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TOMO LX
Livro V
3PRIVADO
DIREITO DAS SUCESSÕES
TÍTULO III
SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
CAPÍTULO XXVIII
TESTAMENTEIRO
§ 5.953. Capacidade dos testamenteiros. 1. Pressupostos subjetivos. 2.Capacidade e momento em que se apura. 3.
Capacidade para ser testamenteiro. 4. Designação deixada a outrem. 5.Capacidade dos funcionários de Justiça. 6.
Escritor do testamento, seu cônjuge e parentes. 7. Testamenteiro testemunha no testamento. 8. Testamenteiro
concubina ou amante do testador. 9. Tabelião e Testamentária. 10. Falido testamenteiro. 11. Legado ao incapaz
nomeado testamenteiro.
§ 5.960.Testamenteiro sem posse direta. 1. Precisões. 2. Meios de cumprir. 3. Nomeação de bens à execução. 4.
Transmissão hereditária da posse. 5. Entrega da posse ao testamenteiro. 6.Testamenteiro quando tem a posse e
administração. 7.Mortes próximas dos cônjuges ou do testador e do herdeiro necessário. 8. Se o testador distribui
toda a herança em legados. 9. Destituição ou remoção de inventariante e cargo da testamentária
§ 5.964.Despesas feitas pelo testamenteiro. 1. Texto legal. 2. Elaboração. 3. Direito anterior. 4. Direito estrangeiro.
5. Despesas a que se refere a regra jurídica. 6. Por conta de quem correm as despesas com as prestações de contas.
7. O que se deve excluir no cômputo das despesas. 8. Natureza da petição. 9. Exigências para serem julgadas
prestadas as contas. 10. Município, Estado-membro ou União herdeira ou legatária. 11. Obrigação de contas “in
rebus minimis”. 12.Disposições secretas. 13. Correições e contas dos testamenteiros
§ 5.974. Reversão do prêmio à herança. 1. Texto legal. 2. Elaboração. 3. Direito anterior. 4. Quando o
testamenteiro perde o premso
§ 5.978.Prestação de contes dos testamenteiros. 1. Cautelas da prestação de contas. 2. Quando se tomam as contas
dos testamenteiros
TÍTULO IV
INVENTÁRIO E PARTILHA
CAPÍTULO 1
INVENTÁRIO
§ 5.983.Questões de direito e questões de fato. 1. Questões de fato e questões de direito; questões de alta
indagação. 2. Regra jurídica, incidência e aplicação. 3. Questões de fato fundadas em provas documentais
inequívocas. 4. Valor da prova documental. 5. Regra jurídica de competência eventual.
§ 5.984.Prazo para a abertura do inventário. 1. Inicio do processo de inventário e partilha. 2. Prazo para a
terminação do processo e prorrogação. 3. “Dies a quo” e críticas sem razão
§ 5.987.Descrição dos bens. 1. Texto legal 2. Requisitos da descrição. 3. Relação geral dos bens. Descrição dos
bens alheios
CAPITULO II
PARTILHA
§ 5.990.Partilha amigável. 1. Texto legal. 2. Conceito e conteúdo. 3.Espécies de partilha amigável. 4. Incapazes e
partilha.
§ 5.991. Partilha judicial. 1. Texto legal. 2. Natureza da partilha judicial
§ 5.992.Princípio de igualdade. 1. Texto legal. 2. Princípio da maior igualdade possível. 3. Equidade romana. 4.
Princípio de igualdade quanto ao valor. 5. Comodidade dos herdeiros. 6.Venda para pagamentos
§ 5.993.Partilha em vida do decujo. 1. Texto legal. 2. Partilha feita pelo ascendente. 3. Necessidade do inventário.
4. Auto-regramento da vontade. 5. Regra jurídica especial. 6. Negócio jurídico da partilha em vida. 7. Partilha em
vida dos bens da herança. 8. Forma judicial se há herdeiros necessários incapazes. 9. Partilha e distribuição de
doações.
§ 5.994.Venda em hasta pública de bens da herança. 1.Texto legal.2.Bens não suscetíveis de divisão cômoda.
3.Reposição.4.Licitação. 5. Indivisibilidade, pressuposto da licitação.6.Legitimados à licitação. 7. Adjudicação.8.
Conteúdo da regra jurídica. 9. Se há herdeiros incapazes
§ 5.955. Frutos da herança. 1. Texto legal. 2. Descrição e entrega dos frutos
§ 5.966.Bens remotos, ou litigiosos, ou de liquidação morosa ou difícil. 1.Texto legal. 2. Sobrepartilha. 3.
Inventariante e sobre- partilha. 4. Natureza da sobrepartilha. 5. Bens litigiosos. 6.Bens de liquidação morosa ou
difícil
§ 5.997. Bens da herança sonegados e bens descobertos após a partilha. 1.Bens sonegados. 2. Bens descobertos
após a partilha. 3.Maioria que delibera. 4. Inventariança
CAPITULO III
SONEGADOS
§ 5.998.Conceito e natureza da sonegação. 1. Conceito. 2. Texto legal. 3. Interpretação do texto legal. 4. Cônjuge
sobrevivo e sonegação. 5. Distribuição de bens em vida do decujo. 6. Partilha em vida. 7. Herdeiros do sonegador
§5.999. Herdeiro e inventariante. 1. Texto legal. 2. Dualidade de penas
§ 6.000.Ação de sonegação. 1. Texto legal. 2. Eficácia da sentença proferida na ação de sonegação. 3. Cônjuge
meeiro ou com parte em algum bem comum. 4. Tributos e sonegação.
§ 6.001.Restituição e prestação do valor. 1. Texto legal. 2. Indenização
§ 6.002.Tempo para a arguição. 1. Texto legal. 2.Momento inicial para a argúição
CAPITULO IV
§ 6.008.Espécies de dividas. 1. Espécies de dívidas e obrigações do testador, ou do decujo, também com herdeiros
legítimos, ou só herdeiros legítimos. 2. Gestões de negócios e administrações. 8. Herança e penas pecuniárias. 4.
Custas, tributos fiscais e despesas processuais. 5. Despesas funerárias. 6.Pagamento de impôsto. 7. Bens doados e
responsabilidade por dívidas. 8. Despesas que tem de ser pagas
§ 6.009.Despesas funerárias e de sufrágio. 1. Conceitos. 2. Despesas funerárias. 3. Sufrágios por alma do finado. .
§ 6.010.Habilitação dos credores. 1. Apresentação ao inventário. 2. Legitimação dos credores. 8. Prova das
dividas. 4. Proporcionalidade e momento da distribuição
§ 6.011.Habilitação dos credores. 1. Habilitação. 2. Procedimento. 3.Eficácia da habilitação. 4. Venda de bens
para pagamento
§ 6.012. Reserva de bens da herança para pagamento. 1. Conceito. 2.Texto legal. 3. Pressupostos da reserva. 4.
Bens e reserva. 5. Cobrança e reserva. 6. Prazo para a propositura da ação. 7. Eficácia da reserva. 8. Cessação da
reserva. 9. Irrecorribilidade. 10. Ação dos credores....
§ 6.013.Discriminação dos bens da herança e dos bens do herdeiro. 1.Precisões. 2. Legitimação dos credores da
herança. 3. Legitimação dos legatários
§ 6.014.Ação regressiva do herdeiro que paga divida. 1. Pagamento de dívida da herança. 2. Exclusão da ação
regressiva. 3.Texto legal. 4. Dívidas do herdeiro
CAPITULO V
CAPITULO VI
Título IV
TESTAMENTEIRO
1.INSTITUTO DA TESTAMENTÂRIA. - erro crer-se que o testamento, onde existe, veio, em linha reta, ou
sempre, do direito romano (1-1. SUMNER MAINE, L’A’ncien Drdt, 187). A evolução jurídica não é privilégio de
povo nenhum. Também poderíamos dizer que o direito grego incentivou a marcha, nesse sentido, do próprio
direito romano (E. LAMBERT, La Fonction du Droit civil com paré, 1, 462). Não é impossível que se tenha dado
o mesmo que entre o direito romano, o judaico e o muçulmano.
Mas o instituto da testamentátria não no tinha o direito romano, ponto este assaz importante, não só para a
interpretação como para se expurgar de falsas noções a doutrina, elaborada, inscientemente, em tôrno da função
testamentária. Nascida na vida jurídica germânica, contra o querer dos herdeiros legítimos, como imediata
incumbência e missão da confiança do testador (GEORG BESELER, Die Lehre von den Erbvertràgen, 1, § 148;
H. BIIUNNER, Deutsche Rechtsgesohichtc, 1, § 56; E’. RICHTER, Privatreúhtliohe Ver fi4jungsmacht des
Testq.mentsvoltgtrecker naciz dem Reckte des deutschen MiLtelalters, 1 sj, a sua fonte é o Salmann, o Treuhãnder,
e a sua lei mais remota, a Lex Scilica, Título 46.
Há institutos, cuja formação necessária nitidamente se ve. Parecem sair das coisas, dos fatos. A concorrência de
certas circunstâncias faz exsurgir as figuras, com os traços principais. A Testamentária é um desses. Ao chegar a
certo ponto.
a sucessão, êle aparece; com a liberdade de testar, adapta-se às novas situações da ambiência jurídica. A doutrina e
as exigências do raciocínio jurídico aproveitam o instituto para esse lapso de existencia dos bens entre a morte e a
efetiva entrega aos beneficiados pelo testamento. Especulação filosófica, interesses e concepções da Igreja, direito
próprio (nas origens, propriedade) de elemento histórico, associam-se, às vêzes com fundo puramente egoísta;
mas a vida subordina-os, em correnteza, à sua ordem e aos seus fins.
O testamenteiro, executor ultimue voluntatis ou executor testamentarius, tem de executar a vontade do testador ou
adimplir o que lhe incumbe. Executores testamentorum na função que lhes toca, “testatoris voluntatem exequi seu
adimplere debent”, mais se parecem com fideicomissários, e de modo nenhum são negotiorum gestores ou
procuratores. Se o fossem, com a morte estaria extinta a procura, e GUOL. DURANDUS (Speculum indiciale, II,
n. ff7) frisou-o em 1566. Têm olficium et cura (cf. JOANNIS ANLREAE, In tertium Decretalium librum noveila
commentarta, n. 5; HENRIQUE CARDEAL HOSTIENSE, In tertium Decretalium tibrum Commentaria, n. 8).
Nos lugares em que se proibia a aquisição testamentária, logo se insinuou a fraude, com a intermediariedade.
Exemplos, na Idade Média, em Norimberga, Hamburgo e Lubeca, na Inglaterra e na Itália (A. HEUSLER,
Institutionen des deutschen. Frivatreehts, 1, 223; FRIEDRIC POLLOÇK and FRIEDRIO WILLIAM
MAITLAND, History of English Law, II, 231 e 237). Com o testamento, em cuja matéria é legítima a invocação
das lições romanas, a execução testamentária, em que aquelas lições não existem, passará de autônoma a posterior,
e mal lembrará o proprietário interimário que foi, nos primórdios, o executor.
4.“TIIEÚHÂND”, “SALMANN”, “AFFATOMIA”, “GAIRETHINX”. ~ evidente, hoje, que o instituto da
Treuhand ou Sal>nann, correspondente à Affatomia franca e ao Gairethinx longobardo, prestou grandes serviços
às últimas vontades. Nos tempos sem testamento por volta do século XII havia as doações pro anima, a traditio
cartae, reconhecida, como super altare, pela Igreja.
Se bem que frutos da mesma árvore, as Testamentárias não são as mesmas na Alemanha, na Inglaterra e no Brasil.
Otrust, a Trustee Com pany, do direito inglês, não tem outra fonte (FRIEDRIC WILLIÀM MAITLAND, Trust und
Corporation, em GRÚNHUT, Zeitsehrift /14 das Privat- uM 6ff entliche Reeht, 32, 1 s.; HOLMES, Executors in
earlier English Law, Select Essays in Anglo-A merican Legal History, III, 737 sã também o testamenteiro, no
Brasil. A diferença, hoje, é grande entre o do direito inglês e o do continente europeu (Ii. CAILLF.MER, The
Executor in England and on the Continent, Seleet Essa ys, 746 são, a que o testamenteiro brasileiro se filia.
Além das doações pro anima, havia-as pro sepultura, em que o titular da fidúcia, o TreuhÉinder, “eleemosinarius”,
se incumbia do singular encargo. As suas funções cresciam, precisavam-se, e os testamenteiros, antes de haver
testamento, exerciam o seu papel tocante e fiel. A Idade Média, desde e século XII, está cheia de Salmannen,
Seelgeráter, testameneleemosinarji waditarli,aril, fidelussores, spondarii, fideicommissarii, que persistem, ainda
mais vivos do que alhures, na Inglaterra dos trustee. A fatia é bem menor nos outros povos; menos característica, a
sobrevivência no Código Civil, porém não menos inabluíveis os traços fundamentais.
Na cegueira pragmatista das fórmulas e dos atos de cartório, não se percebem os princípios jurídicos; mas eles lã
estão, vivos, indesbotáveis, no ato do contador que adjudica os bens, talvez imóveis, ao testamenteiro, e na
faculdade com que este vai a registo, ou com o dinheiro adquire imóveis, para cumprimento de legados.
Mas há particularidades tocantes: a nomeação de incapazes não é nula, durante a incapacidade funciona o
representante do incapaz (administratio durante minore etate, a. durante absentia, a. for the use and benefit of the
lunatic).
No caso de falta, intervém um cessate grant.
Havendo, como há, liberdade de testar, compreende-se que todos os herdeiros possam ser testamenteiros.
Podem ser muitos, em comum (WILLIAMS, Personal Property, 16a ed., 445).
As sociedades e as outras pessoas jurídicas podem ser nomeadas, inclusive a Igreja, o Município. A company, por
um síndico. As outras, pelo representante legal (TRISTRAM and COo’rE, Probate Praxis, V, 17; ERNST
SCHUSTER, Biirgerliche Rechtspflege in England, 246; MARTIN LIEBEGOTT, Nachlassbehandlung im
englischen Recht, Archiv fúr Riirgerliches Recht, 38, 360).
Aceita, ou não aceita. Se aceita, fá-lo expressa, ou tácitamente, por atos de administração, ou pela não recusa
dentro de prazo (ERNST SCHUSTER, Bitrgerliche Rechtspflege iv. England, 248) - Tem de registar a cédula
(principal registry ou district registru).
2. NECESSIDADE DO MÉTODO.
Apurar a verdadeira origem do cargo de testamenteiro é mais valioso do que, no vulgar, se crê. Sabendo, evita-se
falar em mandato, em representação dos herdeiros ou da herança, e que quantas impropriedades, com que se não
compadece a lição histórica. Quando o Projeto alemão falou em representante legal do herdeiro (§ 1.903), todos
sabemos quais as criticas que irromperam na II Comissão e no Congresso dos juristas alemães. Daí a
compreensível irritação de ALFRED SCULTZE (Treuhãnder im geltendeu irgerliChen Recht, fherings
Jahrbiicher, 43, 65), contra COLDFELIJ (Vortrag, fleutsúhe Juristen-Zeitflng, 1, 256), J. PETERSEN-E. ANGER
(Pie CiViiprOZess Qdnuflg, 4a ed., §~ 50 s.), BRETTNER e todos os outros que insistiram nas errôneas de
mandato e de representração.
Diz-nos a história que a execução testamentária surgiu, cresceu, ganhou em precisão exatamente contra a vontade
e o interesse dos herdeiros. primeira consequência é absurdo falar-se de representação ou de mandato deles.
Como bem frisou GUSTAV HARTMANN, no 21.0 Congresso dos juristas Alemães, a Testamentária contradiz a
essência da representação Verhtindl., 1, 8 s.). Ainda hoje, constitui um dos fins precípuos do testamento tal
vigilância, por vêzes compressão dos interesses dos herdeiros, quiçá necessários (artigo 1.728), pela vontade do
testador.
Mais ainda: cabem ao testamenteiro funções, que o herdeiro não poderia exercer por si, menos ainda delegá-las ou
fazer-se nelas representar. Poderá exercê-las quando, cabeça--de-casal, ou herdeiro, além disso assumir o pôsto da
testamentaria. certa análise das relações, KONRAD HELLWIG (Lehrbuch des deutschen Zivilprozessrechts, 1,
301) socorrer-se da representação de patrimônio autônomo, E. MEISCREIDER (Die letztwdhigen Verfdgungen
nach dem RGR., 464) voltar à teoria de GEORG BESELER. .1. WETSMANN (Lehrbuch. des Zivilprozessrechts,
1, 74) seguiu a KONRÂD COSACK. Seguro ao fio histórico, ALFRED SCHULTZE (Treuhãnder im geltenden
búrgeriichen Recht, Jherings Jahrbiicher, 48, 64 s.) considerou o Treuhiinder, titular de limitado direito real,
conforme os velhos negócios longobardos, caracteristicamente fiduciários.
4.CÓDIGO CIVIL SUÍÇO E NATUREZA DA TESTAMENTÁRIA. No Código Civil suíço também não se
adotou expressamente uma teoria (A. ESCHER, Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen Zivilgesetzbuch,
III, 105). Vemos aceita a do testamenteiro com direito próprio, como assentavam alguns
(E.EÇK-R. LEONHARD, Vortráge ilber das Recht des BGR., III, 144), exercendo o direito real sôbre a herança
(ALFRED SCH1IJLTZE, Die Langobardische Treuhand und ihre Umbildung zur Testamentsvollstreckung,
GIERKE’5 Untersuchungen, 73); portanto, a teoria fiduciária (P. TUOR, Das Erbrecht, Komm critar zum
schweizerischen Zivilgesetzbuch, III, 363; A. ESCHER, Das Erbrecht, Kommentar zum schweizerischen
Zivilgesetzbuch, III, 106) . No Exposé des Motifs escreveu-se: “Si cela était nécessaire, nous n’hésiterions pas à le
définir dans la loi, en disant que l’exécuteur testamentaire est le représentant ou l’homme de confiance
(Treuhãnder) du disposant”.
‘7. TIPOS DE TESTAMENTÁRIA. Negócio de confiança, nas origens e hoje, não podia a execução
testamentária ter forma fixa, padrão rígido e intransformável. Há um tipo normal (F. ENDEMANN, Lehrbuch des
Bilrgerlichen Rechís, III, 8ª ed., § 71), que é o oriundo da lei, não tendo o testador limitado ou dilatado as funções.
E os tipos particulares, que dependem dessas dilatações ou desse limites. A vontade do testador faz norma, cria o
tipo. Porém êle nunca perde o operar proprio nomine, ainda quando mais de um e por votos; nem a obrigação de
prestar as contas. Dois elementos irremovíveis, que lhe acentuam a dignidade funcional.
Sendo, como é, cargo, a Testamentária não constitui direito subjetivo (F. ENDEMANN, Lehrbuch des R-
iirgerlichen Rechís, ~ 83-9ª ed., § 71, 567), pôsto que seja situação subjetiva a que deriva da sua vocação ao cargo,
e direito subjetivo, o que lhe advém do interesse patrimonial ao prêmio. Aquela vocação lhe dá o procedimento
para que se lhe reconheça a qualidade de órgão, de titular da função (cf. GEORO JELLINEK, Systern der sub
jelctiven õffentlichen Rechte, 2.ª ed., 148). Por isso mesmo, é indelegável.
Diz-se, vulgarmente, que a Testamentária é função de amigo. A amizade estaria à base de tal atividade. Ora, o
testamenteiro pode ser pessoa estranha, que o próprio testador não conhecia.
O testamenteiro instituído, ou não nomeado pelo testador, pode recusar o cargo, sem qualquer constrangimento,
mesmo se é herdeiro legítimo ou testamentário, ou legatário. Isso não significa que o testador não possa fazer
condição da herança testamentária, ou do legado, a aceitação e o exercício da Testamentária.
Tem-se de pôr o problema da natureza da Testamentária em termos científicos. O cargo de testamenteiro foi
estabelecido pelo testador, ou resulta de lei (exerce-o o cônjuge do decujo) ou de ato do juiz, que escolhe entre os
herdeiros. Não há fonte legal, sem ser a da investidura do cônjuge. O juiz escolhe entre os herdeiros, em ato
jurídico processual, que é a nomeação. A designação pelo testador foi uma das cláusulas do negócio jurídico
unilateral do testamento, negócio jurídico unilateral para eficácia após a morte.
Cumpre que se não confunda com a fonte do cargo de testamenteiro, que é negócio unilateral ou legal, ou mesmo
ato jurídico stricto sensu do juiz que escolhe, a relação jurídica entre o testamenteiro, que aceitou o cargo, e os
herdeiros e os outros interessados na herança, ou na execução do testamento e na administração da herança. A
relação jurídica, essa, é bilateral, ou entre testamenteiro e duas ou mais pessoas que são o outro lado.
Nenhuma outorga de poderes há, da parte dos herdeiros e dos outros interessados, ao testamenteiro. Ou o designçu
o testador, ou a lei fêz testamenteiro o cônjuge, ou o juiz o nomeou dentre os herdeiros.
No caso de pluralidade de testamenteiros, o que a lei prevê, ou há a conjuntividade ou a separação. Isto é: ou todos
participam das funções; ou cada um exerce a sua, restringida no espaço, ou na matéria. Por exemplo: as funções
separadas são conforme a situação dos bens no país, ou no pais e no estrangeiro, ou nos Estados estrangeiros.
8. AUTONOMIA DO TESTAMENTEIRO. Tão acentuada é a figura do testamenteiro, tão certo é que exerce
cargo, e não mandato, tão nítida a sua autonomia, que êle pode praticar atos, ordenados pelo testador, que o
próprio testador não poderia praticar, e à sua capacidade jurídica mais se exige que à própria pessoa que quis
testar. Exemplos: a) O menor de vinte e um anos e maior de dezesseis anos é capaz para fazer testamento, ao passo
que não poderia ser testamenteiro. b) Ordenada a venda de bens, ou quaisquer contratos, pelo testador de menor
idade, vendas e contratos que, em vida, não poderia realizar (Código Civil, arts. 6.0, 1, e 155), o testamenteiro vai
fazer, adimplir, executar, o que ao testador não seria permitido. Por isso, já se invocou a semelhança com os
representantes parlamentares: praticam atos, em vez do povo, mas o povo, por si, não poderia praticar, de modo
que a vontade deles não é representação da vontade popular, eles fazem, com a sua, o conteúdo da vontade do
povo (assim, GEolte JELLINEK, System der sub jektiven õffentlichen Rechte, 2~a ed.. 154; E. ENDEMANN,
Lehrbuch des Riirgerlichen Rechts, III, 8ª ed., § 71, 567). Fora difícil, com a construção que a identifica com o
mandato, ou com a tutela, que, relativamente aos incapazes assistidos, os completa, explicarem-se tais situações,
assaz encontráveis; da Testamentária.
Em relação à herança, o testamenteiro não é um simples curator rei. A sua situação jurídica é de caráter fiduciário,
se bem que (diferente, hoje, da que tinha o Salmann) sem a plena propriedade dos bens. Destinatário da herança, o
heideiro é proprietário, credor, devedor. Possuidor e administrador transitório; nem por isso deixá o testamenteiro,
pelo que resta da sua função histórica, de exercer função para cuja construção científica não é possível deixar-se
de recorrer a elementos que definem o direito real. ~ uma destas situações limítrofes entre a personalidade e a
realidade dos direitos. Não é outra coisa o que diz a sua independência em relação aos herdeiros, o seu falar sôbre
as verbas, a sua faculdade de recorrer de vendas, de cálculos, de partilhas e de tudo mais que toque aos bens
testados. Por isso mesmo, é risível a teoria do mandato a da representação dos herdeiros pelo executor
testamentário. Órgão, titular de um cargo, depende êle do testador, como um deputado depende do povo:
escolhido, claro que tem de obedecer a princípios constitucionais, mutatis mutandis, à vontade expressa do
testador. Contudo, por isso, não perde o direito de obrar livremente, de acôrdo com o que pensa, interpretando os
textos, embora sujeito às decísões finais que lhe aprovem, ou desaprovem os pareceres. Da comparação, varas
vêzes se socorreu F. ENDEMANN (Lehrbuch des Biirgerliehen Rechts, -9ª ed., § 71, 567 e 570).
Onde o testador quis o ilegal, pedir-se-á que se não observe. Onde dispôs contra os bons costumes, ou em
circunstâncias que passaram, não é êle obrigado a pensar o que o testador pensou. Não se chegue a dizer, como E.
ENIYEMANN, que a vontade dele é a vontade do testador, pois que a representa. O testamento é como se
contivesse texto constitucional, cuja interpretação decisiva compete ao juiz. O testamenteiro diz a vontade do
testador, mas di-la como o deputado a do povo, isso é, sujeita a conferir-se com a carta fundamental. Aliás, a
noção de representação é uma destas perigosas abstrações, que obstam, por vêzes, à construção objetiva precisa,
dos fatos jurídicos.
9.ATOS DO TESTAMENTEIRO SÃO “PROPRIO NOMINE”. Sem o estudo da filiação histórica não se poderá
compreender a situação do testamenteiro em relação aos bens da herança. Limitado, restrito, nem por isso perde o
caráter erga omnes o seu direito, nem se desveste de toda a antiga realidade. A idéia de representação e de
mandato constitui superfetação, sociolôgicamente inadmissível (C. F. K’OcH, Das Prenssisehc Erbrecht aus dem
gemeinen Deutschen Rechte cntu’ickelt, 839 e 860; OTTO EISCHER, Recht und Rechtsschutz, 60, nota 2;
GUSTAV HARTMANN, 21. Deutscher Juristentag, 15 s.; EMIL STROHAL, Das deutsche Erbrecht, 2~a ed., § 40,
164; GEORG FROMMHOLD, Erbreeht, nota 1 ao § 2.212; também RIcHARD Sci-Io’r’r, Das Armenrech.t der
dentschen Zivilprozessordnung, 64).
Ono FISCHER caracterizou: disponente de bens alheios, sem ser representante (Ver filger ilber fremde Rechte,
ohne Stellvertreter ZU sem).
JoSEF ROULER (Gesammelte BeitrÉlge nem Civil procs, 847) foi igualmente expressivo: “o que obra em próprio
nome, porém com poder jurídico sôbre bens de terceiro”. Não menos decisiva a jurisprudência (Reieksgerichte, 26
de janeiro de 1894). Lá (como no Brasil, herdeiro do instituto), cogita-se de cargo, e a idéia de representação só
poderá intervir com o caráter especialíssimo dos funcionários, dos eleitos do povo, e outros que exercem cargos.
Na espécie, particular, privado; mas isso longe está de transformá-lo em mandatário, ou, sequer, de identificar o
testamenteiro com as pessoas que assistem a incapazes. É cargo que se rege pelo direito privado (ALFRED
SCHULTZE, Treuhãnder im geltendeu biiirgerlichen Recht, Jherings Jahrbiicher fiir die Dogmatik, 43, 88),
porém mais próximo dos funcionários públicos, a serviço da justiça, do que dos mandatários (GUSTAv
HARTMANN, 21. Deutscher Juristentag, 1, 18; A. WEISSLER, Das dentsche Nachlassverfahren, 176; ERNST
JAEGER, Erbenhaftun.g und Nachíassiconicura in neueu li?eichsrecht, 40 s.).
O testamenteiro nomeado, como o instituído, tem de declarar se aceita, ou não, o cargo. Para isso, se espontânea-
mente não se manifestou, tem de ser intimado. Se outorgou a alguém poderes especiais para a aceitação, ou para
algum outro ato, assume responsabilidade. (Advirta-se que em CARLOS MAXIMILIANO, Direito das
Sucessões, III, 191, fala-se de “representante legal”, o que é erro grave, porque quem tem representante legal não
pode aceitar e exercer Testamentária.)
Para a execução do testamento, o juiz de direito, de ordinário Juiz da Provedoria, científica que tem consigo o
testamento, para que se proceda às providências iniciais (por exemplo, a abertura, se é ou está fechado) e ~e
registe no cartório e se inscreva na repartição fiscal competente, para a futura arrecadação dos impostos de
transmissão da propriedade a causa de morte.
O juízo dos testamentos pode ser, ou não ser, o competente para o inventário e a partilha. Se o é, nele se inicia o
processo de inventário.
Para aceitar a Testamentária, é preciso que a pessoa se possa vincular; mas, se lhe é exigido o assentimento de
outrem, êsse assentimento é indispensável, ou cabe, na espécie, o suprimento judicial. Assim, mulher, maior, seja
solteira, viúva, divorciada, ou desquitada, podia e pode aceitar, livremente. A capacidade só é de apurar-se no
momento de assinatura do termo de aceitação, ou da prática de atos que a componham; e enquanto persistir a
função. A pessoa que, quando fora indicada como testamenteira, era incapaz, pode exercer a função quando se
torne capaz. É o caso do menor que se tornou capaz após a morte do testador e a tempo para a investidura.
Sem autorização do marido, a mulher casada pode, hoje, aceitar a Testamentária; antes, se êle não o permitia, e
não havia justo motivo para isso, podia o juiz suprir a outorga.
Se o marido está interdito, não há pensar-se em exigência de suprimento por outorga pelo juiz.
Nenhuma pessoa jurídica pode ser testamenteiro. Nem pessoa física indeterminada, como o Governador do
Estado-membro, o Prefeito da Cidade, ou Bispo de tal região. Salvo se se referir à pessoa que está no cargo na
ocasião da indicação (e.g., “o atual Prefeito do Recife”, “o Prefeito agora eleito para Pelota?’).
O testador pode designar para o cargo de testamenteiro pessoa inimiga de qualquer herdeiro ou legatário, ou que,
está em lide contra o próprio testador, ou por êle foi demandado. O que importa é a voluntas testatoris. Não passa
à frente o cônjuge do testador, nem quem o juiz nomeie. Todavia, o juiz não pode nomear pessoa inimiga do
testador, mesmo se herdeiro.
Se o testador desconhecia o fato de ser seu inimigo a pessoa nomeada, ou ter proposto contra êle alguma ação, ou
ser devedor do espólio, o juiz pode apreciar as circunstâncias para reputar inidônea a pessoa nomeada (xx não o
teria indicado o testador se conhecesse os fatos).
Podem ser testamenteiros instituidos ou dativos os co-herdeiros, os co-legatários ou o legatário, ou o beneficiado
pelo modas.
Chama-se testamenteiro instituído o testamenteiro que o testador designou. Testamenteiro dativo é o que o juiz
nomeou.. Diz-se testamenteiro universal o que tem a posse imediata ou mediata de todo o espólio e a
administração de todo o monte: testamenteiro parcial, o que não tem toda a posse ou toda a administração. Mas os
dois conceitos têm pouca pertinência, Porque a universalidade, a que nos referimos existir se não há herdeiros
necessários, o que ocorre a respeito de qualquer atribuição de posse e administração. Por onde se vê que a função
da Testamentária é independente da função de possuidor e de administrador.
Alguns sistemas jurídicos, como o francês, o italiano, o suíço, o argentino, o chileno e o uruguaio, não acolhem a
nomeação pelo juiz. Na Alemanha, o juiz nomeia se tal missão lhe foi dada pelo testador. Antes de nomear o
testamenteiro, tem o juiz de ouvir os interessados, se a demora não causaria gastos demasiados (Código Civil
alemão, § 2.200). Na Inglaterra, há a nomeação de administrador dos bens não administrados, se não há
administrador instituído. Nos Estados em que não há a nomeação pelo juiz, a regra é escolherem os herdeiros o
executor do testamento.
2. CAPACIDADE E MOMENTO EM QUE SE APURA. É de mister que o testamenteiro seja capaz no momento
em que deve começar as suas funções (cf. Código Civil alemão, § 2.201). No direito alemão, com regra jurídica
expressa, os dizeres “Zeit zu welcher er das Amtanzutreten hat” que poderiam afastar dúvidas, não nas afastaram:
se vemos EMIL STROIAL (Das deutsehe Erbrecht, 4ª ed., § 40, nota 10) e outros entenderem que o momento é o
da abertura da sucessão ou o da ciência da nomeação, F. ENDEMANN (Lekrbuch des Ejirgerlichen Reckts, III, ~
ed., § 72, 574) fixou-o à época da aceitação da Testamentária. E com razão.
Portanto, se aceitou, será verificada a capacidade. Se foi intimado e não foi assinar, toilitur quaestio: supõe-se não
ter aceitado. De onde resulta que se devem intimar os que, munidos de ato convalescedor, puderem ser; isto é, os
ex-ausentes, os menores suplementáveis na idade. Fica-lhes tempo para se habilitarem, prazo, aliás, que, por
equidade, pode o juiz dilatar.
É escusado dizer-se que a incapacidade superveniente põe fim à Testamentária (Código Civil chileno, art. 1.275).
O testador pode nomear testamenteiro que ainda não é capaz de ser testamenteiro. A capacidade é de exigir-se, não
desde o momento da morte do decujo, mas sim da aceitação. O negócio jurídico é intuitu personae, a causa de
morte e revogável. Se, por exemplo, ao testar, o testador tinha filho menor, que estava estudando engenharia e com
as qualidades que lhe pareciam fazê-lo a pessoa adequada à gerência dos negócios e à execução do testamento,
pode nomeá-lo testamenteiro. Se, ao morrer o pai, no momento de aceitar, ainda não era capaz o filho, tem o juiz
de nomear outro testamenteiro. Se, à abertura da herança, já era capaz, ou no momento da aceitação, se tornou
capaz no mesmo dia, tem êle o ins ad olficium. Pode ocorrer que, por ser vedada a investidura, haja a nomeação
judicial de outra pessoa, e essa recuse, ou seja destituída, mas se haja tornado capaz o filho do testamenteiro.
Então, é aconselhável não imperativo! que o juiz o nomeie para a Testamentária. A despeito de ter havido a
cláusula testamentária, o ofício é de origem judicial.
8.CAPACIDADE PARA SER TESTAMENTEIRO. Fàcilmente se revela o direito relativo à capacidade. Omisso o
Código Civil, dos princípios, expedientes quantitativos e soluções ref e-rentes à atividade, resulta que são
incapazes para exercer Testamentária:
a)Os menores, salve se se lhes suplementou a idade (Código Civil, arts. 59, 1, 6.º, e 9º, § 19, por um dos meios
apontados nos ns. I-V do art. 99, § 1.0). Éstes poderiam exercer mandato judicial. São maiores, ou declarados
maiores, na terminologia legal (art. 1.825, 1) . A regra jurídica do art. 1.298 não poderia ser aplicável ao mandato
em juízo. Com maioria de razão, à Testamentária. Portanto, em relação à idade, só os que têm a plena capacidade
civil podem ser testamenteiros. A capacidade deve-se apurar ao tempo em que se vai assinar o térmo, e não antes.
A abertura da sucessão fixa o momento da capacidade hereditária, mas seria afastar-se da natureza das coisas
exigir-se que em tal momento tenha sido capaz o futuro testamenteiro. Se o testador nomeou menor e, aberto o
testamento, tratar de habilitar-se o nomeado, trazendo a juízo o documento da sua recente maioridade legal
(exemplo: certidão de casamento, sentença do juiz, titulo de emprêgo público efetivo), não se lhe pode recusar o
exercício de um cargo, que só então vai começar.
Na velha doutrina, FRANCISCO PINHEIRO (Tractatus de Testamentis, 1, Seção 11, § 3, 12) sustentava a
capacidade do relativamente incapaz, hoje menor de vinte e um anos e maior de dezesseis anos, para o exercício
da Testamentária. Atuava em seu espírito, como no de outros, em diferente propósito, a falsa concepção de ser
mandato ad negotia a Testamentária. Mas basta atendermos à gravidade do cargo para concluirmos ser
contraditório permanecer insuplementado na idade menor a que se deu autorização para assinar o termo e cumprir
as delicadas missões de testamenteiro.
Na doutrina italiana, ?. 5. AzZARITI, G. MARTIEEZ e GIUSEPPE AZZARITI (Successiovii per causa di morte
e donazioni, 1a ed., 566 s.) excluem da eapacidade para ser testamenteiro o menor com suplemento de idade (“il
menore emancipato”). Mas de modo nenhum podemos acolher, no direito brasileiro, tal opinião.
b)Os interditos: loucos (art. 59, II), surdos-mudos, que não puderem exprimir a sua vontade (III), os pródigos
(art. 6.0, III). Ainda sujeita a recurso, a sentença de interdição produz efeitos desde logo (art. 452).
Se, por ocasião da assinatura do termo, estiver pendente processo de interdição, o juiz, consultando as
circunstâncias, mandará que o imediato testamenteiro, ou um dativo, se não houver outro nomeado pelo testador,
assine, a título provisório, o termo. . Assim será aguardado o julgamento do juízo de interdições. No caso de ter
assinado o termo o interditando, cumpre ao juiz e, a fortiori, ao curador, fiscalizar, atentamente, os atos
testamentários.
c) Os silvícolas (art. 6.0, IV). Enquanto sujeitos ao regime tutelar e, pois, ainda inadaptados à civilização, seria
contraditório confiar-lhes cargo da importância material e moral da Testamentária.
d) Os ausentes declarados por ato do juiz (art. 59, IV). Aqui, só se trata do instituto da ausência. A propósito do
artigo 1.764, versar-se-ão as questões relativas aos ausentes nomeados testamenteiros, à indelegabilidade e à
representação judicial dos testamenteiros.
A mulher casada pode ser testamenteira.
Excluiam-se as mulheres casadas não autorizadas pelos maridos, ou, se estes recusassem a autorização ou nos
demais casos, quando não obtivessem o suprimento judicial da outorga. Esta visto que a mulher desquitada ou que
tivesse a direção e a administração do casal (art. 251) podia livremente exercer a Testamentária. Surgia uma
questão: se o testador nomeou testamenteira a mulher de alguém, que figurava no testamento com assinatura,
,presumia-se ela autorizada? Sim, mas, revogável, como seria, a todo tempo, a autorização (art. 244), só podia tal
circunstância, se ocorreu revogação, constituir elemento para a apreciação do juiz suprimentador.
Aqui, como no caso dos menores nomeados testamenteiros, para não se inutilizar a declaração de vontade do
testador, que bem sabia, numa espécie, da relativa incapacidade do menor, e da necessidade, na outra, da outorga
marital, convinha que o juiz, examinadas as realidades que cercam o incidente, desse a outrem, de acôrdo com as
regras jurídicas de substituição, porém provisôriamente, o cargo testamentário.
Com a sua visão rente dos fatos, trouxe à balha FRANCISCO PINHEIRO questão assaz interessante de direito
civil: solteira ou viúva a testamenteira, casando-se, ,podia continuar a Testamentária? Opinou afirmativamente
(Trac tatus de Testamentis, seção 1, § 4). Entendeu JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA ALVES (Consolida ção
das Leis relativas a Juizo da Provedoria, 1, § 156, nota 64) que precisaria, para continuar, da autorização do
marido. Trata-se de um cargo e a aceitarmos tal solução teríamos de suspendê--la dos cargos públicos e das
profissões. Nos termos em que o disse, seria inaceitável. Mais jurídico seria reputá-la habilitada a continuar. A
dificuldade estava na revogabilidade de autorização marital, porém esta dependia dos direitos de terceiros e dos
efeitos, necessários, dos atos iniciais (Código Civil, art. 244). Ademais, não seria razoável subordinar às
contingencias do poder marital o exercício a que, aceita a função, estava legalmente obrigada a mulher. De
qualquer modo, ocorrendo a denegação e, provocado o suprimento no juízo competente, não lhe sendo concedido,
caso julgado, com erro talvez, mas sôbre questão de direito de família, que se tinha de acatar, deixaria o cargo.
Por isso mesmo, convínha, discordando o marido, logo se recorrer ao suprimento, em cujo processo era
aconselhável atender-se ao caráter das responsabilidades e aos proveitos do prêmio. No juízo da Testamentária,
não se podia assumir atitude que não fosse a de se presumir continuada a habilitação.
Contudo, no Chile, o art. 1.274 opta por outra solução:
“La viuda que fuere albacea de eu marido difunto deja de serlo por eI hecho de pasar a otras nupcias”. De má
técnica, e injusto: primeiro, porque supõe contra interesses de outros e da própria pessoa que exerce o cargo;
segundo, é tão injusto, que, em muitos casos, não poderá ser aplicado: pode o marido intervir imediatamente com
autorização marital e seria absurdo que perdesse o cargo por uma solução de continuidade que não houve. Só se
fala em viúva. E a solteira que se casou? Lei mal feita, tanto mais quanto, no art. 1.273, 2a alínea, afastou
quaisquer inconvenientes pecuniários, pelo dizer expressamente que a mulher casada, que exerça albaceazgo, só
obriga os seus bens próprios.
Na Consolidação das Leis relativas ao Juízo da Provedona de JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA ALvES , 5ªed.,
§ 156) vemos a inclusão das mulheres desquitadas, como se elas pretisassem de licença judicial. Citou o Código
Civil português revogado, art. 1.887, que absolutamente não dizia isso. Trata-se, evidentemente, de regra jurídica
absurda, sem qualquer fundamento de direito escrito, de ciência e de razão.
Já no direito alemão anterior ao Código Civil podia a mulher ser testamenteira (E. MEISCHEIDER, Die
letztwilligen Verfiigungen nach dem BGB., 469). Com o Código Civil alemão, não precisa de autorização do
marido (§ 1.899, alínea 1~a, E. RITGEN, em G. PLANCK, Biirgerlichúes Gesetzbuch, V, 893), mas tem o marido
o direito de denúncia (Kriindigungsrecht), por analogia com o § 1.858 (GEoRG FROMMHOLD e F. RITGEN,
contra G}xrnG MAlicus, Die Testamentsvollstreckung nach dem BGB., Sãchgisches Archiv, VIII, 59, GUSTAV
MÁREER, Die Nachlassbehandlung, 16~a ed., 157, e F. SECKT, Beitrag zur Lehre von der
Testamentsvollstreckung, 43).
Hoje, rege a Lei n. 4.121, de 27 de agôsto de 1962, artigo 19, IV.
e) As pessoas jurídicas. Assim se entendeu, até hoje, no direito brasileiro. Em consequência, não podem aceitar e
exercer por outra pessoa o munus testamentário (art. 1.764). Viu-se na pessoalidade da função empecilho a corpos
que precisam de órgãos para funcionar em juízo (2.~ Câmara da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 12 de julho
de 1927). Não ocorre o mesmo, por exemplo, na Alemanha. Antes do Código Civil alemão, era afirmativa a
opinião geral (HEINRICH DERNEURO, Leh,rbuch des preussisch~en Privatrechts, ~ 33 ed., § 166, contra
BRETTNER, Der Testamentsvollstrecker nach neuem Deutacheu Recht, Archiv fitr biirgerliches Reclzt, 17, 216).
Em relação às ordens, irmandades e corporações, havia leis explícitas no vedar-lhes a Testamentária (Lei de 9 de
setembro de 1769, § 21, Alvará de 20 de maio de 1796, Assentos:
19, de 29 de março de 1770, 4•O, de 5 de dezembro de 1770, 19, de 20 de julho de 17S0, e 2.~, de 21 de julho de
1797). Assim a Consolidação, arts. 1.002 e 1.003.
Também não podem ser executores testamentários as pessoas de direito público, interno ou externo.
No direito português, as pessoas jurídicas podiam ser nomeadas testamenteiras. Decidia-se por analogia com a
capacidade para serem herdeiras ou legatárias (JOsÉ TAvARES, Sucessões e Direito Sucessório, 1, 719). Mas não
tinha isso efeitos no direito brasileiro, ainda que português o testador. porque se trata de cargo a ser exercido
perante a autoridade brasileira.
O nôvo Código Civil português nada contém de explícito.
Os monges, a que as ordens proibem a Testamentária, não são, perante a lei, incapazes (cp. E. MEISCREIDER,
Die letztwiíligeu Verfiigungen nadt dem RGB., 469).
Entendia CARLOS MAXIMILIANO (Direito das Sucessões, III, 194 s.> que “frade ou qualquer outrp membro de
ordem religiosa jamais exerce a Testamentária; porque não pode obrigar-se; excetua-se lôgicamente o egresso”.
Ora, mesmo nos tempos em que a Igreja tinha algo de contrôle das execuções testamentárias, no Liber Sextus de
Bonifácio VIII estava dito:
“Religiosus executor ab alio in sua voluntate ultima deputatus, non potest (cum velle vel nolle non haberat)
huiusmodi officium superiore vel exequi, nisi a superiore suo petita super hoc licentia et obtenta”. Discutia se
valiam os seus atos mesmo sem licença do superior. Basta que se consulte L. FERRARIS (Prompta Ribliotkeca
cjnonica inridica moraIs th,eologica, VIII, n. 51 s. e 55 s.) : “. . .quamvis religiosus velie et nolle non habeat,
habet tamen consensum naturalem, qui una cum consensu testatoris sufficiens esse videtur ad hoc officium”.
Para a legitimação à herança testamentária não há exigência de outro fundamento positivç que a designação pelo
testador. Na sucessão legitima, variaram, através dos tempos, os fundamentos (parentesco, casamento, família,
fisco). Por outro lado, operou-se, com a saisina, o tratamento igual dos herdeiros intestados e dos herdeiros
testados. Não há a aditio como forma de adquisitio (cf. FRANZ BEER, Die Lekre vou deu Successionsgriinden, 9
s.). Tanto o herdeiro testamentário pode ser testamenteiro como o pode ser o herdeiro legítimo, o legatário, ou
qualquer beneficiado, e como qualquer pessoa a quem nada se deixou. Fundamento da sucessão legítima é a lei; o
da sucessão testamentária, a vontade do testador. A Testamentária ou provém de vontade do testador, ou de lei, ou
de ato do juiz, fundado em lei. Quando o Código Civil, no art. 1.763, disse que, na falta de testamenteiro, a
execução testamentária competia ao cabeça-de-casal, fêz testamenteiro portanto ex lege o cônjuge. Na falta de
cabeça-de-casal, ao juiz cabia nomear o testamenteiro. Sobreveio o Código de Processo Civil, art. 527 (cf. art.
469).
Perguntava-se: se quem faleceu não era o chefe de família, ~tinha a função de testamenteiro legal? A resposta
havia de ser afirmativa, porque o que importa é a situação após a abertura da sucessão (e.g., os herdeiros são
filhos, e a mãe é meeira, ou comuneira em alguns bens; ou um dos herdeiros é a viúva:
-ou um dos herdeiros é mulher casada, cujo marido administra os bens). Não se deve dar interpretação restritiva ao
que se pôs, desacertadamente, na regra jurídica (“cabeça-de-casal”), nem demasiado larga. Hoje, ou há
testamenteiro designado ou o juiz nomeia.
4. DESIGNAÇÃO DEIXADA A OUTREM. O testador pode deixar a alguém a função de indicar o testamenteiro
(Código Civil alemão, § 2.198). Com isso, não infringe a regra da indelegabilidade do ato de fazer o testamento e
de exprimir a sua vontade. A pessoa que tal encargo recebe deve desempenhá-lo dentro do prazo marcado pelo
testador, ou pelo juiz. Se o não fizer, perderá o direito de indicar. Resta saber se pode ser pessoa jurídica êsse
terceiro indicante. A situação não é a mesma que se observa quanto ao cargo de testamenteiro. Decidem alguns
que sim (F. HERZFELDER, Erbrecht, J. vou Staudingers Kommentar, V, 9~a ed., 551; F. RITGEN, em
G.PLANCE, Biirgerlickes Gesetzbuch, V, nota 3 ao § 2.198, contra BRErINER Der Testamentsvollstrecker nach
neuem Deutschen Recht, Archiv Urb-iirgerliches Recht, 17, 216). Aceita-se que também possa ser um dos
herdeiros. Pode o terceiro indicar a si mesmo (contra, FRANZ LEONHARD) -Outro ponto que se há de frisar: no
direito brasileiro, pode o testador deixar a outrem a designação do testamenteiro; mesmo para o caso de o
nomeado, que não aceitar, ou não puder continuar, poder designar (também no Código Civil italiano, art. 700,
alínea S.a: ~~II testatore puô autorizzare l’esecutore testamentario a sostituire altri a se stesso, qualora egli non
possa continuare nell’ufficio”) Além disso, no caso de nomeação de testamenteiros separados, nada obsta a que,
para a substituição, se deixe ao que não aceita a designação de um dos nomeados.
