Munari a arte e a estética são importantes e
devem estar presentes nos objetos e produtos de design. Não é a arte destinada a
contemplação pura, a fruição estética e sim a arte para o cotidiano, para o uso nos
atos da vida, onde produtos são desenvolvidos com finalidades específicas e geram
prazer na utilização, povoando o nosso universo material, distantes e além do
supérfluo (que Munari denomina de acaso ou capricho).
O arquiteto e crítico de arte Giulio Carlo Argan (2000) também se refere aos
designers como artistas com conhecimento da esfera produtiva que atuam em
equipe e lidam com produções de caráter cíclico. Para Argan, a arte está no design
desde a tarefa criativa até a determinação de um ritmo estético e econômico dos
atos da vida cotidiana. “É a redução da arte a uma socialidade plena e integrada,
funcional e não hierárquica; e simultaneamente o modo de restituir um sentido e
uma alegria criativa a um fazer que o moralismo tradicional considerava condenação
e pena, porque através da propriedade estética do desenho industrial um valor de
conhecimento ou de experiência do real é positivamente religado aos atos práticos
do trabalho de cada dia” (Argan: 2000, 122 e 123).
Temos nos dois autores tratados acima a questão da arte presente no design não
apenas no ato de criação, mas uma arte destinada a sociedade, na construção da
cultura material de uma sociedade em uma determinada época.
Gillo Dorfles (1998), em seu texto As oscilações do gosto, trata o design como um
campo que dialoga com a arte especialmente pela questão do valor estético e
compara o design a um ‘tipo de arte popular’ pois acredita que o objeto criado em
série equivale a alguns objetos artesanais.
Podemos, assim, perceber que a relação arte e design é explicada por vários autores
a partir de comparações entre o papel do artista e o do designer, bem como com o
papel e a função da arte e do design. Onde o designer é visto como um profissional
que associa arte, técnica, tecnologia, planejamento e conhecimento para as esferas
culturais e produtivas.
Estas questões são polêmicas no meio do design profissional, tanto que percebemos
que muitos autores não as enfrentam profundamente. No máximo, as discussões a
este respeito, quando aceitas, resumem-se a pequenas comparações, chegando-se
ao absurdo de estabelecer que a maioria dos profissionais não têm condições de
dominar a matéria desta discussão. Então a saída mais simples e prática é dizer que
design não é arte e ponto final.
Agnaldo Farias (1999) em seu texto Design é Arte? publicado na revista da ADG
(Associação dos Designers Gráficos/Brasil) exemplifica muito bem esta relação
dizendo que este fato ocorre devido a sedimentação do “mito da objetividade” e das
poéticas racionalistas que atravessam “a arquitetura e artes gráficas como o sol por
uma vidraça...”. E continua sua argumentação dizendo que esta atitude
sedimentada e estabelecida nega a discussão e a abertura para novas posições
estéticas. Ao se estabelecer uma análise mais profunda, sem ranços tradicionalistas,
podemos perceber que o design gráfico contemporâneo se abre a experimentações
de toda a natureza, em poéticas densas e ruidosas.
Farias nos remete aos trabalhos de dois designers brasileiros: Rico Lins e Gringo
Cárdia e também aos internacionais: Tibor Calman e David Carson que são
profissionais de grande relevância no campo do design, mas que estabelecem uma
relação evidente de seus trabalhos com as artes visuais. Também aqui a relação com
as artes, “chamando a atenção às propostas que, a despeito do imperativo de
legibilidade tão cara aos racionalistas, rondavam perigosamente a incompreensão, o
que não as impedia de serem absorvidas e mesmo estimuladas pelo mercado”
(Farias: 1999, 27-28).
Como vimos, o design estabelece relações com a arte ora mais distantes e ora
próximas, mas a discussão nesta área profissional sempre remete ao fato de que na
contemporaneidade, apesar do design pertencer à esfera produtiva ainda guarda
relação e interface com a arte (vide Villas Boas: 1998).