(Advirta-se que no direito italiano, porque o art. 700, alínea 2ª, do Código Civil italiano fala de “non possa
continuare nello ufficio”, se acentua, na doutrina, que não tem tal poder o testamenteiro autorizado a exercer tal
função designativa se não aceitou a Testamentária. Cf. 11. NATOLI, L’Amrninistrazione dei beni ereditari, 1, 387;
G. BRUNELLI e C. ZAPPULLI, Ii Libro delie Suceessioni e Donazioni, 409). De maneira nenhuma no direito
brasileiro, pois quem não foi nomeado testamenteiro pode escolher. No direito italiano, há discussão a respeito (A.
MANCA, Degli esecutori testamentari, Commentario diretto da MARIANO D’AMELIO e FINZI, 627 s.;
CALOGERO GANGI, La Successione testamentariu, III, 827; MARIO TALA-MANCA, Successioni
testamentarie, Commentario a cura di ANTONIO SCLALOJA e GIUSEPPE BRANCA, 445).
5.CAPACIDADE DOS FUNCIONÁRIOS DA JUSTIÇA. E omisso o direito civil, e com êle o processual, sôbre a
capacidade ou incapacidade dos funcionários da Justiça. Mas devemos, no assunto, respeitar o principio geral da
capacidade. Tem-se visto funcionarem, como testamenteiros, ministros do Supremo Tribunal, juizes de Tribunais
de Justiça e da primeira instância, secretários do Tribunal de Justiça e escrivães. Em todo o caso, uma exceção
naturalmente se impõe: o funcionário da Provedoria, no circulo da sua jurisdição, não pode ser testamenteiro (M.
E. ECCIUS, Theorie und Praxis des heutigeu gemeinen preussisefleu Privatrechts, IV, § 255, nota 56; RICRARD
WILKE, Erbrecht, nota 5 ao§ 2.197; contra, sem maior exame, A. WEISSLER, Das deutscke Naehlassverfahren,
183>. Seria preterir pelo fato do cargo privado, do interesse de um, o cargo público, de natureza permanente e
geral. Mas, se, pelo laço de parentesco, ou outro laço fundado e notório motivo de impedimento, não poderia
funcionar o funcionário público, juiz, escrivão, escrevente, é de entender-se que cessa, na espécie, o obstáculo
funcional.
9.TABELIÃO E TESTAMENTÁRIA. Não podem ser herdeiros, nem legatários e, se o forem, serão nulas as
disposições, o oficial público, civil e militar, nem o comandante, ou escrivão, perante quem se fizer, assim como o
que fizer, ou aprovar o testamento (art. 1.719, IV). Fundada em DIOGO GUERREIRO CAMACHO DE ABOIM
(De Inventario, IV, 6, 12 e 13), a doutrina anterior concedia que o fossem (FRANCISCO DE PAULA LACnDA
DE ALMEIDA, Sucessões, § 85; JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA MXTES, Consolidação das Leis relativas
ao Juízo da Provedoria, 3ª ed., § 157). Os que, hoje, querem que se aplique analôgicamente ou por interpretação
extensiva a regra das heranças e legados, para serem coerentes, têm de excluir da capacidade tais pessoas; mas
fogem à questão.
Aqui, não é a regra de direito civil escrito, nem a regra jurídica revelada, também civil, que está em jôgo. O direito
que há de resolver é o que rege o cargo público em si, direito cheio de vedações de ordem funcional, que têm,
como reflexo, efeitos nas investiduras. Se, pelo texto da legislação judiciária ou do Código Processual Civil, for
proibido, claro que os tabeliães não poderão assumir o cargo para que foram nomeados. Dir-se-á o mesmo quanto
aos militares e aos regulamentos que os regem. Aliás, onde se proibir aos tabeliães, entender~se..á que se proIbe
aos que, nos casos excepcionais (arts, 1.656.4.663), lhes fizerem as vêzes.
10.FALIDO TESTAMENTEIRO. Pela falência, fica o falido privado da administração e disposição dos bens que
tão de responder pelas obrigações assumidas para com os credores e não pode, desde o dia da sentença
declaratória, praticar atos para que foi nomeado pelo testador ou pelo juiz. Mas, uma vez aceita, tem de exercê-la.
Com a lição da glosa e dos doutôres era, em Portugal, a doutrina pacífica: “Executor testamenti compelli non
potest, ut illud munus suscipiat, semel tamen susceptum prosegui tenetur” (MIGUEL DE REINOSO,
Observationes Pratieae, ob. 55, n. 21, 879). Confirmam: DIOGO GUERREIRO CAMACHO DE ABOIM (De
Inventario, IV, 6, 84 e 35), M. TEEMUDO (Decisiones, dec. 62, n. 6), JosÉ HOMEM CORREIA TELES (Digesto
português, III, § 1.822) e M. A. COELHO DA ROCHA (Instituições de Direito Civil português, § 720). Após o
Código Civil, nada justificaria entender-se de outro modo.
De forma alguma, pode o testamenteiro ser obrigado a aceitar, pôsto que pudesse, antes da morte do testador,
prometer aceitar. O juiz não pode constringir a isso o próprio testamenteiro dativo, mesmo se o caso seria, como
outrora, de rationabilis causa (cf. L. FERRARIS, Prompta Bibliotheca canonica iuridica moralis theologica,
VIII, s. 68; PIO FEDELE, Esecutore testamentario, Enciclo pedia dei Diritio, 15, 384).
O testamenteiro aceita ou recusa, e a coação seria ilegal (ANT. A BurPRIo, Iii librum tertium Decretalium
Commentarti, Tua nos, n. 6).
~ O herdeiro instituído e o legatário são obrigados a aceitar a Testamentária 7 No direito anterior, JOSÉ HOMEM
CORREIA TELES (Digesto português, III, § 1.825) sustentava a afirmativa. Mas, em geral, não se cogitava de tal
obrigação. Cumpre, porém, distinguir do caso especial do legado essencialmente remuneratório o cargo
testamentário, ou, até, a herança com êsse só propósito. Então, não aceitar o cargo vale não aceitar o legado, ou a
quota hereditária. .~Mais uma vez intervém a importante indagação da causa de instituir e de legar.
A praxe é intimar-se o testamenteiro, com prazo, para assumir a Testamentária. Se não aparece, intima-se o
segundo. ou o terceiro. Não vindo, presume-se sempre que recusou. Não dispõe o mesmo o Código Civil suíço
que lhes dá quatorze dias, findos os quais o silêncio vale aceitação (art. 517). Simples presunção, que prova
contrária pode destruir (EUGÊNE CURTIFORRER, Commentaire du Code Civil suisse, 409).
Se há testamenteiros conjuntos, e não sucessivos, é conveniente que se intimem todos, no mesmo dia, ou com
prazo em que haja tempo para eles se porem em contacto, pois é frequente subordinarem alguns, ou algum
subordinar à aceitação pelo outro, ou pelos outros, a sua declaração de vontade. A conjuntividade permite que, na
própria declaração de vontade, quem aceitou diga que supõe a aceitação por outro, ou outros. Não há, aí, condição.
Melhor é, porém, que responda ao juiz que aguarda a manifestação de outro, ou de outros, caso em que convém
que o juízo dilate o prazo para que seja igual, quanto à expiração, ao que foi estabelecido para outro, ou aos que
foram estabelecidos para os outros. Pode o testamenteiro aceitar a Testamentária, antes do óbito? Sim, responde F.
ENDEMANN (Lehrbuoh des Bitrgerlichen Rechts, SY-99- ed., 576) ; aceitação, que não pode fazer, é a da
herança, a do legado, a do benefício.
Por outro lado, não exige a lei forma especial para a aceitação da Testamentária. Terá de ser feita perante o juiz de
testamentos e, como em todos os casos, frisa F. ENDEMANN, peremptória, sem condição ou prazo. Dada a
atribuição privativa do juiz, valerá, feita no lugar em que se testou, ou em que se pretendia abrir o testamento,
quando ocorrer abrir-se alhures.
A aceitação da Testamentária, já o vimos, não pode ser a termo ou sob condicão (E. MEISCHEIDER, Die
letztwilligen Verfiigacngen nach dum BGB., 470; F. HERZFELDER, Erbrecht, 3. von Stctudingers Komnzentar, V,
9a ed., 671>.
Para requerer que se intime o testamenteiro a vir assinar o termo, são considerados partes todos os interessados na
aceitação, na recusa, ou na execução do testamento, inclusive credores do espólio.
Mas, se o testamenteiro foi nomeado sob a condição suspensiva, ou termo que não seja a morte do testador, antes
do advento da condição ou do térmo não poderá ser intimado (F. IIERZFELDER, Erbrecht, 3. von Staudingers
Kommentar, V, 9.~ ed., 671). Se outro não houver, designado pelo testador, o juiz proverá o cargo, até que se dê o
fato ou se alcance o tempo marcado. Tal nomeação exige que se prove haver necessidade ou conveniência disso.
A recusa da Testamentária é irrevogável (cf. F. HERZFEI -DER, Erbrecht, J. von Staudingers Komment ar, V, ga
ed., 671).
r
42
Sendo mais de um os testamenteiros, qualquer deles pode aceitar, sem se preocupar com os outros. Mas,
excepcionalmente, pelo teor do testamento, pode ocorrer que a recusa de um implique a dos outros. Trata-se de
questão de interpretação (EUGÊNE CURTI-FORRER, Commentaire du Code Civil suisse, 409).
A lei não exige forma especial para a aceitação. Portanto, pode ser feita em requerimento, ou por declaração nos
autos, na contra-fé da intimação para a ciência, em petição anterior à apresentação do testamento, que será autuada
e, mais tarde, apensada ou juntada aos autos do testamento. Se ocorre abrir-se noutro lugar, cujo juiz deva
prosseguir na execução da cédula, pode ser requerida a remessa, ficando traslado, ou certidão, capeada por ofício.
Não pode o testamenteiro aceitar o cargo sob condição, ou por tempo determinado, ou a partir de certo momento.
Se aceitou, entende-se que o fêz pura e simplesmente. Não se lhe faculta aceitar a nomeação com restrições, que
entenda impor, nem, quanto ao prêmio, estipular taxa. Ou o decujo o fixou, ou arbitrá-lo-á o juiz, na forma do art.
1.766.
tSe, por acaso, houve aceitação condicional ou a termo? Será nula a aceitação? Não; nula é a condição, ou o termo.
Cf. Código Civil alemão 2.202. Se houve relação contratual entre o testador e o testamenteiro? Tem de respeitar-
se, com as condições e termos (E. RITGEN, em G. PLANCE, Elirgerliches Gesetzbuch, V, 892). Mas, promessa, a
aceitação tem de ser pura e simples. Num e noutro caso, é possível que o testador prefixe a pena obrigacional, que,
vaie. Isto, como bem disse FtITGEN, não viola a livre aceitabilidade, nem o caráter fiduciário da Testamentária.
Pode o testador impor encargos prévios ao testamenteiro (A.STURM, Die Lehre von den Testamentsvollstreclcern
nach dem BOR., 67).
8.PROIBIÇÃO DE COMPRA E ADJUDICAÇÃO. Ainda que em hasta pública, não pode o testamenteiro
comprar bens confiados à sua guarda ou administração (Código Civil, art. 1.188, 1), nem haver para si, direta ou
indiretamente, ou por ato simulado, no todo ou em parte, propriedade ou efeitos, em cuja administração,
disposição ou guarda, deva, em razão do cargo, intervir; nem, tão-pouco, entrar em especulação de lucro ou
interesse relativo à dita propriedade ou efeito.
Mas a proibição não compreende:
a) O testamenteiro que for cônjuge meeiro, na aplicação do art. 1.777, que dá ao herdeiro (e, pois, ao cônjuge
meeiro), o direito de requerer a adjudicação do imóvel que não caiba no quinhão de um herdeiro (ou na metade do
cônjuge sobre-vivente), ou não admitir divisão cômoda. Aquele a quem for adjudicado reporá, em dinheiro, o que
sobrar.
b) O próprio testamenteiro estranho (não cônjuge e não herdeiro) pode adquirir, após serem julgadas as contas e
ser exonerado do cargo, os bens que pertenceram à Testamentária (Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 62, § 22;
Decreto n. 884, de 2 de outubro de 1851, art. 35; Consolidação das Leis Civis, art. 1.120, nota 35). Porque, então,
cessado o ofício, cessara as responsabilidades e restrições que dele, em virtude de lei, provinham (ANTÔNIO DA
GAMA, Decisiones Supremi Senatus Regni Lusitaniae, 217; sôbre os tutôres, JOAQUIM DA COSTA
EARRADAS, R.defl., 10, 287).
c) válida a disposição: “Deixo a A o prédio da rua B, ou a quantia de cem mil cruzeiros novos, se C, testamenteiro,
quiser ficam com êle por este preço”. O testador fixou o preço. determinou o objeto. A venda, como em outros
casos que se podem lembrar, faz parte da declaração de vontade. Mas é nula a disposição geral: “Concedo-lhe a
faculdade de comprar os bens da herança”, sem qualquer limitação.
Com a aceitação da Testamentária há efeitos jurídicos próprios, que atingem outros que se irradiaram com a morte
do testador. Se o falecido não deixou cônjuge, nem herdeiros necessários, nem parente colateral sucessível, que se
conheça, nem deixou testamenteiro, há a nomeação de curador. Dá-se o mesmo se o testador não deixar cônjuge
ou herdeiro necessário, ou se o herdeiro não existir, ou não aceitar a herança, nem houver colateral sucessível,
notôriamente conhecido, e o testamenteiro não aceitar a Testamentária Se há curador da chamada herança jacente,
nomeado antes de o testamenteiro aceitar, mas êsse aceitar, há a repercussão da aceitação pelo testamenteiro (cf. V.
MICHELE TRIMARCHI, L’Ereditâ giacente.
E) São atribuições que o testador lhe dá:
a) A inventariança, quando não houver cônjuge meeiro, nem herdeiros (Código de Processo Civil, art. 469, IV),
ou, havendo-os, finalmente, na falta de cônjuge meeiro e de herdeiros, for, por uma espécie de nomeação
implícita, chamado à inventariança (arts. 1.579, § 8.0, e 1.769).
b) Se não houver cônjuge meeiro ou herdeiros necessários, pode o testador conceder ao testamenteiro a posse e
administração da herança, ou de parte dela (art. 1.754). Esta posse, que se lhe dá, não exclui a dos herdeiros (arts.
1.580 e 1.754, parágrafo único). No art. 1.754 falou-se em cônjuge, porém é o meeiro e não qualquer; falou-se em
posse e administração da herança, e poderia parecer que, se lha pode dar, é que não tem nenhuma. Desta questão
tratar-se-á quando examinarmos o art. 1.754.
c) O testador, no testamento, pode dar instruções (commendatio causae) ao testamenteiro, que as executará. É da
natureza do instituto (A. HEUSLER, Institutionen des deutschen Privatrechts, II, 658).
O)São atribuições, que o juiz, em virtude da lei, lhe dá:
a)A inventariança, que cabe ao testamenteiro: a) se for cônjuge meeiro; b) se co-herdeiro que se achar na posse e
na administração dos bens da herança; c) ou se, entre co-herdeiros, lhe coube a preferência; d) finalmente, na falta
de cônjuges ou de herdeiros, pelo fato de ser testamenteiro (artigo 1.579). Em verdade, só por esta nomeação
implícita, ou pela outra, explícita, pode dar-lhe tal investidura o testador, podendo preterir herdeiros, porém não os
necessários e o cônjuge meeiro (arts. 1.579 e 1.754). É o juiz que lhe dá, no caso da letra e), em virtude de lei, a
inventariança.
b)Também lhe cabe a inventariança se, removidos o inventariante e o testamenteiro, o juiz nomear alguém para as
duas funções.
11.ANTES DA INVESTIDURA. Já vimos que existem atos praticáveis antes da assinatura do termo de
Testamentária. Mas é regra que todas as ações, praticadas anteriormente à aceitação, sejam consideradas como de
representante do testamenteiro (E. RITGEN, em G. PLANCK, Rúrgerliches Gesetzbuch, V, 393) e os seus direitos
e deveres regem-se pelas regras jurídicas relativas à gestão de negócios (arts. 1.331-
-1.845), ratificável por êle mesmo, ouvido o curador e aprovado pelo juiz, depois de investido nas funções. Por
onde se vê que, somente em casos anômalos, intervém na construção do instituto a noção de representação ou a de
negotiorum gestio.
14. PENA CONVENCIONAL. Vale a pena convencional e cabem sempre, no caso de infração, as perdas e danos.
Aqui, há quem dê ao contraente a alternativa: pleitear a aceitação, propondo a ação para isso, ou, ocorrida a
violação, a ação de indenização (E. IIEEZEELDER, Erbrecht, .T. von Staudingers Kommentar, V, 93 ed., 671).
Porém E. XRETZSCHMAR (Dos Erbrecht des Deutschen BGR, 23 ed., § 45, n. 32) negou a primeira solução. E
parece razoável: a mora para a infração contratual supõe não ter aceito e provar-se, o que o interessado promove
com a petição ao juiz para intimar o testamenteiro; salvo, e nisso não advertiu E. KRETZSCHMAR, se o
testamenteiro por outro modo já incidiu em mora e causou danos.
2. NÚMERO DE TESTAMENTEIROS Se uma lei nova limita o número de testamenteiros que o testador pode
nomear, somente será aplicável se a morte ocorrer na vigência dela.
8. CONTEÚDO DO TESTAMENTO. Em tudo que se trate de conteúdo do testamento, a lei que importa é a do
tempo da feitura, ainda quando o testador tenha morrido sob o domínio da lei nova (FRIEDRICH AFFOLTER,
System des deutschen burgerlicken tbergangsreckts, II, 887; A. NIEDNER, Das Einjiihrungsgesetz, 2a ed., 472).
1. QUESTÕES QUE SURGEM. Pelas diferenças entre as legislações, inclusive entre o direito inglês e o norte-
americano, as funções de testamenteiro suscitam interessantes problemas de direito internacional privado.
Dividiremos os assuntos: a) Forma da nomeação. b) A nomeação, nos seus efeitos, funções e deveres dos
testamenteiros.
3.INTERNACIONAL PRIVADO E TESTAMENTÁRIA Se ocorrer que o testamenteiro não tenha a mesma lei
pessoal que o testador, a lei aplicável quanto aos direitos e deveres do testamenteiro é a do estatuto hereditário,
portanto a lei pessoal do testador (L. KUHLENBECK, Einfúhrungsgesetz, 3. v. Staudingers Kommentar, V, 7aga
ed., 126; cp. ERNST ZITEIMANN, Internationales Privatrechi, II, 1004, s.) ou a brasileira, no caso do art. 150, §
38, da Constituição de 1967.
Se existe diferença entre o estatuto da herança «ex suecessionú) e o pessoal do testamenteiro, como no caso de um
Inglês nomear executor testamentário domiciliado no Brasil, as responsabilidades deste regulam-se pela lei da
herança, e não pela da residência do testamenteiro e lugar da execução (L. RURLENBECK, Einfúhrungsgesetz 3.
v. Staudingers Kommentar, V, qaga ed., 126).
A remunerabilidade da função não é de ordem pública; mas certamente o é a obrigação de prestar contas.
4. Dominio DA ‘LEX FORI”. Na falta de testamenteiro nomeado pelo testador, ~ qual a lei que rege a nomeação
dativa?
A função, aqui, se é puramente judicial, a lei aplicável é a do juiz. Se arbitral, a da sucessão. A parte processual
ésempre regida pela lex .fori.
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.753: “O testador pode nomear um ou mais testamenteiros,
conjuntos ou separados, para lhe darem cumprimento às disposições de última vontade”.
2. ELABORAÇÃO. Antes de tratar da nomeação de testamenteiro pelo testador (art. 2.581), cogitava o Projeto de
CoELHo RODRIGUES, art. 2.580, da capacidade para ser testamenteiro. Projeto primitivo, art. 1.915: “O testador
pode nomear um ou mais testamenteiros para darem cumprimento às suas disposições de última vontade”. Mais
minucioso o Projeto da Câmara, art. 1.760: “O testador pode nomear um ou mais testamenteiros, conjuntos ou
separados, para darem cumprimento às suas disposições de última vontade”. Omissos, portanto, a propósito da
capacidade.
8. NOMEAÇÃO PELO TESTADOR. A regra é que o testador nomeie e discrimine, no tempo, no espaço e quanto
às funções, os poderes dos testamenteiros. Os arts. 1.753-1.762 do Código Civil desenrolam-se com a suposição
de que foi diligente, ao nomeá-los, o próprio si cedendo. Só o art. 1.763 cogita da falta de nomeação por parte do
testador, máximo interessado no cumprimento das suas últimas vontades.
Vulgarmente, o testador nomeia mais de um, enumerados ou não, mas presumidos separados e não conjuntos,
porque mais se vêem aqueles do que esses. Separados, ou o são no tempo, um em falta do outro, ou por funções
discriminadas (simultâneas, mas de atribuições inconfundíveis). Conjuntos, solidários, se não houver distinção do
que fazem e exercerem, ao mesmo tempo, o cargo, ou não-solidários, se, a despeito de serem conjuntos e da regra
jurídica do art. 1.765, tiver de ser excluída a solidariedade, por tê-los querido conjuntos, porém só responsáveis
pelos atos próprios, nas resoluções, segundo discrimene eventual para os casos de discordância.
No direito brasileiro, se há pluralidade de testamenteiros, sem se dar qualquer ordem em que exerçam o oficio, o
que se há de entender é que foram nomeados como testamenteiros e conjuntos. A interpretação da cláusula
testamentária é que importa. Podem as funções ser separadas, pela matéria, ou pelo lugar dos bens. Nada impede
que haja funções separadas e funções conjuntas.
Se o testador nomeia testamenteiros em conjunto (e. g., “nomeio B e C meus testamenteiros”, “nomeio B, C e D
meus testamenteiros”, cf. 3ª Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 27 de julho de 1988, e 63
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 2 de setembro de 1949, 1?. dos 2’., 114, 670, e 88, 296), e eles
aceitam, não pode ser afastada a conjuntividade, salvo se algum deixa o cargo.
Se o testador disse “nomeio meu testamenteiro B, na falta, C, D ou E”, há sucessividade. Ou se disse “meu
testamenteiro E, C ou O”.
Os testamenteiros, nomeados sem a conjuntividade e sem distribuição de funções simultâneas, são sucessivos. É
isso o que se há de entender se há apenas a pluralidade, sem se afastar a conjuntividade. Porém, para essa
interpretação do Código Civil, art. 1.753, de modo nenhum se há de invocar parecença com o mandato, erro de
alguns juristas, em que também incorreu a 63 Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 24 de
dezembro de 1937 (A. J., 46, 273; 1?. dos 2’., 114, 751). O nomeado em segundo lugar somente pode assumir a
Testamentária se o primeiro se recusou ou não pode assumir, por incapacidade (2.ª Câmara Cível do Tribunal de
Justiça de Minas Gerais, 8 de fevereiro de 1947, E. E., 118, 495), inclusive por estar falido (2.0 Grupo de Câmaras
Civis do Tribunal de Apelação de São Paulo, 24 de julho de
1940).
Quando o juiz nomeia testamenteiro, não pode escolher inimigo do testador, ou pessoa que o testador de modo
nenhum nomearia, inclusive por ter interesses contrários à herança. A 2.ª Câmara Civil da Corte de Apelação de
São Paulo, a 22 de novembro de 1985 (E. dos 2’., 102, 610), considerou removível o testamenteiro que se tornou
inimigo do cônjuge sobre-vivente; mas, ai, o juiz tem de partir da verificação das circunstâncias, para saber se, in
casu, o testador o deixaria de nomear, ou se a inimizade seria causa para se reputar contra a nomeação pelo juiz,
ou contra a permanência, a vontade do testador, se vivo fosse. Por exemplo: o cônjuge sobrevivente casou-se com
pessoa inimiga do testador; a discordância grave entre o cônjuge sobrevivente e o testamenteiro consistiu em ter
aquele insultado a memória do testador, ou ter iniciado ou revelado vida imoral.
De modo nenhum se há de admitir que se afaste o testamenteiro nomeado pelo testador somente porque há
herdeiro necessário que o poderia ser (sem razão, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 26 de outubro de 1940,
1?- F., 126, 481).
No art. 1.761, o Código Civil fala de atribuições, além das que constam dos arts. 1.758-1.760, desde que o testador
lhas confira “nos limites da lei”. Assim, ao testamenteiro pode o testador outorgar poderes de vinculação
contratual para o acervo, desde que haja respeito da porção necessária, inclusive a que se inclui na função de
administrador regular. A admnistração pode ir além da partilha dos bens, uma vez que não se trata de herança
necessária. Se algum herdeiro legítimo, não necessário, ou testamentário, é absolutamente incapaz, ou ainda é
relativamente incapaz, está afastado enquanto o é.
Discutiu-se se o direito de acrescimento pode ser derivado de cláusula negocial entre vivos (a favor, e. g., L.
BORSAEI, Comentaco Codice Qivile, li, § 2.238; contra, e. g., V. VITALI, Delie Domiziofli, 278; G.
BORTOLAN, Dei Dírílto di accrescere, 185 s.). Mas ou há lei que o estabeleça, ou resulta de cláusula expressa,
que não seja contra a lei.
Quando se trata de legado, ou de ônus, o herdeiro necessário tem de dar a prova de que êle ofende, no todo ou em
parte, a quota hereditária. Se não o prova, incumbe-lhe cumpri-lo. (Já assim era, a propósito da Lez Falcidia,
conforme está em Caso, L. 17, O., de probatíoflibws et praOSUmPtiO nibus, 22, 3; cf. B. WINDSCHEm,
Lehrbueh des Pandektenrechts, II, 9ª ed., 382; GUSTAV Ka.WYSCHMAR, Erbrechtiiche Com pensation, 9.)
Se há conjuntividade, tem de haver acôrdo de todos os testamenteiros, salvo havendo urgência para que se evitem
danos ou perdas de bens ou de direito hereditário. O desacordo pode dar ensejo a que o juiz decida, ouvidos, se
preciso, os herdeiros.
A conjuntividade pode não ser integral. Então, o testamenteiro nomeia por exemplo testamenteiros conjuntos 3 e
C (e. g., B e a mulher), que serão substituidos por O e E (e. g., dois herdeiros). Aí, houve conjuntividade e
separação; portanto, com a mistidade, não se há de atender às regras jurídicas que concernem aos testamenteiros
conjuntos e aos testamenteiros separados.
Não é o testador obrigado a nomear testamenteiro o herdeiro, nem o cônjuge. Nem pessoa que lhes mereça a
confiança. É ato pessoalíssimo, de escolha íntima, que se funda no interesse do testador pelo cumprimento do que
quis (F. Rim em G. PLANCIC, Biirgerliches Gese.tzbuch, V, 886).
O testamenteiro, cuja nomeação pode ser feita, livremente, pelo testador, não é somente o que tenha de proceder à
execução das disposições relativas à parte disponível, ma~ também aquele a que apenas caiba cumprir cláusulas
da parte indisponível. Pode bem ocorrer que a nomeação constitua a única disposição testamentária: há deveres
legais, que justificariam, por si sós, tal designação, uns, eventuais, e outros, permanentes (F. RITGEN, em G.
PLANOR, Búrgerliches Cc.setzbnch, V, 886; R.ICHARD WILKE, Erbrecht, nota 1 ao -§ 2.197).
5. FORMA DA NOMEAÇÃO DE TESTAMENTEIRO. A nomeação pode ser feita em testamento (art. 1.753) ou
em codicilo (Código Civil, art. 1.653). Mas a disposição mesma, em que nomeia, não precisa, para valer, ser
explícita. Pode o testador não empregar a expressão “testamenteiro”, nem a outra, menos vulgar, “executor
testamentário” (F. REAGEM, em G. PLANOR, Rurgerliches Gesetzbuch, V, 886; cp. GEORG FROMMHOLD,
Das Erbrecht, nota 3 ao § 2.197) . Aqui, como em toda a matéria testamentária, mais se atende à intenção expressa
do que às palavras, rode haver confusão com a fidúcia, particularmente com a função do fiduciário no
fideicomisso, porém, nos fideicomissos, nas fidúcias, prima o mierêsse de outro, ao passo que, na designação do
testamenteiro, todo o interesse ou o principal interesse é o de cumprir-se o que se escreveu.
6. DESIGNAÇÃO DA PESSOA. Pode a nomeação referir-se à pessoa, ou a alguma dentre muitas, indicando a
maneira de se determinar. Mas, se o testador nomeia sem qualquer que caracterize o nomeado, ou deixando em
branco o lugar do nome, é como se nada tivesse escrito (E. RITGEN, em G. PLANCK, Búrgerliches Gesetzbuch,
V, 386).
7. TERMOS EM QUE PODE SER FEITA A NOMEAÇÃO. A nomeação de testamenteiro não precisa ser feita
com palavras solenes (OTTo WARNEYER, Kommentctr zum SOB., II, 1187) às vêzes, faz-se em tom de pedido,
de desejo, com breve ind i.. cação de funções que alguém exercerá.
Se o testador designa A, E e C, menores, seus herdeiros,e acrescenta “O (pai ou mãe) providenciará para que se
cumpra o que desejo”, chilro que nomeou testamenteiro, que é um dos menores, ou são os menores, a que se há de
dar o suplemento de idade.
Basta que o testador escreva: “e espero que A ordene todos os meus negócios” ou “cuide de tudo isso”: nomeou a
A testamenteiro (Hamburg Z. Ri., IV, 6237~.
Outras frases que importam nomeação: “dos meus herdeiros, A tem todos (ou plenos) poderes” (OTTO
WARNEYER, Kornmentar zum SOB., II, 1188) ; “mas, para a minha confiança, A”; “e A cuide disso”; “A
entregará todas essas coisas”.
Se o testador escreve em papel datado e assinado: meu filho A, para cumprir”, esteja ou não ligado materialmente
ao testamento, seja ou não achado no mesmo lugar, desde que a data seja posterior à do testamento, a nomeação
vaie por se tratar de codicilo.
Se o testador houver designado alguém para “cumprir os bens da alma e os legados”, tal incumbência equivale ao
pela execução do testamento, e deve entender-se nomeação para o cargo de testamenteiro (Côrte de Apelação do
Distrito Federal, de 28 de janeiro de 1917).
8. MODALIDADES DO ATO JURÍDICO DA NOMEAÇÃO. ~ Pode ser sob condição, suspensiva ou resolutiva,
a termo inicial, eu final, a nomeação de testamenteiro? O único argumento para negativa seria, por analogia, o do
art. 1.665 (designação de tempo), relativo à instituição de herdeiro. Mas, não só se trata de disposição fora do seu
tempo, retardatária para a idade do Código Civil, como também não se justificaria aplicar-se, extensivamente, à
nomeação de testamenteiro, como se não justifica, evidentemente, nas designações de legatários e de beneficiados
por modus. No direito alemão, embora não no preveja o Código Civil alemão, acolhe-se a afirmativa (E. RITN, em
G. PLANCK, Búrgerliches Gesetzbuch, 887; cp. Moíve, V, 220). Poderemos, com acêrto, seguir-lhe a trilha.
Porém não é pacífica a solução concernente ao nomear-se ~stamenteiro para uma só parte da herança. Em todo o
caso, opinião de ERE’rTNER (Das Recht, IV, 321), negativa, não Obtém aplausos, nem poderíamos aceitá-la.
Pensou que a possilidade se não conciliasse com o necessário entendimento e harmonia no executar, e argumentou
com a excepcionalide de tal discriminação funcional, de que citou, como exemplo, o § 285 da Lei alemã de
Falências. Sem discutir, F. RITCEN ‘recusou-lhe apoio e firmou o contrário (387). Ora, fácil, bem , é responder a
BRETTNER. Se podem ser nomeados dois mais testamenteiros, conjuntos ou separados, de maiores dificuldades
seria tê-los solidários, decidindo-se por maioria, que lhes traçar, precisamente, as funções, ou nomear-se só, para
algumas disposições testamentárias (talvez contra Cônjuge sobrevivo ou contra o herdeiro), deixando ao da ordem
legal (cônjuge, herdeiro instituído, herdeiro legítimo) execução do restante. Pode mesmo ser para um só ato, ou a
parte de um ou mais herdeiros (E. ENDEMANN, LehrtltCk des Bitrgerliehen Rechts, III, 41).
Se a nomeação se fêz na suposição, ou na esperança, de Qualquer circunstância, que se não realizou, ou não era
verdadeira, ou não ocorre, não poderá o testamenteiro assumir O Cargo (Motive, V, 225; E. MEISCHEIDER, fie
letztwilligen FROMMHOLD, Das Erbrecht, nota 3 ao § 2.197) . Aqui, como em tóda a matéria testamentária,
mais se atende à intenção expressa do que às palavras. Pode haver confusão com a fidúcia, particularmente com a
função do fiduciário no fideicomisso, porém, nos fideicomissos, nas fidúcias, prima o interesse de outro, ao passo
que, na designação do testamenteiro, todo o interesse ou o principal interesse é o de cumprir-se o que se escreveu.
6. DESIGNAÇÃO DA PESSOA. Pode a nomeação referir-se à pessoa, ou a alguma dentre muitas, indicando a
maneira de se determinar. Mas, se o testador nomeia sem qualquer que caracterize o nomeado, ou deixando em
branco o lugar do nome, é como se nada tivesse escrito (F. REAGEM, em O. PLANCK, Búrgerliches Gesetzbuch,
V, 386).
7. TERMOS EM QUE PODE SER FEITA A NOMEAÇÃO. A nomeação de testamenteiro não precisa ser feita
com palavra.% solenes (OrTo WARNEYER, Kommentar zum SOB., II, 1187); às vêzes, faz-se em tom de pedido,
de desejo, com breve indicação de funções que alguém exercerá.
Se o testador designa A, B e C, menores, seus herdeiros, e acrescenta “ (pai ou mãe) providenciará para que se
cumpra o que desejo”, claro que nomeou testamenteiro, que é um dos menores, ou são os menores, a que se há de
dar o suplemento de idade.
Basta que o testador escreva: “e espero que A ordene todos os meus negócios” ou “cuide de tudo isso”: nomeou a
A testamenteiro (Hamburg Z. .81., IV, 623)>
Outras frases que importam nomeação: “dos meus herdeiros, A tem todos (ou plenos) poderes” (OTro
WARNEYER,. Kornmentar zum SOB., II, 1188) ; “mas, para a minha cor. fiança, A”; “e A cuide disso”; “A
entregará todas essas coisas”.
Se o testador escreve em papel datado e assinado: “ao meu filho A, para cumprir”, esteja ou não ligado
materialmente ao testamento, seja ou não achado no mesmo lugar, desde que a data seja posterior à do testamento,
a nomeação vaie por se tratar de codicilo.
Se o testador houver designado alguém para “cumprir os bens da alma e os legados”, tal incumbência equivale ao
zelar pela execução do testamento, e deve entender-se nomeação para o cargo de testamenteiro (Côrte de Apelação
do Distrito Federal, de 23 de janeiro de 1917).
8. MODALIDADES DO ATO JURÍDICO DA NOMEAÇÃO. ~ Pode ser sob condição, suspensiva ou resolutiva,
a termo inicial, cu final, a nomeação de testamenteiro? O único argumento para a negativa seria, por analogia, o do
art. 1.665 (designação de tempo), relativo à instituIção de herdeiro. Mas, não só se trata de disposição fora do seu
tempo, retardatária para a idade do Código Civil, como também não se justificaria aplicar-se, extensivamente, à
nomeação de testamenteiro, como se não justifica, evidentemente, nas designações de legatários e de beneficiados
por modus. No direito alemão, embora não no preveja o Código Civil alemão, acolhe-se a afirmativa (E. RITGEN,
em O. PLANCK, Búrgerliches Gesetzbuch, V, 387; cp. Mo tive, V, 220). Poderemos, com acêrto, seguir-lhe a
trilha.
Porém não é pacífica a solução concernente ao nomear-se testamenteiro para uma só parte da herança. Em todo o
caso, a opinião de BRETTNER (Das Reeht, IV, 321), negativa, não obtém aplausos, nem poderíamos aceitá-la.
Pensou que a possibilidade se não conciliasse com o necessário entendimento e a harmonia no executar, e
argumentou com a excepcionalidade de tal discriminação funcional, de que citou, como exemplo, o § 235 da Lei
alemã de Falências. Sem discutir, F. HímEN recusou-lhe apoio e firmou o contrário (387). Ora, fácil, bem fácil, é
responder a BRETTNER. Se podem ser nomeados dois ou mais testamenteiros, conjuntos ou separados, de
maiores dificuldades seria tê-los solidários, decidindo-se por maioria, do que lhes traçar, precisamente, as funções,
ou nomear-se um só, para algumas disposições testamentárias (talvez contra o cônjuge sobrevivo ou contra o
herdeiro), deixando ao da ordem legal (cônjuge, herdeiro instituído, herdeiro legítimo) a execução do restante.
Pode mesmo ser para um só ato, ou para a parte de um ou mais herdeiros (F. ENDEMANN, Lehrbuch des
Búrgerlichen Rechis, III, 41).
Se a nomeação se fêz na suposição, ou na esperança, de qualquer circunstância, que se não realizou, ou não era
verdadeira, ou não ocorre, não poderá o testamenteiro assumir o cargo (Motive, V, 225; E. MEISCHEIDER, fie
letztwilligen inventariante, e da que cabe, ainda se houver inventariante estranho, aos herdeiros (art. 1.580) e aos
legatários já em posse; c) fora dos casos da letra a), o testamenteiro só é possuidor depois de entregues os meios
para cumprir as disposições testamentárias (art. 1.755, parágrafo único) - preliminarmente, é de grande risco
tomar-se a palavra posse, com que, várias vêzes, se pontilha o Código Civil, no sentido técnico dos arts. 485-523,
poder efetivo, onde o conceito excede o de corpus como, pela teoria, o de animus. Quanto aos arts. 1.572 e 1.580,
já ficou esclarecida a distinção. Fora dos arts. 485-528, a palavra posse tem sentido impróprio. Sobretudo, cumpre
não confundir possessio rei e hereditati.s possessio. O conceito de posse da herança é conceito à parte (KARL
KOBER, vou staudingers Komrnentar, ~fl, 4ª ed., 15). Se era testamenteiro o decujo e tinha o poder efetivo sôbre
algumas coisas, ou todas, isto é, se havia, com o assumir o cargo, entrado na posse dos bens, o herdeiro do
testamenteiro sucede nela, por farsa do art. 1.572 (KARL WIELAND, Das Sachenrecht, Kommentar zum
Schweizerischen zivilgesetzbttth de A. EGGER, IV, 496, ao art. 923 do Código Civil suíço), porque tal disposição,
como a do § 857 do Código Civil alemão, se refere a qualquer posse (KARL ICOBER, J. von Staudingers
Kommentctr, ~ 9•a ed., 38; contra: F. ENDEMANN, Lehrbueh des Búrgerlichen R.echts, II, § 35, 6). Não assim se
o testamenteiro não tinha entrado na posse efetiva das coisas (cp. MARTIN WOLFF, Sachenrecht, L.
ENNECCERUS, Ta. KiP~ e M. WOLFF, Lehrbuch des Búrgerlicheu Rechts, II, 15ed., § 12).
Pode ocorrer que o testamenteiro esteja na posse e administração da herança e isso não convenha aos herdeiros. A
lei permite-lhes a alternativa: requerimento da partilha imediata, o que supõe a descrição dos bens; “devolução da
herança” (isto é, da passagem aos herdeiros da posse imediata e da administração). Num e noutro caso, é
pressuposto indispensável habilitarem o testamenteiro com os meios necessários ao cumprimento dos legados, ou
caução de prestá-lo, e ao adimplemento de outros deveres, o que não está na letra da lei mas havemos de entender.
Se a posse imediata e a administração está com o inventariante, o testamenteiro não pode exigir-lhe caução (cf. 2•a
Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 6 de junho de 1938, 1?. dos T., 115, 180) : o que se confere é
o direito a exigir dos herdeiros os meios necessários ao cumprimento das disposições testamentárias e, se o
acionam os legatários, o de nomear bens da herança à execução.
Não poderemos recorrer, como decisivo, ao direito positivo do Código Civil alemão, porque entre o direito
brasileiro e êsse existe a diferença de partir-se, entre nós, a função administrativa, dando-se ao testamenteiro, em
regra, a de cumprir o testamento, e mandando-se preferir a êle, para a inventariança, o cônjuge meeiro, o herdeiro
que já tem o corpus e a administração, ou, até, o mais idôneo. Com isso, visivelmente se ante-põe e se prefere a
administração do herdeiro, quiçá. legítimo, à do testamenteiro (art. 1.579 e §§ 1.0, 2.0 e 3.0). Tal predileção mais
se acentua quando, ao permitir-se ao testador a nomeação do testamenteiro para inventariante (que tanto édizer:
dar-lhe “a posse e administração da herança”) ou para administrar, se excluiu tal possibilidade nos casos de haver
cônjuge (meeiro) ou herdeiros necessários (art. 1.574). Mas, se o direito positivo discorda., a teoria geral da posse
coincide, e dela devemos haver os elementos convincentes para as soluções relativas à posse dos testamenteiros.
Para bem clarear questão de tal sutileza, preciso é começar pelas situações iniciais do cargo. Já se disse que, antes
mesmo do termo, cabem ao testamenteiro funções administrativas (enterro, funerais, disposições imediatas,
inadiáveis). Disso lhe advém situação de posse, que lhe confere a qualidade de possuIdor de administração
(Verwaltungsbesitzer) ou Vertretungsbesitzer, possuidor de representação, como alguns preferem dizer. Evidente
posse, por força de autoridade que o testamento lhe conferiu, se bem que ainda sem cumpra-se.
No Brasil, como na Alemanha (F. HímEN em G. PLANGE, BiUrgerliches Gesetzbuch, V, 398, contra GEORG
MARCUS, Saúhsisches Archiv, VIII, 64, J. BijEM, Das Erbrecht des SOB., 186), a posse do testamenteiro não lhe
vem pelo fato da morte, nem pela simples aceitação do cargo. No Código Civil alemão. § 857, dispõe-se, como no
Código Civil brasileiro, art. 495, que a posse passa aos hardeiros, porém não se disse que passaria ao
testamenteiro. No Código Civil alemão, o § 2.205 usa termos explícitos: é autorizado a tomar posse da herança, in
Besitz zu nehmen. Não recebe a posse, tem direito a ir toma-Ia. Se o quer fazer, ou encontra herdeiro já em posse
dela, ou desamparada está, ou sob poder efetivo de outrem. No primeiro caso, encontrará toda a posse (digamos
assim) com o herdeiro e dependerá deste a entrada do testamenteiro. Se o conceder, nenhuma dúvida haverá.
Também nenhuma, se este herdeiro for inventariante e prontificar-se a dar ao testamenteiro os meios de cumprir as
disposições testamentárias, ou se der caução de prestá-los. Nesta caução, exerce o testamenteiro situação
possessória de credor caucionado.
Se o herdeiro, que está com o poder efetivo, não é inventariante, o testamenteiro não pode manter-se, por si só, na
posse (F. RITGEN, em G. PLANcK, Ehirgerliches Gesetzbuch, V, 898; cp. F. SECKT, Beitrag zur Leh,re vou der
Testamentsvollstreelcung, 54) : terá de ir ao juiz, para que lha dê.
Surge, aí, uma dúvida: se o herdeiro declara não ser da herança, ou se trata de sonegação (arts. 1.780-1.784) ou de
litigiosidade da posse, ~qual o juiz competente? No caso de sonegados, ter-se-á de propor a ação ordinária (art.
1.782), que cabe aos herdeiros, aos credores da herança, incluindo-se nestes o testamenteiro, que, sem o bem
testado, não poderá dar fiel cumprimento ao cargo. No caso de litigiosidade da posse, irão as partes ao juízo
comum (salvo, já se vê, se for aberta excepcionalmente a jurisdição, pela oposição de embargos). Como juiz do
testamento ou do inventário não será possível cogitar de discussão da posse, fundada em título que não seja o da
ordem processual do cargo e do inventário.
Se o testamenteiro a ninguém encontra com o poder fictício sôbre a herança, ou, o que vale o mesmo, encontra
alguém que lhe reconhece a função, entrará por si mesmo na posse. Se o terceiro se opõe, não se lhe pode negar o
direito a reclamar a posse (F. RITGEN, em G. PLANCK, Bitrgerliches Oesetzbueh, V, 398). Sem isso, ficaria
cercada de empecilhos a execução do munus, que se lhe deu. Depois da tomada efetiva da posse, será êle, em
relação aos herdeiros, possuidor imediato ou direto (art. 486). Na literatura alemã é o que se ensina (EMIL
STROHAL, Der Sachbesitz nach dem BGB., Jherings ,Jahrbiicher, 88, 21, E. SECK’r, Beitrag zur Lehre vo’n der
Testamentsvollstreekung, 56, GEoRG FIIoMMHOLD, Das Erbrecht, nota 8 ao § 2.205, E. RITGEN, em G.
PLANOR, Ruirger Licites Gesetzbueh, V, 898), e só A. WEISSLER (Das deutsehe Nachlassverfahren, 189)
considerou os herdeiros como possuídores “representados”. Mais demoradamente, cogitaremos disso a propósito
do art. 1.572.
Depois da posse, o testamenteiro fica como possuidor imediato, e os herdeiros como possuidores mediatos.
Esta é a construção certa e vitoriosa.
À diferença do Código Civil brasileiro, melhor foi a redação do Código Civil português revogado: evitou a
ambigúidade da palavra “posse”. No art. 1.895 declarava: “Se o testador deixar herdeiros legitimários, não podará
autorizar o testamenteiro para se apoderar da herança, mas só ordenar que esses herdeiros não possam tomar
conta dela, a não ser por inventário, com citação do testamenteiro”. No art. 1.896:
Se o testador deixar herdeiros não legitimários, poderá autorizar o testamenteiro, para que se apodere da herança,
mas não dispensá-lo de inventário”. Finalmente, no art. 1.897:
Os herdeiros, mencionados no artigo precedente, podem evitar a detenção pelo testamenteiro, entregando-lhe as
somas necessárias para suprimento das despesas a seu cargo”. Mas, ainda assim, não foi perfeita a terminologia, e
não poderia convir às modernas teorias de posse, que o Código Civil alemão, o Código Civil suíço e o Código
Civil brasileiro consagram.
No Código Civil português de 1966, o art. 2.836, c), cogita das funções de cabeça-de-casal, que pode vir a ter o
testamenteiro, conforme o art. 2.080, 1, b). A administração da herança, até à sua liquidação e partilha, pertence ao
cabeça-de-casal. No art. 2.087, 1, precisa-se: “O cabeça-de-casal administra todos os bens hereditários, e ainda os
bens comuns do falecido, se o cônjuge meeiro se escusou ou foi removido do cargo”.
11.CAsoS QUE ESCAPAM ÀS LIMITAÇÕES LEGAIS. Ainda que haja cônjuge meeiro, ou herdeiros
necessários, o testador pode ordenar, dentro da parte disponível:
a)A entrega imediata de certos bens ao testamenteiro o que constitui Posse e administração porém sem a
continuidade das posses que se dá entre o testador e os herdeiros. Na espécie, o cônjuge meeiro ou os herdeiros
necessários, sujeito.g da herança, instantaneamente recebem a posse imediata, e transferem-na ao testamenteiro,
no tempo em que o quis o testador. Trata-se de acontecimento que se não subsume nos casos vedados pelo art.
1.754 do Código Civil.
b) Se for interdito ou estiver ausente em lugar remoto, ou não sabido, o cônjuge, ou o herdeiro necessário, ou em
cárcere por mais de dois anos. Quanto ao cônjuge, por expressa disposição de lei, que dá, em tais casos, à própria
mulher, em vida do marido, a administração dos bens (Código Civil, artigo 251). Quanto aos herdeiros, porque: a)
interditos, não podem administrar (têm a possessio rei, arts. 495, 496 e 1.572, porém não a possessio h,ereditatis) ;
b) em lugar remoto ou não sabido, não podem exercer, ipso facto, os atos de administração; c) em cárcere por mais
de dois anos, porque, se é motivo bastante para tirar ao marido a administração, também o é em situação análoga
de co-divisão, qual a da herança (herdeiros necessários + herdeiros instituidos ou testamenteiro).
12.ATas QUE O TESTAMENTEIRO PODE PRATICAR. O testamenteiro pode, em virtude da sua função parcial
ou total
a)Denunciar a locação do prédio testado, com fundamento na morte do locador (E’. HERZFELDER, Erbrecht, J.
von Staudingers Komentar, V, 9~a ed., 680; On’o WARNEYER, Kommentar, II, 1195).
b)Se o testador mandou que a casa comercial fosse liquidada e o testamenteiro, que o promove, cumprisse os
legados, está legitimado para os atos necessários, inclusive perante os oficiais de registo (cp. BONDI, Der
Testamentsvollstrecker des Kaufmanns, Zentralblatt fitr Handetsrecht, 308 5.; DtYSTERBICIC, nota ao escrito de
BONDI, Zentralbkttt fhir Handelsrecht, 112 s.).
e)Contratar consigo mesmo em nome do herdeiro (em quaisquer casos, se lho não veda a verba testamentúria, E’.
LEoNHAR», em GEORO FROMMHOLD, Erbrecht, Kommentar zum RGR., 2•a ed., nota III, C, 4, ao § 2.205, e
jurisprudência), se está compreendido ou resulta do que ordenou o testamento.
d)Quitar-se da hipoteca ou de outro débito; mas a averbação ou baixa nos registos lhe é vedada (cp. JOSEP
RORLER, no Der ~e~waltungstestamentsvollstrecker, Seufferts RltLtter. 73, 72, e a jurisprudência, F.
HERZFELIYER, Erbrecht, J. von Staudingers Kommentar, v, 9a ed., 686).
Se são muitos os testamenteiros, não conjuntos, não há contrato consigo mesmo; se conjuntos, deve-se entender
que cada um está excluído da decisão no caso próprio. Se só um, a questão é mais de interpretação das
disposições testamentárias. No entanto, rigorosamente, no caso de dúvida, pode, se o contrato cumpre as verbas
testamentárias. (O testamenteiro
1
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não é representante do herdeiro.) Os recursos legais são os que a lei permite contra o mau cumprimento das
cláusulas testamentárias
Porém testamenteiro não pode contratar consigo mesmo o serviço de advogados dos herdeiros, em nome destes,
abuso contra o qual tenazmente lutamos, quando éramos juiz. Se lhe deram poderes para contratar advogado, sem
dizer o quanto que pagariam, os serviços, que prestar, serão pagos pelos herdeiros amigavelmente, mediante a
conta de honorários, ou cobrados em ação competente. Estipular percentagem ou quantia, em nome dos
mandatários, consigo mesmo, não é permitido. Nenhuma faculdade tem o juiz do inventário ou do testamento de
mandar contar honorários sôbre os quais não f alaram as partes ou seus representantes.
13. ATOS QUE O TESTAMENTEIRO NÃO PODE PRATICAR. Não são exercidos pelo testamenteiro, e isso em
virtude da própria natureza pessoal de tais direitos:
a)O direito de revogação da doação, no caso de morte
do doador pelo donatário. (O Código Civil, art. 1.185, diz que o direito de pleitear a revogação não se transmite
aos herdeiros, que apenas continuam a ação se já contestada a lide. ~ E se a causa da revogação por ingratidão foi
a morte do doador?
Já tratamos do assunto no Tomo XLVI, ~ 5.024, 3 e 9.)
b) As ações de exclusão por indignidade (Código Civil, arts. 1.595-1.602). São legitimados a tais ações os que têm
interesse na sucessão (art. 1.596) : o testamenteiro, só por ser testamenteiro, não no tem (BRETTNER, Der
T’estamentsvollstrecker nach neuem Deutschen Recht, Archiv flir biirgerliches )?echt, 17, 223 s.).
e)A aceitação ou renúncia da herança no caso do artigo 1.585. É a opinião vitoriosa, com O. PLANCK
(Rurqerliches Gcsetzbuch, v, 3.~ ed., 577, 19), F. HERZFELDER (Erbrecht, J. von Staudingers Komrnentar, V, 9•a
ed., 680) e OTTo WARNEYER (Kommcntar, II, 1195), contra EMIL STROHAL (Das
deutsche Erbreeht, 3ª ed , § 40, a, nota 14), E. LEONHARD (GEORO FROMMROLO, Erbrecht, Kommentar
zum ROR., 2ª ed., 347, C, 3), e TRPÚoDoR Kín’ (L. ENNECCERUS, Lehrbuch de.Búrgerlichen Rechts, II, 3,
387, III).
r
§ 5.959. POSSE IMEDIATA
d) O direito de reclamar contra o uso indevido do nome (Das Recht, 21, n. 2.319). Salvo em questões patrimoniais,
que lhe caibam pela administração ou posse.
e)Nos Códigos Civis que admitem o herdeiro convencional, as ações contra as doações em fraude (1?. O. Z., ‘77,
5).
No Código Civil, art. 1.133, 1, veda-se ao testamenteiro a aquisição, mesmo em hasta pública, de bens confiados à
sua guarda ou administração. Todavia, pode o testador designar bens destinados à execução de disposições
testamentárias, inclusive despesas, impostos e custas, e permitir que os adquira o testamenteiro, conforme as
avaliações, para satisfazer o que se dispôs no testamento (1% Turma do Supremo Tribunal Federal, 11 de
novembro de 1946, 11. P., 109, 395). Para isso, é preciso que de modo nenhum esses bens tenham de caber,
mesmo em parte, no quinhão de herdeiro necessário. CI’.
3. DURAÇÃO DA POSSE IMEDIATA. Desde que o testador manda entregar todos os bens ao testamenteiro,
dando-lhe a posse imediata, em relação aos herdeiros e legatários, não pode escusar-se, ainda que o quisesse o
disponente, de fazer inventário dos bens da herança. Se assim não fosse, não seria possível apurar-se-lhe a
responsabilidade na prestação de contas, a que êle é obrigado, sem dispensa possível (Código Civil, artigo 1.757).
No Código Civil brasileiro, a posse imediata pode abranger móveis, imóveis, parte da herança, ou toda ela. Não se
dava o mesmo no Código Civil italiano revogado, onde só se havia de exercer sôbre os móveis e não podia durar
mais de um ano (art. 906). No Código Civil italiano de 1942, artigo 708, alínea 2,a, corrigiu-se a limitação, e está
dito, claramente:
.... . salvo contraria volontà dei testatore, egli deve amndnistrare la massa ereditaria, prendendo possesso, dei beni
che ne famo parte”. No brasileiro, pode durar o tempo que fixar o testador. ~ Se a esteuder de modo injustificável,
para além das vidas dos beneficiados? Não se invoque o direito dos herdeiros, porque tal posse imediata somente
ocorre não havendo herdeiros necessários, e os outros, mesmo legítimos, podiam ser excluídos pelo testador.
Quem da propriedade pode refugar-se não admira que o seja da posse imediata. O mesmo quanto aos legatários.
Resta o cônjuge meeiro, porém não cabeça-de-casal, devido à extravagância do ad, 1.579, § 1.0, que exige à
mulher sobrevivente (dona, ex hypothesi, de parte ideal dos bens, tão proprietária, portanto, como o era o
falecido), para ser inventariante, o estar vivendo, ao tempo de óbito, com o marido. A assimetria, que deriva do
espírito patriarcalista, é destoante dos arts. 394 e 889 e de outros pontos, assaz expressivos, do Código Civil
(nosso Fontes e Evolução do Direito Civil brasileiro, 25). Como se vê, a dificuldade nasce do defeito da lei, mas,
se o testador atribuiu posse imediata ao testamenteiro e esta excede seis meses (arg. do artigo.762; Código de
Processo Civil, art. 544, § 2.0), claro é que ofende o direito da mulher condômina.
1. PRECISÕES. A matéria do Código Civil, art. 1.755, discrepa, essencialmente, da que se vê no parágrafo único.
Para obviar ao inconveniente de comentá-los em conjunta, por serem casos opostos, tivemos de separá-los em
títulos autônomos. No artigo, figura-se o testamenteiro com o poder fáctico, a posse imediata dos bens, aliás, no
caso, todos ou quase todos (pode haver posse imediata e administração de parte da herança, que não justifique o
cargo geral de inventariante). No parágrafo único, versa-se a espécie do testamenteiro sem a posse imediata e a
administração dos bens com que há de cumprir a Testamentária.
2. MEIOS DE CUMPRIR. Se o testamenteiro não é inventariante, cabe-lhe exigir dos herdeiros os meios de
cumprir as disposições testamentárias: a) se elas consistem em legado de coisa certa, requererá a entrega, a êle,
testamenteiro, para levar ao legatário, ou diretamente a êsse; b) se consiste em dinheiro (legado ou modús que
seja), exigirá, com requerimento dentro do inventário, ou intimação do herdeiro, se aquele não se abriu, a quantia
devida, ou a caução de prestá-la; o) se, havendo inventário, não houver dinheiro bastante para despesas da
Testamentária, e não quiserem, ou não puderem os herdeiros adiantar as somas (se os legatários o demandarem),
nomeará à execução bens da herança, o que poderiam fazer se ainda não se inventariaram os bens, ou, antes de o
demandarem, mas em tempo de serem cumpridas as disposições testamentárias (legados, deixas, modais, etc.),
poderá requerer, nos autos, a venda de bens que bastam. Nesse momento, cabe ao inventariante designar os bens
que devem ser vendidos, ouvidos os interessados. Se êle e os herdeiros não designarem, designá-los-á o
testamenteiro. Se ocorrer desacordo, designa-os o juiz.
4.TRANSMISSÃO HEREDITÁRIA DA POSSE. A posse passa aos herdeiros. Resta saber se a posse dos
testamenteiros passa aos seus herdeiros. EMIL STROHAL (Der Sachbesitz nach dem BGB., Jherings Jahrbúcher,
97 s.) entendia que é exceção ao princípio, uma vez que se não transmite a posse própria. Mas a verdade é que tais
herdeiros, assumindo a posse dos bens do testamenteiro, e tendo deveres e direitos, inclusive o de providenciar
para as medidas urgentes, continuam em situação de posse. Aquela atinência ao direito legitimante (das zur
Desitzherrsehaft legitimierende Rechi) deslocaria o problema para terreno estranho à posse. O que se não
transmite é o dever de custódia (Gcwahrsam), no sentido do direito criminal, e os deveres dos servidores da posse.
A posse do testamenteiro transmite-se aos seus herdeiros <JOHANNES BIERMANN, Dois Sachenrecht, 33- ed.,
21, b; M. GREIFF, em G. PLANCK, Biirgerliches Gesetzbuch, ~JJ, 13-23- cd., 40 s.; E. BRODMANS, em G.
PLANCK, Kommentar zum Duirgcrlichen Cesetzbuch, III, 43- cd., 58).
Para que o herdeiro do testamenteiro tenha a posse Imediata (direta dos bens que estavam com o testamenteiro), é
preciso que, ao tempo da morte dele, não houvesse perdido o poder fáctico. Do contrário, não seria transmissão,
mas aquisição da posse imediata pelos herdeiros do testamenteiro (HUCO RRESS, Besitz uud Rechi, 189).
Quanto à posse mediata por exemplo, se o testamenteiro alugou o prédio (testamenteiro possuidor mediato,
locatário possuidor imediato ou direto, em relação a êle), caso em que possui, mediatamente pergunta-se: ~ os
seus herdeiros sucedem-lhe na posse mediata?
EMItI STROHAL (Das deuteche Erbreeht,~ 33- ed., 73 s.) e HUGO KRESS (Besitz und Reeht, 218) entenderam
que a posse mediata depende da posição jurídica, oriunda do cargo, e lhe segue o destino. É querer distinguir onde
não cabe: a posse dos testamenteiros, administrativa num e noutro caso, transmite-se aos seus herdeiros.
2. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.756: “O testamenteiro nomeado, ou qualquer parte interessada,
pode requerer, assim como o juiz pode ordenar, de ofício, ao detentor do testamento que o leve a registro”.
4.DEFEITO DE COLOCAÇÃO. Está fora de lugar o artigo 1.756 do Código civil: não é atribuição do
testamenteiro, que justificasse deixar-se ao último capitulo da sucessão testamentária, o que constitui, em verdade,
o primeiro fato da vida dos testamentos, a apresentação e mais do que a apresentação, o requerer ao juiz que se
intime o detentor a apresentar o testamento. Tão longe do lugar próprio está o artigo que, ao se chegar a êle, já se
lhe sente a ociosidade. Falou-Se em formas de testamento e maneiras de cumpri-lo (artes. 1.644 e 1.655), na
revogação dos testamentos, e só agora se cogita da intimação para apresentá-los.
5.DIREITO ANTERIOR. Diziam as ordenações Filipinas, Livro i, Título 62: “8. E os Provedores terão especial
cuidado de fazer cumprir as vontades dos defuntos. E tanto que forem em cada lugar de sua Provedoria, mandem
com juramento dos evangelhos a todos os Tabeliães e Escrivões do lugar e termo, que lhes mostrem todas as notas,
testamentos, Cédulas e Codicilos, que tiverem, sem sonegar algum, sob pena de privação dos Ofícios, para por
eles verem o que ao Resíduo pertence~ e o mandarem arrecadar na maneira adiante declarada. Os quais darão de
vinte cinco anos atrás, não sendo já tomadas as contas por eles Provedores, ou por outro Oficial, que para isso
poder tivesse; e aos Tabeliães e Escrevais mandarão pagar por cada uma nota e escritura, em que houver Resíduo,
quatro réis, e das em que não houver Resíduo, não haverão cousa alguma. E perguntarão por juramento quaisquer
pessoas, que tiverem por informação, que sabem algumas cousas, que pertencem à execução de seus carregos. 9. E
mandarão pregoar, que todos os Testamenteiros e pessoas outras, que tiverem carregos de cumprir testamentos,
lhos vão mostrar, e os inventários das receitas dos bens dos defuntos, e as despesas, que dele fizeram. E isso a um
certo tempo, que logo lhe assinarão, segundo for o lugar, em que estiverem, sob pena de perderem o prêmio, que
no tal testamento lhes for deixado, e mais pagarem vinte cruzados, a metade para nossa Câmera, e a outra para
quem os acusar”.
6. LEGITIMAÇÃO ATIVA SEGUNDO A REGRA JURÍDICA. 1. Podem requerer a intimação do Código Civil,
art. 1.756:
a)O testamenteiro e o inventariante.b)O Curador de Resíduos, de Ausentes ou de Órfãos.e)O cônjuge meeiro, ou
cônjuge que tenha interesse
provável no testamento. Nada obsta a que se defira a petição de cônjuge sobrevivo que afirma haver testamento:
ainda que nenhum bem seja comum, é de presumir-se o interesse do cônjuge não desquitado no cumprimento do
testamento. Vivendo sob o mesmo teto, em comunhão de sentimentos e atos, deve ter informes seguros e saber
quais os intuitos do testador. Quando éramos juiz, deferimos, certa vez, o próprio requerimento de cônjuge
desquitado, que alegou ter estado durante os últimos momentos com o falecido e ter-lhe ouvido onde se achava o
testamento. A aparição do testamento é de interesse público.
d) Os herdeiros.
e) Os legatários.
f) Os beneficiados pelo motins ou por outro qualquer meio.
g) Os credores.
h) Todo e qualquer interessado (SAMUEL STRYK, Usus moderni Pandectarum specimen, 10a ed., 43, 5, § 1).
Pôsto que a lei fale em parte interessada, não se deve levar a extremo rigor, tanto mais quanto se permite a
intimação de ofício.
II. Também podem requerer a intimação:
a) O herdeiro legítimo, se deserdado, ou preterido, para impugnar o testamento.
b)O herdeiro legitimo ou testamentário de outro testamento, que quiser propor a ação de invalidade ou de
falsidade. O interesse está na urgência para que não pereçam as provas. Foram exemplos de J. F. DE RETES e
ANTÔNIO PEREZ, mas ambos cabem na classe 1, da enumeração supra. Contudo, no caso de 1, b), é mais
própria a ação de exibição ou o interdito exibitório, que desde séculos a praxe reconhece (MANUEL DE
ALMEIDA E SOUSA, Tratado enciclopédico, compendiário, prático e sistemático dos Interditos, §§ 85 e 93).
7. AÇÕES POSSÍVEIS. Além da intimação do Código Civil, art. 1.756, podem ser intentadas as ações de
reivindicação e de exibição e as ações possessórias. Certo, hoje, com o arquivamento obrigatório das cédulas
testamentárias, e registo, não fica em mão do testamenteiro ou dos herdeiros o testamento. Mas não quer isso dizer
que se excluam tais ações, quer nos casos gerais, quer no especial de haver verba de segredo, que o juiz mande
conservar. Exemplo: no testamento do comerciante, a instrução que êle deixa para o caso de esperada crise do
estabelecimento e o modo de resolvê-la.
Demais, o art. 1.756 não dá penas: hão de ser a de perda do prêmio, se o intimado for o testamenteiro, e a de
desobediência. Ora, nas outras ações têm os interessados mais eficaz garantia para os seus interesses. A pena
pecuniária das Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 62, § 9, e da Lei de 7 de janeiro de 1692, § 5, estava em
desuso: o Código Civil não a consignou, mas, assunto processual, podiam consigná-la leis de processo civil, e,
hoje, a lei processual.
A legitimação a que se exija do herdeiro, ou legatário, ou outro beneficiado, a declaração de aceitar, ou não, a
herança, não é somente de outro herdeiro, ou outro legatário, ou outro beneficiado, ou credor da herança. Seria
erro negar-se ao testamenteiro tal direito à declaração, como se fêz, no passado, aos próprios legatários (e. g., A.
BRINZ, Lekrbuch der Pandekten, 814 5.; fl~, 2Y~ ed., § 887, nota 6; HEINRICE DERNBURG, Pandekten, III, §
164, 12; contra, L. ARNIYrS, Lehrbuch der Pandekten, § 509, nota 3; A. DEDEKIND, Das Deliberationsrecht
des Erben unti die interrogationes in iure faciendae, 87 5.; cp. JULIUS MEYER, tYber das Recht dritter
Personen, deu Delaten zur Erkldrung ilber die Annahme der Krbschaft durchden Ricliter der freiwilligen
Gerichtsbarkeit mc nõtigen, 5 s.).
O Testamenteiro tem interesse ligado à sua função, portanto interesse próprio, que se estende mesmo às ações
relativas à herança intestada, como se dá no caso de se saber se o cumprimento de alguma cláusula testamentária
ofenderia a porção necessária.
8.AçÃo DE Exibição DO TESTAMENTO. Se, intimado, o detentor do testamento, não o leva a juízo, pode o
testamenteiro requerer a exibição, bem como, de ofício, o juiz ordená-la. ~ a ação de tabulis exhibendis, de que os
juristas reinícolas, fundados no direito romano, sempre usaram, pois o reter em seu poder, ou em sua casa, o
testamento, constitui dolo: dolo maIo desierit tabulas pene se habere (ANTÔNIO DE SOUSA DE MACErO,
Decisiones Supremi Senatus Justitiae Lusitaniae et Supremi Concilii Fisci, XI, 8, 40).
A ação de exibição não se confunde com a simples intimação do art. 1.756. Mas, desde que o juiz apõe a pena. e.
g., “ser condenado no interesse”, é ação de exibição (porém supõe o rito da lei processual).
Exerce-se contra quem detém ou possui, ou dolosamente deixou de deter ou possuir. O autor prova: que o
testamento estava ou está com o réu, e se deixou de estar o foi por dolo. As presunções bastam.
Pode cumular-se com a de reivindicação do testamento. Com a de reconstituIção do testamento extraviado ou
destruído sem o ter sido por vontade do testador, exercida contra o detentor e os herdeiros legítimos, não se
cumula; mas pode propor-se em alternativa, “ou exibe, ou corre por sua conta a reconstituIção”.
O legatário só tem direito de exibição quanto à cláusula relativa ao seu legado ou outras que com ela se liguem
(claro que supomos testamento com segredo).
9.REGRAS JURÍDICAS COMUNS À INTIMAÇÃO E AOS REMÉDIOS JURÍDICOS EXIBITÓRIOS. O réu
não pode alegar nem entrar na apreciação da validade ou eficácia do testamento. Nem opor que são muitos, ou
anterior ao que está em poder de outrem ou em juízo. Velha lição de J. F. DE RETES: “neque de eo distinguitur,
utrum iustae, an iniustae sint Tabulae, plures, ai~ una, primae, an postremae, omnes enim exhibendas esse”. Se o
testador era incapaz, se há vícios intrínsecos, se está infirmado (Código Civil, art. 1.747, parágrafo único),
revogado (arts. 1.749, 1.746 e 1.747), rôto (arta. 1.750 e 1.751),
•ou caduco, não pode invocá-lo o réu para se eximir à exibição. Os tratadistas de interditos diziam que o interdito
cessa se o testamento tem vícios extrínsecos, e. g., falta-lhe a assinatura do testador ou das testemunhas. Devemos,
contudo, entender que os remédios jurídicos se cumprem e o juiz, examinada a cédula, manda cessar. Se, por
exemplo, o detentor era proprietário do escrito (comprou-o, em leilão, aos herdeiros ou ao própro testador), ser-
lhe-á entregue. Bem assim, quando possuidor; porque, cessada a eficácia do remédio jurídico exibitório, reter em
juízo a cédula seria tirar-lhe a posse.
Para a prova do interesse, basta idônea afirmação em juízo: “in praxi tamen observandum est, sufficere has
probationes esse summarias, imo de interesse partis sufficit ipsius iurata assertio, si alia probatio non suppetat”.
Se no testamento nada for deixado ao autor, e nele houver coisas de segredo, só ao juiz deve ser mostrado (JosÉ
HOMEM CORREIA TELES, Doutrina das Ações, ed. de PONTES DE MIRANDA, § 286, nota).
10. DEvER DO TESTAMENTEIRO. Se bem que o art. 1.756 do Código Civil diga “pode requerer”, deve
entender-se que o testamenteiro, sabendo que o é, e que outrem detém o testamento, deve providenciar para que o
apresente.
1. DEVER DE CUMPRIR. No art. 1.757, o Código Civil cogitou do dever de cumprir as disposições
testamentárias e do dever de prestar contas, de que também tratam os artigos 1.758 e 1.759. A sistematização do
dever de prestar contas pode fazer-se a propósito de outros artigos. O dever de pugnar pela validade do
testamento é objeto do art. 1.760. Do prazo para cumprir, tratam os arts 1.757 e 1.762.
2. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.757: “O testamenteiro é obrigado a cumprir as disposições
testamentárias, no prazo marcado pelo testador, e a dar contas do que recebeu e despendeu, subsistindo sua
responsabilidade, enquanto durar a execução do testamento”.
8. ELABORAÇÃO. No Projeto revisto, art. 2.126: “Os testamenteiros são obrigados a cumprir as disposições
testamentárias no prazo marcado pelos testadores; e a dar contas do que receberam e despenderam?. A isso, que
era o direito anterior (TEIxEIRA DE FREITAS, Consolidação, art. 1.099), acrescentou a parte final a Comissão da
Câmara, em 1902 (Trabalhos, VI, 517).
4.NATUREZA DO CARGO DE TESTAMENTEIRO. Já vimos que o testamenteiro exerce o seu cargo, não
público, sem representar o decujo, a herança, os herdeiros, ou co-interessados,
de direito próprio e por farsa da última vontade e da lei, ou só da lei para cumprimento das últimas vontades de
alguém.
É autorizado a todos os atos que sejam prática e juridicamente necessários para a execução do testamento. Para
isso, pode receber um bem, em adjudicação judicial, e êle mesmo dar a nota ao oficial de registo para transferir
diretamente no nome do herdeiro ou legatário: a transcrição será do cálculo julgado, mais a verba testamentária
que vai cumprir, com os esclarecimentos que êle, próprio nomine, pode prestar. Há transferência a êle, fiduciária;
não paga impostos, nem precisa ela de registo, porque a Testamentária é um cargo.
Nas discussões de direito dentro da porção legítima (e. g., se A recebe como filho legitimado ou como
reconhecido), o testamenteiro não precisa ser ouvido (Oiro WARNEYER, Kommentar, II, 1186), nem é legitimado
a isso. Salvo excepcionalmente: se a discussão envolve a de saber se o testador excedeu ou não a parte disponível..
O testamenteiro é legitimado a defender o espólio, principalmente se há falsas dívidas ou interpretações do testa-
mento prejudiciais a herdeiros testamentários ou a legatários (83 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, 22 de novembro de 1947, OD., 52, 206). Casos há em que se não justifica a intervenção do testamenteiro.
5.QUANDO COMEÇAM OS DEVERES DO TESTAMENTEIRO. Os deveres do testamenteiro não começam
somente da aceitação do cargo. Esta, em verdade, é a regra; mas casos há em que, antes da aceitação, o
testamenteiro teve conhecimento das disposições testamentárias, ou seja pela nomeação e no momento dela ou da
publicação (F. HERZFELDER, Erbrecht, J. von Staudingers I<ommentar, v, 9~ cd., 673; cp. E. MEIScHEIDER,
fie letztwiltigen Ver fúgungen nctch dem 8GB., 470), ou pela notificação oficial (leitura na ocasião de se abrir), ou,
até, pela correspondência entre o testador e o testamenteiro, ou entre herdeiros e êle. Da ciência, e não da
aceitação, começam os deveres: quem vai aceitar um cargo, desde o momento que principiam as funções deve
velar por êle. Claro que isso não se da se há nomeação com a condição suspensiva ou com o termo inicial.
6.CUMPRIMENTO DOS TESTAMENTOS E CONTEÚDO DAS DISPOSIÇÕES. Não importa qual o conteúdo,
econômico ou não econômico, desde que lícito, da disposição testamentária. Cabe ao testamenteiro executá-la.
Os meios para executar o que no testamento se ordena são os da herança, e não os próprios (cp. E.
MEISCHEIDER, fie letztwilligen Verfilgungeu nãoh dem 8GB., 489) ; e, se ocorre, por exemplo, o caso do art.
1.679, duas qualidades tem êle: testamenteiro, legatário. Mas, se o legatário em tais condições for outrem, cabem-
lhe as medidas para realizar o que o testador quis.
Em regra, a conseqüência do art. 1.679 não importa em perda da Testamentária. Porém isso pode resultar da
vontade do testador, o que desloca para o terreno da interpretação o problema sugerido.
Se o testador disse: “nomeio testamenteiro a A, que tem de cumprir tudo que consta do meu testamento, inclusive
ceder 100 ações da Companhia B para completar a legitima do meu filho C”, claro que o nomeado recusando-se a
isso não pode pretender a Testamentária. A aceitação não pode ser sob condição ou a termo, mas à nomeação não
se proíbem condições e termos.
O testamenteiro deve executar as vontades do testamento, ainda contra o parecer unânime dos herdeiros. Se há
divergência, recorre ao juiz. Se depende de tempo, enquanto não for decidido, não deve executar, podendo, para
que esta espera não se dilate em demasia, marcar prazo aos interessados (BUGÊNE CURTI-FORRER,
Commentaire dii Code Civil SUiSSÚr 410), ou requerer ao juiz que o marque, intimados aqueles a que interessa o
exame da validade ou a interpetação.
10.INSUFICIÊNCIA DOS BENS PARA CUMPRIMENTO DOS LEGADOS. O testamenteiro não é obrigado a
denunciar a insuficiência dos bens para o cumprimento dos legados antes de se verificar tal insuficiência. Mas,
ouvido para dizer se cabe, tem de fazê-lo, ainda sumariamente, e responde pelo que disser. Se, ouvido o
inventariante, o testamenteiro apuser: “De acordo com o inventariante”, respondem solidariamente. Ocorre o
mesmo quanto ao “Nada oponho” e ao ‘7. J.” do Curador. Exime-se da responsabilidade quando diz: “De minha
parte, em princípio, não me oponho; se é verdade a informação do inventariante, concordo”. Porque a pessoa que
administra é precipuamente obrigada a informar, inclusive quanto às circunstâncias ocasionais (baixa de títulos,
falências de devedores do espólio, ações perdidas, etc.).
11.MATÉRIAS SÔBRE AS QUAIS NÃO É PRECISO FALAR O TESTAMENTEIRO Sôbre os direitos regidos
pela lei de sucessão legítima não é ouvido o testamenteiro, porque a parte indisponível é metade do monte partível,
e nada importam os denominadores e numeradores das frações. Salvo: quanto ao artigo 1.723 do Código Civil;
quanto à existência ou não de herdeiros necessários; quanto aos arts. 1.726-1.728. Em verdade, tudo isso é de
ordem testamentária.
Se o testamento não cogita de um herdeiro e este intenta ação de herança ou de filiação, só é indispensável que êle
figure se está em causa a validade ou eficácia do testamento ou de algumas das verbas.
Quando estiver em causa ou em via de satisfazer-se interesse pessoalíssimo do herdeiro, ainda que oriundo de
disposição testamentária, atender-se-á ao que opina o interessado.
1.FUNÇÃO DE TESTAMENTÁRIA. Pela natureza do encargo de testamenteiro, tem êle de prestar contas. Se a
Testamentária fosse simples mandato, seria simples prestação de contas aos herdeiros e legatários. Porém não no
é. Daí a indis
r
§ 5.968 PRESTAÇÃO DE CONTAS
97
pensabilidade de se fazer audicialmente, sendo magna pars o Curador de Testamentos.
Quem quer que percorra o capítulo sôbre testamenteiro, nota que em nenhum artigo o Código Civil fêz alusão, ou
remissão implícita, aos institutos do direito das obrigações (mandato, gestão de negócios e comissão).
A Testamentária constitui matéria exclusiva do direito sucessório. Sanções ou regras jurídicas dos outros ramos do
direito só se invocam, em princípio, para se resolverem problemas surgidos com a deturpação ilegal do instituto.
2. OBRIGAÇÃO DE PRESTAR CONTAS. A lei exige que o testamenteiro preste contas. Disso não podem
dispensá-lo os juizes, nem os testadores, nem os interessados. Tanto é cargo a Testamentária.
A Testamentária não se transmite hereditariamente, mas passa aos herdeiros do testamenteiro a obrigação de
prestar contas, como se fossem o testamenteiro, e dentro das forças da herança deste.
Pelo caráter de cargo, nula é a prestação de contas em que não foi ouvido o Curador de Testamentos.
Por se tratar de ato em que está em causa o interesse do testamenteiro, que é o de exonerar-se das
responsabilidades, a prestação de contas pode ser feita por procuração, com poderes especiais.
Não se trata de desempenho de funções testamentárias. Demais, se o procurador não as presta bem, não serão
aprovadas as contas. Sempre se entendeu assim (Relação da Bahia, 15 de janeiro de 1853).
No direito brasileiro, o cargo de testamenteiro conservou os mais puros caracteres: na própria quotidiana praxe, as
prestações de contas são mais entre êle e o Curador, perante
o Juiz, do que entre êle e os interessados. Certo, ouvem-se herdeiros instituídos, legatários e beneficiados; mas o
uso é trazer o testamenteiro as quitações, as certidões das gravações, ou das transferências de imóveis, ouvir-se o
Curador, que as confere com as verbas, segundo a interpretação que foi dada, e aprová-las o Juiz desde logo, ou
exigir melhores provas, outros documentos, ou quitações por termo nos autos, antes de as julgar boas e bem
prestadas.
98
1
3.EM QUE CONSISTE A PRESTAÇÃO DE CONTAS. Na prestação de contas são apreciados: a) os atos de
execução das cláusulas testamentárias, ou se refiram a gravações, encargos, substituições, ou a modos de partir ou
de distribuir, segundo a vontade do testador, ou a aquisições e vendas; ti) os atos de administração do
testamenteiro, rendas, comissões pagas, impostos, atos de conservação e de defesa da posse.
Quando, por ocasião da prestação de contas, não tiver chegado o momento de cumprir-se alguma disposição
testamentária (e. g., modus, a partir de determinado ano ou sob condição, instituição condicional, legado de bem
futuro), ficará exonerado de tudo, menos disso, o testamenteiro que prestou e teve aprovadas as suas contas.
4.JUIZ NÃO PODE DISPENSAR A PRESTAÇÃO DE CONTAS. Ainda que o testamenteiro alegue idoneidade,
concordância de todos os interessados, ou outro qualquer motivo, não pode o juiz dispensá-lo de prestar as contas,
É medida acima dos interesses dos herdeiros, legatários e mais beneficiados. As aparentes exceções que adiante se
apontarão concernem à dupla qualidade testamenteiro, herdeiro e nelas a mesma pessoa, herdeiro, se quita a si
mesma, testamenteiro, e vai a juízo prestar as contas, como ocorre ao testamenteiro herdeiro das sobras.
e onde morreu. Cp. M. TREMUBO (DecisiOfl~35, d. 62, n. 9), SIMÃO DE OLIVEIRA DA COSTA (De Mwnert
Promeorqe, juactimim compendium, add. cap. 1, ns. 9 e 10), DíOoo GUERREIRO CAMACIIO DE ABOIM (De
Munere fudicis OrphanOrum Opus, Tractati{5 Quaxtus. De rationibite reddendis ã.jstrahendiqi, 1. 1, c. 4, ns. 1 e
34). GABRIEL PEREIRA DE CASTRO (DecisiOflCS Supremi gienttSsimiqUe Senatus Portugailitie, cap. 16, ns.
39 e 40) dizia que, no caso de o testador ter previsto onde havia de ser enterrado, no lugar onde era domiciliado e
tinha os beim é que prestava contas: nam nU quis administflLtioflQW geril, ibi solummodo rationem redâcre túnel
ur. Como pensava também DIOGO GUERREIRO CAMACRO DE ABOIM. Ambos com razao: Neo tenetur
executor testumúnti reddere rationes in loto, in qno def~net~s se sepetiri iussit, sed in loto nu obuil et degebal. Se
o testamenteiro assinou o termo num lugar e e domiciliado noutro, chama-se a contas por precatória: Si tameu
executores suscipant administratiOflem iv. uno loto, et in alio vivant, poterunt citari, seu vocari ad locum
admiúistratiofiís.
Em verdade, não se chegou a doutrina limpa e uniforme. Vendo-se as ordenações Filipinas, a do § 4 e as dos §§ 8,
9 e 19, vê-se que o velho direito queria dizer: se os testamenteiros são domiciliados fora do lugar em que
aceitaram a testamentaria, a este lugar vieram, por ser cargo pessoalíssimo, e podem ser chamados a êle, para
prestar as contas; mas e agora é o caso das ordenações Filipinas se coincide ser domiciliado no lugar em que
aceitou e é competente para o testamento, “os nossos Provedores, e os prelados e Oficiais Eclesiásticos não
obriguem os Testamenteiros irem dar conta fora do lugar, onde viverem, por a muita vexação, que nisso
receberiam nossos povos”. A diferença entre irem e virem tudo esclarece.
As distinções de DIOGO GUERREiRO CAMACUO DE ABOIM e GABRIEL PEREIRA são estranhas à
jnterpretação do § 4 do Ti tulo 62. Encambulharam com o texto reinícola a questão da competência para o
testamento atinente aos §§ 8, 9 e 19, que o legislador no § 4 supõe resolvida. Por isso mesmo, não é aqui o lugar
para se indagar da competência para o testamento. Resolvida esta, perante o juiz correm o cumprimento e a
prestação de contas. Donde a regra: a prestação de contas faz-Se no lugar em que se cumpre o testamento.
§ 5.964. 1 DESPESAS E TESTAMENTEIRO
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9.PRIV 4 ATIVIDADE DO JUíZO DA PROVEDORIA. O juiz dos testamentos também o é da prestação de
contas. Por isso mesmo não é possível: a) atribuição de competência pelo testador a outra autoridade pública, seja
juiz, ou não (exemplo da Provisão de 1.0 de setembro de 1817: ainda que o testador dê à Câmara Municipal a
tomada de contas, não deve ser observada a verba testamentária, que infringe lei de jurisdição)
b)não pode o testador deixar a alguém ou a juízo arbitral, seja de particulares, seja de juizes, o decidir sôbre a
prestação de contas, mas devemos entender que o pode quanto a contas mensais, anuais, ou outras, desde que não
toque a necessária e legal prestação final de contas; e) não podem os herdeiros, legatários ou mais beneficiados
furtar ao exame judicial, por meio de transação, compromisso, ou qualquer outro expediente, as contas do
testamenteiro. Mas podem: a) regular entre si questões de interesse, que de modo nenhum excluam a prestação de
contas perante o juiz; b) passada em julgado a decisão sôbre a prestação de contas, e tendo algum interessado
proposto ação rescisória, pode haver desistência, ou transação, se concordar o Curador. Éste, se o interesse atinge
alguma verba, pode prosseguir na ação rescisória, como poderia intentá-la.
1.TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.758: “Levar-se-ão em conta ao testamenteiro as despesas feitas com
o desempenho de seu cargo e a execução do testamento”.
2.ELABORAÇÀO. No Projeto iirimitivo, art. 1.923: “As despesas necessárias para o fiel desempenho das
funções do testamenteiro correrão por conta da massa hereditária”. Na Câmara dos Deputados, art. 1.765: “Levar-
se-ão em conta ao testamenteiro as despesas feitas com o cumprimento do testamento e com o desempenho das
respectivas funções”. O Projeto primitivo, art. 1.923, somente continha o primeiro enunciado.
OProjeto revisto, art. 2.127, dizia: “Levar-se-ão em conta aos testamenteiros as despesas legalmente feitas
conforme o testamento até o dia da citação para prestação de contas”.
3. DíitErro ANTERIOR. O art. 1.758 consigna que o testamenteiro tem autoridade para as despesas com o
desempenho
do cargo e a execução do testamento. Assim, no substancial, as Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 62, § 12.
4.DIREITO ESTRANGEIRO. Código Civil português revogado, art. 1.908; francês, art. 1.034; italiano revogado,
artigo 911; venezuelano, art. 976; alemão, § 2.215; argentino, art. 3.873; mexicano, art. 3.754.
9.EXIGÊNCIAS PARA SEREM JULGADAs PRESTADAS AS CONTAS. Não julgará o juiz prestadas as contas:
a) se ainda não foram inscritas as hipotecas legais, clausulados ou averbados os bens; b) se não foram prestadas as
cauções que se prestam independente de requerimento; o) se ainda não foram pagos os impostos (e o juiz poderá
intimar para que os pague, sob pena de remoção e sequestro, Aviso n. 138, de 4 de abril de 1867).
10. MUNICÍPIO, ESTADO-MEMBRO OU UNIÃO HERDEIRA OU LEGATÁRIA. Pode ocorrer que a pessoa
investida da Testamentária, ou dela e da inventariança, seja o Procurador respectivo, funcionário do Ministério
Público. A despeito do cargo, que seria federal se Procurador da União, tal testamenteiro responde perante o Juiz
da Provedoria, por onde corre o cumprimento do ato testamentário. O fato de herdar a Fazenda Nacional não
transfere a jurisdição. (Cf. Avisos de 10 de junho e de 14 de agôsto de 1850). Quanto às ações de invalidade de
testamento, em que é herdeira a União ou algum Estado-membro, regem os princípios gerais.
11.OBRIGAÇÃO DE CONTAS “IN REBUS MINIMIS”. No direito anterior, a Ordenação do Livro 1, Título 62,
§ 21, considerava despesa de que se não costuma passar recibo, e, juradas, valiam, as de duas onças de prata
(então $650). Modernizando-a, JOSÊ HOMEM CORREIA TELES (Digesto português, III, § 1.844) fixou em
15$000 o total, não excedendo cada adição a 1$875 (igual a duas onças). SOUSA BANDEIRA falava em despesas
não excedentes de 25$000.
No direito de hoje, tais despesas podem ser provadas por testemunhas ou presunções (o limite de hoje, em direito
substantivo, é de dez cruzeiros novos, Código Civil, art. 141) - Neste assunto, as leis dos Estados-membros
podiam regular a prova, uma vez que se não afastassem dos princípios do Código Civil.
No Distrito Federal, o testamenteiro podia ser crido quanto a menos de 25$000, tratando-se de despesas de que se
não costuma passar recibo (Código do Processo Civil do Distrito Federal, art. 818, § 1.0). Pagaria em tres dôbro se
a afirmação fosse falsa (§ 29).
Hoje, estabeleceu-se e está constitucionalmente prevista a uníficação do processo.
12.DISPOSIÇÕES SECRETAS. No direito anterior, havendo instruções reservadas ao testamenteiro, jurava êle
pelo cumprimento, a fim de se pagar o respectivo impôsto (Resolução de 16 de julho de 1813; TEIxEIRA DE
FREITAS, Consolidação das Leis Civis, arts. 1.083, nota 3, e 1.115).
Entendemos que vale essa afirmação do testamenteiro, mas, se alegar isenção de impôsto, deve ser cobrado o que
pagaria se legatário fosse o próprio testamenteiro Aliás, se não se acham tais disposições previstas no testamento,
e daí querer OLEGÁRIO HERCULANO DE AQUINO E CASTRO (Prática das Correiçá es, 415 s.) que não
tivessem valor tais declarações verbais (Ordem de 27 de setembro de 1859).
Devemos distinguir:
a)Segredo absoluto, bens deixados ao testamenteiro ou a outrem. Toltitur quaestio, paga o impôsto de entrega a
êle.
b)Segredo referido no testamento, com obrigação ao testamenteiro, segundo as instruções: paga o impôsto da
natureza do legado, se isso se pode concluir do testamento ou o da transmissão ao testamenteiro
c)Segredo em escrito para só ser visto pelo juiz e pelo Procurador da Fazenda: paga o impôsto específico.
Se o testamenteiro tiver consigo dinheiro do defunto, que já em seu poder estava, ou que arrecadou, ou recebeu de
divida, e comprar apólices da dívida pública, deve pagar o umpôsto, porque a herança foi de dinheiro, e não de
apólices. Se oculta ou consegue não pagar o impôsto, trata-se de fraude e incide nas sanções legais, de ordem
criminal e fiscal (Ofício de 29 de fevereiro de 1836; Consolidação das Leis Civis, artigo 1132).
Quanto às coisas em segredo, a lição de DIOGO GUERREIRO CAMACHO DE ABOIM (De Munere Judicis
Orphanorum Opus, Tractatus 1, de Inventario, 1, liv. 4, c. 6, n. 311) e JOSÉ HOMEM CORREIA TELES
(Digesto português, III, § 1.848) é a de que se têm por cumpridas se o testamenteiro o afirma.
Por vêzes os testadores querem que se ignore como êle dispôs da herança, ou da porção disponível. O testamento
público e o particular não permitem o segredo, porque as testemunhas presentes assinam: naquele, elas assistem ao
ato; nesse, elas escutam o que o testador lê. O testamento cerrado é que dá a solução, porque apenas se exige que
as testemunhas estejam presentes à entrega ao oficial público. Nem êsse nem as testemunhas conhecem as
disposições (e, se conheciam, não importa, porque foi mero acidente). Em princípio, só se sabe o que é que o
testamento cerrado contém quando se abre, após a morte do testador.
O testamento cerrado (quase sempre, lacrado, cosido, ou com outro meio de fechamento material, e não somente
colado) não adveio ao direito luso-brasileiro com as Ordenações Filipinas, Livro IV, Título 80, porque na
Ordenações Afonsinas, Livro IV, Título 108, depois de se falar do costume, que “foi e he d’antigamente em estes
Regnos geralmente usado”, das cinco testemunhas, permitiu-se assim o testamento aberto feito por tabelião como
“no caso que tever estormento pruvico nas costas”.
O testador tem de saber e poder ler. Se não podia ler, o testamento cerrado é nulo. O que pode ocorrer é que não
saiba ou não possa escrever. Quem sabe escrever sabe ler. Quem não sabe ler não pode escrever. Se o testador lia
tão mal que não poderia entender o que está escrito, há perigo da decretação de nulidade.
Surge o problema do testamento secreto que foi escrito e assinado pelo testador (portanto, quando podia ler), mas
êsse, ao ser entregue ao oficial público, não o pode ler. Tem-se respondido que, não podendo ler, não pode saber se
entrega ao ofical público o papel em que escrevera o testamento (G. EUNIVA, Deite Successioni legittime e
testamentarie, secondo ii Codice Civile del Regno d’italia, 191 s.). Mas o não poder ler não implica de modo
absoluto que não possa identificar o objeto. O cego, por exemplo, pode abrir o cofre e de lá tirar o testamento que
guardara e há as cinco testemunhas a quem êle pode dar indicações que identifique o testamento.
13.CORREIÇÕES E CONTAS DOS TESTAMENTEIROS. O juiz em correição pode rever as contas dos
testamenteiros, emendá-las, reformá-las, a fim de limpá-las de nulidades, erros ou irregularidades Outrossim,
tomar as contas que os juizes provedores não tomaram (Decreto n. 834, de 2 de outubro de 1851, arts. 34, §§ 1 e 2,
e 35; Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 62, § 29, e Título 88, §§ 40 e 42; Lei de 3 de dezembro de 1841, art.
119; Decreto n. 143, de 15 de março de 1842, arts. 3 e 36).
O juiz em correição pode revogar as prorrogações concedidas pelos Juizes da Provedoria aos testamenteiros,
quando não ocorra motivo cabal para a concessão (Código Civil, artigo 1.622, parágrafo único; Decreto n. 834,
art. 34, § 1).
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.759: “Sendo. glosadas as despesas por ilegais, ou por não
conformes ao testamento, remover-se-á o testamenteiro, perdendo o prêmio deixado pelo testador (art. 1.766)”.
2. ELABORAÇÃO- Na Câmara dos Deputados, art. 1.766: “Sendo glosadas as despesas por ilegais, ou por não
conformes. ao testamento, o testamenteiro será removido e perderá o prêmio deixado pelo testador”. Nenhuma
disposição no Projeto primitivo no Projeto revisto, art. 2.128, mais vivo se via o direito anterior: “Sendo glosadas
as despesas por ilegais, por não conformes ao testamento, ou por terem sido feitas depois da citação para prestação
de contas, os testamenteiros serão removidos, e perderão o prêmio deixado pelos testadores”. E no parágrafo
único: “Também incorrerão os testamenteiros na perda do prêmio, quando, tendo sido citados para prestação de
contas, não acudirem à citação”.
3. DIREITO ANTERIOR Nas Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 62, § 12, dizia-se, por outros termos, o
mesmo. (Cp. TEIxEIRA DE FREITAS, Consolidação das Leis Civis, artigo 1.107).
8-CAUÇÃO PRESTADA PELO TESTAMENTEIRO. Nem os herdeiros, nem os legatários podem exigir do
testamenteiro caução de entrega dos bens. A natureza do seu cargo imuniza-o disso. Mas o testador, no testamento,
ou no codicilo, pode autorizar o pedido de tal caução, ou, até, ordená-la (F. HEEZEELDER. Erbrecht, .J. von
Staudingers Kommentar, V, 9•a ed., 704). Se o testamenteiro é legatário do usufruto, ou confunde na sua pessoa
outra qualidade, que permita exigência de caução, o interessado pode requerê-la, ou o próprio testamenteiro pode
prestá-la desde logo.
2. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.760: “Compete ao testamenteiro, com ou sem o concurso do
inventariante e dos herdeiros instituidos, propugnar a validade do testamento”.
3. ELABORAÇÃO. No Projeto primitivo, art. 1.919: “Cumpre-lhe sustentar a validade do testamento, exclusiva-
mente, se for inventariante, e conjuntamente com o inventariante se outrem exercer êsse encargo”. Na Câmara dos
Deputados, art. 1.767: “Compete ao testamenteiro defender a validade do testamento por si ou com o inventariante
e demais herdeiros instituidos”.
4. DIREITO DE OUTROS pOVOS. No Código Civil francês, art. 1.031, “ils veilleront à ce que le testament soit
exécuté et jís pourront, en cas de contestation sur son exécution, intervenir pour en soutenir la validité”. Código
Civil português revogado, ad. 1.899, 8.0: “Em vigiar pela execução das disposições testamentárias e em sustentar,
se for necessário, a validade delas em juízo e fora dele”. Cf. italiano revogado, art. 908, espanhol, art. 902,
argentino, art. 3.862, venezuelano, art. 964, 39, chileno, art. 1.295, mexicano, art. 8.780, VII, e uruguaio, art. 985.
5.CONTEUDO DA REGRA JURÍDICA: TESTAMENTEIRO “EX SE”. dever precípuo do testamenteiro pugnar
pela validade do testamento. Quem não está disposto a fazê-lo não pode continuar no cargo de testamenteiro.
Pela lei, a ação pode correr somente contra êle; mas discordamos, em parte, da interpretação de CLóvís
BEvILÂJQIJA (Código Civil comentado, VI, 228), que lia o art. 1.760 pela forma seguinte: “Será, porém, útil a
quem contestar a validade do testamento citar, além do testamenteiro particular, o inventariante e os herdeiros
instituidos”. Não é, às vêzes, só útil: é necessário, quando já aberto o inventário e há inventariante herdeiro,
instituído ou não.