Retornamos a Agnaldo Farias, que nos lembra que, tendo em vista o avanço da
produção cultural, cada área do conhecimento humano deve ser aberta a debates, e
exemplifica: “retomam-se exposições de design gráfico porque é anacrônico
prosseguir mantendo a oposição entre arte e design, pois um produto resultante de
um projeto de design, tal como um logotipo, pode ter a mesma força de um haikai;
não tem fundamento estabelecer que aquilo que se destina ao mercado e a uma
empresa deva ser rigidamente separado do que é produzido artisticamente, fosse
assim a capela Sistina não deveria ter a importância que tem por ter sido
encomendada pela Igreja” (Farias: 1999, 29).
Ainda, segundo este autor, arte “(...) não é uma questão de assunto, mas de
tratamento formal de um determinado assunto. Ademais, desde que Marcel
Duchamp realizou o primeiro ready-made, ficou patente que um dos aspectos
basilares da produção artística era o questionamento de suas fronteiras. Vale dizer
que muito do que hoje se faz em nome da arte é contra as compreensões correntes
do que seja arte. Vai daí que discutir se design gráfico é arte ou não é perder-se em
uma falsa questão. Discute-se a pertinência de um rótulo e, em contrapartida,
perde-se de vista a densidade da dimensão estética de um determinado produto,
uma dimensão que jamais poderá ser reduzida às demandas funcionais, sob pena de
perder seu interesse no âmbito da cultura” (Farias: 1999, 29).
Podemos afirmar, então, que o design tem uma estreita relação com a tecnologia,
sendo esta, um dos pilares do design e podemos dizer o mesmo com relação à arte.
Não há como se desenvolver um projeto sem a tecnologia, e também sem os
procedimentos de criação, invenção e de inovação que advém da arte. Mas, é
importante lembrar, que um projeto não é apenas e tão-somente a tecnologia, ou
puro tecnicismo e nem tão somente pura arte contemplativa ou vivencial (como as
instalações e sites specifics da arte contemporânea). É a integração da tecnologia e
da arte que dão sustentação aos aspectos culturais, estéticos, funcionais e de
linguagem do projeto que serão refletidas no produto que foi desenvolvido.
Sem o projeto não há como o design estabelecer uma relação com a tecnologia e
com a arte, a não ser como um exercício aleatório repleto de puro tecnicismo ou do
livre fazer criativo. Por conseqüência, a tecnologia; que é de suma importância, pois
todo o projeto para se materializar, para tomar forma necessita do emprego da
tecnologia; estabelece estreita relação com o design, mas não o define
completamente. A tecnologia, assim como a arte, estabelece relações com o campo
do design e sempre estas áreas são encontradas no universo e nas definições do
design. Flusser nos lembra que a palavra grega “techne significa ‘arte’ e está
relacionada a tekton, um ‘carpinteiro’. A idéia básica aqui é que a madeira (hyle em
grego) é um material sem forma ao qual o artista, o técnico, dá a forma, fazendo
com que ela apareça em primeiro lugar. A objeção básica de Platão à arte e à
tecnologia era que elas traíam e distorciam formas teoricamente inteligíveis (‘Idéias’)
quando transferiam isso para dentro do mundo material” (Flusser: 1999, 17).
Podemos observar que há certas palavras e definições que sempre estão presentes
na pesquisa de uma definição de design. Flusser diz que esta situação se deve ao
fato de estas palavras estarem ligadas a este campo e também ligadas umas às
outras, configurando um campo comum de conhecimentos e de ações.
“As palavras design, máquina, tecnologia e arte estão relacionadas uma com as
outras, um termo é impensável sem os outros, e todos eles derivam da mesma visão
existencial do mundo. Entretanto, essa ligação interna tem sido negada por séculos
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Carta a um jovem designer
(pelo menos desde a Renascença). A cultura burguesa moderna fez uma divisão
entre o mundo das artes e o da tecnologia e máquinas; assim a cultura dividiu-se
em dois ramos exclusivos: um científico, quantificável e ‘duro’, o outro estético,
avaliável e ‘flexível’. Essa divisão infeliz começou a tornar-se irreversível no final do
século dezenove. Na lacuna, a palavra design formou uma ponte entre os dois. Ela
pôde fazer isso porque expressa a ligação interna entre arte e tecnologia” (Flusser:
1999, 17).