Hoje, como antes, a falta de citação do testamenteiro nas ações de invalidade do testamento é causa de nulidade. É
êle o réu principal (certo, o Tribunal de Justiça de São Paulo, a 2 de maio de 1892; errado, e indefensável, a 3 de
junho de 1899). Se, com a ação de invalidade, se cumula a de petição de herança (é o teor vulgar de tais ações,
petições de heranças qualificarias) ou de reivindicação, é necessário citar os que têm a inventariança e a posse dos
bens.
Os livros, que hoje falam de ação de invalidade proposta contra o herdeiro legítimo, desatendem ao texto do
Código Civil, que, nos casos ordinários, só exigiu que corresse contra o testamenteiro. Não reparam na diferença
entre o nôvo e o velho direito, melhor diremos a velha praxe urdida em torno das Ordenações Filipinas, Livro 1,
Título 62, § 2.
Como a defesa, que o testamenteiro fizer, poderá ser apreciada pelos herdeiros e legatários, é prudente que êle lhes
dê ciência, ou requeira, no processo, que se citem os herdeiros e legatários.
O Código Civil, na ação simples de invalidade, só exige a citação do testamenteiro.
Nas ações de nulidade, de anulação e de ineficácia, do testamento, é indispensável a citação dos herdeiros
testamentários, dos legatários e do testamenteiro (ou dos testamenteiros conjuntos) e de outros beneficiados por
disposições testamentárias. Se falta alguma, há nulidade do processo (cf. Câmaras Reunidas do Tribunal de
Apelação do Rio de Janeiro, 26 de abril de 1939, R. dos IX, 120, 247).
Ao herdeiro instituído ou pessoa a quem aproveite a deserdação incumbe provar a veracidade da deserdação; não,
o testamenteiro (cf. 53 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 25 de novembro de 1949, 1?. dos IX,
185, 219).
O 2.º Grupo de Câmaras Civis do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 27 de janeiro de 1949 (R. dos T., 179, 158),
como a 3ª Câmara Civil, a 9 de setembro de 1948 (177, 275), sustentou que, para a ação de petição de herança,
basta a citação do inventariante, desde que não seja dativo, dispensado o chamamento do testamenteiro e dos
herdeiros. Ora, conforme expusemos no Tomo LV, § 5.605, 2, não se propõe ação de petição de herança contra o
testamenteiro ou contra o lnventariate da herança; mas sim contra os possuidores da herança, que podem ser
herdeiros, ou a pessoa que se considere o único herdeiro. Tem de ser ouvido o inventariante, bem como o
testamenteiro, se trata de herdeiro testamentário, ou de demandante que algo sustenta contra o testamento.
‘7. CONSEQUÊNCIAS DA AUTONOMIA O testamenteiro procede, em juízo, ex se; nada tem com o
inventariante e os herdeiros, que acaso figurem: a sua missão é defender o testamento, por que o seu cargo
assenta nessa suposição de validade.
O Código Civil, art. 1.760, reconhecendo a autonomia do testamenteiro, excluiria com isso a teoria da
representação dos herdeiros instituidos, se esta não se chocasse, também, com o art. 1.769. ~ mais pura a doutrina
no direito brasileiro do que nos de outros povos, em que a Testamentária apenas auxilia ou assiste aos herdeiros
instituidos.
Dá-se ao testamenteiro, no Código Civil, art. 1.760, posição de primeira plana, consentânea com o seu cargo.
As considerações, que noutros lugares fizemos, sôbre a natureza da Testamentária, aqui têm plena aplicação.
Se o testamenteiro representasse os herdeiros, poderia aceitar por eles. E não pode. Se aos legatários, idem. E
tambem não pode. Se aos herdeiros, no caso do art. 1.769, a teoria terá de falhar: o testador distribuiu toda a
herança em legados. Éle pode tudo, em verdade, menos, exatamente, o que possa significar representação do
herdeiro ou legatário. (Aliás, representação dos herdeiros e dos legatários seria tese “falsamente eclética”, como
bem frisou FRANCESCO MESSINEO (Contributo alia dottrina della esecuzione Testamentária: critica deile
teorie, elementi costitutivi e indole dell’esecuzione, ns. ‘26 e 28), “non tenendo conto deila contradi~ione
immanente negli interessi degli uni rispetto a queIli degli attri”).
As idéias de mandato foram meras figuras analógicas (BíAGío BRUGI, Istituzioni di Diritto Civile, 3•a ed., 882).
Por isso mesmo, podem todos os herdeiros confessar, e o testamenteiro prosseguir, ex se. Podem transigir,
renunciar, ou o que quer que seja, e ficar, na lide, o testamenteiro.
1.ATRIBUIÇÕES E PRAZO PARA CUMPRIMENTO. As atribuições dos testamenteiros são dadas pelo testador,
no texto do testamento, ou do codicilo.
A lei permite ao disponente que as funções sejam restringidas ou amplificadas em relação às dos arts. 1.753-1.760
do Código Civil.
O tipo mínimo seria o do testamenteiro que tem o só dever de vigiar a entrega de um bem, ou a gravação de uma
legitima, ou de um quinhão de herdeiro instituído, ou de um legado.
O tipo máximo será o testamenteiro com direito ao uso e ao fruto, o testamenteiro com a propriedade, com o dever
de transmitir, em certo tempo, ou quando se realizar condição, a alguém, os bens que recebeu.
O testador pode atribuir ao testamenteiro a administração da herança, além de outras, ou das outras; ou somente a
de administrar, fora as que derivam da lei. Na dúvida, é de entender-se que tem tal função administrativa. Pode ser
a termo ou sob condição. Quando cessam toda as atividades do testamenteiro, automàticamente perde êle o cargo
(cf. KARL HOLTZ, Die verwaltende Testamentsvollstreclcunq der §§ 2209 und 2210 BGR., 17 s. e 50 s.).
2.TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.761: “Além das atribuições exaradas nos artigos anteriores, terá o
testamenteiro as que lhe conferir o testador, nos limites da lei”.
3.ELABORAÇÃO. Na Câmara dos Deputados, art. 1.768: “Além destas atribuições, terá o testamenteiro as que
lhe houverem sido conferidas pelo testador, dentro dos limites da lei”. Recebeu-o do Projeto revisto, art. 2.129,
por sua vez decorrente do Código Civil português revogado, art. 1.894, inspirado no Projeto de FELÍCIO 005
SANTOS, art. 1.818.
4. DIREITO ESTRANGEIRO. No Código Civil português revogado, dizia o art. 1.894: “Os testamenteiros terão
as atribuições que o testador lhes conferir, dentro dos limites da lei”. Cf. Código Civil espanhol, art. 901,
argentino, art. 3.851, mexicano, art. 8.728, e venezuelano, art. 962, pr. Cp. Código Civil chileno, art. 1.298: “El
testador no podrá ampliar las facultades de albacea, ni exonerarle de sus obligaciones, según se hallan unas i otras
definidas en este titulo”.
O art. 1.761, que alarga a concepção da Testamentária, assaz restrita no Projeto primitivo, veio do Projeto revisto,
art. 2.129, inspirado no Projeto de FELÍCIO DOS SANTOS, artigo 1.813. Livrou o Código Civil brasileiro da
limitação chileno-uruguaia, nada louvável, e deturpadora do instituto.
5.COMPREENSÃO DA REGRA JURÍDICA. Além da posse e da administração, além de tudo que se permitiu ao
testamenteiro nos artigos anteriores, faculta o Código Civil conceder-se-lhe tudo que se poderia conceder dentro
da lei. Noutros termos, o art. 1.761 permite, por disposição de última vontade, outorgar todos os poderes que por
lei são outorgáveis. Desde a posse e a administração até os mais caracterizados atos de fidúcia, de que é exemplo o
testamenteiro-fiduciário, herdeiro ou legatário, a quem incumba transmitir a outrem no dia tal, ou quando se casar
alguém, ou quando o beneficiado se formar em curso superior, ou quando completar vinte e um a não, alguma
quantia ou algum bem. Terá a propriedade restrita e resolúvel. Ainda mais: o testamenteiro-usufrutuário ou nu
proprietário.
Aqui, em verdade, há campo aberto para os negócios de fidúcia. Seria impossível prever todas as figuras jurídicas,
todos os poderes conferíveis aos testamenteiros, são todos os poderes permitidos por lei, salvo onde pessoalíssima
a atribuição do testador, como as do pátrio poder.
Em todos os processos em que intervém, ou como autor, ou como réu, o testamenteiro é parte (G. PLANCK,
Euirgerliches Oresetzbuch, ~J, 3a ed., 588, 2; FRANZ LEONHARD, Zrbrecht, 2~a ed., 354, II). É opinião
dominante (OTTO WARNEYER, Kornment ar, 1200), contra a representação do herdeiro, qud defendia
BRETTNER (Der Testamentsvollstrecker nach neuen Deutschen Recht, Archiv flir biirgerliches Recht, 17, 213),
ou da herança (KONRAD HELLWIG, Ansprueh und Klagrecht, 248) -Com os meios da herança, pleiteia e
sustenta interpretações e direitos. Por isso mesmo, responde e obriga pelas custas a herança (parte testável), e não
pode invocar assistência pública, alegando ser pobre.
Se o testador tirou ao testamenteiro qualquer poder de administração, a ação contra os bens somente pode correr
contra o inventariante e os herdeiros.
Se o testador deu ao testamenteiro a incumbência de vender bens, particularmente, pelo justo preço (isso se
subentende), está autorizado a fazê-lo o executor. Os herdeiros e mais beneficiados só têm ação contra o
testamenteiro. Com a boa doutrina, JOSÉ HOMEM CORREIA TELES (Digesto portugués, III, § 1.836), fundado
em DIoco GUERREIRO CAMACIIO DE ABOIM (De Munere ludicis Orphanorum Opus, Tractatus 1, de
Inveutario, Livro 4, c. 6, ns. 114 e 146). Ao tempo de TEIXEIRA DE FREITAS (Tratado de Testamentos e
Sucessões de A. J. GOUvEIA PINTO, 238), haviam de ser, dizia, judiciais; mas, quanto aos bens testados, é
impertinência limitar a autonomia do testador: poderia deixá-los ao testamenteiro, ~por que não os há de entregar
para a venda?
Justo preço é o da avaliação, se houve. Se a venda foi feita antes, avaliam-se para se verificar se foram bens
vendidos. Das contas, o testador não no pode dispensar.
Noutro lugar, TEIXEIRA DE FREITAS (Tratado de Testamentos e Sucessões de A. J. GouvEIA PINTO, 240) deu
a razão de não se cumprir a autorização de venda particular: “Ao que hoje os juizes não se prestam”; bem parca
justificativa, que destoa dos princípios que regem a Testamentária. Com a doutrina de Dioco GUERREIRO
CAMACHO DE ABOIM, FRANCISCO PI-NHEIRO (Tractatus de Testamentis, app. n. 84) e JOSÉ HOMEM
CORREIA TELES.
O testamenteiro, de ordinário, pode exigir que o herdeiro ou o legatário cumpra o modus (cf. HANs KLIEBERT,
Di Auflage, 99).
6.PRAZO DE CUMPRIMENTO. Dizia o Código Civil, artigo 1.762: “Não concedendo o testador prazo maior,
cumprirá o testamenteiro o testamento e prestará contas no lapso de um ano, contado da aceitação da
Testamentária”. E no parágrafo único: “Pode êsse prazo prorrogar-se, porém, ocorrendo motivo cabal”. O prazo
ficou reduzido a seis meses pelo Código de Processo Civil, art. 544, § 2.0: “Se o testador não houver marcado
tempo para cumprir-se o testamento, será de seis meses o prazo, contado da data da aceitação da Testamentária”.
7. ELABORAÇÃO. Cf. Projeto primitivo, art. 1.920: “Se o testador não lhe conceder prazo mais extenso, deverá
prestar as contas da sua Testamentária, dentro de seis meses, contados da notificação de sua nomeação. Este prazo
poderá ser prorrogado pelo juiz, havendo motivos justos para fazê-lo”. Cp. Câmara dos Deputados, art. 1.769: “Se
o testador não conceder prazo maior, o testamenteiro cumprirá o testamento, prestando suas contas dentro de um
ano, contado da aceitação da Testamentária. Este prazo pode, entretanto, ser prorrogado por motivo justificado”.
Derivou do Projeto revisto, art. 2.181.
8.NÃO HÁ TESTAMENTÁRIA SEM PRAZO. A principal consequência do Código Civil, art. 1.762, é a de não
haver execução testamentária por tempo indefinido. Primeiro, procura-se saber se há prazo fixado ou subentendido
pelo testador. Onde o há, deve respeitar-se. Os herdeiros necessários e o cônjuge meeiro, que o reputar demasiado
longo, não podem atacá-lo. Inventário e execução testamentária são coisas distintas; o inventário deve ultimar-se
nos três meses do art. 1.770, a Testamentária no prazo que lhe deu o testador ou no legal, de modo que não há
nenhuma possibilidade de se ferirem, com os prazos amplos ao testamenteiro, os direitos dos herdeiros necessários
ou do cônjuge (cp. arts. 1.579, 1.754, 1.770 e 1.754, parágrafo único).
O testador é o máximo e único interessado na fixação do prazo para a execução testamentária: os herdeiros
testamentários, por definição ex testamento, não têm direitos que não sejam os que o testador lhes deu, e o testador
podia, livremente, exclui-los. Tão amplo era o seu poder, tão perfeita a sua livre disposição, que, em relação aos
herdeiros legítimos, para os excluir, bastaria dispor de todo o patrimônio sem os contemplar (art. 1.725). Quanto
ao que o art. 1.726 chama “remanescente”, também deriva do testamento a herança: “entender-se-á”, diz a lei,
“que instituiu os herdeiros legítimos no remanescente”. Se ocorre que o testador instituiu herdeiros aos
descendentes e ascendentes, que o são necessários (artigos 1.608-1.619 e 1.721), ou pelos mencionar, ou por não
ter disposto da metade disponível, tais herdeiros necessários não podem opor-se aos prazos da Testamentária, nem
às atribuições do testamenteiro. A metade indisponível, esta sim, transmite-se desde logo, e não pode sofrer as
restrições do art. 1.754. As únicas restrições que os bens de tais herdeiros podem sofrer são as do art. 1.728.
Se o testador não fixou prazo para o cumprimento das suas últimas vontades, estatui a lei que seja,
presumidamente, o de seis meses. Mas não se lhe exigiu dilatação expressa do prazo: pode resultar, por
interpretação, de verbas testamentárias. Exemplo disso é determinar êle que os impostos sejam pagos com as
rendas, mas estas não darem para o cumprimento no limite legal. Aqui, cabe distinguir: dilatação prôpriamente
dita, como se disse “paguem-se os impostos com as rendas dos três primeiros anos”, o que faz presumir prazo de
quatro; é dilatação não resultante de direito dizer do testador, mas de circunstâncias criadas pelas verbas, e neste
caso apreciada pelo juízo em processo de prorrogação de prazo.
Dentro dos prazos hão de ser cumpridas as verbas e prestadas as contas.
11.PRORROGAÇÃO 1)05 PRAZOS. A regra é constituir causa suficiente para a remoção dos testamenteiros o
não terem cumprido o testamento e prestado as contas dentro do prazo que o testador ou a lei fixou. A brevidade
da execução dos testamentos interessa ao bem público (Alvará de 2 de outubro de 1811).
Se o não cumpriram e não prestaram as contas, ou são removidos, ou, “ocorrendo motivo cabal”, ser-lhe-á
prorrogado o prazo.
São motivos cabais ou justas causas para a prorrogação:
a) Litígio sôbre os bens da herança, salvo chicana ou outra culpa do testamenteiro, ti) Impossibilidade de
cumprimento por dificuldade de liquidação ou de entrega, exceto se há culpa, mora ou negligência do
testamenteiro (cf. Ordenações Filipinas, Livro 1, Titulo 62, §§ 2 e 17; Decreto n. 834, de 2 de outubro de 1851, art.
34, ~ 1).
Os juizes em correição podem revogar as prorrogações concedidas sem justa causa (Decreto n. 834, art. 84, § 1).
No caso de concurso de credores, não terminam as funções do testamenteiro, suspendem-se, de fato e de direito,
para tudo quanto se refira à administração dos bens e pagamentos dos credores. O testamenteiro pode pedir a
abertura da falência.
1.VOCAÇÃO PARA A TESTAMENTÁRIA. A vocação para a Testamentária nada tem com a situação de
herdeiros necessários ou simplesmente legítimos. Quem testa, testa do que é seu e pode dispor. Pouco importa
exista, ou não, no momento da morte ou em virtude dela, comunhão indivisa ou pro diviso. Os herdeiros
necessários que, logo após o cônjuge na situação do Código Civil, arts. 1.579, § 1.0, e 1.754, têm preferência para
a inventariança, nada haviam de ter com a testamentaria.
2. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.768: “Na falta de testamenteiro nomeado pelo testador, a execução
testamentária compete ao cabeça-de-casal, e, em falta deste, ao herdeiro nomeado pelo juiz”. HouVe alteração.
Diz o Código de Processo Civil, art. 527: “Inscrito e registrado o testamento, o escrivão notificará o testamenteiro
nele nomeado, para dentro em cinco dias, assinar o termo de Testamentária; se não houver testamenteiro nomeado,
estiver ausente, ou não aceitar o encargo, o escrivão o certificará nos autos, que fará conclusos, e o juiz nomeará
testamenteiro dativo, recaindo a preferência, onde não houver testamenteiro judicial, em quem estiver em
condições de ser inventariante”.
Assim, passou a ser de relêvo o art. 469 do Código de Processo Civil, onde se diz quem há de ser inventariante,
com a redação dada pela Lei n. 4.121, de 27 de agôsto de 1962.
8. ELABORAÇÃO. Na Câmara dos Deputados, sugeriu-se: “Na falta de testamenteiro nomeado pelo testador, a
execução testamentária compete ao cabeça do casal, e, na falta deste, ao herdeiro que for nomeado pelo juiz”.
Tirado do Projeto revisto, art. 2.132 (Projeto de FELÍCIO DOS SANTOS, artigo 1.815).
4.DIREiTo ESTRANGEIRO. No Código Civil português revogado, art. 1.893, dizia-se: “No impedimento, ou por
escusa do testamenteiro, incumbe aos herdeiros o cumprimento do testamento, com as seguintes declarações: 1.0.
Se as porções hereditárias forem desiguais, pertencerá o encargo ao mais avantajado; 2.0. Se forem iguais, será
encarregado da Testamentária o que for designado por nomeação dos interessados, e, não se acordando estes, ou
sendo algum dos herdeiros menor, interdito ou ausente, o respectivo juiz nomeará um dentre eles”. Cp. Código
Civil espanhol, art. 911, argentino, art. 3.864, chileno, art. 1.271, uruguaio, art. 965, e mexicano, art. 3.679.
Também no direito português falava-se em herdeiros, para cumprir o testamento, no impedimento ou escusa do
testamenteiro (art. 1.893), mas, ao ler o artigo, JOSÉ TAVARES (Sucessões e Direito Sucessório, 1, 715) não
confundiu instituidos e legítimos, e escreveu: “O art. 1.898 determina que o juiz nomeie testamenteiro um dos
herdeiros instituidos”. Esta a boa doutrina. Herdeiro necessário, herdeiro legítimo, podem ser (contra o conselho
oriundo da natureza das funções) testamenteiros, nomeados pelo testador ou pelo juiz, mas, pelo juiz, sê-lo-á
dativo e não por escolha entre indicados por lei.
No Código CiVil português (1966), art. 2.820, apenas se diz que “o testador pode nomear uma ou mais pessoas
que fiquem encarregadas de vigiar o cumprimento do seu testamento ou de o executar, no todo ou em parte: é o
que se chama Testamentária”. Acrescenta-se no art. 1.321: “1. Só pode ser nomeado testamenteiro o que tiver
plena capacidade jurídica.
2.A nomeação pode recair sôbre um herdeiro ou legatário”.
5.PARTICULARIDADE BRASILEIRA. Aos herdeiros instituídos, que haviam de ser os preferidos para a
execução testamentária, o Código Civil deu segunda plana: introduziu a vocação do cônjuge sobrevivo, seja ou
não herdeiro instituído. Não se quis, com isso, misturar sucessão legítima e sucessão testamentária: trata-se de
presunção de afeto e de confiança, para a qual é de mister o conjunto de circunstâncias que a prefigurem. Assim,
proposta ação de desquite, não pode o cônjuge pretender o cargo de executor testamentário.
No direito brasileiro de hoje, o art. 527 do Código de Processo Civil subordinou a nomeação de testamenteiro, se
não houve nomeação pelo testador, ao que se estabelecera para a nomeação de inventariante. Portanto, podia ser
testamenteiro dativo, pela ordem legal, o cônjuge sobrevivente quando de comunhão o regime no casamento, salvo
se, sendo a mulher, não estivesse por culpa sua, convivendo com o marido ao tempo da morte deste (art. 469, 1), o
herdeiro que se achar na posse e administração dos bens, na falta de cônjuge sobre-vivente, ou este não puder ser
nomeado (art. 469, II), o herdeiro mais idôneo se nenhum está na posse dos bens (art. 469, III), o testamenteiro,
quando não houver cônjuge ou herdeiro, ou quando o testador lhe concedeu a posse e a administração da herança,
por não haver cônjuge ou herdeiro necessário (art. 469, IV), pessoa estranha, na falta de cônjuge ou de herdeiro,
quando não houver testamenteiro, onde não houver inventariante judicial (art. 469, V).
6. FUNÇÃO DA TESTAMENTÁRIA A regra jurídica, que se poderia tirar da história da execução testamentária,
confirmada pelos Códigos modernos, seria a da vocação do herdeiro instituido para as funções de executor do
testamento (Código Civil português revogado, art. 1.893, argentino, artigo 3.867, espanhol, art. 911, chileno, art.
1.271, peruano, artigo 807, boliviano, art. 600, e japonês,~ art. 1.112), ora indiretamente, escolhido pelo juiz, ora
por eleição dentre eles, ora segundo critérios quantitativos. Mas tudo isso foi afastado.
Havendo pluralidade, claro que o legislador tem de fixar processo seletivo, que concentre a função. Em todo o
caso, o Código Civil brasileiro, art. 1.763, introduziu a regra nova de preferir aos herdeiros, diretos interessados na
herança testamentária, o cônjuge meeiro. Por se tratar de inovação, tendo-se de procurar-lhe o fundamento,
somente se pode encontrar o da presunção da continuidade de confiança, que a existência em comum até o
momento da morte estabelece (arts. 1.763 e 1.579, § 1). Éste raciocínio, verdadeiro em relação à mulher
sobrevivente, assaz se enfraquece diante da assimetria, nada justificável, de se conferir ao marido sobrevivente que
não vivia com a mulher, a missão testamentária.
Em relação ao inventário, a lei é expressa: só à muller se exige estar vivendo, ao tempo da morte, com o marido.
Mas, quanto à Testamentária, nada justifica que se confie ao marido, separado de fato, a delicada e íntima missão
de confiança, que .4 a Testamentária. O art. 1768 dá a execução, na falta de testamenteiro nomeado, em primeiro
lugar, portanto com preterição dos herdeiros instituidos, ao cabeça-de-casal, porém fora absurdo confiar a pessoa
que, não vivendo em comum, só se pode presumir desautorizada, função cuja causa determinante é a da amizade,
ou, na falta, a do interesse pela boa execução do testamento e da voluntas testantium.
Vivendo em comum, ainda que não tenha interesse no testamento, isto é, não seja herdeiro, nem legatário, nem
beneficiado, não é de estranhar que se repute o cônjuge sobrevivo como o maior amigo do testador. Mas,
separado, sem qualquer vantagem na execução, quiçá interessado na nulidade do testamento (arts. 1.603, III, e
1.611), ou no defeituoso cumprimento, para acréscimo do remanescente, não é possível sem absurdo preferi-lo aos
herdeiros testamentários.
Para bem aplicarmos a lei, atendamos à essencial missão do cargo de executor. Cabeça-de-casal, mulher, separada,
de fato, do marido, isto é, que não vive, ao tempo da morte dele, em sua companhia, não pode ser inventariante
(art. 1.579, § 1), porque o diz a lei, ainda assim ressalvados certos casos, que não permitem a irrefletida
observância da regra, como o do marido, meeiro, é certo, mas sem haver adestos conjugais, nem bens trazidos à
comunhão, e aquele, assaz vulgar, que vive separado, juridicamente na situação de administrador, mas, de fato,
sem qualquer participação na administração dos bens comuns. Cabeça-de-casal, se as circunstâncias são de molde
a elidir qualquer presunção de confiança da mulher no marido, ~como poderemos admitir que a lei o chame a
executar negócios jurídicos, cujo único fundamento é, exatamente, esta confiança?
Diante da reclamação do herdeiro instituído, ou de qualquer interessado na execução do testamento, não pode o
juiz deixar de examinar, pelas provas apresentadas, a verdadeira situação de existência dos cônjuges. Exemplo:
seria imoral dar a lei ao marido, a que a mulher recusava, pela repulsa aos seus atos, qualquer conversa, o cumprir
as últimas vontades desta mulher.
A intromissão do cônjuge na vocação testamentária, particularidade do direito brasileiro, tem certo encanto,
derivado de um reconhecimento legal da confiança que nasce da vida em comum, da intimidade sexual. Mas
empanaríamos a própria beleza do enunciado, conspurcaríamos o seu próprio fundamento moral, fazendo-o servir
a casos contraindicados e a situações inconfessáveis. Presunções valem até onde se pode presumir. Em matéria
testamentária, sobretudo, nunca devemos desfitar os olhos da vontade do testador.
8.TESTAMENTEIROS E COLISÃO DE INTERESSES. Não pode ser testamenteiro a pessoa que tem interesse
contra o testamento, ou contra o espólio que tem de defender. Não pode exercer cargo quem, contra os bens, que
administra ou contra a força geradora do cargo, exerce, ou tem de exercer, ações, ou pugnar por interesses
materiais (F. ENDEMANN, Lehrbuch des Búrgerlichen Rechis,~, 8ª-9.ª ed., § 72, 575).
Se o testamenteiro for o herdeiro ou o cônjuge sobrevivo e advier choque de interesses (de que, convém frisar, não
é a ação de invalidade de testamento o caso único), deixará o cargo ao testamenteiro sucessivo, ou ao nomeado
pelo juiz. É imoral a prática de estar o herdeiro, que, pela ordem legal, assumiu a Testamentária, a pugnar contra a
vontade do falecido, a titulo de opinião no interpretar as verbas. Mais acertado andou o direito alemão em frisar a
normalidade dos choques dos interesses entre herdeiros e testamenteiros, indo às consequências de considerar
nulas certas nomeações para o cargo. A Testamentária é tida, no direito alemão, como limitação ao poder jurídico
dos herdeiros legítimos. 1
No Código Civil, art. 1.763, fala-se de herdeiro nomeado pelo juiz. Viciosas práticas já tendiam, na sua 2
inconscíencia nefasta, a entregar o cargo à pessoa que vai ser inventariante, como se a vocação para os dois cargos 9
fosse a mesma. Não no é. Não o poderia ser. No art. 1.768, já entre os herdeiros interveio o arbítrio judicial,
arbítrio que se devia orientar por sugestões razoáveis, essencialmente diversas das que presidem à escolha do
herdeiro inventariante, quando não há algum na posse corporal e na administração dos bens (art. 1.579, § 2.0). Tão
diferente se presume a solução, que o testamenteiro será chamado à inventariança, na falta de tais herdeiros. No
artigo 1.579, procura-se de preferência o legítimo, quiçá necessário, que tem a posse. No art. 1.763, deviam ser
preferidos os mais interessados na execução testamentária. É de supor que o não sejam os legítimos, os
necessários, porque a esses de algum-modo prejudicou o testamento. Conforme já vimos, até se excluem do cargo
noutros países. Os herdeiros do art. 1.768 seriam os instituidos. Havia e há pessoas que confundem e lêem
herdeiros como se fossem quaisquer.
Com o advento do Código de Processo Civil, o art. 527 agravou a confusão entre as duas funções, a do
inventariante e a do testamenteiro. Se não há testamenteiro nomeado pelo testador, nem testamenteiro judicial, o
juiz nomeia testamenteiro dativo, “recaindo a preferência”, na espécie, “em quem estiver em condições de ser
inventariante”. O art. 1.763 do Código Civil foi pôsto de lado e o art. 469 do Código de Processo Civil passou a
ser a regra jurídica em que se estabelece a ordem para a nomeação.
Cumpre aos juizes reagir contra tais deturpações de função, não só pelo sentido histórico do instituto, como
também pelos graves inconvenientes de ordem prática.
Entre os herdeiros testamentários, mas somente como elemento de fato para sugestão ao arbítrio do juiz, convém
preferir os de maior porção. Se o testador distribuiu toda a herança em legados e não nomeou testamenteiro, é
aconselhável, mas só aconselhável, nomear o maior legatário (DIOGO GUERREmO CAMACI-lo DE ABOIM,
De Munere ludicis Orphanorum Opus, Tractatus 1, de Inventario, Livro 4, c. 6, n. 76).
Se o testador, que instituiu herdeira universal uma filha casada, ou outra mulher, casada, e confiou a
Testamentária a pessoa estranha, faltando esta, não deve o juiz, sem examinar a situação, nomear a herdeira ou o
marido. É de presumir-se que os quisesse evitar o testador (E. ENDEMANN, Lehrbuchdes Urgerlicheu Rechts,
fl~, 9ª- ed., § 72, 573).
Os herdeiros do art. 1.726 são mediatamente instituidos:
herdeiros de caráter especialíssimo; por isso mesmo, têm, como instituidos, ainda por presunção legal, direito a
executar o testamento (vocação para a Testamentária), com direito, porém, por serem legítimos, ao prêmio (art.
1.766) : êle não é interessado no cumprimento; herda o que sobra. Poder-se-á alegar colisão de interêsses, mas a
boa solução é só se admitir quando outras circunstâncias intervierem. Nos casos ordinários, o testador dispôs em
legados e deixou alguma coisa, que vai restar:
o herdeiro ex testamento, pela presunção da lei, é êle, êle cumpre os legados. Se algum foi instituído, não cabe o
artigo 1.726; salvo, se não ocorre acrescimento, se foi somente para uma parte (metade, quarto e quinto) e os
legados não esgotam o resto.
Quando, porém, se propuser ação de invalidade de testamento, este herdeiro mediatamente instituído, para
continuar no cargo, terá: de renunciar a qualquer direito à sucessão decorrente da invalidade; ou obrigar-se a
cumprir a cédula com a própria parte que, vencida a ação, lhe tocar. Réu e autor ainda encoberto não poderá ser.
Dá-se a colisão de interesses.
10.LEGATÃRIOS E TESTAMENTÁRIA. O Código Civil, art. 1.763, não cogitou dos legatários. Só se falou de
herdeiro. Mas, se a lei é omissa, nem por isso deve o juiz afastar da função o legatário de grande importância, se
tem idoneidade para o cargo. O Código Civil português revogado, art. 1.839, foi mais minucioso, mais restringente
do arbítrio judicial. Lá, o critério de escolha obedecia a regra jurídica de ordem econômica. Estatuía o art. 1.839,
aliás fora da seção dos testamenteiros e indevidamente na de instituição de herdeiros e legatários: “Se a herança
tiver sido toda distribuída em legados, e o testador não houver nomeado testamenteiro, será havido por executor
do testamento o legatário mais beneficiado. Em igualdade de circunstâncias, será o que for designado pelos
legatários, e, se não puderem acordar, ou se houver entre os legatários algum menor, ausente ou interdito, será o
executor designado judicialmente”. Em todo o caso, êsse critério estritamente econômico, não parece deva ser
decisivo e só. Na falta da nomeação pelo testador, intervém ainda entre herdeiros o elemento confiança do juiz.
Com igual razão, há de caber entre os legatários. Em igualdade de condições de fidúcia, de idoneidade, como diz o
Código Civil a respeito dos herdeiros, é que deverá intervir o critério do maior interesse.
O que acima apontamos quanto ao Código Civil, art. 1.763, também se passa com o Código de Processo Civil, art.
527. Apagou-se a distinção que teria de atender à diferença das funções.
1.PESSOALIDADE DA TESTAMENTÁRIA. A Testamentária é cargo pessoal. Não se pode exercer por outrem,
princípio, este, de caráter universal e superior. As leis que acaso o desfaçam violam a realidade histórica e o
próprio substrato do instituto. Deformam-no. Deturpam-no. Deprimem-no.
A transmissão entre vivos da Testamentária seria o regime da irresponsabilidade; e na execução testamentária a
fidúcia. a fé, a confiança, a responsabilidade pessoalissima, é dado essencial.
A opinião que sustentamos, firmemente, em 1935, no Tratado dos Testamentos, Tomo V, sôbre de modo nenhum
se poder considerar representante dos herdeiros, ou da herança, como, sem exatidão científica se diz, o
testamenteiro, mas sim titular de cargo privado, é a que, hoje, sustentam HORST BARTHOLOMEYCZIK
(Erbrecht, 4a cd., 242) e muitos outros juristas. –
2. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.764: “O encargo da Testamentária não se transmite aos herdeiros
do testamenteiro, nem é delegável. Mas o testamenteiro pode fazer-se representar em juízo e fora dele, mediante
procurador com poderes especiais”.
3.ELABORAÇÃO. No Projeto primItivo, art. 1.921, dizia-se: “As atribuições do testamenteiro são
personalíssimas”. No Projeto da Câmara dos Deputados, art. 1.771, estabeleceu-se: “O encargo da Testamentária
não se transmite aos herdeiros do testamenteiro, não pode ser delegado; pode, porém, o testamenteiro fazer-se
representar nos atos judiciais e extrajudiciais por procuração com poderes especiais”. Proveio dó Projeto revisto,
art. 2.133.
4.DIREITO ESTRANGEIRO. No Código Civil francês, diz o art. 1.032: “Les pouvoirs de l’exécuteur
testamentaire ne passeront point à ses heritiers”. Cf. Código Civil italiano revogado, art. 909. Cf. Código Civil
espanhol, art. 910: “El aibacea no podrá delegar el cargo si no tuviere expresa autorización dei testador. Termina eI
albaceazgo por la muerte, imposibilidad, renuncia ó remoción deI albacca, y por cl lapso del término seflalado por
ei testador 6 por la ley”. Cp. Código Civil mexicano, art. 3.722, venezuelano, art. 973, peruano, artigo 821,
uruguaio, arts. 970 e 971. Estava no Código Civil português revogado, art. 1.906: “O encargo do testamenteiro não
se transmite aos herdeiros, nem pode ser delegado’k O Código Civil japonês, art. 1.118, admite delegação em caso
de necessidade.
No Código Civil italiano (1942), art. 710, está dito: “Su istanza di ogni interessato, l’autorità giudiziaria puô
esonerare l’esecutore testamentario daí suo ufficio, per gravi irregolarità nelI’adempimento dei suoi obblighi, per
inidoneità all’ufficio o per aver commesso azione che ne menomi ia fiducia”. No Código Civil português (1966),
art. 2.331: “1. O testamenteiro pode ser judicialmente removido, a requerimento de qualquer interessado, se não
cumprir com prudência e zêlo os deveres do seu cargo ou mostrar incompetência no seu desempenho. 2. Se forem
vários os testamenteiros nomeados conjuntamente e não houver acôrdo entre eles sôbre o exercício da
Testamentária, podem ser removidos, ou apenas algum ou alguns deles”.
5.INTRANSFERIBILIDADE “INTER VIVOS” E “CAUSA MORTIS”. Pôs por princípio o Código Civil, art.
1.764, que o cargo da Testamentária nem se transmite a herdeiros do testamenteiro, nem se delega. O acréscimo da
segunda parte do artigo pode significar outra coisa que aquilo que, embaixo de qualquer enuciado concernente a
pátrio poder, texto que disse: “mas pode o pai fazer-se representar em juízo e fora :êle mediante procurador com
poderes especiais”. Quer dizer: Patrio poder e Testamentária são pessoais, e a representabilade, judicial ou
extrajudicial, tem de ser de tal modo resalta, que não tire ao pai e ao testamenteiro o caráter pessoaisimo das suas
opiniões sôbre a execução dos seus atos.
7.INDELECABILIDADE DA TESTAMENTÁRIA. O art. 1.764 Código Civil diz ser indelegável o encargo da
Testamentária. quem lei a regra jurídica como se fosse proibitiva deixar-se a outrem a determinação do
testamenteiro. Quer for: assim como o art. 1.667, III, declara nula a disposição e institua herdeiro ou legatário
pessoa incerta, cuja indelegabilidade se cometa a terceiro, ter-se-ia de considerar o art. 1.764
vedativo de se deixar a outrem a determinação da indelegabilidade do executor testamentário. Seria a
indelegabilidade pelo testador. Porém não foi isso o que se regulou no art. 1.764. O que se proibe é que o
testamenteiro passe a outrem o cargo de execução testamentária. Mas, assim entendido, pareceu chocarem-se a
primeira e a segunda parte da regra jurídica, onde se diz “o testamenteiro pode fazer-se representar em juízo e fora
dele, mediante procurador com poderes especiais”. Já vimos que esta interpretação não tem nenhuma razão de ser:
a representação, que se permite, tem de conformar-se com aquela essencial intransmissibilidade.
8.DESIGNAÇÃO DO TESTAMENTEIRO. Diz a lei que não é delegável a Testamentária; isto é, não pode o
testamenteiro ceder ou transferir ou outorgar a outrem o encargo. Restam, porém, algumas questões: a) ~ Pode êle
deixar a alguém a missão de designar o testamenteiro? b) Pode confiar a escolha ao juiz? o) ~Pessoa jurídica, que,
no direito brasileiro, não tem capacidade para ser testamenteiro, pode receber a incumbência de escolhê-lo?
Quanto ao caso a) : A solução não pode ser a mesma que era a do direito português, onde a lei fora expressa em
reputar indelegável a nomeação, art. 1.740: “não pode.., deixar-se dependente do arbítrio de outrem, quer - . .,
quer, finalmente, pelo que pertence ao cumprimento ou não cumprimento do mesmo testamento”. Daí a solução
negativa de JOSÉ TAvARES (Sucessões e Direito Sucessório, 1, 716). No art. 1.764 do Código Civil brasileiro
não se cogitou da indelegabilidade pelo testador, e sim pelo testamenteiro. Não é a nomeação, mas o encargo, que
não é delegável. A questão da indelegabilidade da nomeação tem de ser discutida sem ser a respeito do artigo
1.764, porque este só se refere à intransmissibilidade voluntária ou hereditária da Testamentária.
No Código Civil português (1966), art. 2.384, apenas se diz: “A Testamentária não é transmissível, em vida ou por
morte, nem é delegável, bem que possa o testamenteiro servir-se de auxiliares na execução do cargo, nos mesmos
termos em que o procurador o pode fazer”.
Recorrendo à interpretação, não há caso análogo, que sirva e, uma vez que o não há, só os princípios gerais podem
acudir.
Se, no direito moderno, havia o exemplo, já bem velho, do Código Civil português revogado, contradizia-o, de
modo não pode significar outra coisa que aquilo que, embaixo de qualquer enunciado concernente a pátrio poder,
texto que dissesse: “mas pode o pai fazer-se representar em juízo e fora dele, mediante procurador com poderes
especiais”. Quer dizer: pátrio poder e Testamentária são pessoais, e a representabilidade, judicial ou extrajudicial,
tem de ser de tal modo restrita, que não tire ao pai e ao testamenteiro o caráter pessoalissimo das suas opiniões
sôbre a execução dos seus atos.
7.INDELEGABILIDADE DA TESTAMENTÁRIA. O art. 1.764 do Código Civil diz ser indelegável o encargo
da Testamentária. Há quem leia a regra jurídica como se fosse proibitiva de deixar-se a outrem a determinação do
testamenteiro. Quer dizer: assim como o art. 1.667, III, declara nula a disposição que institua herdeiro ou legatário
pessoa incerta, cuja identidade se cometa a terceiro, ter-se-ia de considerar o art. 1.764 como vedativo de se deixar
a outrem a determinação da identidade do executor testamentário. Seria a indelegabilidade pelo
testador. Porém não foi isso o que se regulou no art. 1.764. O que se proibe é que o testamenteiro passe a outrem o
cargo de execução testamentária. Mas, assim entendido, pareceu chocarem-se a primeira e a segunda parte da
regra jurídica, onde se diz “o testamenteiro pode fazer-se representar em juízo e fora dele, mediante procurador
com poderes especiais”. Já vimos que esta interpretação não tem nenhuma razão de ser:
a representação, que se permite, tem de conformar-se com aquela essencial intransmissibilidade.
8.DESIGNAÇÁO DO TESTAMENTEIRO. Diz a lei que não é delegável a Testamentária; isto é, não pode o
testamenteiro ceder ou transferir ou outorgar a outrem o encargo. Restam, porém, algumas questões: a) ~ Pode êle
deixar a alguém a missão de designar o testamenteiro? b) i,Pode confiar a escolha ao juiz? c) ~Pessoa jurídica,
que, no direito brasileiro, não tem capacidade para ser testamenteiro, pode receber a incumbência de escolhê-lo?
Quanto ao caso a) : A solução não pode ser a mesma que era a do direito português, onde a lei fora expressa em
reputar indelegável a nomeação, art. 1.740: “não pode.., deixar-se dependente do arbítrio de outrem, quer. ., quer,
finalmente, pelo que pertence ao cumprimento ou não cumprimento do mesmo testamento”. Daí a solução
negativa de JosÉ TAvARES (Sucessões e Direito Sucessório, 1, 716). No art. 1.764 do Código Civil brasileiro não
se cogitou da indelegabilidade pelo testador, e sim pelo testamenteiro. Não é a nomeação, mas o encargo, que não
é delegável. A questão da indelegabilidade da nomeação tem de ser discutida sem ser a respeito do artigo 1.764,
porque este só se refere à intransmissibilidade voluntina ou hereditária da Testamentária.
No Código Civil português (1966), art. 2.334, apenas se diz: “A Testamentária não é transmissível, em vida ou por
morte, nem é delegável, bem que possa o testamenteiro servir-se de auxiliares na execução do cargo, nos mesmos
termos em que o procurador o pode fazer”.
Recorrendo à interpretação, não há caso análogo, que sirva e, uma vez que o não há, só os princípios gerais podem
acudir.
Se, no direito moderno, havia o exemplo, já bem velho, do Código Civil português revogado, contradizia-o, de
modo causa ao testamenteiro: seria recorrer contra si mesmo. O juízo exigiu que a procuração desse poderes
especiais e expressos para o determinado recurso, porque era de presumir-se que os poderes concedidos não
abrangiam o de recorrer de despacho que mais se ajustava com o parecer, do testamenteiro.
De outra feita, o testamenteiro, pessoalmente, pagara um legado. Posteriormente, o advogado, nos autos, opôs-se a
isso, de modo que o legatário que juntara aos autos a cópia do recibo, no qual se continha interpretação
consentânea com o pagamento, negou poderes ao advogado. Examinada a procuração, foi isso o que o juízo
resolveu. Tais casos, que são frequentíssimos, mostram o alcance da regra legal que veda a delegabilidade do
cargo de testamenteiro.
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.765: “Havendo simultâneamente mais de um testamenteiro, que
tenha aceitado o cargo, poderá cada qual exercê-lo, em falta dos outros. Mas todos ficam solidàriamente obrigados
a dar conta dos bens, que lhes forem confiados, salvo se cada um tiver, pelo testamento, funções distintas, e a elas
se limitar Reúnidas da Côrte de Apelação do Distrito Federal, a 12 de janeiro de 1914 (E. de D., 83, 556),
acentuou que, havendo herdeiro necessário, o cálculo seria a parte disponível.
O Código Civil manteve a distinção entre cálculo e dedução. Disse bem o Tribunal de Apelação do Distrito
Federal, a 11 de agôsto de 1987, (A. J., 45, 168; sem razão, a 6.a Câmara Cível, a 14 de janeiro de 1936) “O
trabalho do testamenteiro não está necessàriamente em relação constante com as importâncias que administra, ou
distribui ou liquida. A gravação das legítimas por exemplo pode ser um trabalho simplíssímo e versar sôbre toda a
herança; o cumprimento de um legado universal pode não dar nenhum trabalho ao testamenteiro e abranger no
entanto toda a metade disponível ou ser a ela superior, quando os herdeiros não sejam da categoria de necessários;
ao inverso, a distribuição de pequenos legados ou mesmo o cumprimento de disposições sôbre bens da alma, pode
ser trabalhosíssima e não versar sendo sôbre infímas importâncias, caso em que, ainda que no máximo arbitrada,
não compensaria o prêmio os serviços prestados pelo testamenteiro; êsse inconveniente, como bem o demonstra
PONTES DE MIRANDA (Tratado dos Testamentos), foi obviado pela lei, permitindo que o juiz, calculando o
prêmio sôbre toda a herança liquida, o reduza a 1% nas heranças de maior vulto ou o eleve a 5% quando êsse valor
for reduzido, de sorte a equilibrar com realidade a remuneração devida pelos serviços prestados na execução do
testamento”.
8. ELABORÁÇÃO. No Projete primitivo, dizia o artigo 1.924: “Se o testamenteiro não for herdeiro nem
legatário, terá direito a um prêmio arbitrado pelo juiz, que atenderá à importância da herança e a maior ou menor
dificuldade da execução do testamento”. E o parágrafo único: “Êsse prêmio não poderá exceder a 5% da porção
disponível dos bens hereditários”. Como se vê, mandara-se contar até 5% da porção disponível, critério que nâo
vai prevalecer, mas a que, nos seus comentários, ficara preso o autor do projeto. Na Câmara dos Deputados, disse
o art. 1.773: “Quando o testamenteiro não for herdeiro, nem legatário, terá direito a um prêmio, que se não houver
sido fixado pelo testador, será de 1 a 5%, arbitrado pelo juiz, sôbre a herança líquida, conforme a importância dela,
e a maior ou menor dificuldade da execução do testamento”. E o parágrafo único: “Éste prêmio será deduzido
somente da metade disponível, quando houver herdeiro necessário”. A simples justaposição faz ressaltar a
diferença.
4.DEFINIÇÃO. Vintem é a remuneração percentual, até cinco por cento da herança, paga aos testamenteiros,
pelos seus serviços na execução do testamento e, eventualmente, no respectivo inventário. Trata-se, pois, de
quantia estipulada pro labore a administratione, com as peculiarídades de se ter de fixar nos limites percentuais de
um e de cinco e poder ser predeterminada nos testamentos.
Em qualquer dos casos, o testamenteiro tem direito do prêmio, como ao pagamento de quaisquer serviços que
preste. Ainda que a tivesse fixado o testador, não constitui liberalídade. Gomo a todo direito, corresponde a êle a
pretensão, no sentido de Anspruch, que o assegure (Código Civil, art. 75; L. RUHLENEECK, Das Biirgerlich.e
Gesetzbueh, ~ 2.~ ed., 276).
É gratuita a Testamentária: em Portugal (Código Civil revogado, art. 1.892), Espanha (art. 908), Venezuela (artigo
974), França e Itália; salvo quanto à dativa, no Japão (artigo 1.120). Remunerada: na Alemanha (§ 2.221>, Suíça
(artigo 517, in tine), Argentina (arta. 2.872 e 2.873), Uruguai (artigo 991), Peru (art. 830), México (art. 8.756), e
Bolívia (art. 606).
No direito brasileiro, se o testamenteiro não é herdeiro, nem legatário, tem direito à remuneração, ao prêmio, como
se diz na lei. Ou o testador o fixou; ou o juiz o tem de fixar, de um a cinco por cento. Se há herdeiro necessário, ou
se há herdeiros necessários, só se deduz da metade disponível. Se um testamenteiro só exerceu por determinado
tempo a função e outro lhe sucedeu, tem-se de atender ao tempo e à qualidade de serviço, para que se divida o
percentual. O testamenteiro destituído nenhum direito tem ao prémio, mesmo se somente de parte.
As despesas feitas pelo testamenteiro para o exercício do seu ofício são a cargo da herança. Não podem atingir as
quotas necessárias; e tem-se de pré-excluir tudo que foi despendido temerâriamente, ou com defesas simplesmente
dilatórias e inúteis. O dinheiro pode ter sido retirado da massa hereditária, ou antecipado pelo testamenteiro.
Os herdeiros legítimos necessários ou não, têm direito ao prêmio (3.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul, 14 de janeiro de 1945, J., 26-27, 228 s.).
Se o testador, ou o juiz, nomeou testamenteiro cônjuge de algum dos herdeiros legítimos, tem o testamenteiro
direito à remuneração, porque se trata de função pessoal, estranha a. herança legítima, mesmo se o testamenteiro é
casado sob o regime da comunhão universal de bens (2~~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 9
de novembro de 1958, D.dai. de 24 de março de 1955).
Decretada, com trânsito em julgado, a nulidade ou a anulação do testamento, não tem a pessoa que foi
testamenteiro direito ao prêmio. Se já o recebera, tem de devolvê-lo. A fortiori, se o caso é de- inexistência
(falsidade do testamento, cf. 8•a e 4a Câmaras Cíveis do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 16 de janeiro de
1939, com voto de desempate de PONTES DE MIRANDA, Presidente>.
6.EvOLUÇÃO DA LEI E DA PRAXE. ~ preciso notar que tal evolução foi só a do direito escrito, tardo, assaz
tardo, no Brasil e em Portugal, em ver a vida, em trazer à forma legal a regra que, nos atos, já se observa.
Continuou-se a querer que os costumes não derroguem as leis e a cada passo se vê o desmentido a êsse afã de
tentar prender em malhas abstratas o surto irrefreável da existência.
Já ao tempo das Ordenações Filipinas discutiam os doutôres; e a praxe teve em AGOSTINHO BAREOSA (Vota
decisiva Canonina, 126, n. 143) e em MIGUEL DE REINOSO (Observa.tiones Praeticae, 55, n. 23) quem
aprovasse o pedirem os testamenteiros a paga dos seus trabalhos. Aliás, decidiam questão anterior, renhida, entre
SPINO, BAEÇA e outros. Com eles, ficou PASCOAL JosÉ DE MELO FREIRE, sempre propenso ao realismo
jurídico e à atenuação da mal compreendida rijeza dos textos (Institutiones furis Civilis Lusitani, Livro III, Título
6, § 15) : “possunt tamen a iudice salarium petere, qui illud suo arbitrio dare, et aestimare debet pro modo
facultatum defuncti, et ad loci consuetudinem”.
9.JuÍzo nos PRÊMIOS. Ainda que o inventário corra noutro juízo, só o Juiz da Provedoria poderá arbitrar prêmios
(Alvará de 23 de janeiro de 1798; Decreto n. 834, de 1851, art. 87; Decreto n. 1.405, de 1854; Código do Processo
do Distrito Federal, art. 814; Decreto n. 16.273, de 1923, art. 90, §§ 4 e 5).
A Relação do Rio de Janeiro, nos acórdãos de 6 de agôsto de 1853 e 20 de setembro de 1850, decidiu que o juiz do
inventário é competente para resolver as dúvidas existentes sôbre o modo de contar as percentagens, se bem que
não o seja para arbitrar, julgar devidos ou não devidos os prêmios. Vemos reproduzida, sem comentário, tal
atribuição de competência (JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA ALVES, Consolidação das Leis relativas ao Juízo
da Provedoria, 1, 5a ed., § 227). Ora, se o Juiz da Provedoria arbitrou, teve, por lei, o dever de considerar, no seu
ato, o valor da herança; portanto, serviu de base em sua consciência, para fixação, justamente importância de que,
agora, se suscitam dúvidas. Uma interpretação que diminua ou aumente este quanto necessáriamente diminuirá ou
aumentará o prêmio. Levantada a questão perante êle, pode bem ser que julgue procedente a impugnação do modo
de liquidar e, quiçá, em consequência, deficiente ou exorbitante a percentagem. Permitir ao juiz do inventário
intrometer-se na aplicação do despacho de outro, constituiria evidente absurdo processual.
10.COMO SE CALCULA O PRÉMIO. Para se contar o prêmio, deduzem-se as dívidas passivas e despesas de
enterro e funerais. É do líquido, e não da massa geral dos bens, que se abate a percentagem (Alvará de 23 de
janeiro de 1798, Decreto n. 834, art. 87). Mas pode ocorrer que as dívidas passivas absorvam todos os bens. Nesse
caso excepcional, para que não fiquem sem remuneração os serviços prestados ao espólio, resolviam JOAQUIM
AUGUSTO FERREIRA ALVES <Consolidação das Leis relativas ao Juízo da Provedoria, 1, 5? ed., § 219; Da
Sucessão testamentária, Manual do Código Civil brasileiro! 19, 447 s.), e CLÓXTIS BEvILÁQUA (Direito das
Sucessões, 373) que se arbitrasse o prêmio, pagando-o os credores. Outra solução buscou-se, após o Código
(ITABAIANA DE OLIVEIRA, Elementos de Direito’ das Sucessões, § 718) : despesa judicial, com privilégio
geral (art. 1.569, II), ou especial sôbre a coisa arrecadada e liquidada (art. 1.566, 1), ter-se-ia de respeitar o prêmio.
Mas, se bem olharmos as realidades, veremos que, em espólio cujo passivo absorve o ativo, é nenhuma, por bem
dizer,a função do testamenteiro. A do inventariante, sim, pode ser útil no arrecadar e liquidar os bens. Se o
testamenteiro arrecadou e liquidou, não há discutir: assiste ao prêmio o privilégio. Será, contudo, difícil imaginar a
utilidade dos serviços de testamenteiro, em espólio negativo, quando este não é inventariante, nem tem a posse e a
administração dos bens. Na Alemanha, é dívida da massa (L. KUHLENBECK, Das Elirgerliche Cesctzbuch, ~JJ,
23 ed., 276; F. HERZFELDER, Erbrecht, J. vou Staudingers Kommentar, V, 7i’-83 ed., 590; contra A.
WEISSLER, Das deutsehe Nachlassverfahren, 204).
11.DEDUÇÃO DA PERCENTAGEM. ~De que se deduz o prêmio? No direito anterior, deduzia-se da metade
disponível. se houvesse herdeiro necessário, e de toda a herança líquida, nos outros casos (Decreto n. 1.405, de 3
de julho de 1854). No Código Civil, fala-se em toda a herança líquida (art. 1.766), salvo (parágrafo único) se há
herdeiros necessários. Por onde se vê que ocorreu perfeita continuidade do direito escrito. Porém a redação criou
distinção entre o modo de calcular e a dedução para pagamento.
Aliás, antes do Código Civil, já era praxe distinguirem-se, indo ao encontro disto o Decreto n. 1.405. No Alvará de
28 de janeiro de 1798, dispunha-se que “haverão por prêmio de seu trabalho (os testamenteiros) o prêmio do que
se apurar da herança, segundo a praxe testamentária observada nestes remos”. Mas a dedução, a êsse tempo, fazia-
se do monte partível, com prejuízo do princípio da inviolabilidade das legitimas. Foi o Decreto n. 884, de 2 de
outubro de 1851, que ressalvou o direito dos herdeiros necessários, mandando que se imputasse na parte
disponível (art. 37). Apagaram-se as dúvidas então existentes Mas o mesmo Decreto mandava calcular sôbre o
testado, e não sôbre o monte. ~ Não tinha importância a invocação? Que a tinha, prova-o a reclamação do
MARQUÊS DE ABRANTES, presidente do Recolhimento de Santa Teresa. Ficava assaz restrito o máximo do
prêmio (então sôbre a têrça. o que valia dizer: sôbre 1 2/3% da herança). O Conselho de Estado, com o parecer,
provocou (CÂNDIDO MENDES DE ALMEIDA, Imperiais Resoluções do Conselho de Estado, 468) o Decreto n.
1.405, cujo art. 1 equilibrou os interesses em jôgo: cálculo sôbre a herança e dedução somente da parte testável.
Interpretando-o, porque se quis, a despeito da mudança, manter a praxe, criada pelo Decreto n. 884, esclareceu,
ainda em 1.0 de agôsto de 1904, a Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal: “Cumpre notar que o
mencionado Decreto de 1854 contém nos seus dois primeiros artigos duas disposições diferentes, pois no primeiro
estatuiu sôbre o modo de contar ou calcular o prêmio e no segundo sôbre o modo de realizar o pagamento. Assim,
segundo o artigo primeiro, o juiz deve arbitrar o prêmio atendendo ao valor da herança; e pelo art. 2 determina-se
que o pagamento se faça deduzindo-o sômente da taça, quando houver ascendentes ou descendentes; e de tOda a
fazenda líquida nos outros casos. Ora, como a palavra
herança significa a universidade dos bens deixados pelo decujo e não simplesmente a têrça, não se pode restringir
a expressão herança, de que usa o citado art. 1, à herança testamentária, como o fêz a sentença apelada. O
fundamento de que o testamenteiro só pode ocupar-se da herança testamentária ou têrça é de todo improcedente,
porquanto casos há em que, embora existam herdeiros necessários, o trabalho de liquidação incumbido ao
testamenteiro, aplica-se a todos os bens do testador, como no caso de testamenteiros universais, que como tais
tomam conta de toda a herança, fazem o inventário e as partilhas”.
Tinha razão o MARQUÊS DE ABRANTES: o prêmio da parte disponível seria por tal forma amesquinhada, tão
pequeno o prêmio “que ninguém só por êle quererá encarregar-se de tal ônus”.
Depois do Código Civil e a despeito da tradicional distinção, ainda se discutiu a maneira de calcular-se, e houve,
como há, na jurisprudência, decisões díspares. Em 20 de setembro de 1918, decidiu, em câmara plena, o Tribunal
de São Paulo que, havendo herdeiro necessário, se calculasse sôbre a metade disponível, e não sôbre a herança, o
prêmio arbitrado. Era a volta ao regime profligado pela reclamação ABRANTES e pelo antigo Conselho de
Estado. No Distritq Federal, tinha-se mantido a dualidade conceptual, modo de calcular e modo de deduzir, com a
qual, se lermos o Código Civil, veremos que êle bem se ajusta: no art. 1.766, cogita da herança toda <“sôbre toda
a herança líquida”). No parágrafo único, fala de dedução (“este prêmio deduzir-se-á somente da metade disponível
quando houver herdeiro necessário”).
Os advogados e juristas continuaram dissidindo, e a análise de dois pareceres poderá clarear o assunto nos termos
que, ainda em 1924, o punham os discordantes. CLÓVIS BEVILQUA (Revista de Direito, 78, 489) argumentava:
a) que a função do testamenteiro só se refere à parte testamentária ou disponível, e não à legitima, círculos
diferentes de relações jurídicas; b) que o art. 1.766 manda calcular “sôbre a herança liquida”, porém é claro que se
reporta à herança testamentária; e) que o artigo não se acha no título da sucessão em geral, mas da sucessão
testamentária: “a lei não manda que o testamenteiro oficie na sucessão legítima, e seria extravagância pensar isto”.
Portanto, conclui, se há de deduzir, quando houver herdeiro necessário, da porção disponível, e sôbre ela, e só
sôbre ela se conta. Ao primeiro argumento, o da letra a), respondemos: não é certo que a função do testamenteiro
só se refira à herança testamentária, cabe-lhe velar pelo testamento e pela voluntas testantium, que, ainda nos
casos de herança necessária, incide nas próprias legítimas; justamente uma das mais delicadas funções que hoje
tocam aos testamenteiros é a de oficiar, pugnar, usar de recursos, na interpretação e execução da vontade do
testador quanto às próprias legítimas (art. 1.728). Já dissemos que toda a herança poderá ir aos herdeiros
necessários, por não os haver testamentários, nem legados, nem modus, e no entanto existir nomeado, ou dever sê-
lo pelo juiz, o testamenteiro. No direito brasileiro, a a Testamentária abrange tais atribuições, que admira
escrevesse CLÓvrn BEvILÁQUA ser extravagância pensar-se em ofício do testamenteiro nas sucessões legítimas.
Pode ocorrer que so seja este o seu cargo: converter bens da legítima, gravá-los de inalienabilidade,
incomunicabilidade, ou livre administração pela mulher herdeira. Quanto ao segundo argumento, o da letra b), não
é claro, como disse, que se refira à herança testamentária: o elemento histórico atesta o contrário e está presente à
memória dos juristas o incidente ABRANTES, significativo e explícito. Quanto ao terceiro e último, pouco lhe
serve o fato de estar no título da sucessão testamentária, e não da sucessão geral, o art. 1.766: também naquele
título há regras sôbre as legítimas (arts. 1.721-1.724) ; e, além de outros dispositivos, todo um capítulo sôbre
herdeiros necessários. Ora, se havia a controvérsia, havemos de interpretar que a desfez o Código Civil (R. de D.,
73, 485-489), conforme lhe opuseram. Na doutrina, com a interpretação que unifica modo de contar e dedução de
prêmio, há CLóvís BEvILÁQUA (Código Civil comentado, VI, 236), que vai além deduz-se da metade
disponível, mas só se conta sôbre o que efetivamente dispôs o testador, TITo PRATES DA FONSECA (Sue essão
testamentária, 841), que parece querer o cômputo sôbre o testável (metade disponível, e não, como CLÓVIS
BEVILÁQUA, o disposto). Contra CLÓVIS BEVILÁQUA e, pois, com a distinção tradicional, ALFREDO
BERNARDES, CARVALHO MOURAO (Revista de Direito, 73, 485-489), ITABAIANA DE OLIVEIRA
(Elementos de Direito das Sucessões, 470) e, ambíguo, JOAQUIM AUGUSTO FERREIRA ALVES (Da Sucessão
testamentária, Manual do Código Civil brasileiro, 19, 448).
Parece-nos, porém, que é preciso descer à realidade da questão. A única importância da contenda está no valor
máxímo, no limite intransponível, dos 5%. Porque, as mais das vêzes, nos casos concretos, apreciando a justiça do
arbitramento, o que os Tribunais deviam fazer era verificar se, contada sôbre toda a herança, injusta a percentagem
ou (opinião pessoal de algum juiz) sôbre o efetivamente disposto, diminuta. Mas, in abstracto, contada como
queria CLóvís BEVILÁQUA, haveria testamenteiros sem prêmio: como se não deixou herdeiros testamentários,
nem legados, nem, sequer, encargos; ou com infima remuneração: se testou muito pouco. Lembre-
-nos a reclamação ABRANTES, cheia de realismo e de bom senso: com tão maus pagamentos, ninguém quereria
tais responsabilidades, que não são pequenas. Na prática, a opinião extremista do cálculo sôbre o testado não
poderia prevalecer, a tantos absurdos levaria. Toma-se, ao acaso, um testamento:
monte partível, um milhão e tantos mil cruzeiros novos; por haver herdeiros necessários, metade testável,
quinhentos mil e tantos cruzeiros novos: nenhum herdeiro testamentário, um só legatário, de mil cruzeiros novos,
o que vale dizer efetivamente disposto na porção testada, mil cruzeiros novos; missão do testamenteiro, vender
todos os bens do espólio, ultimar os reparos de um prédio, defender a voluntas testantium (quiçá, também, o
testamento) quanto às diferentes cláusulas que gravam as legítimas, exercer a posse e a administração da herança.
Máximo arbitrável, segundo CLOVIS BEVILÁQUA:
cinquenta cruzeiros novos.
Segundo o Tribunal de São Paulo: vinte e cinco mil cruzeiros novos. Ressalta a arbitrariedade da solução CLÔvIS
BEVILAqTJA. O MARQUÊS DE ABRANTES, que tanto se irritou com a solução do cálculo sôbre o testável,
certo se indignaria diante da inovação hodierna. Outro testamento: monte partível, cinquenta mil cruzeiros novos,
mas resultado de liquidação de um ativo superior a dois mil cruzeiros novos, trabalhosa e acidentada; metade
testável, vinte e cinco mil cruzeiros novos. Solução do Tribunal de São Paulo: máximo arbitrável, mil duzentos e
cinquenta cruzeiros novos.
Vejamos agora a possibilidade mínima e máxima segundo o critério tradicional da distinção entre cálculo do
prêmio e dedução. No testamento de um milhão e tantos cruzeiros novos: mínimo, dez mil cruzeiros novos e tanto;
máximo, cinquenta mil e tantos cruzeiros novos. Havendo herdeiros necessários, saem dos quinhentos e tantos da
parte disponível pelo testador, sem ofensa, portanto, do principio da inviolabilidade das legitimas. No testamento
dos cinquenta mil cruzeiros novos, dois mil e quinhentos cruzeiros novos é o máximo, que, havendo herdeiros
necessários, se deduzirá dos <vinte e cinco, inatingidas as legítimas, menos injusto que o prêmio de mil duzentos
e cinquenta cruzeiros novos da solução do Tribunal de São Paulo. Se imaginarmos que o primeiro testamento não
tinha o legado de dez mil cruzeiros novos e o segundo, nem herdeiros testamentários, nem legatários, e
seguíssemos à risca o que diz CLÓvIS BEVILÁQUA (Código Civil comentado, VI, 286) : “o prêmio deduzir-se-á
da metade disponível, mas deve ser calculado sôbre a porção de que, efetivamente, dispôs o testador”, teremos
testamenteiros sem prêmio.
Não foi isso, nem outra solução que o Código Civil acolheu. Já longe estamos da gratuidade da Testamentária, que
as forças da vida fizeram ceder às práticas, bem mais razoáveis, derrogadoras de textos insensíveis e abstratos.
Nem o elemento histórico, nem a análise das relações, nem a significação aritmética do mínimo e máximo da
percentagem, justificam sotopor-se a letra da lei a exegese da unificação dos modos de contar e de deduzir.
Alhures, e. g., no § 2.221 do Código Civil alemão, que reconhece o direito à remuneração, não lhe prescreve
limites abstratos de máximo e de mínimo.
12. HERANÇA LIQUIDA. Se o testador era solteiro, desquitado, ou viúvo, ou, casado, todos os bens eram
separados, por força do regime. Herança líquida é o líquido de todos os bens, o monte Uquido. Se, casado, tinha
bens comuns e eram todos (comunhão universal), herança liquida é o líquido da meação. Sôbre esta meação é que
se conta o prêmio e da metade dessa meação é que se deduzirá. Porque só esta metade constituí o testável ou
disponível.
Se as -dívidas passivas abrangem toda a herança, os credores têm de pagar o prêmio do testamenteiro (5.~ Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 20 de junho de 1952, 1?. dos T., 203, 840), se exerceu alguma função.
13. CRITÉRIOS NO ARBÍTRIO. O Código Civil manda que o juiz arbitre sôbre a herança líquida, atendendo: a)
à importância dela; b) à maior ou menor dificuldade na execução do testamento (Código Civil, art. 1.766). Além
desses elementos, cogitava de outro o Decreto nº 1.405, de 1854: o costume do lugar. Velho critério, ad boi
consuetitdinem, que aparece nos atenuadores da gratuidade reinícola da função de testamenteiro. Hoje, não tem o
juiz de observá-lo: arbitra, por força da lei, e a referência do Decreto de 1854, art. 1, apenas denunciava a origem
consuetudinária da sua faculdade de arbitrar. Pois que lhe vinha do costume, e não da lei, o poder, tinha êle de
beber no ambiente a sugestão fixatória. Com este terceiro elemento, variava, de lugar em lugar, a norma de
arbitrar, pluralismo de decisão, peculiar, na sua natureza fragmentária, a todas as formações costumeiras
(PONTES DE MIRANDA, Introdução científica, ns. 1, 141 e 160; Rechtsgef’ifld und Regriff des Rechts, 191 e
248; Fontes e Evolução do Direito Civil Brasileiro, 31 e 50 s.). Mera sobrevivência, a remissão do Decreto de
1854, que o Código fêz bem cm riscar.
Hoje, prêmio é remuneração de serviços. Seria exato preço deles, se a lei não cogitasse de outro elemento: o valor
da herança. Mas este valor tinha, necessariamente, de vir à balha, pois o critério adotado não consiste em somar
parcelas dos serviços prestados, como se paga a conta de um fornecimento, mas em determinar quanto por cento
se há de deduzir. Aliás, não havia possibilidade de outra recomendação legal: os trabalhos podiam ser tais, que
absorvessem grande parte da herança, e então o pagamento, mesmo justo, importaria em grande despesa para o
monte; podiam ser pequenos, mas pelo valor da herança e responsabilidade (elemento moral) do testamenteiro,
ridícula a paga ao executor. A lei preferiu o expediente quantitativo (nosso Fontes e Evolução do Direito Civil
Brasileiro, 296; Sistema de Ciência Positiva do Direito, II, 249) o mínimo de 1%, que tem a consequência, às
vêzes, de pagar muito a quem trabalha pouco, e o máximo de 5%, que, não raro, fica aquém dos serviços
prestados.
A fixação dos prêmios é função de muitas variáveis. Deve o juiz, com a prática, atender ao máximo destes dados,
que a fazem crescer ou decrescer. Um dos critérios, assaz fácil e justo, é o de se partir da metade do quanto
arbitrável (2 1/2) e examinar os elementos a que chamaremos aumentativos e diminutivos.
São elementos aumentativos: a) Exercer o testamenteiro a função de inventa riante, que devia caber ao cabeça-de-
casal, ou ao herdeiro, e só em falta deles lhe toca (art. 1.579, § 3,0), b) Exercer a função de cabeça-de-casal, pois,
então, toda a herança está distribuída em legados e lhe fica toda a responsabilidade hereditária (art. 1.769). e) Ter
havido luta na defesa (vitoriosa) de disposições restritas, apostas pelo testador à herança ou ao legado. d) Não
haver contrato de honorários pagos pelo espólio ou pelas quotas dos herdeiros, para auxiliar o exercício da
Testamentária ou dele e do inventário, e) Dificuldade, ou longa duração, como conversão de juros em apó•lices,
no cumprimento dos encargos, ou legados. f) Correção, presteza, dedicada exatidão no exercício do cargo,
elemento que, na boa ordem dos serviços forenses, não pode deixar de conferir certo valor qualitativo ao trabalho
do profissional.
São elementos diminutivos: a) Haver contrato de honorários, pagos à parte. b) Não ser o inventariante, nem
exercer as funções de cabeça-de-casal, e) Não ter havido luta judicial, sem trabalho de persuasão em interpretação
de cláusulas testamentárias. d) Ser assaz simples e não trabalhosa a testamentaria.
Já vimos escrito que, representado, em juízo, por advogado, o testamenteiro, e aprovado, após a audiência dos
interessados, o contrato de honorários, serão pagos pelo acervo hereditário, por serem despesas feitas com o
desempenho do cargo e a execução do testamento. Até aqui, perfeitamente jurídico. Mas acrescentou-se: o prêmio
nada tem com isso.
Cumpre distinguir. Do prêmio não se irá subtrair o que ao advogado se pagou. Porém, antes, por ocasião do
arbitra. mento, não poderia o juiz deixar de ter em vista a testamentaria que, pelo próprio testamenteiro, se
exerceu, se bastou, e a outra, que dividiu com outrem o serviço.
Outro critério pode seguir o juiz: partir de um e subir em função dos serviços prestados. Só atenderá aos elementos
aumentativos.
14.OUTRAS FUNÇÕES DO TESTAMENTEIRO. Dissemos que o testamenteiro não pode reclamar paga pelos
serviços que, na execução do testamento, prestou como advogado ou guarda-livros. Acrescentamos que no prêmio
tudo se inclui. Mas, se êsse testamenteiro é advogado notável, cujos serviços avultam no curso do processo, ou
ressaltam a lisura, a dedicação, a presteza, com que promoveu as medidas prescritas, a liquidação do espólio, não
deve o juiz deixar de levar em conta, como elemento aumentativo da percentagem a arbitrar, a qualidade, digamos,
de tais serviços.
Em geral, para se apreciarem os serviços do testamenteiro, devem levar-se em conta os que êle prestou como
advogado, tabelião, etc. (F. HERZFELDER, Erbrecht, 3’. von Staudingers Kommentar, v, 7a,,8a ed., 590).
Mas os serviços de advogado ao espólio, fora da função testamentária, como a defesa em ação, contra os
herdeiros por dívida do falecido ou possessória em que era réu ou autor o falecido, contam-se à parte.
15.ALTERAÇÕES DOS CRITÉRIOS. Mas há circunstâncias que podem deixar de atuar, e. g., todos os herdeiros,
maiores, convêm no quanto do prêmio, e o testamenteiro o aceita. ~ Por que, então, a intervenção do juiz negando-
lhe aprovação? Pela voluntas testantium, falará o Curador de Resíduos. Se não houver discordância, deve o juiz
abster-se de recusar-lhes assentimento, salvo se contravém ao testamento ou à lei, ou tiver fito de lesar a algum
dos herdeiros ou interessados. Tudo, ax~ se resume em prudência. Cumpre, porém, observar que, nestes acôrdos,
sempre se há de ouvir a Fazenda, e evitar o juiz que se destine o alto valor do prêmio a diminuir quotas
inalienáveis ou gravadas. Os doutrinadores alemães (F. RIThEN, em G. PLANCE, Biirgerliches Cesetzbuch, V,
422; L. KUHLENBECK, Das Riirgerliche Gesetzbuch, III, 2.~ ed., 276> são acordes em dizer que, se, em
primeira linha, há de atender-se à vontade do testador, em segunda vem a concordância das partes inte-ressadas.
Compreende-se: podem contratar, podem e devem ser atentas ao seu interesse. Somente se há órfáos, ausentes ou
interditos é que perde valor, como elemento para se arbitrar a comissão, o fato de aquiescerem ou indicarem uma
percentagem, nos limites legais, os herdeiros e fiscais. Certo, no direito brasileiro, não está o juiz adstrito a isso;
mas é aconselhável que, por equidade e partindo da consideração de serem bons julgadores do próprio interesse os
herdeiros, e se isso não lesar o testamenteiro, adote o quanto; passa a ser, com a forma ou sem ela, homologação
judicial de arbitramento.
Vemos, todos os dias, virem os testamenteiros alegar a necessidade de constituir advogados para a defesa de
recurso& ou de despachos recorridos. Quiçá de outros interesses processuais do espólio. Não poderá o juiz,
reconhecendo-a, desaprovar•o contrato de honorários e, neste, terá de considerar a qualidade dos serviços
prestados. Ora, se há recursos, lides, e o testamenteiro, advogado, não recorre a outrem, não onera o espólio com o
contrato de honorários, provavelmente percentual, justo é que o juiz, no arbitrar, eleve, em consideração disso, o
prêmio.
É prática lastimável pedirem os advogados, sem qualquer exposição, o arbitramento dos prêmios. Há serviços que
não estão bem visíveis nos autos, que se escondem em verbas testamentárias de conversões, em instruções
relativas a fazendas, fábricas, etc, O simples exame perfunctório dos autos não dará ao juiz os dados para arbitrar
com justiça. Tudo aconselha a que os testamenteiros, ao requererem arbitramento de prêmios, dêem as
informações complementares. Alguns pagaram, à parte, advogados, por ocasião de agravos, em que venceram em
proveito do testamento, outros, advogados, os defenderam por si sós; porém tudo isso se deve expor, esclarecer.
16.CÔNJUGE E PRÊMIO. Na falta de testamenteiro nomeado pelo testador, dizia-se que ao cabeça-de-casal
competia a execução testamentária (Código Civil, art. 1.763). Portanto, antes dos próprios herdeiros. Com o
Código de Processo Civil, art. 469, 1, ficou em primeiro lugar o “cônjuge sobrevivente, quando de comunhão o
regime”. No art. 1.766, excluem-se do prêmio herdeiros e legatários. Quais sejam estes herdeiros e legatários,
adiante discutir-se-á. Mas do cabeça-de-casal ou cônjuge sobrevivo não cogitou a regra jurídica sôbre prêmio,
nem, razoavelmente, tinha de cogitar. No regime da comunhão de bens, ou lhe cabe o que é seu, a meação, ou, se
alguma coisa lhe foi deixada expressamente, ou por se não haverem nomeado herdeiros, ou por força do art. 1.726,
será, além de cabeça-de-casal, herdeiro instituído, ou legatário, ou herdeiro legítimo, e então nesta qualidade é que
se lhe há de apurar o direito a prêmio. Deslocar-se-ia a questão.
A qualidade pura de cabeça-de-casal não lhe tira a justa pretensão à prêmio. É insustentável a opinião dos que lha
negam pela razão de lhe cumprir fazer o inventário e dar partilha dos bens (AGOSTINHO MARQUES
PERDIGÃO MALHEIRO, Manual do Procurador, 479; CLÓvIS IBEVILÂQUA, Direito das Sucessões, ~ 102).
Confusão, que vemos em vários lugares, entre execução testamentária e função de inventariar. Proceder ao
inventário é obrigação do cônjuge meeiro, mas pugnar pelo testamento, não. Por isso, muito se vê renunciar o
cônjuge àTestamentária, sem abrir mão da inventariança. Inventariar, partir, certo lhe interessa, ainda que menor,
noutros regimes, a sua porção. Mas assumir a missão de executar, quiçá pleitear a validade do testamento
impugnado, pode não ser do seu interesse e ainda mais contrário a êle.
19.CÔNJUGE DO HERDEIRO INSTITUIDO. A regra é a seguinte: quando o testamenteiro for casado com o
herdeiro instituído, o que muito ocorre em sendo este do sexo feminino ou interdito, e na qualidade de interessado
ou parente foi nomeado pelo testador ou pelo juiz, não poderá reclamar prêmio. O cônjuge testamenteiro somente
terá direito ao prêmio se o teria, na espécie; o herdeIro ou legatário, em cujo lugar figura.
Mas, ainda neste caso, é recomendável interpretar-se o testamento. Pode bem ser que outra coisa tivesse querido,
embora não explicítamente, o testador. Demos exemplo: meação aos herdeiros neCessários; metade disponível,
distribuída entre eles; primeiro testamenteiro, um estranho, advogado; segundo testamenteiro, outro estranho,
também advogado; terceiro testamenteiro, outro advogado, genro do falecido; prêmio:
5%.Diante de tal verba tem o juiz de considerar separada-mente a qualidade de genro e a de testamenteiro. O que o
testador pretendeu foi confiar a profissional, e não a parente (pode até acontecer que um dos herdeiros seja
advogado) o cargo da Testamentária.
Ocorrerá o mesmo se, ao tempo da morte, não se achavam casados o herdeiro e o testamenteiro. Mas, como
réplica, podemos figurar outro caso: não ser herdeiro, nem legatário, nem casado com herdeiro ou legatário, o que
exerce a Testamentária, e no entanto nada lhe caber de prêmio. Basta que o testador diga: “pois a herdeira A,
confia imensamente em
será meu testamenteiro ela, ou, fazendo as vêzes dela, E”. A relação de confiança é entre A e E. Se o testador
preteriu a outros, só o fêz em atenção à herdeira, que, ex hnpothesi. moralmente é mais testamenteira que E. Não
quer isto dizer que se não possam buscar informes sôbre esta relação, para se conhecer o verdadeiro conteúdo da
disposição testamentária. Papéis, notas e conversas podem servir para revelar, em toda a sua inteireza, a vontade
do testador. Por isso mesmo, é aconselhável que, havendo dúvidas sôbre a premiabilidade da Testamentária, de
comêço se levante a questão. Infelizmente, só a vemos suscitada por ocasião do cálculo, já adiantados os serviços,
resolvidas as interpretações, algumas vêzes decidida a própria validade do testamento. Em suma: quase executado
ou prestes a isso.
Para que o testamenteiro não tenha direito ao prêmio, e preciso que seja “herdeiro ou legatário”. Se quem sucede
na herança ou no legado é casado sob o regime da comunhão de bens, e testamenteiro é o cônjuge, não se devia
negar ao cônjuge, que é testamenteiro, o direito ao prêmio. O testamenteiro não herdou. Mas há, hoje, o art. 548, §
2.0, do Código de Processo Civil. O acórdão da 1•a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 9 de maio de 1949 (1?.
dos T., 191, 431), que negou direito ao prêmio ao testamenteiro casado com legatária foi justo, como o da 5•a
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 30 de maio de 1952 (203, 333).
O cálculo para o percentual é sôbre toda a herança líquida, ou sôbre a parte disponível, se há herdeiro necessário.
Não há outro pressuposto legal. Ao juiz fixar o quanto, com exame do caso e das circunstâncias, sem que possa
dizer, como fêz a 2•a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 27 de maio de 1947 (11. 1’., 117, 85), que “o
testamenteiro só tem direito a percentagem sôbre todo o patrimônio quando sua intervenção tiver abrangido o
acervo, integralmente”. Só há o limite legal resultante da existência de herdeiro necessário; mas êsse limite é para
a dedução, e não para o cálculo (cf. Tribunal de Justiça de Alagoas, 30 de novembro de 1948, O D., 60, 262:
se calcular e deduzir tivessem no texto idêntica significação, a parte final do artigo, mandando deduzir a vintena
de todo o acervo da herança, constituiria imperdoável redundância. Bastaria, aliás, atentar nas construções verbais
calcular sobre e deduzir, verificar-se-ia que os dois verbos exprimem coisas diversas, e que o último tem apenas a
função de indicar a fonte de onde deve sair o pagamento”). Disse a 3ª Câmara Civil do Tribunal de Apelação de
São Paulo, a 2 de março de 1938 (ti. dos. T., 113, 682) : “. . . é impossível acolher o princípio de que a vintena
deve ser calculada sôbre o montante das deixas testamentárias. Tais deixas nunca poderão ser equiparadas a toda a
herança líquida, de que fala o art. 1.766 do Código Civil” (cf. 43 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 4 de outubro de 1951, 197, 280).
Se a herança ou legado foi deixado com a cláusula de incomunicabilidade, ou outra, que o implique, não se poderá
negar nos casos ordinários, ao cônjuge testamenteiro, o direito ao prêmio.
Portanto, a questão não podia ser posta em termos simplistas: j cônjuge do herdeiro instituido ou do legatário tem
direito ao prêmio? TEIXEIRA DE FREITÂs (Tratado de Testamentos e Sucessões, de A. J. GOUVEIA PINTO,
254), distinguia os regimes do casamento. Se a herança ou legado se comunica, o marido faz as vêzes da mulher
nos serviços de testamenteiro, ou a mulher, se exerce o cargo, as do marido, herdeiro ou legatário. O extinto
Código do Processo do Distrito Federal, artigo 814, § 2, entendeu meter-se nesse assunto de direito material:
“Sendo o testamenteiro casado com herdeira, ou legatária, do testador, não terá direito ao prêmio, se o regime do
casamento for o de comunhão de bens”. Entenda-se herdeira instituída. Mais: quando ela, se exercesse o cargo,
não teria.
As circunstâncias criam tantos e tão diferentes casos que as regras, quaisquer que sejam, falham. Trata-se de
questão de vontade do testador: na falta de elementos ex testamento: é que se recorre a textos de lei.
O regime de bens do casamento constitui critério para a presunção. Mas elidível esta, aqui como nos outros casos.
Não se deve adotar exclusão absoluta, como talvez se tirasse da Consolidação das Leis Civis, de TEIxEIRA DE
FREITAS, art. 1.139, nota 54, nem o direito brasileiro tirava ao poder judicial o exame da questão (Aviso n. 45, de
19 de janeiro de 1869).
21.PAI, TUTOR OU CURADOR 1)0 HERDEIRO. Não é possível presumir-se prêmio ao testamenteiro a herança
ou o legado ao filho, pupilo ou curatelado daquele. Quanto ao legado aos filhos, já era assente (TEIxEmA DE
FREITAS, Consolidação das Leis Civis, art. 1.139, nota 54), e a fortiori se há de firmar quanto a tutôres e
curadores. Não há a presunção, porém isso não afasta a possibilidade de expressa vontade do testador:
nomeio testamenteiro a E e deixo, por isso, a seu filho cinquenta apólices”. Dificuldade surgirá se o testamenteiro,
pai, tutor ou curador, não quiser prestar os serviços. Neste assunto, só as circunstâncias podem aconselhar o juiz, e
só elementos ínterpretativos do testamento dirão do destino do legado. Em qualquer desses atos do juiz, devem
intervir o Curador de Órfáos, o de Resíduos, e eventualmente, levada a ocorrência do Juiz de Órfãos, a remoção do
tutor poderá remediar a situação. O próprio ato do pai não está livre de ser apreciado com fundamento no Código
Civil, art. 394, quiçá art. 395.
A sutileza da questão, que envolve mais do que a perda da Testamentária, a do legado, impõe ao juiz da Provedoria
a máxima prudência na classificação do dispositivo. Tanto mais quanto, nesta matéria, os elementos de
interpretação, que tornem inteligível o texto testamentário, podem não ter sido produzidos pelas partes. Serão
cartas, instruções, caráter da amizade, laços com a própria criança ou interdito, condenações intimas de família.
Daí a necessidade de serem ouvidas as pessoas que cercavam o falecido e cujos sentimentos conheciam.
23.PRÊMIO E RATEIO. a) Reduções. O prêmio não está sujeito a rateio. Aqui, cabe fazer-se a distinção antes
estabelecida entre a parte do legado prêmio que remunera e a parte liberalidade pura. Se é certo que os prêmios
não se rateiam, fixadas pelo testador, ou arbitradas pelo juiz, não é menos certo que os legados-prêmios podem
não no ser em sua totalidade e estar, na parte legada, sujeitos a redução proporcional no que excederem a porção
disponível, conforme o artigo 1.727. Mais uma vez se afirma a verdadeira doutrina do legado prêmio e do legado
não prêmio.
b)Morte do testamenteiro. Se o testamenteiro morre na vigência da Testamentária, depois de prestados apreciáveis
serviços, talvez quase todos, o juiz deve arbitrar o prêmio, ao final, por todos os serviços, objetivamente, e,
depois, discriminar o que é paga do labor do falecido e o que é paga do seguinte testamenteiro. A soma deles é que
não deve exceder de 5%. Tal a solução que demos e a praxe que desde então, inexcetuada, se observa na
Provedoria.
24. PRÊMIO E IMPÔSTO. É isenta de impôsto de transmissão causa mortis o prêmio dos testamenteiros, quer
consista em percentagem fixada pelo testador ou pelo juiz, quer em legado (Decreto n. 2.800, de 19 de janeiro de
1898, art. 12, § 5). Pelo Decreto n. 5.581, de 31 de março de 1874, a isenção apenas vai até o valor de 5%. Quis-se
que, após o Código Civil, que não limitou a 5% o prêmio estipulado pelo testador, em legado ou não, não mais se
cobrasse impôsto sôbre êle quando excedesse de tal vigésimo da herança (A. li. SOUSA BANDEIRA, Do cálculo
da vintena e do prêmio dos testamenteiros, 1?. de D., 42, 449). Mas tal interpretação não pode prevalecer: ofende
os interesses da Fazenda, permitiria deixar sob a forma de prêmio testamentário, e o argumento em que se funda
(remuneração maior de 5%, quando o próprio testador o determine) não merece ser atendido, pois não no-lo deu o
Código Civil e, antes, já os testadores não estavam adstritos ao máximo percentual, que a praxe e a lei criaram aos
juizes.
Uma das sobreveniências do velho princípio da gratuidade da Testamentária, temo-la na presunção da
remuneratoriedade do legado deixado ao testamenteiro. Que FRANCISCO PINIELITITOo, ao tempo em que
escreveu, assim pensasse, muito se compreende. Mas, hoje, remuneratório não devia ser presuruido o que se
deixou, pelo fato de ser exatamente o contrário o princípio hoje vigente, o da não-gratuidade da execução
testamentária. Óbvio seria nada presumir a lei, e deixar ao exame do testamento, como nos demais casos, a decisão
da causa do
legado. Em si, pouco lesiva é a presução do art. 1.766; porém, pela tendência ao menor esforço, ao não entrar em
distinções, a doutrina e a praxe vão atribuindo à praesum caráter absoluto, que ela, presunção de vontade de
outrem, não pode ter.
Há casos em que a presunção da lei lesa, abertamente, absurdamente, a Fazenda. o testador nomeou testamenteiro
alguém cujo legado vai a 5% da herança. o trabalho testamentário não vale 1 1/2%. Mas, por têrça de se crer
remuneratória a deixa, sôbre ela não se conta o impôsto. Vale dizer:
dá-se ao testador o direito de transmitir, sem paga à Fazenda, bens que valham o prêmio do monte líquido. Dai,
nas dos legados nos cálculos de imposto, dever o procurador dos feitos atentar na aplicação do art. 12166, e
coligir, quando couber, dados que elidam a presunção legal.
25. PROCESSO Do PRÊMIO. Na ordinariedade dos casos, pede-se o premio por simples petição, que se manda
aos autos. Ordena o juiz que se proceda ao cálculo da herança liquida sôbre que arbitre, ou já o advogado OU
testamenteiro entrega o pedido acompanhado da certidão, tirada no Juízo do Inventário, se fora da Provedoria se
processou. Examinando os autos, o juiz arbitrará.
Melhor seria que a justiça fosse autuada em apenso, pela possibilidade de haver recursos. Em todo o caso, nada
obsta a que o juiz, no prazo da contraminuta, ou antes, quando mandar tomar o agravo, mande desentranhar o
incidente e dar vista para o agravo, autuado em apenso. Subindo, cortar-Se-á a linha de apensação.
Pode contudo ocorrer que a instância superior não se julgue habilitada, com o só apenso, àpreciação, ou o
testamenteiro ou interessados agravantes desde logo requeiram que também subam os autos.
26. RECURSOS. Do arbitramento pelo juiz, quer quando excessivo, quer quando diminuto, quer denegatório o
despacho, quer de deferimento, cabem os recursos legais, segundo a lei processual. No Distrito Federal, era o de
agravo.
Somente após o trânsito em julgado da sentença que aprove as contas do testamenteiro, pode êle receber o prêmio
(cf. Tribunal de Apela@o da Bahia, 2 de agôsto de R. dos T., 126, 661).
Ainda depois de arbitrado o prêmio pode o juiz, que o arbitrou, reduzi-lo, por julgar excessivo o arbitrado (Côrte
de Apelação do Distrito Federal de 3 de julho de 1925). Às vêzes é indispensável a redução por se terem omitido
elementos que a diminuiriam, se conhecidos fossem; por exemplo, haver, no processo do inventário, feito por
testamenteiro, contrato de honorários com advogado dividido o labor, não se justifica o pagamento alto.
O juiz só deve entregar ao testamenteiro o prêmio, depois de julgadas as contas: enquanto não for proferida a
sentença e passar em julgado, a soma deve ficar à disposição do Juízo da Provedoria, a fim de oportunidade ser
levantada (Conselho Supremo da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 6 de agôsto de 1922: “A vintena ou
prêmio das testamentarias é remuneração pro labore et administration, e, revertendo à herança, nos casos
declarados no art. 1.768 do Código Civil, nele expresso o de não ter sido cumprido o testamento, não poderá ser
antecipado o pagamento, subordinado ao evento de condição ou termo pelo qual se integra e faz-se exigível o
direito, que assiste aos testamenteiros”)
1. TExTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.767: “O testamenteiro que for legatário poderá preferir o prêmio ao
legado”.
Lê-se no Código de Processo Civil, art. 548, § 3.0: “Será lícito ao testamenteiro preferir o prêmio à herança ou
legado”.
3. DIREITO ANTERIOR. Não havia a regra. Quer dizer o legado ao testamenteiro, nomeado pelo testador, não se
presumia remuneratório dos serviços que prestaria com a execução do testamento. O Código Civil, art. 1.767,
introduziu egra jurídica especial, sem correspondências no espaço e no tempo. Cp. Código Civil mexicano, art.
3.757, diferente.
4. CASOS DE PRÊMIO Aos LEGATÁRIOS. Três situações podem assumir os testamenteiros contemplados no
testamento:
a) o testador deixou legado, explicitamente remuneratório da execução testamentária, e, nesse caso, aceita a
testamentar:a, aceitou-se o legado, aquiesceu-se no trabalhar pelo estipulado; b) é legatário o testamenteiro, mas o
legado, pelo que se depreende do testamento e das circunstâncias, nenhum fito havia de remunerar, caso em que
terá direito ao prêmio e ao legado; o) assinado o termo de Testamentária, vem à balha o direito ao prêmio e, contra
a interpretação separativa do testamenteiro, decide o juiz pela remuneratoriedade do legado, e então,
evidentemente, cabe aplicar-se o Código Civil, art. 1.767 optara, se quiser, o legatário.
Conforme ficou dito, o art. 1.766 apenas cria presunção. Se esta foi elidida, pode o testamenteiro, certamente por
julgar insuficiente e parca a indenização fixada em legado, pedir que, em vez deste, se lhe dê a percentagem. O
que com isso se pretende é evitar fique mal remunerado o serviço do executor.
Os doutrinadores, longe da prática, não vêm as questões, assaz - delicadas, que suscita o art. 1.767. ~ Pode o
testamenteiro que assina o termo, no caso a) (legado explicitamente remuneratório), ressalvar o seu direito à
escolha? Argumento contra: seria aceitar sob condição. Mas, ainda que se quisesse estender, absurdamente, ao
testamenteiro o que o Código Civil estabelece quanto aos herdeiros (art 1.583), não constituiria condição, e sim
ressalva, o requerimento do nomeado pelo testador. Diante da exposição, deve o juiz, ouvidos o curador e
interessados, proferir o despacho, no qual, está visto, terá de interpretar os textos testamentários e de pesar os
interesses do espólio.
~Pode o legatário, nomeado testamenteiro pelo testador, não aceitar o legado, mas assinar o termo da
Testamentária? Cumpre distinguir. Se renunciou o legado, explicitamente remuneratório, sem prévia preferência
pelo prêmio, devidamente processada, só se pode entender que não aceitou paga pelos seus serviços. Se duvidosa a
remuneratoriedade do legado, tem o juiz de interpretar o ato da renúncia, quando, ventilada a
questão do legado pagamento e do legado independente da Testamentária, for julgado que se trata de deixa
remuneratória. Porque, então, interpretada a vontade do testador, será um dos casos de aplicação do art. 1.767, mas
restará a exegese do ato precipitado do testamenteiro, para que se decida se houve opção prévia ou renúncia.
Quando o legado não tiver caráter remuneratório e a interpretação da verba elidir a presunção legal, será absurdo
falar de opção. Tem o legatário direito ao legado e ao prêmio. fim não exclui o outro. Não se opta entre dois
direitos distintos e autônomos. Por isso, convém afastar a doutrina simplista, que restringe a interpretação das
verbas e pretende, contra a essência mesma do direito testamentário, atribuir à qualidade de legatário o efeito
extravagante de tornar, cegamente, sem distinção, nem exame, sem a visão das realidades, sem o respeito pelo
trabalho alheio e ao mesmo tempo pela vontade do testador, gratuito o cargo testamentário. É querer interpretar a
lei com o velho e revogado critério peninsular da gratuidade da Testamentária. Contra tal solução, que é a de
CLóvis BEvILÁQUA (Código Civil comentado, VI, 237), de ITABAIANA DE OLIVEIRA (Elementos de Direito
das Sucessões, 2.~ ed., 471), de Tiro PRATES DA FONSECA (Sucessão testamentária, 337), devemos ter em
vista: foge ao principio fundamental do favor voluntatis (arts. 85 e 1.666), interpreta largamente regra de lei, o art.
1.766, que abre exceção à regra geral da remuneratoriedade da Testamentária. E não só: quem lê o art. 1.766,
percebe que a lei só abre exceção por presunção (como ficou exposto anteriormente), presunção que só poderia
nascer na falta de elementos para revelação da voluntas testantium. Em verdade, não analisaram o artigo, menos
ainda, as relações a que se aplicaria: o hábito de citar, revive as opiniões em notas de TEIXETRA DE FREITAS
ou em pedacinhos, paragrafados, não raro contraditórios, de JOAQUIM AUGUSTO FERREmA ATIVES.
6.HERDEIRO E REGRA JURÍDICA. Só o Projeto de COELHO RODRIGUES, art. 1.588, falava do herdeiro.
Diante da letra do Código Civil, diz-se que não pode êle fazer o mesmo que o legatário, por ato violento da lei
(JoÃo Luís ALVES, Código Civil anotado, 1247), ou pelo fato de representar o sucedendo (CLõvis
BEVILÁQUA, Código Civil comentado, VI, 237), velharia de ficção que continua a fazer perros e duvidosos os
raciocínios de direito sucessório. Só interessa à questão o herdeiro instituído a que, pelo exame do testamento, não
se quis atribuir prêmio, isto é aquele, em proveito do qual não se conseguiu desfazer, com argumentos de voluntas
testantium, a presunção auxiliadora da lei. Mas, aqui, nem podia êle reservar a escolha, porque contraviria o
Código Civil, art. 1.583, proibitivo de aceitações condicionais, ou a termo, das heranças, empecilho legal, de alta
monta, a que JoXo Luís ALvES não deu atenção, nem, tão-pouco, no curso da execução testamentária, ou depois
dela, escolher, porque sería não retratar a aceItação, ato permitido (art. 1.590) e sim querer tornar remunerável o
que não era. Aliás, como antes dissemos, gratuidade de serviço do herdeiro instituído corre por conta do antigo
critério do cargo gratuito, que, já em Portugal, a praxe desmentia.