O design é o campo, a área por excelência que surge e atua a partir da relação com
a tecnologia. Devemos lembrar que foram as mudanças que ocorreram no processo
de industrialização que incentivaram as mudanças tecnológicas no momento em o
design foi impulsionado e desenvolvido, sendo apontado também como o momento
de seu surgimento por muitos autores. Giulio Carlo Argan, em um artigo de sua
autoria, escrito em 1961 e publicado em 2000, diz que: “O homem moderno, o
homem das grandes cidades, não identifica seu ambiente com a natureza, mas com
o mundo das coisas artificiais, feitas pelo homem para o homem mediante uma
tecnologia da qual sente orgulho como de uma criação própria: ele quer, portanto,
inserir o objeto no contexto de um mundo não natural, mas social” (Argan: 2000,
127).
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O ICSID – International Council of Societies of Industrial Design foi fundado em 1957 e seu
primeiro congresso ocorreu em 1959, em Estocolmo. O ICSID mantém suas atividades até os
dias atuais.
determinantes no campo do design, consideradas também um saber e fazendo parte
de um conjunto de conhecimentos que o profissional desta área deve ter.
Atualmente, o ICSID assim define o design: “o design é uma atividade criativa cujo
alvo é o de estabelecer as qualidades multifacetadas dos objetos, dos processos, dos
serviços e dos seus sistemas de vida em ciclos completos. Conseqüentemente, o
design é o fator central da humanização e da inovação das tecnologias e o fator
crucial da troca cultural e econômica” (texto ICSID, site ICSID, 2003).
"O projeto gráfico é uma atividade intelectual, técnica e criativa, relacionada não
simplesmente com a produção das imagens, mas com a análise, a organização e os
métodos da apresentação de soluções visuais para problemas de comunicação. A
informação e a comunicação são a base da vida interdependente da rede mundial,
seja nas esferas comerciais, culturais ou as sociais” (site ICOGRADA, 2003).
Este texto não tem como propósito apresentar conclusões definitivas, mas sim de
apontar temáticas presentes no universo do design como questões a serem
ampliadas, desenvolvidas, discutidas. Questões que devem ser analisadas,
observadas através das interfaces que estas áreas – design, arte e tecnologia
estabelecem, modificam e constroem o design contemporâneo. Fica aqui o convite
para a análise da arte e da tecnologia e suas conseqüências para a cultura e para a
sociedade contemporânea por meio da vivência do design.
Referências Bibliográficas
__________. O Desenho Industrial. História da Arte, Tomo 10, São Paulo: Salvat
Editora, 1978, pp. 101 -127.
ESCOREL, Ana Luisa. O Efeito Multiplicador do Design. São Paulo: Senac, 2000.
FLUSSER, Vilém. The Shape of Things: A Philosophy of Design. Londres,
Reaktion Books, 1999.
LIPOVETSKY, Gilles. Os Tempos Hipermodernos. São Paulo: Barcarolla, 2005.
MALDONADO, Tomás. El Diseño Industrial Reconsiderado. México: Gustavo Gili,
1993.
MUNARI, Bruno. A Arte como Ofício. Lisboa: Editorial Presença, 1993.
_________. Das Coisas Nascem as Coisas. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
Periódicos e Revistas
ARGAN, Giulio Carlo. A História na Metodologia do Projeto In: Caramelo, n.6, SP,
FAU/USP, 1992, pp.157-170.
BOMFIM, Gustavo Amarante. A Morfologia dos Objetos de Uso: Uma
Contribuição para o Desenvolvimento de uma Teoria do Design. In: Anais do
P&D Estudos em Design, v.1, RJ, Aend-BR, 1996, Teoria & Design pp.27-41.
FARIAS, Agnaldo. Design é Arte? In: Revista da ADG, n. 18, SP, ADG, 1999, pp.
25-29.
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Mônica Moura é doutora em comunicação e semiótica com tese sobre
design de hipermídia, bacharel e licenciada em artes com atuação
profissional em design, ensino e pesquisa. Atua como coordenadora,
pesquisadora e professora na área de design e no grupo de pesquisa
design: criação e novas mídias da Universidade Anhembi Morumbi.