Na construção jurídica, a escolha prévia não é impossível. Pode o herdeiro, salvo circunstâncias especiais, não
aceitar a herança, mas, intimado como testamenteiro nomeado pelo testador, vir assinar o termo e cumprir o
munus testamentário. Se o herdeiro, que recebe legados, pode renunciar à herança, ou, aceitando-a, renunciar
aqueles (art. 1.583), com maioria de razão não se pode fazer dependente da aceitação da herança a do cargo
testamentário.
A escolha posterior repugnaria à construção jurídica. Neste caso, se bem que, no direito brasileiro, seja retratável a
aceitação, não poderia o ato de retratação ter efeito de fazer surgir o direito à retribuição percentual, não pelas
razões de CLÓvIS BEvILÁQUA (Código Civil comentado, VI, 237), mas por força da presunção legal da vontade
do testador, que, na espécie, não destinou quota percentual (fixação ordinária, direta, de paga), nem parte aliquanta
(remuneração em legado).
O fundamento da exclusão do herdeiro, no caso do art. 1.767, não foi o da representação, porém, precisamente,
consideração de ordem matemático-econômica.
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.768: “Reverterá à herança o prêmio que o testamenteiro perder, por
ser removido, ou não ter cumprido o testamento (arts. 1.759 e 1.766)”.
2. ELABORAÇÃO. No Projeto da Câmara dos Deputados, art. 1.775, dizia-se: “O prêmio que o testamenteiro
perder, por ter sido destituído ou por não ter cumprido o testamento, reverterá à herança”. Assim o Projeto revisto,
art. 2.138.
3. DIREITO ANTERIOR. As Ordenações Filipinas, Livro 1, Titulo 62, §§ 12 e 14, impunham reverter à Fazenda.
Chamava-se resíduo, e era um dos casos de entrega à Fazenda Nacional. Sôbre os outros, oportunamente se falará.
4. QUANDO O TESTAMENTEIRO PERDE O PRÊMIO. Se, chamado a prestar contas, sob pena de remoção e
tomada à revelia, não comparece a juízo, deve o juiz removê-lo e decretar a perda do prêmio: é consequência da
desatenção ao mandado. Se comparece e fica provada a negligência, a prevaricação, ou lhe são glosadas as
despesas por ilegalidade, ou não-conformidade com o testamento, remover-se-á, perdendo o prêmio. Se. ainda
depois de prestadas as contas, e recebido o prêmio, o testamenteiro deixou de defender a validade do testamento,
ou foi negligente ou prevaricador no desempenho de tal função, pode ser condenado •à restituição do que recebeu.
Em todos estes casos, o premio reverte à herança, mas isso há de ser entendido de acôrdo com as realidades: a) se
for nomeado outro testamenteiro, ou assumir o cargo o imediato designado pelo testador, terá direito à paga dos
serviços que prestar (poderá não ser o mesmo prêmio, porque o testamento pode estar, em parte, já cumprido, e
talvez todo, como se dá nos casos de perda posterior à prestação de contas) ; b) se havia mais um, e o ato causador
da pena resultou de culpa exclusiva tio condenado à perda do prêmio, a apreciação de quanto que deve ser
diminuído importa apreciação prévia dos serviços do que continuará nas funções.
O prêmio tirado ao testamenteiro não exclui a paga de prêmio ao nôvo testamenteiro, ainda quando, perdido
aquele, não possa a herança reavê-lo. Os serviços do nôvo executor nada têm com a situação de débito ou de culpa
do removido.
Se o testamenteiro executou a sua função e prestou contas, recebendo, depois, o prêmio, mas adveio a decretação
da invalidade do testamento, tem êle de restituir o que recebeu (3.~ e 4•a Câmaras Cíveis do Tribunal de Apelação
do Distrito Federal, 16 de janeiro de 1939, 1?. dos T., 118, 737), mas pode pleitear a retribuição, por via ordinária,
dos serviços que haja prestado ao monte.
1.TÉCNICA LEGISLATIVA E DIREITO HODIERNO. Ao critério religioso-político que regrava a sucessão não
podia afeiçoar-se a inovação dos tempos: espólios sem pessoa que traga à geração sucessível os bens da pessoa
morta.
No direito luso-brasileiro, nada menos justificável que esta velharia sacral, político-familiar, da necessidade da
institutio. Estranha exigência que os romanistas emprestavam na pratica e na doutrina lusitana, contra o direito,
neste ponto bem mais acertado, mais nôvo, da Igreja. A velha luta, a que tantas vêzes aludimos, entre o direito
mediévico e eclesiástico, criador do testamenteiro, e o romano, com a figura sacro-familiar do herdeiro.
O Código Civil, art. 1.769, teve a missão de reafirmar a pureza das fontes, o maior valor da noção de confiança
do testador em relação à concepção romanica da continuidade do defunto.
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.769: “Se o testador tiver distribuído toda a herança em legados, o
testamenteiro exercerá as funções de cabeça-de-casal”.
2. ELABORAÇÃO. No Projeto primitivo, estabelecia a art. 1.926: “Se o testador tiver distribuído a herança em
legados, o testamenteiro será o inventariante, não havendo cônjuge a que deva caber o exercício dessas
atribuições”.
3. DIREITO ANTERIOR. Não havia a regra jurídica escrita. A instituição não era necessária; e, claro, se toda
distribuída em legados a herança, havia de inventariar os bens o testamenteiro. JOSÉ HOMEM CORREIA TELES
(Digesto português, III, .§ 1.825) entendia que teria de exercer o cargo o principal legatário; mas TEIXEIRA DE
FREITAS apôs nota (Tratado de Testamentos e Sucessôes de A. J. GOUVEIA PINTO, 237> de não estar em uso.
4. TERMINOLOGIA SUSPEITA. Exercerá as funções de cabeça-de-casal, diz a lei. ~ diferente de ser cabeça-
de-casal. Aliás, o descaso pela exatidão semântica dos termos leva a aplicações errôneas, ainda em juristas de
nota.
6. REGRA JURÍDICA E NOMEAÇÃO DE TESTAMENTEIRO PELO Juiz. No Código Civil, nem no art. 1.769,
nem no art. 1.763, diz-se que será testamenteiro o legatário. Nem no Código de Processo Civil, arts. 527 e 469.
Hoje, só ao cônjuge, se de comum o regime matrimonial, ou, sujeito a escolha, a um dos herdeiros confere a lei o
direito à Testamentária, conforme o Código de Processo Civil, arts. 527 e 469. Não se tem o artigo 1.839 do
Código Civil português revogado, que regulava o direito do legatário à função de executor, quando a herança
tivesse sido distribuída, toda, em legados: “Se a herança tiver sido toda distribuída em legados, e o testador não
houver nomeado testamenteiro, será havido por executor designado judicialmente”.
O art. 1.769 faz inventariante, com as funções amplas que teria o cabeça-de-casal, a pessoa que o testador ou o juiz
nomeou para testamenteiro. Não diz mais do que isso. Porém, no seu íntimo critério, sendo gente conhecida e
idônea os legatários, é recomendável que o juiz dentre eles escolha. Mas a lei não lhes dá direito, por serem
sucessores singulares: constitui errônea reformar a segunda instância o despacho de nomeação, para dar os cargos,
fundando-se no art. 1.769, ao legatário.
Aqui, é oportuno observar o seguinte: a segunda instantanea não pode nomear; pode dar provimento ao recurso
para julgar idôneo ou mais idôneo um dos herdeiros instituidos, um dos nomeados pelo testador. Quanto à
nomeação livre pelo juiz, não pode fazê-la: é atribuição de primeira instância. Pode, sim, dizer: “não cabe”, “não
foi boa”. Mas nomear. nunca. Se diz “não foi boa”, descem os autos, e o juiz nomeia outrem. Entes coletivos não
podem nomear tutôres dativos, nem curadores, nem testamenteiros: podem apreciar as nomeações feitas. É outra
coisa.
‘7. OUTRAS FÓRMULAS TESTAMENTÁRIAS. Em vez de distribuir a herança em legados, pode o testador
preferir outras fórmulas:
a) “A minha parte disponível passará por morte dos meus herdeiros (legítimos) a F.”. Aqui, o testador deixou her..
deiro fideicomissário.
b) “Lego o que tenho (3 prédios) a A, B e C; por morte deles, será herdeiro D”. O testador legou; morto cada um
dos legatários, haverá os bens D, herdeiro. É nesse sentido que se lê em E. IIERZFEImER (Erbrecht, J. von
Staudingers Kommentar, v, 9Y- ed., 446) ; o herdeiro pode ser um simples substituto (Nacherbe).
c) “Deixo a A a minha herança; morrendo receberão 13, C e D, os prédios a, & e c, como legados”.
São composições válidas.
II - PRECISõES. Para bem estudarmos o assunto, cumpre separarmos situações diferentes e inconfundíveis: a)
Quando acabam as funções do testamenteiro em relação a ele. b) Quando acaba a Testamentária. ey Quando
cessam as responsabilidades do testamento.
6. TESTAMENTEIRO QUE NÃO MAIS QUER EXERCER A TESTAMENTÁRIA. O testamenteiro que deseja
deixar o cargo há de invocar os motivos, para serem apreciados pelo juiz; por exemplo, moléstia grave, ou viagem
urgente. Se deixa o cargo sem razão, nem tempo, ainda que o juiz lho defira, responde aos herdeiros, legatários e
mais beneficiados pelos danos que a inopinada ou extemporânea denúncia ou renúncia do cargo motivou. Assim,
por exemplo, se alegou colisão de interesses que não existia e a saída foi nociva ao cumprimento das últimas
vontades.
Se o marido da testamenteira introduz revogação da autorização que deu, e disso advém danos, responde êle.
Ninguém pode ser constrangido a aceitar cargo de testamenteiro, salvo condição do legado ou da herança, porque,
então, a não aceitação do cargo implica não aceitar a deixa. Aceito, deve prosseguir na execução, sob pena de
responder pelos danos e perder prêmio ou benefício.
A aceitação pode ser por palavras expressas, como por atos (FRANCISCO PINHEIRO, Tractatus de Testamentis,
App. Seç. 1, § 6, n. 59, no Tomo II, 752).
Se o testador disse que deixava ao testamenteiro determinada quantia se êle aceitasse a Testamentária (ou
cumprisse a função de testamenteiro>, não legou; fixou o prêmio, o que podia fazer. O juiz não pode alterar a
remuneração, nem o testamenteiro pode preferir a fixação pelo juiz (23 Câmara Cível do Tribunal de Apelação de
Minas Gerais, 13 de maio de 1940, 1?. EX, S4, 140: .... . atribuir ao testamenteiro certa importância em dinheiro
como recompensa à aceitação do munus é estipular remuneração: não é instituir um legado. E, assim entendida a
cédula, conclui-se que o juiz não podia fixar a vintena, nem o testamenteiro usar da opção a que se refere o art.
1.767”).
1. ORDEM DAS QUESTÕES. No direito intertemporal, várias são as questões que a respeito de testamenteiros
podem surgir. Por intuitos práticos, devemos separá-las pela ordem das regras jurídicas do Código Civil.
3.EXTENSÃO DO PODERES DOS TESTAMENTEIROS. Se a lei do tempo da feitura é mais limitada, tudo se
resolve segundo a lei do tempo da morte. Se, ao contrário, mais restrita (imperativamente) a lei do tempo da
morte, o testamenteiro somente terá as funções que tal regime lhe permitir. As restrições, provindas de leis
posteriores à morte do decujo, são inoperantes.
Quanto às regras jurídicas não-imperativas, claro que a matéria se devolve ao direito intertemporal da
interpretação dos testamentos.
Em todo caso, as leis posteriores à morte, que regulam relações entre herdeiros e testamenteiros (exemplo, Código
Civil, art. 1.755, parágrafo único), poderão ser invocadas.
O art. 1.769 aplica-se a todos os testamenteiros de espólios cujos testadores faleceram na vigência do Código
Civil.
4.PRÊMIO E DIREITO INTERTEMPORAL. As mudanças de lei, no tempo, também, podem ocasionar questões
de prêmio: qual a lei que a rege: a do tempo da morte, a do tempo da execução ou a do testamento.
Em geral, rege o prêmio a lei do momento em que se abriu a sucessão. O mesmo princípio de unidade da lei, que
vigora na sucessão em direito internacional privado, domina em matéria de direito intertemporal. Salvo se outra lei
foi conteúdo da vontade do testador, como se supos vigente a lei do tempo da feitura, ou se, sabendo em
elaboração outra lei, prêviamente se referiu a ela.
De qualquer modo, o direito ao prêmio, segundo a lei aplicável ao aceitar o cargo, não pode ser tirado, por outra
lei, ao testamenteiro, O Código Civil, arts. 1.766 e 1.767, aplica-se a todos os testamenteiros de heranças abertas
na vigência do Código Civil.
5. PRAZO PARA ACABAR. O testamenteiro tem o prazo que lhe marcou o testador, ou o que resultar da lei do
tempo da morte. A lei nova, isto é, posterior à morte, nem no dilata, nem no restringe.
O prazo fixado pelo testador pode ter como conteúdo a lei do tempo da feitura. Se o decujo aludiu a prazo legal,
para, por exemplo, acrescentar-lhe “mais três meses”, entende-se o prazo da lei do tempo em que escreveu o
Se o
testament
testamento. eiro não
6.DIREITO INTERTEMPORAL E FIM DAS FUNÇÕES DE TESTAMENTEIRO. ~ Qual a lei que deve reger a
remoção do testamenteiro?
A denúncia ou renúncia do cargo rege-se pela lei do tempo da morte. Também por ela o fim das funções pela
condição resolutiva, o termo final ou a cláusula rebus sie stantibus. Quando se trata de remoção por força de lei
incapacidade do testamenteiro ou definição legal de incompatibilidade, aplica-se o direito do tempo das funções.
Se a lei do tempo A dizia ser hereditàriamente transmissível o cargo testamentário, e a lei posterior à morte do
testador, o torna intransmissível, deve-se atender, não a esta, mas à lei do tempo da morte.
No caso inverso, pelo mesmo motivo: se o testador não queria a tranmissibilidade, neste, como, naquele, há de se
en-~ tender que a sua vontade continha a lei de então.
7. REVERSÃO DO PRÊMIO À HERANÇA. Quando o testamenteiro perde o prêmio e o testamento, pela morte
do testador, se executa conforme o Código Civil, reverte a percentagem, ou o legado remuneratório, à herança
(Código Civil, artigo 1.768), Mas, se o testador faleceu antes do Código Civil, a reversão obedeceria ao direito
anterior.
Ainda pode ocorrer que nova lei, posterior à da morte, altere a reversão: se a perda se deu sob a lei da morte (ex
hypothesi, Código Civil), aplicar-se-á o art. 1.768; se já na vigência da nova lei, a reversão seguirá o sistema desta.
Trata-se de penalidade, e não de efeito do testamento.
1. PRECISÕES. Além do que já dissemos sôbre nomeação de testamenteiros, cumpre atender às possíveis
questões relativas aos arts. 1.758-1.769 do Código Civil.
Veremos que não é possível princípio absoluto: alguma coisa, e quase tudo, segue a ler successionis, mas há
campo aberto à autonomia dos testadores e pontos em que a lex fori não pode ceder o passo às leis estranhas.
Título IV
INVENTÁRIO E PARTILHA
CAPÍTULO 1
INVENTÁRIO
3.JURISDIÇÃO VOLUNTARIA. A expressão “jurisdição voluntária” é responsável por muitos erros dos juristas
e juizes, pela indeterminação do conceito e pela contradição entre elementos conceptuais de hoje, de origem
medieval. Jurisdiotio voluntctria diziase a atividade dos juizes diante de um só interessado ou de dois ou mais
interessados em acôrdo, in volentes. Supunha a participação do juiz na formação de negócios jurídicos, que em
grande parte passaram e continuam de passar a outros funcionários do Estado que nua os juizes. Ao perderem êsse
elemento subjetivo (atuação do juiz>, perderam, por certo, a razão de gerem considerados de jurisdição:
continuou a atividade estatal, mas outra que a jurisdicional. Os tabeliães,ou notários, ditos, de comêço, indices
chartularil, foram os que receberam maior carga desses negócios; porém não somente eles.
O Estado recente retira, a cada momento, para os seus órgãos administrativos, muitos atos que permaneciam com
os juizes, e alguns que haviam passado aos tabeliáes. Por outro lado, alguns processos, em que de ordinário não se
discutia, saíram da ganga das declarações de vontade (in volentes), para o regime processual das “ações”, quando
se fêz a toda pretensão, salvo exceções raríssimas, corresponder ação. Por muito tempo se empregou o termo para
se designar, a mole dos processos especiais, que alguma vez foram “voluntários”, ou sem se ver o que havia de
contencioso em muitos deles, ou sem se perceber que nem todos os processos eram de condenação. No fundo, não
se atendia à existência de ações constitutivas, nem, sequer, a que essas comportavam o contraditório. O próprio
critério distintivo de AIIOLF WACH (Hana. buch des deutschen Zivilprozessreents 1, 47 s.), que extremou a
atuação de relações ezistentes (jurisdição normal) e a constituição de novas relações (jurisdição voluntária), tem
valor apenas de distinção de maior ou menor preponderância daquele elemento, ou desse. Andam, com frequência,
juntos. A “sentença”, no sentido estrito, a decisão somente de mérito, de natureza constitutiva, deu a J.
WEISMANN (Lehrbuch des deutschen Zivilprozessrechís 1, 25) a oportunidade para repelir a linha separativa
nítida entre os dois campos. Sem razão, porque, em casos tais, o processo cabe na jurisdição normal, uma vez que,
onde aparece o elemento contraditório, êsse elemento exclui pensar-se em jurisdição voluntária. Temos, pois, regra
de sintaxe do direito: a jurisdição voluntária tem de ser pura; a normal, dita contenciosa, é toda jurisdição em que
se leve em conta relação jurídica existente, suscetível de controvérsia no processo, ainda que se limite o poder
cognoscitivo do juiz.
Um dos processos vítimas da imprecisão do conceito de jurisdição voluntária foi exatamente o de inventário e
partilha.
A lenda de ser de jurisdição voluntaria ou graciosa a partilha penetrou fundo na doutrina e na jurisprudência
brasileira, sem que outra coisa fizessem os juristas e juizes do que repetirem, sem pensar, o que outros escreveram.
Ao próprio Decreto n. 143, de 15 de março de 1842, art. 4º, que o chamou “processo administrativo”, atribui-se
consagração do erro. No meio deles, era de ver-se ANTÓNIO JOAQUIM RIBAS (Consolidação das Leis do
Processo Civil, nota 806 antes do art. 812) advertir: .... . a partilha é, por sua natureza, um processo contencioso
Judiciário, em que se discutem direitos privados, para o fim de se lhes definir o objeto e os limites”.
§ 5.982. Inventário judicial
2.ABOLIÇÃO DE INVENTÁRIOS EXTRÁJUDICIAIS A parte final do Código de Processo Civil, art. 465, teve
por fito cortar cerce qualquer interpretação no sentido de se permitir inventário extrajudicial esse, se foi feito, é
nulo. Não vale, sequer. como contrato de direito privado.
Naturalmente, não se há de confundir a inventariação com a partilha, O que há de ser judicial é o inventário (1.ª
Câmara do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, 30 de março de 1943, Decisões, 1, 1944, 424). A 3.ª
Câmara Cível, a 5 de outubro de 1944 (E?. F., 102, 298), afirmou que não existe inventário negativo (9. O que
não existe é partilha, se não há bens; muitas vêzes precisa alguém de abrir o inventário e provar-lhe a
negatividade.
Se, porém, o inventário extrajudicial foi feito e ilegalmente aproveitado, no processo de inventário e partilha
válido em sua abertura, pode dar-se a aplicação das regras jurídicas processuais, tratando-se, como se trata, de
nulidade não-cominada.
Por outro lado, o trânsito em julgado da sentença de partilha, como, aliás, a expiração dos prazos processuais,
cobre a nulidade da extra-judicialidade, no sentido de não ser possível a querela de nulidade ipso iure do processo
e da sentença, porém não obsta à rescisão da sentença que resolveu pela aceitação do ato extrajudicial. A sentença
não se faz nula: existe, e não é nula; é apenas rescindível.
4.CUMPRA-SE DE TESTAMENTO. Acima falamos de inventário e partilha, mas é de toda a relevância que os
direitos dos herdeiros, dos legatários e de outros beneficiados, sôbre os bens da herança, sejam alegados e
provados para que se inventariem os bens e se partilhem, respeitados aqueles direitos. Se esses direitos provêm de
testamento ou mesmo de codicilo, o cumpra-se é pressuposto para qualquer eficácia do testamento. Por isso,
convém que se caracterize o que é o cumpra-se.
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O juiz verifica se o testamento está com as formalidades extrinsecas. Formalidades extrínsecas são as que derivam
de todas as regras de forma aplicáveis à espécie de testamento. Essa inspeção é anterior à conclusão e consta do
auto de apresentação e leitura. Conclusos os autos, manda o juiz que seja ouvido o curador de testamentos
(“órgão do Ministério Público”). Tratando do testamento cerrado, o Código Civil, artigo 1.644, falou de abertura; e
daí ter-se mantido confusão propositada, velha de mil anos, a despeito do esforço dos juristas para evitá-la.
Os testamentos têm de ser registados. O registo é exigido aos testamentos públicos, aos cerrados, aos particulares,
ao marítimo e ao militar. Aos codicilos também (nosso Tratado dos Testamentos, IV, 355).
A inscrição ou apresentação nas repartições fiscais é velhana, em que a legislação insiste. O cumpra-se precede ao
registo e à inscrição. Mas, pergunta-se, ~ que é que devem fazer os escriváes: registá-lo, para maior garantia do
testamento, que lhe foi entregue e vai sair do cartório; ou mandá-lo à inscrição, e depois registá-lo, incluindo, no
registo, mais essa formalidade cumprida? Razão fiscal contra razão do interesse dos beneficiários. Leis
discordantes. No Distrito Federal, por exemplo, até 1929, havia duas praxes diferentes nos dois cartórios. Na
doutrina, afirmativas obscuras quanto à anterioridade do registo. Nas leis fiscais, é que se deve buscar a solução, e
são elas acordes em mandar que se inscrevam depois de registados. Uma delas, para inscrição fixava prazo de oito
dias contados do registo. Mandava-se cumprir (chamado “despacho” de cumpra-se), registar e inscrever.
Só após o registo e a inscrição é que se começa a cumprir isso que querem dizer as leis fiscais. Aliás, obsoleta e
inútil providência a da inscrição: a Fazenda limita-se a tomar o nome do testador, o estado civil, se consta, e o
cartório a que foi distribuído. As verbas ainda vão ser interpretadas, classificadas, reduzidas, e pouco adiantaria à
estação fiscal o inteiro teor da cédula. Não se justifica a exceção, que ela é, ao princípio de não saírem dos
cartórios os originais dos testamentos. Nota escrita do escrivão, assinada ou fiscalizada pelo juiz, chegaria ao
mesmo resultado. E essa é a praxe.
O cumpra-se, introduzido pela praxe e, mais tarde, ato legal, constitui sanção judicial, para a exequibilidade do
testamento, exame preliminar (cognição superficial) pelo juiz. o conteúdo ele sentença de constituição integrativa
de forma. Por êle, proclama-se que “existe” um testamento sem aparentes ou visíveis nulidades (elemento
declarativo da sentença) ; diz-se que está regularmente feito, com as solenidades extrínsecas e sem aparente
nulidade ou ineficácia. Não se trata, porém, de sentença declarativa. É constitutiva (integrativa de forma).
Nulidades, se as há, dependem de provas atiunde, de contenda de provas, de longo exame, que as torne, afinal,
visíveis, Essas, ainda alegadas, não podem ser discutidas e julgadas no rito de apresentação, abertura e cumpra-se
que precede à inscrição e ao registo. Não é lugar, nem momento próprio, e o cumpra-se ou a denegação do
cumpra-se não as julga: são estranhas ao poder de decidir que, na espécie, tem o juiz.
O que se requere ao juiz é a inspeção, para verificar se o instrumento tem as formalidades extrínsecas essenciais, e
também se não contém nulidade pronunciável de ofício. Diziam o mesmo, no direito anterior, os tratadistas. Pena
foi que o Código de Processo Civil, art. 526, só se referisse a solenidades extrínsecas. Na execução, eliminará o
juiz tudo que for contrário a direito, decretando a nulidade das diversas disposições; mas há nulidades visíveis,
não extrínsecas, que fazem nenhum o próprio testamento, e fora absurdo que, vendo-as, o juiz ordenasse o
cumprimento da cédula. Casos típicos são o testamento feito pelo interdito, o testamento do menor de dezesseis
anos, o do louco, ou surdo-mudo que não possa exprimir a sua vontade. Trata-se de comparação fácil de datas,
diante das certidões. Se o Código Civil, art. 146, parágrafo único, manda que o juiz as pronuncie de ofício,
também no plano processual, o art. 524 do Código de Processo Civil (“suspeito de nulidade e falsidade”) não nos
deixa dúvida, apesar do final do art. 526. É regra jurídica, pois, que se há de negar o cumpra-se quando houver
nulidade resultante de se terem preterido formalidades extrínsecas, visíveis no próprio instrumento (como número
insuficiente de testemunhas) ou em prova literal (ser absolutamente incapaz uma delas) ; ou se houver nulidade
por falta de solenidade intrínseca, daquelas nulidades substanciais ao testamento e pronunciáveis, de ofício, pelo
juiz, sejam visíveis no testamento (“eu, testador, interdito por loucura na cidade de São Paulo, mas em verdade
com uso das minhas faculdades mentais”>, sejam só verificáveis em certidão de registo.
Qualquer outra nulidade, das que de ofício não se pronunciam, terá de ser apreciada em ação própria, e não no
processo especial da apresentação e cumpra-se dos testamentos, que é de cognição superficial. Sôbre as que o juiz
pode apreciar, não precisa que se arguam, para que êle as decrete. Não se trata de “anulação”, mas de exame
prévio, exatamente com o fim de decretar as nulidades e ineficácia, uma como peneira judicial para melhor
policiamento das cédulas testamentárias. Criou-a a prática, utilitatis causa; consagraram-na, depois, as leis,
considerando-a indispensável. Em geral, as provas de incapacidade absoluta não se podem considerar aliunde,
porque as interdições se inscrevem em registo público (Código Civil, art. 12, III) e os nascimentos têm o seu, cujas
certidões não poderiam aguardar ações para produzirem os seus efeitos de fé pública. Dir-se-á o mesmo quanto ao
testamento com data posterior à morte do testador. Juntou-se certidão de óbito (Código Civil, art. 12, 1); não se
compreenderia que o juiz, conhecendo-a, apusesse o cumpra-se a tal cédula. Na espécie, nem sequer é nula: n’si o
existe, pela falta do sujeito.
Estudando-se, a fundo, a natureza da ação de cumprimentO de testamento, baseada naquela cognição superficial
de que falamos, temos que a) essa cognição superficial é aquela que têm os juizes na verificação dos pressuposto
para o adiantamento de execução, ou para a concessão de medidas preventivas. Apenas, a sentença de cumpra-se ~
sendo que constitui, integrando, dita constitutiva integrativa, em vez de excutiva-condenatória, ou mandamental.
A cognição superficial basta para que toda a eficácia ~ se opere:
a sentença tem toda a sua força e produz todos os seus efeitos. Por isso mesmo, é suscetível de rescisão (Código
de Processo Civil arts. 798-801), de querela de nulidade (e.g., casos do art. 1.010, 1) e de perder a sua eficácia se,
em ação de cognição completa, se desconstitul o testamento (ação de nulidade de testamento, que é ação
constitutiva negativa~ de cognição completa).
Se nega a autenticidade do documento, com fundamentos que ao juiz do inventário e partilha pareçam destruir a
inequivocidade da prova, cabe-lhe remeter a parte às vias ordinárias (cf. 1•a Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Paraná, 24 de novembro de 1948, Paraná .7., 48, 346).
2.REGRA JURÍDICA, INCIDÊNCIA E APLICAÇÃO. O direito incide; o juiz aplica o direito, que incidiu, ou
com que constitui algum negócio ou situação jurídica (sentença constitutiva, que é aquela em que incidência e
aplicação coincidem). Questões de direito são questões de aplicação: a) se já incidiu a regra jurídica, como é o
mais frequente, o juiz, se considerasse qualquer dúvida razão para remeter às vias ordinárias, seria juiz somente
competente para chancela, o que não se dá senão rarissimamente, por defeito de técnica legislativa; 19 se ainda
não incidiu, é aplicação constitutiva, e o juiz, sem poder de apreciar as dúvidas, estaria bem reduzido em seu
papel. Note-se ainda que se tornaria, assim na espécie a) como na espécie 19, dependente do íntimo do juiz, de
elemento subjetivo, a determinação da competência, o que é contra os princípios de técnica legislativa e de
organização judiciária, sôbre ser, de lege lata, contra as regras jurídicas do Código de Processo Civil, arts. 133,
148 e 149. Alguns juristas brasileiros invocaram a MANUEL DE ALMEIDA E SOUSA (Tratado prático de Mor
gados, g•a ed., 433), sem advertirem em que ali está êle a falar de posse, ao passo que, nas Ações sumárias (1,
215-226), foi claro, quando, a respeito de questão sôbre responsabilidade do herdeiro, disse que, “como
consistente em direito, não depende de alta indagação, nem repugna à sua natureza a que dela se conheça em
qualquer juízo sumário”. Ésse o princípio dominante, como se vê em SILVESTRE GOMES DE MORAIS
(Tractatus de E’xecutionibus instrumentorum sententiarum, III, 199). Hoje, subsume-se no art. 113 do Código de
Processo Civil, e esse artigo não entrou nas leis, inclusive constitucionais, como se fosse simples frase de discurso.
4.VALOR DA PROVA DOCUMENTAL. Prova documental Inequivoca é qualquer prova documental sôbre a
qual não haja questionabilidade a respeito do seu valor de atendibilidade. O valor como meio de prova é questão
de direito e não lhe cria equivocidade Exemplo: aí não se processa ação de nulidade de escritura pública, por
falsidade.
1.INICIO DO PROCESSO DE INVENTÁRIO E PARTILHA Lê-se no Código Civil, art. 1.770: “Proceder-se-á ao
inventário e partilha judiciais na forma das leis em vigor no domicílio do falecido, observado o que se dispõe no
art. 1.603, começando--se dentro de um mês, a contar da abertura da sucessão, e ultimando-se nos três meses
subsequentes, prazo este que o juiz podera dilatar, a requerimento do inventariante, por motivo justo”. No
parágrafo único: “Quando se exceder o último prazo deste artigo, e por culpa do inventariante não se achar finda a
partilha, poderá o juiz removê-lo; se algum herdeiro o requerer, e, se for testamenteiro, o privará do prêmio, a que
tenha direito (art. 1.766) “. O processo do Código Civil, artigo 1.770 (inventário e partilha), tem de ser iniciado
dentro de um mês, a partir da morte do decujo (cp. Código Civil, artigo 1.572). Iniciado, têm-no três meses para
se terminar. Regularmente, acabaria no fim do quarto mês (ALVARO VÁLASCO, Decisionum Consultationum ao
Rerum iudioatarum in Regno Lusitaniae, 1, 98). Se a lei de organização judiciária não permite que se abra ou
corra nas férias (art. 4.0), o tempo em que não podia ser aberto, ou não podia correr, exclui-se do cálculo. A sanção
contra o inventariante é a do Código de Processo Civil, art. 476. Pode havê-la fiscal, ou proveniente de disposição
testamentária. Não se excluem no cômputo do mês os sete dias do art. 164, III, do Código de Processo Civil.
2.PRAZO PARA A TERMINAÇÃO DO PROCESSO E PRORROGAÇÃO. Cf. Código Civil, art. 1.770, 2.~
parte, que aí só se referia à prorrogação do prazo para terminar o inventário. Quanto ao prazo para a abertura, a
regra jurídica está sujeita, desde a Glosa, aos casos em que não haja justo motivo para não ser aberto (nisi
dilficultas in inventarji confectione). A prorrogação do prazo para terminar depende de requerimento e despacho
do juiz, processando-se em apenso aos autos do inventário, ouvidos os interessados, os órgãos do Ministério
Público e o representante da Fazenda. Motivo justo é conceito mais amplo do que força maior.
3.“DIES A QUO” E CRÍTICAS SEM RAZÃO. Alguns comentadores querem, para criticar o Código de Processo
Civil (e o Código Civil), que se lhe exprobre o não ter dito, claramente, que o prazo da terminação começaria da
abertura da sucessão. Se um deles o dissesse, erraria; e o Código de Processo Civil, como o Código Civil, estatuiu
exatamente que se contaria da abertura do inventário, e não da sucessão. Aliás. êsse processo sem-cerimônia de
interpretar as leis, para as ínquinar de falhas e sem se perder tempo em estudar o instituto ou a regra jurídica em
comentários de improviso, alcançou, nos últimos anos, graus de incrível virulência epidêmica. Bastaria que se
lesse a ALvARO VALASCO (Deoi.sionutn, 1, 98), pura se ver que se descontam o tempo até trinta dias e o que foi
perdido sem culpa (e. g., prisão, dificuldade de se conhecerem os bens). O dever de terminar é outro que o de
começar. J. J. C. PEREIRA E SOUSA (Primeiras Linhas sôbre o Processo Civil, 1V, nota 1.021, 75) era explícito:
.... . e acabar dentro de dois meses, contados do comêço do mesmo inventário”. A impraticabili. dade, no caso
concreto, justifica a prorrogação, que não é de arbítrio do juiz. Pertenceu mesmo ao Desembargo do Paço (Alvará
de 24 de julho de 1713) depois, às Relações do Império (Lei de 22 de setembro de 1828, art. 2.0, § 60). Não
infringe a regra jurídica sôbre competência para as ações acessórias a regra jurídica de alguma lei de organização
judiciária que atribua a outro juiz que o do inventário o conhecer das prorrogações, porque não há acessoriedade;
nem, sequer, conexão necessária, nem prevenção, nem é causa hereditária, e sim causa entre o que pede a
prorrogação e o Estado.
A prorrogação tem de ser motivada ( 1ª Turma do Tribunal de Apelação de Pernambuco, 2 de março de 1944, A.
F., 14, 170).
1. CôNJUGE SOBREVIVENTE. Tem legitimação processual ativa para requerer a abertura do inventário o
cônjuge sobrevivente, ainda que não tivesse havido entre êle e o cônjuge falecido qualquer bem em comum;
porque a vida a dois pode ter estabelecido confusão material de bens de propriedade de cada um. Com maioria
supérflua de razão, se adquiriram algum bem por direito não matrimonial (e. g., compraram juntos a mesma coisa).
Não se confunda essa legitimação processual ativa com a legitimação de direito material para ser inventariante
(Código Civil, art. 1.579 e § 1.0; Código de Processo Civil, art. 469). A legitimação do art. 468 do Código de
Processo Civil independe da vida em comum.
O desquite a pré-exclui. A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 4 de junho de 1946 (R.
F., 111, 451), disse que o cônjuge inocente, no casamento putativo, tem qualidade para intervir no inventário do
cônjuge culpado (queria dizer: de má fé). Essas proposições vagas são perigosas. O cônjuge que, na sentença de;
decretação de nulidade ou de anulação, foi declarado de boa fé, pode ter interesse na sucessão, porém não é, a
priori, interessado, nem herda legitimamente (cp. Código Civil, art. 1.611).
2.HERDEIROS, LEGATÁRIOS E SEUS CESSIONÁRIOS. Têm legitimação processual ativa, para requerer a
abertura do inventário, herdeiros, legítimos ou testamentários, e os legatários. O beneficiado pelo modus subjetivo,
ainda que não se trate de inodus prncipal (nosso Tratado dos Testamentos, Iii, 106, 109 e 121), é equiparado ao
legatário. Se assubjetivo, faz-lhe as vêzes na provocação o órgão do Ministério Público. Além dos herdeiros, dos
legatários, ou dos beneficiados pelo modus, qualquer dos seus sub-rogados, ou por outro modo sucessor no direito
à herança, legado ou modus.
3.TESTAMENTEIRO. Pode dar-se que o testamenteiro seja cônjuge sobrevivente ou herdeiro, ou legatário; mas
o art. 468, III, do Código de Processo Civil só se refere à legitimação com a própria qualidade de testamenteiro; e
acrescenta: ..... quando, por concessão do testador, lhe competirem a posse e a administração dos bens da
herança”. Se o testamenteiro não se acha nessas condições, não pode pedir inventário. Tem, porém, a> a pretensão
a haver dos herdeiros os meios para cumprir as disposições testamentárias, ou a que prestem caução (Código Civil,
arts. 1.755, parágrafo único, e 1.754, parágrafo único), pois que se acham, corporalmente, em mãos diversas; b) a
nomear à execução os bens da herança, se o demandarem os legatários ou o beneficiado pelo modus (Código Civil,
art. 1.755, parágrafo único). Somente contra o testamenteiro pode ser exercida a ação dos legatários, no caso do
art. 468, III, do Código de Processo Civil.
4.CREDOR DO HERDEIRO. O inventário sempre foi segurança para os credores. A pretensão deles ao
beneficium separationis firmava-se em serem satisfeitas as dívidas, de maneira precípua, antes de se confundirem
com os bens próprios dos herdeiros ou haveres do decujo. O Código de Processo Civil exige que os credores do
herdeiro estejam munidos de “sentença executória” ou de título certo e líquido; não se referiu aos credores do
decujo, porque esses podem intentar a ação contra os herdeiros, se não há inventário, inclusive executar títulos as
sentenças (art. ao art. 898). A eles não se exige que tenham a “sentença executória” ou o título certo e líquido. Aos
credores do herdeiro, sim... ~ Que é, porém, sentença executória? A lei fala de “sentença exeqúível” (Código de
Processo Civil, arts. 882 e 886) ; e são elas as ações executivas de sentenças de condenação, ou as de sentenças de
mandamento, quando, além do imperativo do mandado, importem execução, no sentido lato (e. g., embargo, certas
ações de caducidade ou amortizações, etc.). Algumas sentenças declarativas e as constitutivas podem ter efeitos de
condenação ou executivos. São sempre “executórias”, na parte das custas e despesas, ainda nos casos do Código
de Processo Civil, arts. 63 e 59, parágrafo único. O Código de Processo Civil, ao falar de titulo certo e líquido,
atendeu à maioria dos casos de ação executiva, não abrangendo, porém, todos os casos da ação do art. 298.
O credor da herança não é legitimado, somente por ser credor, a requerer a abertura do inventário (6.~ Câmara
Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 18 de fevereiro de 1952, 11. dos T., 200, 441). Tem êle pretensão contra
a herança toda; portanto, nenhum interesse em inventário tendente à partilha. Se os bens não bastam para
pagamento das dívidas, há o cor’-curso de credores, para o qual se procede, ou já se procedeu à descrição e
avaliação de bens, ou houve a situação falencial de que trata o Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, arts.
12-6.o, e ao síndico cabe a arrecadação dos bens.
5. MASSA FALIDA DO HERDEIRO. O representante da massa, na falência do herdeiro (não do legatário), ou na
liquidação coativa ou no concurso civil de credores, é legitimado a requerer a abertura do inventário. Também o
representante na falência do cônjuge sobrevivente, ou na liquidação coativa, ou no concurso civil de credores,
ainda que o regime matrimonial de bens não tivesse sido o da comunhão, é autorizado a requerer o inventário.
6. MINISTÉRIO PÚBLICO. A função do Ministério Público depende, aí, da que se atribui ao seu órgão.
7. FAZENDA PÚBLICA. É legitimada processual ativa a requerer a abertura do inventário, por órgâo, a Fazenda
Pública, qualquer que seja o interesse ; por exemplo, de impôsto de transmissão de propriedade (causa mortis), ou
multa federal ou municipal, ou de simples fiscalização, como em caso de impôsto de renda, O juiz pode exigir a
prova do interesse. (atiter, parecendo-lhe “sempre interessada” a Fazenda Pública, o Tribunal de Apelação de
Pernambuco, a 2 de maio de 1944, A.F., 14, 118).
8.ENUMERAÇÃO TAXATIVA. A enumeração acima é taxativa. a) No caso de se dever abrir inventário, por ter
legitimação o que o provocou e já estar esgotado o prazo, o juiz ordena que se inicie, por portaria. Êsse fato é
eventual documentação da incúria dos que tinham dever de pedir a abertura. b) Se o prazo se esgotou, sem que
fosse provocado pelos interessados nem aberto o inventário, a pedido do que tem de ser inventariante, o juiz deve
mandar, de ofício, também por portaria, que se inicie.
1.DEFINIÇÃO DE INVENTARIANTE. Inventariante é que faz a relação dos bens e dos herdeiros, administra os
bens da herança e representa-a, até que passe em julgado a partilha.
3.TEXTO DA LEI PROCESSUAL CIVIL. Lê-se no Código de Processo Civil, art. 469: “A nomeação de
inventariante recairá: 1. No cônjuge sobrevivente, quando de comunhão o regime do casamento, salvo se, sendo a
mulher, não estivesse, por culpa sua, convivendo com o marido ao tempo da morte deste. II. No herdeiro que se
achar na posse e administração dos bens, na falta de cônjuge sobrevivente ou quando este não puder ser nomeado.
III. No herdeiro mais idôneo, se nenhum estiver na posse dos bens. IV. No testamenteiro, quando não houver
cônjuge ou herdeiro, ou quando o testador lhe conceder a posse e a administração da herança por não haver
cônjuge, ou herdeiro necessário. V. Em pessoa estranha, na falta de cônjuge, herdeiro ou testamenteiro, onde não
houver inventariante judicial”.
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.771: “No inventário, serão descritos com individuação e clareza
todos os bens da herança, assim como os alheios nela encontrados”.
2.REQUISITOS DA DESCRIÇÃO. Os bens têm de ser deseritos. É exigido à descrição ser com clareza e
individuação dos bens. Por isso mesmo, se algum bem consiste em empresa, ou condomínio, ou outra comunhão,
tem de ser designado o todo. com a possível descrição, e têm de ser mencionados todos os elementos
componentes.
Quanto aos bens alheios, que eventualmente se encontrem no monte, ou eles são partes divisas ou partes indivisas
ou bens distintos que se acham, por alguma razão, ou mesmo sem razão, juntos aos bens da herança. A descrição,
com clareza e individuação, tem de pôr ao vivo qual a titularidade (propriedade, usufruto, uso, habitação, posse
mediata, posse imediata, tença) que tocava ao decujo, ou que, com a morte, se extinguiu. Quanto à descrição dos
bens alheios, que também há de ser feita com clareza e individuação, tem-se de aludir à pessoa ou às pessoas que
se sabe serem donas, ou terem direitos reais limitados, posse, ou tença.
Tem-se mesmo de descrever os bens de que o decujo tinha apenas posse imprópria, imediata ou mediata (cf. g,a
Câmara Civil do Tribunal de Justiça, 14 de setembro de 1950, 1?. dos T., 189, 700).
4.DESCRIÇÃO Dos BENS ALHEIOS. A descrição dos bens comuns ao falecido e ao cônjuge sobrevivente já é
descrição de bens parcialmente alheios. Também o é a de bens comuns sem que a comunhão seja de direito de
família. Mas pode dar-se que se achem com o falecido bens alheios, de que tivesse a posse imediata, ou de que
tivesse apenas a tença como servidor da posse de outrem. Todas essas situações possessórias têm de ser descritas
(sôbre o assunto do que era posse do testador, em direito material, nosso A Saisina no direito brasileiro, separata
de Ciência do Direito, II, 115-147).
Os bens alheios têm de ser descritos, porém não incluídos no inventário (cf. 33 Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, 19 de junho de 1947, E. dos T., 169, 281), até mesmo se apenas tinha o decujo pretensão à
decretação de invalidade do título de terceiro (4.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 10 de
agôsto de 1944, 154, 722). Se houve a descrição do bem como se fosse titular de direito real, ou de posse, o
decujo, e houve sentença, transiita em julgado, que o negou, tem de ser excluído do inventário (13 Câmara Civil, 7
de dezembro de 1942, 142, 116). Se o bem não está na herança como se possuidor ou tenedor o decujo, não cabe a
descrição (33 Câmara Civil, 15 de agôsto de 1939, 124, 117).
Se o decujo tinha a posse, tem-se de incluir no inventário, com a devida referência (cf. 2.ª Câmara Civil, 8 de
outubro de 1937, 110, 647) e a espécie (própria ou imprópria, imediata ou mediata).
Se o testador descreveu os bens alheios que estavam ou estariam sob a sua guarda, ou em sua posse, ou por ser
titular de algum direito real, para saber se é eficaz o que disse, tem o juiz, bem assim o inventariante e o
testamenteiro, de atender aos princípios jurídicos. Pode o testador ter atribuído a outrem o que era seu e faz parte
da herança, ou ter sido omisso no descrever ou contar.
PARTILHA
declarativa, segundo a concepção da lei) : o cálculo tem-se como aprovado, isto é, como negócio processual
perfeito.
Não há dúvida quanto à sentença de divisão e à de partilha modificarem o estado em que o mundo jurídico se
achava antes dela. Daí não poder ser preponderantemente declarativa. A discussão foi entre ser declarativa ou ser
constitutiva, o que embaraçou sobremodo a solução do problema de classificação. Mas de muito se repeliu a tese
da declaratividade: não há. identidade entre o estado posterior à sentença e o estado anterior a ela, ainda quando os
comuneiros, na partilha, tenham ficado com partes indivisas, como antes era o objeto do direito de cada um.
Convém insistir nos conceitos de partir e de dividir. Nem sempre parte quem divide; nem sempre divide quem
parte. O direito romano colheu a essência das duas categorias quando distinguiu, precisamente, o campo da acUo
familiae erotscundae e o campo da atÉia commwni dividundo, a ponto de só permitir que se usasse daquela uma
vez. Por quê? Porque aquela se refere a uma relação que não é a da comunhão pro indiviso de direito das coisas
puro. Se o monte partível se compõe de três prédios e os herdeiros são três, a partilha dos três, sendo um para cada
herdeiro, não divide. Somente parte. Se são quatro os herdeiros e dois têm de ficar num só prédio, em vez de se
dividir, criou-se a indivisão: no entanto, partiu-se o monte e uma das linhas da partilha deixou de coincidir com as
coisas e atravessou uma delas. Se esse prédio é divisível, ao tempo de se partilhar também se pode dividir o
prédio, e então haverá partilha mais divisão. Ou ~e há de deixar para depois, como exercício de atÉia communi
dividundo.
A partilha tanto abstrai da res, que se partilha aquilo mesmo que não está no patrimônio do morto (bens sujeitos a
colação), e se satisfaz com o quid inteliectuale.
Porém ,qual a natureza da ação de partilha e da ação de divisão, em classificação das ações segundo a eficácia da
respectiva sentença? O assunto é da máxima importância teórica, porém não é menor o seu interesse prático.
De início, observemos que, sendo dividir e partilhar conceitos distintos, a natureza das duas ações pode não ser a
mesma. Ou o que há, nelas, de comum as põe na mesma classe, sem que penam elas ser mais do que subclasses;
ou elas
ocupam classes distintas. Respondida afirmativamente a primeira questão, está prejudicada a segunda.
A primeira disputa foi em torno de serem declarativas ou constitutivas as ações de partilha e de divisão. O dilema
já sacrificava o bom andamento da investigação: e. g., em vez de um “Qual é a classe?”, o constrangente “~É da
classe a ou da classe b?”
Assim, não se poderia ter campo livre para as investigações e para a solução.
No plano do direito material, a propensão dos civilistas é para acentuar a natureza declarativa do negócio jurídico
da divisão. No plano do direito processual, entre processualistas, é para a apontar como constitutiva. Em todo o
caso, civilistas alemães e austríacos entenderam que há constitutividade no negócio jurídico (e. g., E. ECK, Die
sogenttnntefl doppelseitigefl Klagen, 140) e não faltaram processualistas que o vissem como declarativo (e.g., W.
RíscE, Reitráge vir Urteilslehre, 64 5.; HERMANN LAMMPROMM, Teilung, Darlehen, Auflage und lJrnsatz-
Vertrag, 266). O dilema era pôsto onde não cabia. No plano processual, a ação não é declarativa, nem constitutiva.
Os civilistas não sem causa em menor esforço intelectual tendiam a considerar declaratório todo negócio jurídico
ou ação de eficácia ex tune. As doutrinas francesa e italiana com toda a repercussão nos países latino-americanos,
incorreram nessa fácil identificação. Nada restaria a discutir. A partilha e a divisão seriam declarativas, uma vez
que vão ao passado, retroativamente. O mais grave é que se levou ao processo civil, como elemento para a
classificação das ações e das sentenças, tal conceito, que descurava assim do conteúdo como do fim dos negócios
jurídicos. A prova de que havia sentenças constitutivas de eficácia ex tune deixou perplexa a doutrina. Mais ainda
a estarreceu a descoberta de sentenças declarativas de relações jurídicas já extintas ou futuras.
Assim, o problema da natureza das pretensões a dividir e a partir foi sacrificado pelos que se preocuparam com o
eventual negócio juridico divisório ou partitivo, que uns queriam declaratório, e outros, constitutivo. Aqueles
deslocavam a questão para terreno tão árduo quanto o dela própria, o da natureza dos negócios jurídicos ditos
declaratórios ou de reconhecimento (negócios jurídicos cognitivos). Ésses, para o terreno das discussões em tôrno
dos negócios jurídicos constitutivos, além de irem da mais leve espécie de negócio jurídico constitutivo aos mais
típicos. Para isso, tinham eles de afastar a obrigação de dividir ou de partir; e quem os lê bem contempla o esforço,
a pertinácia e o insopitável wislt fui thinking, com que procederam a essa penosa e deformante cirurgia.
Seja como for, tal atitude deslocava para o terreno do direito material problema que deveria confinar-se no terreno
do direito processual, por ser problema de eficácia de sentença.
Na primeira fase do juízo de divisão ou de partilha, há exame de relação jurídica de comunhão e dos direitos de
cada comuneiro, ou pelo menos dos que suscitaram a relação juridica processual, O elemento declarativo tinha de
ser, aí, de primeiro plano, e é o elemento declarativo que se encontra em tantas ações não declarativas. Porém,
quer histórica, quer sístemâticamente, não era êsse o elemento preponderante, nem o é hoje, ainda quando se tenha
atenuado a impermeabilidade do processo divisório às “questões de alta indagação”. Verdade é, porém, que essa
secundariedade do elemento declarativo, ou a exigência de se pleitear fora algum incidente de natureza
declarativa, concorreu para que se tentasse construir a divisão ou a partilha, sem se aprofundar o estudo da
pretensão a dividir ou a partilhar. Não se via, sobretudo, que o não se levantarem questões sôbre a qualidade de
condômino, ou de co-herdeiro, ou, em geral, de comuneiro, mal disfarçava que se supunha, ou se supõe, a
cognição completa disso, embora sem se preparar, a respeito, a futura coisa julgada material. Se o chamado à
divisão, ou à partilha, propunha, ou propõe, ação contra o pretenso comuneiro, aquela suposição somente operava,
ou opera, para a eficácia da ação de divisão ou de partilha, à semelhança do que se passa com a ação de desquite,
~e está proposta ou depois dela se propõe a ação de nulidade de casamento, ou mesmo a ação declaratória negativa
(não-existência do casamento).
Na primeira fase do processo da partilha como da divisão, ou a) há interesse de cada um dos figurantes em se pôr
termo ao estado de comunhão, ou partindo-se, ou dividindo-se, ou b) os que não pediram a partilha ou a divisão, e
relutam, são chamados ao processo e à decisão judicial. É desprezar os casos b) negar a existência de conflito de
interesse, ou de lide, nas ações de divisão e de partilha, ao que se não forraram HEINRLCH DEGENKOIB
(Einlassungszwang und Urteilsnorm, 68 sjp, ZIMMERMANN (tYber die Teilung, Archiv jiir die civilistlsehe
Praxis, 84, 196) e recentemente SALVATOBE SÂTTÂ (Teoria e Pratica dei Processo, 11). Na apreciação liO,
alguns juristas exageram o papel do juiz, em detrimento do caráter negocial que, ainda fora dos casos a), persiste;
e outros o reduzem de mais, para justificar a negação de qualquer contenciosidade e, pois, a classificação das
ações de divisão e de partilha como de jurisdição voluntária (assim, E. WINDSCHEID, Lehrbuek, II, 937; OTTO
GEIB, Die rechtlíche Natur der Adio eornmuni dividundo, 62 s., e o comum dos escritores). Mas OTTÚ
KARLOWA (Rãmiscke Reehtsgesckicitte, II, 456) mostrou que isso não tem, sequer, justificação histórica. O juiz,
nos processos divisórios, não se põe no lugar dos interessados, suprindo a falta do negócio juridico, pela razão
muito simples de que, no direito clássico, não existia negócio de divisão ou de partilha.
Na opinião isolada de OT¶r’o GEIB (fie rechtlicke Nata der Adio communi dividundo, 25 s., 88 s.), trata-se de
um desses casos em que há a ação, e não há a pretensão, o que representaria, além da desatenção do autor às
alusões do direito positivo ao direito (e à pretensão) a dividir e partilhar, oblíteração do que as fontes antigas nos
apresentam sôbre a pretensão e a obrigação de dividir. A ação veio atender á execução dessa obrigação.
Por outro lado, a tentativa de classificar a pretensão a dividir ou a partilhar como direito formativo gerador (ou
transformador), excluiria a cooperação dos outros, ou a obrigação, que eles teriam, de adimplir ou de ver
adimplida em juízo. A situação do comuneiro, na divisão ou na partilha, está longe de ser como a do titular do
direito de opção, nos contratos de opção; é da mesma classe que as pretensões à prestação, que surge das
promessas de contratar. A construção da pretensão a dividir ou a partilhar como direito formativo gerador (011
transformador) é de artificialidade gritante, porque implica o excluir-se a obrigação à divisão ou à partilha (traços
disso já em E. 1. BEKKER, Aktionen des flischefl Privatrúchts, 1, 226 s.), para se apontar, sem fundamento, o
“direito potestativo” (O. PAVANINI, Natura dei Giudizi divisori, 41-76). Em todos os tempos, quando se descobre
algum fato, classe ou estrutura, em ciência ou em aplicação de ciências, como a mediema, se procura explicar pelo
nôvo achado mais do que êle pode explicar.
Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Nem havemos de cair na concepção dos indicia duplicia, exagerando a
reciprocidade, nem havemos de escorregar para o apagamento dessa reciprocidade, “isolando” cada comuneiro, a
ponto de torná-lo sozinho, como o titular do direito de opção (nosso Tratado ele Direito Predial, Tomo III). Nesse
ponto, foi E. ECE (Die sogenannten. doppelseitigen Klagen, 140 s.) o que mais perto chegou da verdade,
mostrando a semelhança da situação dos comuneiros com a dos que têm pretensão a contratar.
A sentença declarativa não tem eficácia ex tune, exatamente porque nada desconstitui, só declara. A sentença que
declara nada pode ajuntar; se ajuntasse, faria n’tais do que declarar. Nem se diga que a situação ou relação
“declarada” é que tem tal eficácia, porque a confusão, aí, é ainda mais grave. Êsse erro, de W. Risou (Beitràge zur
Urteilslekre, 77), deve ser repelido energicamente. Dificilmente se admite que tenha caído em tão grande cincada
de falar de eficácia ex tuno do negócio jurídico declarado. A esses e outros absurdos levou o chamar-se
“declaratória” a eficácia retroativa de certos atos jurídicos. Um engano leva a outro; e acaba-se por tecer toda uma
rede de equívocos. Nem o contrato de divisão nem a sentença de divisão são declarativos, O contrato de divisão e
a sentença de divisão não são, ainda, constitutivos: nem aquele constitui, nem essa, O que os comuneiros fazem,
com o negócio jurídico de divisão, é executar, por si sós, a divisão, que era uma das pretensões de cada um;
propondo todos, um, ou alguns, ação de divisão, o juiz executa por eles. Executar não é constituir, nem
desconstituir. Menos ainda declarar. A concepção da sentença de partilha, ainda no sistema francês, como
declarativa, é semelhante à do Sol que giraria, noite e dia, em tôrno da Terra imóvel. O jurista que não consegue
libertar-se desse equívoco dificilmente se libertará de outros. Havemos de ver os fatos para podermos classificá-
los: se os trocamos por outros, é aos outros que classificamos, e não a eles. Uma das maiores provas do interesse
prático da classificação científica das ações, por suas sentenças favoráveis, está no esclarecimento da
executividade de certas ações, que discussões pré-científicas
[
tentavam classificar segundo a velha concepção dual, e na análise lógica dos conceitos que estão à base das ações.
Demais, ~como explicar, se a ação de divisão ou de partilha fosse declarativa, a adjudicatio das partes divisas
(Oro KALiLOWA, Rõmische Rechtsgesekiehte, 458) e a eficácia só obrigacional do contrato de divisão ou de
partilha? O direito clássico teve de enfrentar o problema do que se pagaria a mais ao que não recebeu na coisa toda
a sua parte e resolveu-o como condenação (condenatio) a cumprir obrigação nova; donde, na decisão, a
adjudicatio e a condenatio.
O negócio jurídico dito declarativo e a sentença declarativa somente têm de comum o adjetivo e ambos conterem
enunciado de fato sôbre relação jurídica. Mas o plano em que se acha o juiz não é negocial: é o plano processual,
por sobre as partes, em vez de entre partes. O negócio jurídico declarativo é negócio sôbre eficácia de outro
negócio ou situação. Às vêzes, os juristas confundem esses negócios ou esses atos com a convalidação (e.g., F.
CARNELUTTI, Teoria Generale dei Diritto, 402 ou com a ratificação, o que é fora de toda a técnica. Nem sempre
o negócio jurídico declarativo traz à relação ou situação declarada qualquer plus em eficácia. Alude à eficácia,
porém não lha dá, ou não lha aumenta necessariamente.
A pretensão e a obrigação a dividir e a partir nascem com a comunhão mesma. São pretensões e obrigações
oriundas da comunhão. O status uipio subsiste enquanto não há exercício da pretensão a dividir, que ali opera à
semelhança das denúncias, declarações unilaterais receptícias de vontade (semelhança, não identificação). O mal
dos juristas tem sido esquecerem-se da comunhão, que é matéria de direito das obrigações, relação jurídica
inelidível entre condôminos, co-herdeiros, ou comuneiros em geral, e somente prestarem atenção ao direito real
que há no condomínio (e não há, aliás, em muitas comunhões>.
A ação communi dividundo e a ação farniliae eroiscundae têm por fito transformar a comunhão em não-
comunhão, ou em comunhão de outra natureza (e.g., em vez de co-herdeiros, condôminos de certos prédios). Essa
transformação só se obtém por execução das obrigações de dividir e de partir. Vai-se mesmo à venda da coisa, se é
preciso. A conversão da coisa, aí, ainda não é tão caracteristicamente execução como a arrematação, mas há o
elemento executivo que é pequeno nas ações para tomada de resoluções polos condôminos.
Temos, pois:
a) Não há princípio a priori para se saber qual o conteúdo e a eficácia das decisões do juiz no processo de divisão
ou de partilha. Cada questão decidida tem o seu conteúdo, e a decisão, sua eficácia. A particularidade dessas ações
está exatamente em se atribuir ao juiz certa cognição de toda a pretensão a dividir ou a partir, simplificadas,
portanto, as cognições fragmentárias de quanto seja necessário à divisão e à partilha, salvo o que já estiver
subtraído à sua cognição, e.g., pela litispendência, ou pela coisa julgada material, ou por eficácia de algum
negócio jurídico. Naturalmente, se êle nada disse a respeito, pois não foi levantada questão, não se aproveitou a
sua cognição potencial, e não cabe pensar-se em eficácia de coisa julgada material. Tudo ocorre, então, como a
propósito da sentença de desquite, que não produz coisa julgada material que obste à ação de inexistência ou de
nulidade de casamento, se não foi suscitada essa questão prejudicial, ou não foi proposta a reconvenção.
(Cumpre não confundir a coisa julgada material com a coisa julgada formal das questões que foram resolvidas ou
podiam ter sido levantadas e não foram, devendo-se ter como fora de tempo.) A sentença do juiz não manda só
dividir, ou partir, nem só condena a dividir, ou a partir; a sentença do juiz divide, parte (OTTo KARLJOWA,
flõmische Rechtsgeschichte, II, 457). Dividindo, partindo, não constitui, porque não se trata de substituto do
negócio jurídico divisional ou particional: executa. Nenhum negócio jurídico entre os comuneiros poderia ter a
eficácia dessa sentença, em que, ao lado da adizcdicatio, pode haver condemnatio, ou, nos casos em que o juiz
ordena que prêviamente se depositem as “reposições”, condenatio (elemento declaratório ou condenatório) e
execução dessa condenação. Se essa medida não foi tomada, há parte da sentença que precisa ser executiva: a
sentença é executiva; mas, quanto às reposições, condenatórias, suscetível de execução à parte (acuo iudicati). Ao
direito positivo dar-lhe a natureza de mandamento ou de ação executiva. Onde houve adjudicação, por certo não se
há de falar mais em execução futura, isto é, em
efeito executivo; houve e há a força executiva. Com o indicium acceptum, ficou o juiz com o poder de conversão
para executar a obrigação de dividir ou de partilhar. O poder de conversão abrange o adiudicare das partes divisas
ou das partes no valor, se não cabe a divisão material. Por onde se vê, com claridade, quanto o fundo histórico
sustenta a dogmática jurídica.
b) A sentença de divisão ou de partilha não é constitutiva, porque a eficácia divisional, já preestabelecida em
partes e modalidades, não é nova, mas apenas realização, execução.
Nem 1 já prefigura II, porque A teria de ser de A, E de E e C de C; nem II pode ter eficácia ex hino, sem supor
força de lei que estabeleça essa incursão ao passado. Em vez de, em (1), se cancelarem E e C, dando (1’), ou em
(2), A e C, dando (2’), e em (8), A e E, poder-se-iam cancelar A e C em (1), ou A e E, e assim por diante.
A assimilação da pretensão a dividir e a partir a direito formativo gerador (ou transformador) também desatenderia
a que o comuneiro. no momento de querer a divisão, ou a partilha, emitiria declaração unilateral de vontade de
conteúdo tão indeterminado quanto antes: não saberia qual a porção da coisa que lhe tocaria; e essa determinação
dependeria do exercicio das pretensões similares à dele, ou. preferentes à sua, em certas circunstâncias, e de toda
uma série de situações de natureza “executiva”.
A só declaração unilateral de vontade do comuneiro é insuficiente, teórica e pràticamente, o que põe abaixo
qualquer construção que recorra ao conceito de direito formativo.
c)A sentença de divisão e a de partilha não são declarativas, porque há um plus que se não explicaria com a
simples declaratividade. O dividir e o partilhar exigem acôrdo de vontades. Um só dos interessados não pode
dividir ou partir. No status quo, todos querem permanecer no estado de comunhão. Quando um dos interessados,
pelo menos, quer a divisão, ou a partilha, e há algum óbice, inclusive legal, nasce-lhe a ação, que ou é exercida
também pelos outros, assinando todos a petição, ou por um ou alguns, vindo os autos a juízo depois, a in jus
vocatio. Algo se vai passar e seria impróprio de ação declarativa. Há tantas pretensões à divisão quantos os
comuneiros. Essa pretensão não é de direito real (JOSEF KOHLER, Gesammelte Abkandlungen, 188, 5.); II.
LÂMMFROMM, Teilung, Daricheu, Auflage unel Umsatz-Vertra.q, 267), nem, se quer, mista (1?.
STEINLECHNEE, Das Wesen der iuris communio unel iuris quasi communio, II, 141). A pretensão a dividir e a
partilhar é puramente pretensão pessoal (Orro RÃRLOWA, Romísche Rechtsgeschichte, II, 455).
A actio communi dividundo é actio in personam. Dita in rem scripta, por passar ao sucessor do condômino.
A divisão e a demarcação dentro do processo do inventário e partilha podem ser simplesmente operatórias, e. g., o
decujo deixou um terreno, com x metros de frente e 2 x de fundo, tendo-se, no esbôço, atribuído 42 a A e x/2 a B,
com os mesmos 2 x de fundo, ou x com x de fundo a A e a E, e x com x de fundo a C e a D, ou em frações
diferentes, se os herdeiros acordaram, no correr do processo, quanto aos limites. Ainda a divisão e a demarcação
podem ser ação incidente, que se processa dentro do processo d~ inventário e partilha.
d) i,São executivas ou mandamentais a ação de partilha e a de divisão? Naturalmente, a pergunta refere-se à
preponderância, isto é, à força da sentença.
A discussão sôbre serem executivas ou constitutivas as ações de divisão e de partilha termina por ser vitoriosa a
primeira afirmativa. Restaria decidir-se se são executivas ou mandamentais, uma vez que o juiz manda a órgãos da
justiça que partam. Ora, a ação mandamental tende exatamente à obtenção de mandado judicial a outro órgão do
Estado. Aqui, porém, o mandado não é eficácia da sentença, mesmo adiantada. O mandado, tanto na ação de
divisão quanto na de partilha, é para operação que vai servir à sentença (cuja eficácia é que há de ser classificada),
e não operação em ‘virtude de sentença, que aí tivesse sua eficácia específica. O agrimensor e o partidor prestam
serviços técnicos à execução; não exaurem, com o seu oficio, a função de dividir e de partilhar. Os próprios co-
herdeiros podem partir; e os condôminos, dividir.
A partilha feita pelo pai, ou pela mãe, não executa; donde o caráter constitutivo integrativo da sentença do juiz. A
partilha amigável executa; a homologação integra a execução. (Note-se a diferença entre integração da declaração
unilateral de vontade do pai, ou da mãe, na partilha amigável, e integração da execução. Ali e aqui, a sentença é
constitutiva integrativa, porém não são idênticas.)
Onde há pretensão há exigibilidade. Onde há exigibilidade pode haver, da parte daquele a quem se exige, recusa à
exigência. Qualquer atividade para que se satisfaça a pretensão é positiva, do lado do autor, podendo não ser
positiva do lado dos outros interessados e, ex hypotesi, não no é de parte de quem não quer dividir ou partilhar. por
aí fàcilmente se vê que, mesmo se tivesse havido, no direito clássico, negócio jurídico de divisão e de partilha, a
que se houvesse substituído a ação de divisão ou a de partilha, isso não seria argumento, menos ainda bastante,
para se postular a jurisdição voluntária das ações de partilha e divisórias.
Quem vai a juízo, por exemplo, pedir a homologação da partilha, não contende; mas basta que tenha agido
sozinho. Ainda: se a lei impõe o processo judicial, exerce pretensão em ação adequada, pretensão “insatisfeita”.
Não importa à contenciosidade da jurisdição contestar, ou não, a outra parte a pretensão, ou a ação. Ações
declaratórias, em que o réu não nega a pretensão, nem apresenta contestação, ou em que desde logo confessa, não
deixam de ser “contenciosas”.
Outra questão foi a de se saber se as ações de partilha e de divisão eram “contenciosas”. (Cercados de problemas
que só nos últimos séculos, ou nestes, lograram solução, era fácil aos juristas encherem o tempo com essas
discussões acadêmicas.)
e) A ação tem de nascer para que de ação se possa falar. ~ tanto ação em processo contencioso a que tem por fito
obrigar os outros interessados à divisão, ou à partilha, quanto o seria, por exemplo, a ação declarativa típica, tão
usual. Ora, é preciso que alguém suscite para que à pretensão se some a ação. O que se passa, depois, é execução
pelo juiz em vez de pelas partes, ainda quando com essas coopere, apenas homologando. A regra não é ser
amigável a partilha; a partilha amigável é excepcional e toma o caráter negocial dependente de integração. Não é
muito diferente o que ocorre com outros negócios jurídicos que têm de ser feitos nos autos, ou fora deles, mas
juntáveis, e integrados pelos juizes. (Note-se que, na partilha amigável, a eficácia preponderante está ligada a
momento antes da sentença, ainda quando dependa da homologação; a sentença, embora quando necessária, é
posterius.) Aliás, nas ações cominatórias o juiz põe a alternativa “execute ou sofra”. Na partilha amigável,
executa-se, e pede-se que o juiz homologue. dizeres em termos semelhantes, homólogos; dizer, pois, como nas
outras sentenças; dar a força de sentença ao ato dos declarantes.
A coincidência de pretensões dos interessados todos têm a pretensão de dividir ou de partir não basta para se
dizer voluntária a jurisdição. Nem é certo que todos tenham ação para dividir ou para partir, porque a ação, aí,
depende de se querer que se satisfaça a pretensão e pode bem ser que somente um ou alguns queiram. A nota
promissória que tenho em mãos está vencida e é exigível, porém ainda não cobrei (não quis), de modo que
nascesse a ação cambiária. Herdei,. com outros, o prédio x, posso exigir a divisão, se é divisível, ou a venda, para
extrair do valor a minha parte. Se não acordam comigo os outros interessados, nasce-me a ação. Quando
estabelece que a divisão ou partilha tem de ser judicial, o testado elíde a comunicação de vontade, que havia de ser
feita, para dividir ou partir, inserindo-a na petição: nesses casos, a petição leva consigo a comunicação de vontade
para dividir ou partir; o Estado fêz simultâneos o exigir e o propor a ação. Há insatisfação geradora de ação; e a
sua concomitância com a ação e com a propositura foi causada pela exigência da judicialidade, na falta de regra
que separasse o nascimento da ação e a propositura Essa concomitância também aparece nos casos de direito das
obrigações em que se dispensa interpelação prévia do devedor, sem se poder pensar, portanto, em qualquer
insatisfação anterior à citação.
Que o casamento perante o juiz seja ato de jurisdição voluntarla, é inegável; que o reconhecimento do filho, pela
comunicação para registo civil, seja ato de jurisdição voluntária, como os demais atos de registo civil, ou
comercial, também é inegável. Muitos atos, que eram de jurisdição voluntária, per
deram êsse caráter, por terem deixado de ser perante juizes.
Voluntários, porém não jurisdicionais. Não há prestação jurisdicional sem jurisdictio.
O processo da ação de divisão, como o da partilha, estabelece relação jurídica processual em que o juiz fica
investido de jurisdição contenciosa para todas as questões prejudiciais lue surjam, não dependentes de outro rito. A
sentença de homologação longe está de ser somente integrativa do que os interessados acordaram. Por isso
mesmo, onde o juiz decidiu questões prejudiciais, com o elemento declarativo, ou condenatório preponderante, há
eficácia de coisa julgada material. A exigência de ter havido, quanto a essas questões, discordância específica e
concreta, é absurda, porque equivaleria a adotar-se para a eficácia de coisa julgada material das quaestiones
praeiudiciales pressuposto que se não adota para o petimm propriamente dito, nas ações declarativas e
condenatórias. A sentença de homologação é sentença como qualquer outra; é prestação jurisdicional, cuja
extensão executiva vem à frente, porém que se mescla com outras eficácias correspondentes a elementos
mesclados ao elemento predominante.
f)Tem-se usado e abusado da alusão ao “interesse comum”, nas ações de divisão e de partilha.
A concepção da divisão e da partilha como interesse comum atribui ao adjetivo “comum” significado que, em
lógica, não pode ter: o que é comum é o objeto; alguns interesses são comuns, como o de se conservar a coisa;
porém o interesse de cada comuneiro quanto à sua quota, ou a sua pars futura, não é comum. Cada um tem o seu,
semelhante, não o mesmo que os outros. Há interesses semelhantes em se desfazer a comunidade de interesse. Há
interesse comum em ação dos herdeiros para declaração da existência da relação jurídica derivada da herança, e
nem por isso seria voluntária a jurisdição para essa ação declaratória típica; não há interesse comum se um deles,
ou alguns, ou todos pedem a divisão ou a partilha: A pede a sua pars b na herança, E a sua pars b, o a sua pars c.
Pedir divisão não é pedir que se divida o bem, e sim que se divida para se dar ao autor a “sua” parte divisa, isto
é, a sua res. Tanto isso é a verdade científica que A, E e O, donos do edifício divisível, podem pedir a “divisão”
dele em apartamentos, sem pedirem que se lhes dêem partes divisas; e D, E e F, donos de fazenda, podem pedir a
divisão da fazenda em três fazendas, sem que a II se atribua a fazenda 1; a E, a fazenda 2, e a F, a fazenda 3: A, E e
C continuarão donos do edifício; 13, E e F, donos das três fazendas. Vê-se bem que a ação de divisão dividiria, aí,
o objeto, sem cortar a comunhão. Ora, a actio communi dividundo é “mais” do que isso: é execução pela
substituição de sujeitos de direito; A passa a ser dono dos apartamentos A; E, dos apartamentos b, e c, dos
apartamentos c; ou 13, da fazenda 1; E, da fazenda 2, e F, da fazenda 3, deixando cada um de ser dono do que foi
atribuido aos outros. A idéia de declaração seria fraca para exprimir isso.
Quando se diz que pertence à jurisdição voluntária tudo que conduz à constituição de nova eficácia jurídica, vai-se
demasiado longe: as ações executivas estariam incluídas, pelo forte elemento constitutivo que há nelas.
Ora, em certos momentos, ainda quando ausente o herdeiro, os que processam divisões ou inventários e partilhas
percebem claramente o que há neles, de contenção.
Certamente, tem o juiz da divisão ou da partilha a função concreta, pragmática, de pôr em contato os interessados.
Mas livremo-nos de pensar em pretensão de cada um deles à cooperação, como pareceu a KONRADHELLWIG
(Lekrbuch des deutscken Zivilprozessrechts, III, 115, nota 71) : a cooperação resulta da confluência das pretensões
a dividir, que todos, um, ou alguns exerceram em ação adequada, talvez com a relutância, ou a contragosto de um
ou de alguns. Pensar-se em pretensão à cooperação, de direito público, é artificialidade sem interesse prático. E
sem fundamento teórico, ou histórico.
O elemento constitutivo na eficácia da sentença de divisão é maior do que na eficácia da sentença de partir, salvo
se o partir também divide.
g) A diferença entre a venda da coisa executada, em virtude de processo de cognição incompleta, ou em virtude de
processo de cognição completa, e a venda da coisa comum, na ação communi dividundo, ou na ação familiae
erciscundae, está em que, ali, se vende a coisa que pertence ao executado, contra o que êle quer, ou pelo menos
contra a sua atitude, e aqui a coisa é comum. A executividade existe numa e noutra, porque ambas servem à
execução: as pretensões de direito material é que são diferentes. Por isso mesmo, HERMANN LAMMFROMM
(Teilung, Darleh eu, Auflage und Umsatz-Vertrag, 274) fêz bem em notar o elemento comum, tal como, muito
antes, ZIMMERMANN (tber die Teilung, Archiv flir die civilistische Pra-xis, 34, 207). Ressalta a importância da
observação quando se considera a ação sem qualquer propósito executivo, como a do bem em ruína pertencente a
menor.
Na venda da coisa comum, sem ser em execução de dívida dos comuneiros ou em ação de divisão ou de partilha,
tem natureza diferente a ação; e a eficácia da sentença é surpreendente para os que não aprofundaram o estudo
científico das ações: a ação deixa de ser executiva para ser constitutiva, como a de locação ou a de administração
da coisa comum. Constitutiva com forte elemento declarativo e efeito mandamental, em vez de executivo, o que
explica bastar o ofício ou o mandado para a entrega do dinheiro. Não se precisa de partilhar, nem, com maioria de
razão, de acUo indicati. Porém pelo simples fato de se tratar de dinheiro, a mais facilmente divisível das coisas.
Em todo o caso, se surge dúvida quanto às quotas, logo se vê que se trata de ação de divisão ou de partilha, ações
(executivas) encurtadas ao extremo. Então, o elemento executivo retoma o que a mandamentalidade ganhara.
A unicidade de órgão e de processo que o direito luso-brasileiro e o brasileiro acolheram mais progredido,
teêricamente, do que os outros sistemas (e. g., francês e alemão)
teve a vantagem de mostrar que a executividade obrigava à unidade formal.
1. TExTO LEGAL. Estatui o Código Civil, art. 1.772: “O herdeiro pode requerer a partilha, embora lhe seja
defeso pelo testador”. Acrescenta o § 1.0: “Podem-na requerer também os cessionários e credores do herdeiro”.
Ainda se diz no § 2.0: “Não obsta à partilha o estar um ou mais herdeiros na posse de certos bens do espólio, salvo
se da morte do proprietário houver decorrido vinte anos” (redação dada pela Lei n.0 2.437, de 7 de março de 1955).
2.LEGITIMAÇÃO ATIVA PARA A AÇÃO DE PARTILHA. Fala-se de requerimento da partilha, porque de
ordinário já se iniciou o inventário: pediram-se a abertura do inventário e a partilha.
Legitimados ativos, na primeira plana, são os herdeiros, necessários, simplesmente legítimos, ou testamentários.
Os legatários podem exigir o legado, não pedir a partilha, porque só se parte o que é comum. Se o legado foi de
um bem a duas ou mais pessoas, exigido o legado, podem os legatários pedir a divisão, que se rege pelo direito das
coisas, e não pelo direito das sucessões.
Quando se põe em dúvida que a pessoa, que se diz herdeiro, o é, incumbe-lhe prová-lo. Em alguns sistemas
jurídicos, como o alemão, o herdeiro tem o certificado judicial, o Erbschein, de seu direito hereditário, com
eficácia semelhante à do registo de imóveis. Tanto podem requerê-lo os herdeiros legítimos como os
testamentários. O certificado de herdeiro tem fé pública (G. EICHHORN, Das Erbeslegitimationsverfahren nach
dem EGE., Gruchots Beitràge, 45, 251; cf. PAUL WACHLER, Gesetz betreffend die Ausstelung gerichtlicher
Erbbescheinigungeu, 31; WILHELM HILLENKAMP, Zur Lebre vom Erbschein, 11 e 17 5.; i. FR. BEHREND,
Anevang und Erbengernere, 22 e 47; quanto ao terceiro que se cria herdeiro, ERICH REHS, Der Erbschein, 40;
Voss, tber den Erbschein nach dem BGB., Cmtchots E.eitrãge, 43, 680 s.).
O fato de o testador determinar quais os bens que entram na disposição a causa de morte, ou mesmo no tocante a
herdeiros necessários, não os faz objeto de legado, e sim de herança. Para que se trate de legado, é preciso que
esteja afastada a universalidade. Se o testador deixou os bens a, b e e a E e d, e e f, a C, mas falou de ter B um
têrço da porção disponível e C um quarto, o que se há de entender é que E herdou um têrço e C herdou um quarto
da porção disponível, de modo que; se a, b e c esgotam ou não esgotam o têrço, ou d, e e f esgotam ou não
esgotam o quarto, E e C são herdeiros do têrço e do quarto, respectivamente, devendo-se incluir a, b e e na
herança de E, e d, e e f na herança de C. Pôsto que a vontade do testador possa ser diferente, o que se há de
admitir, de ordinário, é que, mesmo se a, b e e excedem o têrço, ou d, e e 1 excedem o quarto, o testador supôs que
o valor de a, b e e fosse o do torço e o valor de d, e e f fosse o do quarto.
A inclusão de determinado bem, ou de determinados bens, no quinhão do herdeiro necessário, é permitida, sem
que se haja de pensar em legado. Acertadamente, decidiu a 4~a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a
25 de setembro de 1946 (1?. dos T., 166, 210) : “O herdeiro somente pode exigir que o ascendente lhe não tire,
ainda que o queira. o valor da meação indisponível. Quais os bens que o constituirão ou sôbre que recairá aquele
valor, não é sua faculdade o determinar ou exigir, mas é da faculdade do testador”.
Se o testador atribuiu a alguém, herdeiro, necessário ou não, ou legatário, mais do que caberia na porção
disponível, tem-se de fazer a redução. Se no quinhão necessário de algum dos herdeiros ofende a atribuição, em
doação, ou a causa de morte, tem-se de reduzir, porque nulamente se dispôs (cf. 2•a Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 26 de outubro de 1943, 1?. dos T., 151, 190).
4.HERDEIROS E HERDEIROS NA POSSE DA HERANÇA. A partilha pode ser requerida sem limite temporal;
mas, se algum ou alguns herdeiros estão na posse de determinados bens da herança, há o prazo preclusivo de vinte
anos. Se todos estão de posse, ou se nenhum deles tem posse, há, ali, o estado de comunhão, e, aqui, a falta de
qualquer elemento protectivo, possessório, a favor de qualquer herdeiro. Não se pode pensar, então, em preclusão,
nem em prescrição, da pretensão à partilha. Cf. 2~a Turma do Supremo Tribunal Federal, 4 de novembro de 1947
(R.F., 118, 99). O Código Civil, no art. 1.772, § 2.0, refere-se à ação de partilha da herança. Tal ação é que se
extingue, hoje, passados vinte anos. Nada tem com a ação de usucapião, ou qualquer ação em defesa da
propriedade. Por exemplo: o herdeiro que está, há dez anos, na posse da herança, adquiriu com justo titulo e de
boa fé, de outrem (não do que era o dono decujo), bem imóvel que se tinha de considerar incluso na herança; a
usucapião ocorreu antes de se extinguir a ação de partilha da herança. Se o bem é móvel e o herdeiro o possuía, há
três anos, como seu, de boa fé e com justo título, ou mesmo independentemente de justo título e de boa fé, por
cinco anos, houve usucapião. O que importa é verificar-se se o herdeiro possuía como bem estranho à herança.
Se foi pedida a partilha, ou se foi feito o inventário e se aguarda a partilha, que foi requerida, porque o
requerimento de inventário por algum herdeiro, ou pelo cônjuge, supõe que se chegue, depois, à partilha, o fato de
estarem os bens há vinte anos na posse de algum herdeiro, que teve ciência do requerimento, de modo nenhum
impede que se prossiga. Houve atuação dentro do prazo preclusivo. Daí ter-se de precatar a interpretação do art.
1.772, § 2.0, diante de julgados que falam de sobrestamento da partilha, como o da 2~a Câmara Civil da Côrte de
Apelação de São Paulo, a 28 de fevereiro de 1936 (R. dos T., 103, 503) Co da g~a Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, a 15 de agôsto de 1941, 136, 654).
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.773: “Se os herdeiros forem maiores e capazes, poderão fazer
partilha amigável, por escritura pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz
Uma vez que os herdeiros, figurantes da partilha, são pessoas com capacidade, a partilha pode ser partilha
amigável. Para isso, ôbviamente, é indispensável o consentimento de todos, porque se trata de negócio jurídico
plurilateral. Nenhuma eficácia teria a partilha amigável em que algum dos herdeiros deixasse de figurar, ou em
que algum deles deixasse de figurar por ser incapaz.
2.CONCEITO E CONTEÚDO. A partilha amigável é aquela em que não houve deliberação de partilha. Se
houve deliberação de partilha, a partilha é judicial. Em todo o caso,
não havendo incapaz entre os interessados, nem divergência entre eles, ainda que tenha havido deliberação de
partilha, podem os interessados preferir a partilha amigável antes de ser proferída a sentença de julgamento da
partilha. Se ainda não foi feita a escritura pública da partilha amigável, pode ser requerida a partilha judicial
(JOSÉ HOMEM CORREIA TELES, Doutrina das Ações, ed. de 1918, 172). O escrito particular não obsta ao
requerimento. O escrito particular, antes da homologação, contém negócio jurídico distratável.
A partilha amigável é realização do fim das obrigações entre os co-herdeiros, extinguindo-se o laço entre eles, se
outro dela não surge; pelo menos, extinguindo-se o laço de direito hereditário. Cada herdeiro comuneiro é
obrigado aos outros e as partilhas executam essas obrigações mútuas, oriundas da indivisão. A partilha é, pois, fato
solutivo, não só constituitivo; executa, concretiza. Cada um reclama aos outros o que é seu. A partilha amigável é
execução pelos próprios herdeiros ou projetos de execução pelos próprios herdeiros, se em escrito particular. No
primeiro caso, a partilha, não homologada, é titulo executivo à semelhança de certos títulos formais. No segundo
caso, há força executiva, e não só efeito: a eficácia executiva nasce da partilha mesma, ao contrário do que se dá
com a sentença de condenação. Não se precisa da execução na parte da posse, porque é de prever-se que os
outorgantes -outorgados da partilha amigável tenham procedido, cem suficiente minúcia, na distribuição dos
quinhões e na tradição dos bens. Não há formal de partilha amigável. Isso põe ao vivo que, in jure condendo, a
sentença de partilha deveria dispensar citacão inicial de execução: a intimação da sentença seria para o recurso,
ou, findo o prazo, para completo cumprimento. Ainda assim, atendendo-se a que da partilha, depois das
formalidades registárias, quase nada resta para se cumprir, salvo, eventual-mente, algum ato de retenção indevida
dos bens, a citação é mais o inicio de outra ação executiva, que está aí, por exemplo, em lugar da ação possessória.
3.ESPÉCIES DE PARTILHA AMIGÁVEL. O Código de Processo Civil conhece quatro espécies de partilha
amigável: a) por escrito particular, com homologação judicial, de irado a sentença de homologação é integrativa
do ato executivo (sentença constitutiva integrativa) e o valor probatório do escrito não homologado é nenhum e o
do escrito antes da homologação é apenas de ato preparatório da partilha amigável; b) por escritura pública, sem
homologação judicial, puro negócio jurídico de direito material; e) por escritura pública, com homologação, para
ter a forma de execução de sentença, oriunda do exame feito pelo juiz; d) por termo nos autos, com a sentença
constitutiva integrativa e a forma de execução de sentença. Todas essas espécies entram na classe das partilhas
amigáveis. A espécie do arrolamento, não. Assemelham-se elas a execução das obrigações por ato espontâneo dos
obrigados. Na espécie b), a força sentencial da escritura é nenhuma:
nem cabe na ação de execução de títulos extrajudiciais, nem na execução de partilha. ~ documento para se
reivindicar ou cobrar; não para se executar. Nem os interessados podem requerer a divisão ou demarcação
permitidas após a feitura da partilha; têm de propor as ações comuns de divisão e demarcação. Têm, contudo, a
ação de imissão de posse.
a) À partilha amigável por instrumento particular, que tem de ser homologada, não se pode esconder o elemento
negocial, o negócio de solução recíproca das obrigações de partir, cada um dos interessados executando a sua
obrigação. A sentença é integrativa de forma dessa “deliberação” extrajudicial. Como a partilha amigável executa,
a sentença, integrando-a, tem força executiva, que lhe vem do conteúdo mesmo do ato negocial.
b) A partilha amigável por escritura pública, sem homologação, nos casos em que a lei a permite, é puro negócio
jurídico executivo (solutivo), de direito material, que deixa subsistir a relação jurídica processual, enquanto não se
junta aos autos do processo de inventário e partilha.
a) A partilha amigável por escritura pública, que se leva à homologação a) é apresentada a juízo porque nela se
previu essa formalidade (então integrativa da eficácia), e a sua eficácia executiva começa com a sentença, tendo
sido o negócio jurídico condicionalmente suspensivo (da eficácia), ou b) nada se previu na escritura pública, e
então o que se passa é comunicação de vontade dos interessados no sentido de se obter a força executiva, própria
das sentenças (eficácia que se sabe, por muitos outros casos, ser mais intensa que a das escrituras públicas).
d) À partilha amigável, por termo nos autos, segue-se a homologação, que é a sentença integrativa de forma, no
que se aproxima da espécie a) e de c) a) e se distancia de e) 6) e, ainda mais, de b). Tem força sentencial, como em
a) e em Não há, quanto à eficácia das sentenças nos três casos, a), c) e d>, qualquer diferença, a despeito de serem
diferentes os negócios jurídicos da partilha, que a sentença integra.
4. INCAPAZES E PARTILHA. A lei falou de incapazes, e neles estão incluídos os ausentes, julgados tais por
sentença. Mas a partilha amigável é negócio jurídico unânime (ato coletivo de todos), porque não se parte sem se
apanhar o todo hereditário, de modo que, se está ausente e irrepresentado algum herdeiro, ou o cônjuge
interessado, não pode haver partilha amigável. Assim, a 1•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação. de Minas
Gerais, a li de março de 1940 (O D., V, 214).
A partilha amigável ou se faz a) por escritura pública, ou 6) por termo nos autos, ou e) por escrito particular, com
homologação judicial. Se há herdeiros que são incapazes, não há partilha amigável. A que se fizer é nula, ou é
anulável, conforme os princípios gerais sôbre invalidade e incapacidade. A capacidade é verificada no momento da
lavratura da partilha amigável, de jeito que pessoas que eram incapazes ao tempo da abertura da sucessão e o
deixaram de ser, podem figurar em partilha amigável. (Advirta-se que só há inventário judicial; cf. 43 Câmara
Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 6 de fevereiro de 1945, 1? dos 1’., 155, 266.)
A partilha amigável pode ser feita a qualquer tempo. O art. 629, parágrafo único, do Código Civil não o impede,
porque, em tal regra jurídica relativa a termo da indivisão, se supõe ter havido “acôrdo”. O tempo pode correr, sem
que se exija a partilha, a despeito de ir além de cinco anos. Se os herdeiros acordaram em não pedir a partilha, ou
os herdeiros e os cessionários ou credores, ou só esses, ou só aqueles, ou esses e aqueles, se não há mais herdeiros,
então tal pacto de não dividir tem de ser de conformidade com o art. 629, parágrafo único. Cf. 23 Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 22 de novembro de 1949 (R. dos T., 184, 181).
1. TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.774: “Será sempre judicial a partilha, se os herdeiros divergirem,
assim como se algum deles for menor ou incapaz”.
Se a espécie é de partilha judicial, afastada, portanto, a partilha amigável, nada se partilhou se o que se fêz foi
partilha amigável. Houve invalidade, e em consequência disso nenhum efeito se produziu. Qualquer juiz pode
recusar qualquer pedido de eficácia; bem assim qualquer autoridade administrativa.
2.NATUREZA DA PARTILHA JUDICIAL. A partilha judicial nada tem de contratual. Trata-se de ato de início de
execução e, com a sentença final, ato de execução, para o qual nenhum elemento se levou com qualquer acôrdo
entre os interessados. A partilha amigável, sim, é negócio jurídico , que o juiz, se feita por instrumento particular,
apenas homologa. Considerar contratual a partilha de que se fala no art. 1.774 do Código Civil (Código de
Processo Civil, art. 511; cp. 512 e parágrafo único) é atribuir-lhe negocialidade entre partes, que ela não tem
(absolutamente sem razão, F. CARNELTJTTI, Istituzioni dei nuono processo civile itoliano, III, 1a ed., 208; cp.
EUGÊNIO MINOLI, Contributo alia Teoria dei Giudizio divisorio, 68 s.).
§ 5.992. Princípio de igualdade
2.PRINCÍPIO DA MAIOR IGUALDADE POSSíVEL. No artigo 1.775, o Código Civil recomenda, na partilha, a
maior igualdade possível. A fonte do princípio foi rotina. O art. 505 do Código de Processo Civil provém de JosÉ
PEREIRA DE CARVALHO (Primeiras linhas sôbre o Processo orfanológico, 1, sj. O processualista tirou-o a
ÁLVARO VALASCO, a DIOGO GUERREIRO CAMACHO DE ABOIM e a MANUEL DE ALMEIDA E
247 SousA, dando-lhe forma própria. Cf. ANTÔNIO JOAQUIM RIBAS (Consolidacão das Leis do Processo
Civil, art. 851).
3. EQUIDADE ROMANA. A igualdade, que aí se recomenda, é a equidade romana, que, exatamente na actio
famliae erciseundae, o Imperador Filipo tinha por ponto certo de direito (explorati iuris est!) os bens dos pais
intestados devem dividir-se, com igual direito, em porções viris entre os filhos e as filhas, inter filios ao filias
bona intestatorum parentium pro virilibus portionibus aequo inre dividi oportere expiorati iuris eM (L. 11, C.,
famiiiae erciscundae, 3, 86). Naturalmente, a regra só se refere, tanto no Código Civil quanto no Código de
Processo Civil, à partilha de bens da sucessão legítima. Na partilha dos bens testamentários, é a vontade da
testador que se consulta. Daí, pareceu-nos confusão de DIOGO GUERREIRO CAMACHO DE ABOIM buscar
como fundamento à eqUidade o que “presumidamente” quereriam, in casu, os pais.
Os casos de aplicação do princípio são muitos e a jurisprudência brasileira examinou alguns: a) Há de evitar-se
reposição, por implicar venda forçada, em vez de divisão equitativa (Relação de Minas Gerais, 27 de fevereiro de
1904). 6) Partilhar a um o solo e a outro as árvores é romper a equidade (Relação de Minas Gerais, 8 de abril de
1899).
A igualdade quanto ao valor dos quinhões é absoluta; isto é, não se pode, por comodidade, ou por outro motivo,
atenuar. Quanto ao valor dos bens, à natureza e à qualidade dos bens, não; é relativa, no sentido de ser atendida, se
possível. Se a respeito de algum bem, ou de alguns bens, há litigiosidade, ou provável litigiosidade, tem o juiz de
atender às circunstâncias, in casu (cf. 1•a Turma do Supremo Tribunal Federal, 4 de dezembro de 1947, R. E., 119,
94). A comunhão no edifício, pro indiviso, pode dar ensejo a distribuição que a evite. Até mesmo a inimizade entre
dois ou mais herdeiros a que se atribuísse a compropriedade (cp. Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas
Gerais, 9 de janeiro de 1939, R. dos 7’., 125, 222). Nada obsta a que se partilhe a algum herdeiro terra que é
limítrofe à de que êle é proprietário, usuário, usufrutuário ou mesmo arrendante, porque, se isso aumenta o valor,
não se fere o principio da igualdade, uma vez que não e diminuiria, com isso, o valor de qualquer outro quinhão.
(No Código Civil, o art. 1.775 fala de se observar, na partilha dos bens, “quanto ao seu valor, natureza e qualidade,
a maior igualdade possível”. No Código de Processo Civil, art. 505, 1, alude-se “a maior igualdade possível, seja
quanto ao valor, seja quanto à natureza e qualidade dos bens”. Nem um texto, nem outro, se refere ao valor dos
quinhões.)
A propósito da maior igualdade possível, advertiu a 23 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul,
a 13 de junho de 1951 (R. EX, 138, 495) : “Os dois fundamentos da sentença apelada, tendentes a condenar o
mencionado ato inobservância da igualdade da partilha e desprêzo a instruções de serviço na comarca não têm a
mínima procedência e não são de molde a justificar a reforma total ordenada pelo juiz. Em primeiro lugar, a
igualdade que a lei recomenda deve ser encarada em concreto, segundo um critério relativo que, na repartição dos
bens, atenderá à natureza destes e à condição dos herdeiros. A jurisprudência, adverte PONTES DE MIRANDA,
tem aplicado o princípio sem se ater a uma orientação rígida, uniforme, e seria errôneo tomar os dizeres da lei
como regras abstratas, pois casos há em que dar de tudo parte aos herdeiros redundaria, muitas vêzes, em
incomodidade para todos: a comunhão continuaria e é de evitar-se. De outra parte, a composição dos quinhões
deve ser feita com os bens que forem mais proveitosos aos herdeiros, atendendo-se à idade, profissão ou ocupação.
E acrescenta: “A igualdade maior possível a que se refere a lei é a igualdade que não prejudicaria a alguns dos
herdeiros; é a igualdade que atenda às circunstâncias e aos bens do monte, e não a igualdade cega; é a igualdade
que respeita as regras que recomendam não se fragmentar, se melhor seria dar um a um herdeiro e outro a outro”
(Comentários ao Código de Processo Civil, III, II, 91). O que a sentença entende por igualdade, na espécie,
redundaria em ofensa aos direitos dos herdeiros, que vivem em desarmonia e, nas aperturas em que os colocou a
partilha, se vêem impossibilitados de dispor livremente de seus quinhões, porque a desassinada foi contemplada
em todos os bens da herança. Essa situação será fonte de incômodos e transtornos. E PONTES DE MIRANDA
observa que o juiz tem de examinar o caso, com certa imaginação, para prevenir os choques”.
4.PRINCÍPIO DE IGUALDADE QUANTO Ao VALOR. O princípio da igualdade quanto ao valor não só se
funda em se considerar, de ordinário, mais alto que o valor da avaliação o preço do imóvel, como pareceu sem
fundamento, à 23 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 18 de março de 1952 (R. dos T., 200, 335) e
à 6ª Câmara Civil, a 2 de maio de 1952 (202, 301). Mesmo porque pode ser exato ou maior do que o do mercado o
valor que deram os avaliadores.
5.COMODIDADE Dos HERDEIROS. A comodidade dos herdeiros há de ser atendida. Os exemplos mais
frequentes são os de vizinhança de prédios herdados e prédios já de propriedade do herdeiro, os de situação do
edifício ou apartamento em lugar em que reside ou tem negócios o herdeiro, os de serem em comunhão os bens
que se distribuem a herdeiros do mesmo grau, os de armazém do mesmo gênero que um dos herdeiros explora, o
de pôr-se no quinhão de E o terreno limítrofe ao de que êle é proprietário, ou titular de direito real limitado, ou
inquilino, o de incluir-se no quinhão de C a hipoteca que recai em prédio que é de E.
O testador não pode alterar a igualdade do valor, na partilha, se os herdeiros são necessários (cf. s~ Câmara Cível
do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 15 de setembro de 1944, R.F., 100, 191).
Quanto à partilha amigável, que somente pode ser feita entre herdeiros com capacidade, a invocação do art. 1.775
é impertinente (33 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 9 de dezembro de 1948, R. dos 7’., 178,
172). Idem, se houve concordância prévia em se tratando de partilha judicial (1.8 Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 2 de setembro de 1940, 138, 151). O que pode ocorrer é alegação de invalidade, e. g.,
ilicitude ou impossibilidade, como a de ser estrangeiro a pessoa a que se atribuiu bem que somente a Brasileiro se
podia atribuir, ou ter havido erro, dolo, ou coação.
Quanto à situação de imóvel, conveniente a um dos herdeiros, cf. 13 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio
de Janeiro, 26 de junho de 1947 (B. 3’. do E. do Rio de Janeiro, II, 198).
6. VENDA PARA PAGAMENTOS. Se foi vendido algum bem, ou se foram vendidos alguns bens, para
pagamento de tributos, inclusive impôsto de transmissão a causa de morte (4.a Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 17 de setembro de 1942, E. dos 2’., 141, 160), o produto da venda, e não o valor da
avaliação, é que se tem de partilhar. Não fere o princípio da igualdade o evitamento da comunhão, pois que é
aconselhável (43 Câmara Civil, 18 de março de 1943. 143, 649).
Se se evita a venda de bem do espólio e para isso se admite que algum herdeiro deposite o valor, é preciso que
haja concordância de todos os herdeiros (omissa, a 43 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 11 de
dezembro de 1947, R. dos 2’., 172, 686). Aliter, se há hasta pública.
1. TEXTO LEGAL. Estatui o Código Civil, art. 1.776: “É válida a partilha feita pelo pai, por ato entre vivos ou de
última vontade, contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários’ .
O que logo se tem de frisar é que a expressão “pai” foi infeliz. Seria absurdo que pudesse o pai fazer a partilha, e
não no pudesse a mãe. Ainda mais: em vez de pai, havemos de entender qualquer ascendente, uma vez que se não
prejudique a porção necessária.
Depois, tem-se de distinguir da partilha em vida a distribuição do monte doado.
2.PARTILHA FEITA PELO ASCENDENTE.. Diz o Código de Processo Civil, art. 502: “A partilha feita pelo pai,
por ato entre vivos ou de última vontade, será respeitada, desde que não prejudique a legitima dos herdeiros
necessários”. Cf. Código Civil, art. 1.776. A diferença é apenas de redação. Fora do caso de prejuízo à legitima de
algum dos herdeiros necessários, o que só se dá se o pai dispôs de mais de metade dos bens existentes ao tempo da
morte ou a título de partilha, ou por se lhe haver diminuído a fortuna, o art. 502 do Código de Processo Civil é
completo e imperativo. Nem juiz, nem partes o podem modificar. Julgada a partilha feita pelo pai, qualquer ato
posterior, que altere a distribuição, é
de transmissão inter vivos. Praticava-se em Portugal o respeito da partilha feita pelo pai, já antes das próprias
Ordenações Afonsinas. Pai ou mãe, entendia-se.
É erro dizer-se que a partilha em vida é doação aos herdeiros necessários, de modo que o sucedendo perde sempre,
desde logo, a propriedade (e. g., 23 Turma do Tribunal de Apelação do Pará, 18 de agôsto de 1944, E. dos 2’., 157,
799). Se foi atribuida a propriedade aos herdeiros houve adiantamento da legítima e partilha, como poderia só ter
havido adiantamento de legítima sem qualquer referência a partilha da herança necessária. Nem os adiantamentos
de legítima, nem as partilhas podem ofender a porção indisponível. Se, por exemplo, deixou de constar um dos
herdeiros necessários, a partilha em vida foi nula (cf. 23 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 26
de outubro de 1943, E. dos 2’., 151, 190). Se advém herdeiro necessário além dos que foram contemplados,
ineficaz tornou-se a partilha em vida. Se a omissão foi por haver testamento com cláusula de deserdação, a
validade depende do que foi julgado quanto à veracidade do fundamento.
A partilha em vida do decujo tem de respeitar os quinhões necessários. O patrimônio, de que se hão de calcular, é
o do momento em que se lavra a partilha em vida. Têm-se de levar em conta as doações já feitas aos descendentes
e as despesas necessárias, como as de funerais (23 Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 22 de
julho de 1940, E. F., 84, 673, e E. dos 2’., 135, 209). Ao abrir-se a sucessão, hão de ser computados os bens
adquiridos depois (Câmara Cível, 25 de maio de 1938, E. dos T., 116, 763).
3. NECESSIDADE DO INVENTÁRIO. A partilha feita pelo pai ou mãe ou outro ascendente não dispensa
inventário:
a)porque o partilhável pode ter sido desfalcado, ou aumentado; b) sine inventaria totius hereditatis partitiones feri
di/ficile ao pene impossibile, para repetir DIOGO GUERREIRO CAMACHO DE ABOIM; e) porque só existe, de
lego lata, inventário judicial.
4.AUTO-REGEAMENTO DA VONTADE. O ascendente pode “familiam suam pro arbitrio inter heredes
dividere, salva eorum legitima” (PASCOAL JOSÉ DE MELO FREIRE, Institzttiones luris Civilis Lusitani cum
publici tum privati, III, 158). Tem, portanto, plena liberdade em partilhar e dividir; só o respeito das legítimas é
limitação ao seu arbítrio.
5.REGRA JURÍDICA ESPECIAL. Pai, diz a lei; mas já interpretamos o Código Civil, art. 1.776. Pois a expressão
é reminiscência verbal do patriarcalismo romano; traço que o pátrio poder da mãe teria apagado, se já não tivesse
desaparecido antes. PASCOAL JosÉ DE MELO FREntE já se não refere a pai, mas a “testador”. O Código Civil
pôs claro que a partilha pelo decujo pode ser feita em ato entre vivos, quer dizer por escrito entre êle e os herdeiros
necessários. A partilha feita pelo pai é de origem romana, sem o intuito de evitar discórdias futuras, fundamento
que se lhe incriminou depois, quando se pensou ter sido de origem cristã. A razão é de ordem econômica, e sempre
foi. Conservou-se no direito português para se assegurar a permanência das famílias em certos bens ou indústrias;
e dela usavam muito, nos séculos XVIII e XIX, os comerciantes, para fazer os seus sucessores na casa comercial.
.À base está o patriarcalismo romano, despótico, absorvente; na camada histórica posterior, ressalta a sustentação
do prestigio econômico familiar. Raríssimas são as partilhas pelo testador, ou por atos inter vivos, que têm por fito
evitar discórdias. Invenção de juristas, a que PASCOAL JOSÉ DE MELO FREIRE evitou dar crédito, na sua
prudência de professor de direito que também era historiador.
6. NEGÓCIO JURÍDICO DA PARTILHA EM VIDA. -. Quer por ato entre vivos, quer causa mortis,~ a partilha
do Código de Processo Civil, art. 502, é negócio jurídico, declaração de vontade do decujo, e como tal se rege,
devendo ser tratada como contrato, ou como disposição de última vontade, respectivamente, para todas as
consequências. Não é só ato de execução, como a partilha entre herdeiros. A sentença tem, então, elemento
declarativo da partilha feita, com elementos de constitutividade e de execução. Quando o genitor parte, parte o
todo seu. (Assim na ciência como na prática, é de todo interesse comparar as duas partilhas, a amigável e a em
vida. As ações são diferentes; e as sentenças.)
O elemento de declaratividade da sentença tem a consequência da coisa julgada material, no tocante à existência
da partilha pelo ascendente; não, está claro, quanto à sua validade. Por outro lado, a sentença, que cobre a partilha,
tem de ser rescindida, se se quer atingir o ato jurídico do decujo. Assim, depois da sentença, a ação rescisória teria
de ser baseada no Código de Processo Civil, art. 798, 1, e), e não no Código Civil; porém o ataque à validade da
partilha pelo decujo, ato de direito material, somente seria de pleitear-se segundo o Código Civil, em ação
constitutiva negativa, ou autônoma ou inserta, por exemplo, em ação de nulidade de testamento (constitutiva
negativa).
Se a partilha feita pelo ascendente o foi por escritura pública, é de invocar-se, para se dispensar a homologação
judicial, a analogia do Código de Processo Civil, art. 512, parágrafo único, 13 parte; salvo se há algum herdeiro
que seja incapaz, ou se algum herdeiro a impugna por ofensa à legítima, ou se requere alteração na partilha em
virtude de mudança de circunstâncias, tais como haver o testador alienado algum bem, ou ter o testador deixado a
fazenda à única filha casada com fazendeiro e tendo essa, já viúva, ao tempo da morte, vendido o gado ou a
fazenda que tinha, ou tendo-se casado com pessoa estranha à vida e interesse do campo.
A sentença que homologa a partilha feita pelo ascendente, sentença integrativa só de forma, não obsta à ação
constituiva negativa quanto à validade da partilha, quando seja envolvente de questão de fato com alta indagação,
salvo portanto se tal questão foi resolvida. Se alguma questão de fato foi decidida sem o dever ser, por se tratar de
questão de alta indagação, então, no recurso de apelação, é que se discute a prejudicial da alta indagação. Passando
em julgado a sentença que a decidiu, ainda que ventilada, na apelação, ou noutro recurso, a prejudicial, somente se
pode impugnar a sentença, trânsita em julgado, pela ação rescisória.
A força da sentença homologatória da partilha feita pelo decujo é constitutiva integrativa, de modo que a
executividade e a declaratividade passam à segunda plana. O elemento declarativo é apenas ligado à prejudicial da
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existência 5 da partilha que fora feita pelo decujo.
A partilha 6 feita pelo ascendente, disse a 13 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 7 de fevereiro
de 1950 (R. dos 2’., 185, 376), “é antecipação de herança Cl), e não doação: havendo herdeiros menores, tem
de ser feita judicialmente sob pena de nulidade de pleno direito”. Primeiro, não é verdade que, com a partilha em
vida, de que trata o art. 1.776 do Código Civil (Código de Processo Civil, art. 502, 1ª parte), se antecipe herança:
não há nenhum adiantamento de legítima quando o genitor apenas partilha o que por direito de legítima têm de
receber os herdeiros necessários; o negócio jurídico unilateral de partilha pelo genitor, é para ter eficácia se es
herdeiros prováveis vierem a receber a herança, tanto que, se um é deserdado, ou excluído por indignidade, a parte
do negócio jurídico unilateral que a êle se refere é como se não tivesse sido escrita. A partilha feita pelo genitor é
negócio jurídico unilateral, pré-excludente do negócio jurídico bilateral, ou multilateral, que é a partilha amigável.
A exigência do inventário judicial é comum às três espécies.
Resta saber se, junta aos autos, a escritura pública de partilha feita em vida depende de homologação. Noutros
termos: feita em vida, por escritura pública, é de invocar-se, por analogia, o art. 512, parágrafo único, 13 parte, do
Código de Processo Civil? A resposta tem de atender à natureza do ato, que em vida partilhou a herança futura, e
aos textos do Código Civil e da lei processual. A homologação é dispensada, como o é para a partilha entre
herdeiros feita por escritura pública. Salvo se há incapaz, porque êsse não é apresentante ou um dos apresentantes
da partilha, por si e sem assistência de outrem. O juiz tem de homologar tal partilha. Idem, se algum dos herdeiros
a impugna como ofensiva da legítima necessária. Ou se por outra razão~ a tem por nula ou ineficaz.
Se o ascendente fêz a partilha, em vida, por escrito particular, a homologação é indispensável, por analogia com o
artigo 512, parágrafo único, 23 parte, do Código de Processo Civil.
Não basta que a partilha em vida seja homologada pelo juiz (i.a Turma do Supremo Tribunal, 19 de janeiro d~
1953:
“Sustenta.. . o recorrente.. . a dependência entre os arts. 1.773 e 1.776 do Código Civil: em havendo menores, há
de ser forçosamente judicial a partilha. O recorrente, porém, e nisto reside o seu equívoco, não requereu partilha
judicial, mas a homologação de partilha amigável. Há distinguir, como bem nota PONTES DE MIRANDA, quatro
modalidades de partilha amigável:
a) por escrito particular, com homologação judicial, de modo que a sentença de homologação é integrativa do ato
executivo (sentença constitutiva integrativa) e o valor probatório do escrito não homologado é nenhum e o do
escrito antes da homologação é apenas de ato preparatório da partilha amigável; b) por escritura pública, sem
homologação judicial, puro negócio jurídico de direito material; c) por escritura pública, com homologação, para
ter a forma de execução de sentença (art. 510), oriunda do exame feito pelo juiz (art. 512, verbis “não penderá”) ;
d) por termo nos autos, com a sentença constitutiva integrativa e a forma de execução de sentença (artigo 510) “.
Ver Comentários ao Código de Processo Civil, III, II, 106.
A homologação, feita pelo juiz, não torna judicial a partilha, como a homologação do desquite amigável não o
torna judicial.
7.PARTILHA EM VIDA DOS BENS DA HERANÇA. O ascendente, a despeito da necessariedade da herança dos
descendentes, pode, em vida, ou em testamento, distribuir a herança. Aí, não há disposição; apenas há regramento
do que os herdeiros necessários vão receber. Aliás, o adiantamento de legitima necessária, em parte ou no todo, já
distribui. No Livro do Eclesiasta (XXXIII, 24), disse-se, com toda a atenção à função da operação distributiva da
herança: “In tempore exitus tui distribue hereditatem tuam”. Com a partilha em vida, como com o adiantamento da
herança legítima, os futuros herdeiros ficam escapos às despesas de processo e de impostos. Mas, principalmente,
evitam-se díscrepâncias e, com a colaboração do ascendente, ou simplesmente parente, atende-se ao interesse
especial ao gôsto de cada um.
O Código Civil, no art. 1.776, apenas se referiu ao “pai “ válida a partilha feita pelo pai, por ato entre vivos, ou de
última vontade, contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários”. Diante do texto, surge a
questão de interpretação, que é precipuamente a de se saber se “pai” está aí em vez de a) pai e mãe, ou 14 de
ascendente, ou c) de parente, de que herdariam legitimamente, porém não necessariamente, os sucessores previstos
no negócio jurídico unilateral.
8.FORMA JUDICIAL SE HÁ HERDEIROS NECESSÁRIOS INCAPAZES. O art. 1.773 do Código Civil não
dispensa a forma judicial da partilha em vida, de que cogita o ad. 1.776. Se há herdeiros necessários incapazes, ou
algum herdeiro necessário incapaz, tem o ascendente de requerer que se faça em juízo a partilha (1.~ Câmara
Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de fevereiro de 1950, R. dos T., 185, 376). Assim, o juiz examina a
espécie, sem que, morto o partilhante, fique fora de apreciação judicial o respeito das heranças necessárias e do
princípio de igualdade (art. 1.775).
A partilha em vida pode ser parcial (e. g., de um ou de alguns bens). Pode ser de toda a porção necessária; com o
pode ser da porção necessária e de parte da porção disponível, o que implica doação e há de respeitar os limites
que a lei estabelece para as doações.
A exigência de reserva de parte ou renda suficiente para a subsistência do doador (Código Civil, art. 1.175) não
impede que se partilhe tudo (ou quase tudo), uma vez que se resguarde a subsistência. A porção disponível não
pode ser excedida (art. 1.176), porém isso não tem como consequência não se poder partilhar, em vida, entre os
herdeiros necessarios. a porção necessária, como adiantamento de legitima ou apenas para que se respeite após a
abertura da sucessão.
O valor dos bens partilhados em vida é o do momento da partilha. Se outros bens o decujo adquire, têm de ser
partilhados, em vida ou após a abertura da sucessão (cf. 23 Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas
Gerais, 25 de maio de 1938, R. dos 1’., 116, 763).
A partilha em vida não é pacto sucessório. Ou há adiantamento de legítima, ou há doação. O efeito é imediato, mas
o decujo pode reservar-se uso, usufruto, habitação, ou renda, ou parte de renda.
9.PARTILHA E DISTRIBUiÇÃO DE DOAÇÕES. Quem pode dispor da metade dos bens, ou de todos os bens,
pode distribuí-los em vida. O que se assemelha com a partilha em vida é a doação única a duas ou mais pessoas,
com a distribuição de partes. Mas de jeito nenhum se trata da partilha em vida de que cogita o Código Civil, art.
1.776, cujo, pressuposto fundamental é a necessariedade da herança.
Com a partilha em vida, antecipa-se a partilha da herança. ~ preciso que haja herança; portanto, que haja herdeiros
necessários, e não simplesmente legítimos, ou donatários. As doações podem ser sem qualquer caráter de
distribuição, mesmo se as doações são adiantamento de legítima. Para que haja distribuição, é preciso que haja
comunhão, e não simples doações plúrimas. Não há, então, doações individualmente feitas; há doação. Se a
herança é necessária, partilha-se a porção que se tem como porção necessária. Porém isso não afasta a
possibilidade de ser, em vida, partilhada a herança necessária e se incluir no todo partido bens que estariam na
porção disponível.
1.TEXTO LEGAL. O Código Civil disse no art. 1.777: “O imóvel que não couber no quinhão de um só herdeiro,
ou não admitir divisão cômoda, será vendido em hasta pública, dividindo-se-lhe o preço, exceto se um ou mais
herdeiros requererem lhes seja adjudicado, repondo aos outros, seu dinheiro, o que sobrar”. Houve alteração, em
virtude do art. 503 do Código de Processo Civil: “Os bens não suscetíveis de divisão cômoda, que não couberem
na meação do cônjuge sobrevivente ou no quinhão de um só herdeiro, serão vendidos na forma dos artigos 704 a
706, partilhando-se o preço, salvo quando os interessados preferirem arrendá-los, administrá-los ou possuí-los em
comum, ou se qualquer herdeiro, ou o cônjuge sobrevivente, requerer a respectiva adjudicação, repondo, em
dinheiro, a diferença”. E no parágrafo único: “Requerida a adjudicação por dois ou mais interessados, sem que
seja possível acôrdo entre eles, o juiz marcará dia e mandará citar os interessados para proceder-se à licitação entre
o cônjuge sobrevivente e os co-herdeiros, incluindo-se os bens no quinhão de quem oferecer maior lanço”.
Convém frisar-se que, já antes do Código de Processo Civil, se estendia aos bens móveis a regra jurídica do artigo
1.777 do Código Civil (cf. 5•a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 30 de outubro de 1939,
A. J., 54, 229).
Se algum bem imóvel tem de ser dividido, a divisão exige a transcrição; porque o que se herdou foi pra indiviso.
Também a substituição da compropriedade pra indiviso pela propriedade pro diviso, em virtude da partilha, ou
pela quota no monte hereditário supõe a transcrição, mesmo que não se trate de bens ou de bem imóvel. Todas as
partilhas de herança tem de ser transcritas. Aliás, outros atos como os de adjudicação de bens imóveis e outros
bens que supõem registo têm de ser registados. O Decreto n. 4.857, de 9 de novembro de 1939, artigo 178, b), VI,
ao referir-se a legados, só falou da “entrega de legados de imóveis”, porém tem-se de entender que, nos registos
especiais de alguns bens móveis, como os de propriedade industrial e intelectual, se exige a formalidade registária.
Com a saisina, transfere-se a propriedade pro indiviso, ou a propriedade que toca ao herdeiro único. Mas a divisão
e a partilha só têm eficácia definitiva com o registo.
2.BENS NÃO SUSCETÍvEIs DE DIVISÃO CÔMODA. O Código de Processo Civil, art. 503, somente cogita do
bem imóvel que não oferece divisão comoda (ou que seja indivisível). O conceito equivale ao do art. 405. (1) Se o
bem cabe na meação do cônjuge sobrevivente, ou na sua parte em bens comuns (a comunhão pode não ser
universal), e êsse o quer, a sua comunicação de vontade deve ser atendida, se não há razão mais forte, raríssima,
que c juiz exponha, fundamentando o despacho. Para se afastar das regras jurídicas do Código de Processo Civil,
arts. 508 e 505, tem êle de explicar porque assim procede. (II) Se o bem cabe no quinhão de um só herdeiro, e ásse
o quer, deve ser atendido. (III) Se o cônjuge com bens comuns também o deseja, decidir-se-á, examinando-se, com
justiça, as comunicações de vontade, mediante a licitação. (IV) Se o bem não cabe na parte do cônjuge, nem no
quinhão de um só herdeiro, ou a) os interessados (dois ou mais) preferem ficar com êle (não importa ao juiz qual o
fim: arrendá-los, dá-los em administração, ou possuí-los em comum) ; ou b) um só, dois, ou mais interessados
(cujas partes, somadas, não abrangem o valor do bem) requerem que lhes seja adjudicado, repondo, em dinheiro, a
diferença; ou c) serão vendidos na forma das vendas judiciais. ~ óbvio que, se só um quer ficar com o bem, ainda
que não caiba no seu quinhão, deve o juiz deferir-lhe o pedido de adjudicação (13 Câmara Cível do Tribunal de
Apelação de Minas Gerais, 22 de maio de 1941, R. dos T., 138, 281). Se há pedido de adjudicação, não se vende o
bem (43 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 24 de outubro de 1940, 1?. dos T., 128, 511). A 23
Câmara Civil do mesmo Tribunal, a 5 de agôsto de 1941 (R. dos 2’., 133, 136), entendeu que o juiz pode denegar
o pedido de adjudicação, feito pelo cônjuge sobrevivente, se importaria prejuízo dos menores herdeiros. £ difícil
imaginar-se o prejuízo previsível; e difícil defender-se a solução da 23 Câmara Civil quando a lei não excluiu a
própria licitação, havendo menores.
3.REPOSIÇÃO. A reposição permite que o interessado ou os interessados adquiram bem que excede o seu
quinhão. O excesso não é aquisição causa mortis; é compra-e-venda, e como tal sujeito a impôsto de transmissão
inter vivos. O dinheiro reposto paga a compra e sub-roga-se ao excesso, para todos os efeitos da sub-rogação real
(pretium succedit in toco rei) ; ainda que se trate de operação em que o inventariante, com o dinheiro, complete a
aquisição do bem, para satisfazer exigência testamentária. Porque o princípio da sub-rogação real, em assunto de
comunhão hereditária, a faz independente de se ter adquirido o bem com meios da herança, ou não (FRANZ
LEONHARD, Erbrecht, 23 ed., 183; aliter, R. BEYER, fie Surrogation hei Vermàgen im BGR., 222).
Ocessionário pode pedir a adjudicação; não tem a pretensão a licitar segundo o Código de Processo Civil, art. 503,
parágrafo único. De modo que, se cônjuge sobrevivente, ou herdeiro, pede a adjudicação, se há de deferir; se
cônjuge sobrevivente e herdeiro ou herdeiros a pedem, tem de haver licitação. A 2.~ Câmara do Tribunal de
Justiça de Sergipe, a 9 de março de 1950 (J. de 1950, 29), viu bem que no art. 503, combinado com o parágrafo
único, se criou direito de preferência.
4. LICITAÇÃO. O problema de técnica legislativa que os velhos juristas portuguêses levantaram consiste A) em
se deixar ao juiasoíver com arbítrio puro (a), ou com arbítrio judicial (b), pelo exame das afirmações de lado a
lado, em resolução de comunicação de vontade com base dispositiva (o), ou B) em se permitir que “os
interessados” oferecessem pelo bem maior lanço. Note-se: os interessados, isto é, “entre o conjuge sobrevivente e
os co-herdeiros”, a licitacão, no sentido da L. 6 de ULPIANO, D., familiae erciscundae, 10, 2: “Nam ad
licitationem rem deducere, ut qui licitatione vicit hic habeat instrumenta hereditaria, non placet neque mihi neque
Pomponio”. Porque, dizia ULPIANO, “pôr a coisa à licitação para que o vencedor nela tenha os documentos da
herança, não me parece bem, iiem a mim nem a Pompônio”. Essa licitação, que aos dois não agradava, e assim a
A. FABPm como a ALVARO VALASCO parecia reprovável, acabou por se implantar no direito não escrito
português. Mas o .ÁLVARO VALASCO da cons. 114, n. 6 (Decisionum Consultationum ao Rerum iudicatarum in
Reçjno Lusitaniae, II, 275), mudoà o seu modo de ver em Praxis Part itionum a Coilationum inter haeredes (520),
achando que a licitação aumentava o valor dos bens e, pois, seria de admitir-se. O art. 503 do Código de Processo
Civil parece-se com a prática do Senado, anterior às Ordenações Filipinas, segundo a informação de PEDRO
BARBOSA, nos comentários ao título do Digesto de Legais: ou assinar-se a coisa a um co-herdeiro; ou, se
excede, ser-lhe adjudicada, com reposição do excesso; ou admitir-se a licitação. O Senado, conforme se lê em
MANUEL ÁLVARES PÊGÂS (Resolutiones Forenses, VI, 184-187), achava a licitação “prática observada” (31
de agôsto de 1689) ; e o comentador afirmou que eram frequentes tais resoluções. Todos citaram a ÁLvÂItÕ
VALASCO, na Praxis Partitionum ei Coltationum inter haeredes.
Cumpre não se confundam as licitações, que ULPIANO e POMPÔNIO reprovavam, com as licitações em hasta
pública, erro em que incorreu Dioco GuEIUiEIRo CAMACHO DE ABOIM (De Munere ludicis Orphanorum
Opus, in quin que tractatus divisum, quorum primus est de InvenMrio, Livro II, Caífltulo 3). Advirta-se também
que JORGE DE CABEDO e PEDRO BARBOSA, conhecedores da matéria, não haviam incluído a licitação
condenada por ULPIANO e POMPÔNIO nas Ordenações Filipinas. O Senado teimou, acertadamente, em
conservá-la.
Se, ao tempo do pedido de adjudicação, houve valorização do bem, pode o juiz, se lho requerem, determinar nova
avaliação (23 Turma do Supremo Tribunal Federal, 6 de agôsto de 1948, R. E., 128, 64).
Somente se há de deferir o requerimento de licitação, se o bem não cabe na meação do cônjuge sobrevivo (23
Turma do Supremo Tribunal Federal, 13 de julho de 1948, 1?. F., 121, 90), ou no quinhão de algum herdeiro, ou
se o cônjuge ou o herdeiro não requere a adjudicação, repondo, em dinheiro, a diferença (cf. 33 Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 23 de setembro de 1947, 1?. E., 123, 158, e O D., 52, 247). Se dois ou
mais interessados requerem a adjudicação, e não há acôrdo entre eles, há a licitação (43 Câmara Cível do Tribunal
de Apelação do Distrito Federal, 8 de junho de 1945, O 19., 42, 384; 53 Câmara Cível, 29 de setembro de 1942,
R.F., 94, 68).
O cessionário do quinhão hereditário tem pretensão à adjudicação (Côrte de Apelação do Distrito Federal, 29 de
janeiro de 1918, 1?. de D., 48, 176; 53 Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 1.0 de outubro
de 1943, R.dos 2’., 149, 700; Tribunal de Apelação do Rio Grande do Norte, 24 de abril de 1944, 152, 697).
6. LEGITIMADOS À LICITAÇÃO. A licitação não é entre os pretendentes só: é entre todos os interessados,
cônjuge sobrevivente e co-herdeiro, talvez legatário. Resta saber se, alegando algum deles não ter dinheiro para o
justo valor da coisa, pode suscitar a venda em hasta pública, admitindo-se terceiros (assim, a L. 3, § 1, C., de
communi dividundo, 3, 37). De lege ferenda, a nossa resposta seria afirmativa, pelas razões de MANUEL DE
ALMEIDA E SousA (Tratado prático compendiário de todas as Ações Sumárias, II, 130 e 137) : não há mais
próprio remédio para se verificar se a avaliação foi baixa; e os interessados podem concorrer. De lege lata, se
alguém requere a venda, não obsta à licitação.
O cônjuge prefere aos herdeiros, ou tanto importa que haja dois ou mais pedidos, todos de herdeiros, ou de
herdeiro ou de herdeiros e cônjuge? A 2•a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 13 de julho de 1948 (E. 9., 121,
90), deu a primeira solução. No mesmo sentido, decidira a 7•a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal, a 24 de janeiro de 1947 (118, 131). Não é o que está na lei: no art. 503, parágrafo único, do Código de
Processo Civil, há regra jurídica explícita, que é a de proceder-se “à licitação entre o cônjuge sobrevivente e os co-
herdeiros”. Tão-pouco têm preferencia os co-herdeiros incapazes (23 Turma do Tribunal de Justiça do Espírito
Santo, 11 de dezembro de 1946, E. do T. de 3., 1, 329, que reformou a decisão de primeira instância que deferira o
pedido de adjudicação feita pelos menores).
7.ADJUDICAÇÃO. A adjudicação, com reposição do excesso, é fruto da praxe portuguêsa; só se algum outro
interessado também quer é que se recorre à licitação: “Se vero partes hanc divisionem nolint admittere, tunc
deveniendum est ad licitationem, ut plus offerenti in solidum addicatur”, dizia PEDRO BARBOSA. Portanto, se
alguém pedia a venda, era impossível adjudicar-se. Isso, quanto à adjudicação, não está no Código de Processo
Civil. Nem quanto à licitação. De lege Jerenda, pensaríamos diferentemente. De lege lata, temos de interpretar o
Código de Processo Civil. Na tradição dos direitos portuguêses e brasileiros, não se vende se alguém quer que se
lhe adjudique; nem se dois ou mais pedem adjudicação, porque então se licita. ALVARO VALASCO foi explícito
(Praxts Partitionum et Coilationum inter hoeredes, 520 e 605). Tal a nossa lei: ou se adjudica, ainda com
reposição; ou se licita: nu se vende. Vender vem em último lugar.
Antes da praça, ao herdeiro adjudica-se pelo preço da avaliação; se iniciada, atende-se ao que se ofereceu,
inclusive se houve a licitação a que se refere o Código de Processo Civil, art. 503, parágrafo único ( 2.a Turma do
Supremo Tribunal Federal, 6 de abril de 1951, R. 9., 138, 138).
Desde que se fêz a partilha e se julgou (23 Turma do Supremo Tribunal Federal, 30 de outubro de 1951, 144, 101)
e enquanto não se vende o bem, o pedido de adjudicação é permitido. Não há prazo.
O cessionário do herdeiro pode pedir adjudicação (2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, 29 de maio de 1951)
não, porém, tomar parte na licitação a que se refere o art. 508, parágrafo único (1~ Turma, 10 de dezembro de 1951,
R. E., 147, 123). Sem razão, permitindo a licitação pelo cessionário, a 23 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro, a 19 de abril de 1949, e a 2.ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 17 de abril de
1951 (R. dos T., 199 168).
O herdeiro ou o cônjuge sobrevivente tem pretensão à adjudicação, sem que seja preciso que os outros
interessados concordem. O Código de Processo Civil, art. 706, 1, referindo-se à mesma espécie de que trata o art.
503, 2.~ parte, fala de adjudicação “a um ou mais herdeiros acordes”, o que levou a Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Paraná, a 29 de janeiro e a 25 de janeiro de 1947 (Paraná 3., 45, 131 e 266) a interpretar o art. 503, 23
parte, como se, não estando acordes em que se faça a adjudicação a um dos herdeiros, ou mais, seja ilegal a
adjudicação. O erro é gritante. Não se disse, no art. 706, 1, que só se adjudicará o bem “se os demais herdeiros
acordarem”, mas sim “a um ou mais herdeiros acordes”. Não se poderia adjudicar dois ou mais, sem que em tal
condomínio não acordassem os adjudicatários, tanto que, se não acordarem, incide o art. 503, parágrafo único.
Ceda, a 3ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 28 de junho de 1948 (E. dos T., 176, 234).
Se o cônjuge ou o herdeiro pede a adjudicação e o juiz defere, sem ouvir os outros interessados, pode qualquer
outro, enquanto não transita em julgado a decisão de deferimento, também pedir, compondo-se a pluralidade de
pedidos, de que cogita o art. 503, parágrafo único. Portanto, o interessado, que recorre, pode introduzir o seu
pedido, inclusive no recurso, dando ensejo a que o juiz ordene a licitação. A 33 Câmara Civil do Tribunal de
Justiça de São Paulo, a 18 de dezembro de 1947 (E. dos 21, 178, 350), entendeu que, “não tendo o interessado
formulado pedido de adjudicação no momento oportuno” (porém não disse quando começava de ser inoportuno o
pedido), não mais poderia pleitear a licitação se outrem já a pedira. Certo, o despacho do Juiz de Direito de
Jequitinhonha (Minas Gerais), publicado em O Diário de Belo Horizonte, a 23 de maio de 1949, salvo no que não
considerou definitiva a sentença que defere a adjudicação: ainda não passara em julgado, o que é outra coisa.
A adjudicação segundo o art. 503 do Código de Processo Civil pode ser pedida enquanto não homologada a
partilha (Turma Julgadora do Tribunal de Justiça de Alagoas, 17 de outubro de 1947, A. 3., 85, 468). As despesas
com a reforma da partilha ou correm por conta do requerente ou do espólio, conforme a data da concordância e da
apresentação. Se os interessados concordaram antes de se fazerem as despesas inutilizadas e o requerente só
apresentou o pedido depois de feitas, responde por elas êsse; se a concordância já foi posterior, há de entender-se
que concordaram com a reforma.
Da adjudicação ao cônjuge sobrevivente ou ao herdeiro (art. 503, 23 parte ) têm de ser intimados os herdeiros e
demais interessados (23 Turma do Supremo Tribunal Federal, 2 de janeiro de 1948, E. F., 121, 472). Contra quem
não foi intimado, não transita em julgado.
O requerimento de adjudicação só se há de fazer após o pagamento das dívidas e quando já se souber qual o
quanto do quinhão (cf. 23 Turma do Supremo Tribunal Federal, 20 de outubro de 1951, E. E., 144, 101; e 18 de
janeiro de 1949, O D., 60, 165). Se dois ou mais herdeiros querem a adjudicação, individualmente, tem de haver a
licitação, conforme o Código de Processo Civil, art. 503, parágrafo único: “Requerida a adjudicação, por dois ou
mais interessados, sem que seja possível acôrdo entre eles, o juiz marcará dia e mandará citar os interessados para
proceder-se à licitação entre o cônjuge sobrevivente e os co-herdeiros, incluindo-se os bens no quinhão de quem
oferecer maior lanço”.
<~ de afastar-se a adjudicação se algum dos herdeiros é incapaz (ou se o é o cônjuge)? Afirmativamente, quanto a
herdeiro, a 43 Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 21 de setembro de 1943, E. 9., 100,
494). Porém, com tal interpretação, priva-se o herdeiro incapaz de ser beneficiado pelo requerimento de
adjudicação, ou mesmo da licitação. Certas, as decisões da 33 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a
27 de março de 1952, E. dos 7’., 201, 298, e da 23 Câmara Civil, a 20 de abril de 1948, 174, 247).
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Não há necessidade, para a adjudicação, do assentimento dos demais herdeiros ou do cônjuge (3.~ Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 28 de junho de 1948, E. dos T., 176, 234). A 23 Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, a 5 de agôsto de 1941 (133, 136), entendeu que seria de negar-se a adjudicação se tal
medida prejudica herdeiros incapazes. Então, houve má avaliação e se supõe que os herdeiros incapazes também
quiseram a adjudicação. Fora daí, de modo nenhum é de acolher-se o julgado.
8.CONTEÚDO DA REGRA JURÍDICA. O Código Civil, artigo 1.777, não falou da licitação (CLÓvIS
BEvILÁQUA, Código Civil comentado, VI, 252, afirmava não a admitir o Código Civil; mas também as
Ordenações Filipinas não trataram dela!). O Código Civil não está derrogado. O Código de Processo Civil fêz à lei
civil o que a jurisprudência seiscentista fizera às Ordenações Filipinas. Onde o direito material deixa branco para
que, dentro dele, se exerça certo arbítrio do juiz, enchendo êsse branco com algum expediente, a lei processual não
atinge a lei material. ANTÔNIO DE PAIVA E PONA (Orfanologia Prática, 1, 15), depois de definir a licitação
como se fazia então, auctio pretiluxta, considerava pressuposto suficiente algum herdeiro reputar de maior valor
que o da avaliação a coisa avaliada: não se precisaria de requerer adjudicação e haver concorrência. JosÉ
HOMEM CORREIA TELES (Doutrina das Acões, § 149, 173; Digesto português, II, § 1.097, 155), que também
considerava a licitação meio de corrigir a má avaliação dos bens, não reputou suficiente a impugnação do valor
dado na avaliação, exigiu a concorrência do requerimento de adjudicação. Portanto, a licitação era expediente
técnico de desempate e como tal perdurou, a despeito de os compiladores das Ordenações e de os legisladores do
Código Civil não a terem contemplado. É preciso que haja concorrência de requerimentos de adjudicação.
Firmada no que acima escrevemos, a 1~a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 23 de outubro de 1952 (D. da 3.
de 5 de setembro de 1955), que citou os Comentários ao Código de Processo Civil, III, 90.
9.SE HA HERDEIROS INCAPAZES. ~A licitação entre cônjuge sobrevivente e herdeiros não é permitida se há
herdeiros incapazes. Assim, não obstante o silêncio da lei portuguêsa, resolvia JOSÉ HOMEM CORREIA TELES
(Digesto portugués, II, § 1.102, 156). Hoje, a hasta pública só se impõe, se está em dúvida a verdade da
avaliação. Mas, se não está em dúvida a verdade da avaliação e sim há só concorrência de pedidos de adjudicação,
sem suspeita de conluio entre os que pediram a adjudicação, a fim de obstar a venda ao público, não há no Código
de Processo Civil limitação à licitação pela só presença de incapazes no inventário e partilha. O órgão do
Ministério Público, o representante ou assistente do incapaz ou o curador especial, se o representante do incapaz
ou o relativamente incapaz, assistido, pediu licitação (colisão de interesses), velam pelo incapaz.
Em todo o caso, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, a 10 de dezembro de 1951 (E. 9., 147, 123), entendeu
que ainda aí se há de respeitar o art. 704, § 2.ª, do Código de Processo Civil.
1.TEXTO LEGAL. Lê-se no Código Civil, art. 1.778:“Os herdeiros em posse dos bens da herança, o cabeça-de-
casal e o inventariante são obrigados a trazer ao acervo os frutos, que, desde a abertura da sucessão, perceberam,
têm direito ao reembôlso das despesas necessárias e úteis que fizeram, e respondem pelo dano, a que por dolo, ou
culpa, deram causa
2.DESCRIÇÀO E ENTREGA DOS FRUTOS. Quem está com os frutos da herança tem de comunicá-lo ao
inventariante, ou aos herdeiros, e ao cônjuge. A descrição há de ser feita. Não se há de demorar a partilha pelo fato
de se saber que há frutos e não foram entregues, nem descritos. Passam a ser inventanados e partilhados em
aditamento (33 Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 10 de maio de 1945, 3., 26-27, 377).
As canas plantadas e outros vege{ais ainda não são frutos (sem razão, a 23 Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, 2 de outubro de 1951, E. dos 7’., 196,. 156), mas, sim, partes dos bens, têm de ser descritos, ainda que
em aditamento ao inventário e à partilha.
Se o testador havia dado em locação algum ou alguns bens, os direitos, que êle tinha, como os deveres, passam aos
herdeiros, que têm de respeitar o vínculo contratual. Se há frutos, têm de ser tratados conforme as cláusulas do
contrato. Idem, a faculdade de sublocação (cp. JULIUS PETERSEN, Die Rerufung zur Erbschaft und die
letzwilligen Verfiigungen, 67, 1).
5.BENS LITIGIOSOS. A litispendência torna litigioso o bem. O ser litigioso não impede que o bem seja objeto
de negócio jurídico, por uma das partes, nem exclui a cessibilidado da ação exercitada; apenas afasta tais negócios
jurídicos quanto à eficácia da futura sentença na demanda pendente. A alienação da coisa litigiosa permite a) a
imissão de posse ou que se apreenda a coisa, só sendo ouvido o terceiro depois de efetuado o depósito. Em vez
disso, pode o exeqúente b) executar o condenado pelo valor estimado na sentença ou liquidado. Se o terceiro
adquirente ainda não tem posse do móvel, ou não lhe foi transcrito o título do imóvel, a execução é contra o
devedor alienante, não contra o terceiro (MANUEL GONÇALVES DA SILVA, Comentaria, III, 299). Se a coisa
foi desapropriada pelo Estado, a execução é no preço; se o condenado o levantou, é como se houvesse perecido. Se
ainda não foi depositado ou entregue o preço, o exequente substitui o desapropriado no processo da
desapropriação.
A alienação da coisa litigiosa é ineficaz contra o exequente, pois que entre o executado e o exequente estava o ato
estatal da inserção da coisa no litígio. A tradição do direito brasileiro, bem antes das Ordenações Filipinas, Livro
IV, Titulo 10, § 9, foi sempre nesse sentido, como se vê da decisão 131, ns. 6 e 7, de JORGE DE CABEmO. O que
importa, para a eficácia, é ter provindo do executando, réu na ação da cognição, ou do executado, ainda- que
mediando muitos adquirentes-alienantes, o título do terceiro. Advirta-se, com HÁRTOLO DE SAXOFERRATO e
AGOSTINHO BARnoSÁ, que, nas ações possessórias, res litigiosa não é a propriedade, mas a posse, ac proinde
iv. alium transferi nou potest (ANTÔNIO DE SOUSA DE MACEm, Decisiones, 189) ; mas, havendo ação sôbre o
possessório, o terceiro que, pendente a lide, houve a posse, fica sujeito à sentença, pelo vício da litigiosidade. Nos
casos de alienação necessária, o valor fica, em vez da coisa; porque a alienação necessária, nesse sentido, é
celebrada abs que vitio rei litigiosaé (MANUEL .&LvARES PÉGAS, Resolutiones Forenses, 1, 458: “Nisi
alienatio necessaria, quia tunc nuílo modo potest argui de fraude. Quidquid enim ex necessitate fit, non dicitur
fieri in fraudem”). A necessariedade da alienação conceptualmente exclui a proibição: a alienação também é pelo
Estado.
Diante do que acima se expôs, compreende-se que se deixe para sobrepartilha o que é bem litigioso. Porém a regra
jurídica do art. 1.779 do Código Civil, como a do art. 514 do Código. de Processo Civil, são ius dispositivum;
portanto, a deliberação há de ser pela maioria dos interessados.
Se são litigiosos todos os bens da herança, suspende-se a feitura do inventário (5.ª Câmara Civil da Côrte de
Apelação de São Paulo, 13 de março de 1985, E. dos T., 97, 450>, ou a partilha.
O fato de existir em juízo ação de nulidade ou de anulação de testamento de jeito nenhum permite sustar-se a
partilha (4.ª Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 26 de abril de 1939, E. dos 7’., 120, 589).
1. BENS SONEGADOS. Se a sonegação se deu, a medida que lhe corresponde é a de sobrepartilha; se a partilha
foi feita com dolo, ou outro vício, cabe ação de anulação (cf. 23 Turma do Tribunal de Justiça do Espírito Santo,
14 de agôsto de 1951, E. do T. de J. do E. S., VI, 840). Aliás, a ação de anulação só se refere à partilha, de modo
que nada tem com os bens sonegados, podendo apenas ser supérflua a sobrepartilha se toda a partilha é anulada.
2.BENS DESCOBERTOS APÓS A PARTILHA. Se após a partilha foram conhecidos bens que não se sabia serem
elementos da herança, a solução da sobrepartilha é a única, salvo se tais bens entram em algum legado. Exemplo
de bem descoberto: haver maior número de alqueires de terras do que aquilo que se partilhara (13 Câmara Civil do
Tribunal de Apelação de São Paulo, 20 de agôsto de 1952, E. dos T., 205, 494).
3.MAIORIA QUE DELIBERA. O deixar-se para sobre-partilha o que consta da herança, por haver alguma das
situações objetivas previstas, depende de deliberação da maioria dos interessados. Nos textos legais fala-se de
maioria dos herdeiros, mas a propósito da inventariança. Se há cônjuge meeiro, ou com parte no acervo, tem êle de
ser ouvido. O voto é de cada um, e não conforme o valor do quinhão. Se a maioria decide que se deixe o bem ou
se deixem os bens para sobre-partilha, a feitura somente é exigível quando cessar o litígio, a liquidação, ou quando
trânsita em julgado a sentença proferida na ação de sonegação.
Quanto aos bens descobertos após a partilha, a sobrepartilha independe de deliberação.
CAPÍTULO III
SONEGADOS
1.CONCEITO. Diz-se sonegado o que deveria ser desfrito e entrar na partilha, porém não o apresentou o herdeiro,
ou, tendo sido doado ao herdeiro algum bem, não o levou à colação, ou o inventariante, que sabia ser o bem
elemento da herança, não o descreveu. O assunto está nos arts. 1.780 e 1.781 do Código Civil.
2. TEXTO LEGAL. Lê-se no Código Civil, art. 1.780: “O herdeiro que sonegar bens da herança, não os
descrevendo no inventário, quando estejam em seu poder, ou, com ciência sua, no de outrem, ou que os omitir na
colação, a que os deva levar, ou o que deixar de restitui-los, perderá o direito que sôbre eles lhe cabia”.
A regra jurídica atende a que sonegar vem de sub-negare (sonegare). Quem sonega nega por baixo,
disfarçadamente, dissimuladamente. Tanto sonega o herdeiro que deixa de comunicar que tem a posse ou a tença
de bem ou de bens da herança, para que se inclua no inventário, como aquele herdeiro que, sabendo que outrem
está com a posse ou a tença do bem ou dos bens da herança não o comunica como aquele que deixa de levar à
colação o que lhe cumpria levar, e como aquele que tinha de restituir o bem ou os bens, e não no fêz.
8.INTERPRETAÇÃO no TExTO LEGAL. Há três atitudes que foram assumidas para a interpretação das regras
jurídicas sôbre a sonegação: a) a de se entender que existe sonegação sempre que se não dá ao inventário para se
incluir no monte aquilo que devia mencionar quem sabe existir (cf. JOAQUIM JosÉ CAETANO PEREIRA E
SOUSA, Esbôço de um Dicionário Jurídico, II, verbo “Sonegar”: “não dar ao inventário para se empadroar
aquilo, que quem sonega deve manifestar”) ; b) a de se considerar sonegação o que se deixou de mencionar com
dolo, ou má fé; e) a de se ter por sonegador quem ocultou, ciente ou não de ser da herança o bem.
Em a) supõe-se o dolo, ou a má fé, ou a culpa, pois que o herdeiro sabia que tinha de apontar, ou de colacionar, ou
sabia que outrem tinha a posse ou a tença. Por isso, o demandado pode provar que não sabia (ônus da prova ao
demandado), ou cabe ao demandante alegar e provar (o que seria menos acertado, pois que já provou a posse ou a
tença do demandado) ; salvo se a posse ou tença era de outrem, porque, ai, o demandante tem de alegar e provar
que o demandado disso tinha conhecimento (ônus da prova ao demandante).
A solução interpretativa b) tornaria pressuposto necessário para a aplicação das regras jurídicas sôbre sonegação a
alegação e prova do dolo, ou da má fé. O demandante teria de alegar, na petição, o dolo, ou a má fé, e prová-lo.
No sentido da solução a), que dera CLÓvIS BEVILÁQUA e que sempre defendemos, a 23 Turma do Supremo
Tribunal Federal, a 1.0 de agôsto de 1948 (R.F., 128, 408) e a 24 de abril de 1951, 189, 174, a 23 Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Paraná, a 15 de março de 1949 (Paraná J., 49, 400), a 13 Câmara Cível do Tribunal de
Apelação do Rio Grande do Sul, a 26 de junho de 1945 (J., 26-27, 542).? e a 17 de julho de 1989 (A. 1., 58, 58), a
23 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 8 de outubro de 1944 (1?. dos T., 156, 599) e antes,
ambiguamente, a 10 de novembro de 1942 (143, 158), e a 4•a Câmara Civil, a 18 de agôsto de 1941 (185, 141).
No sentido da solução b), a 13 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 9 de abril de 1945 (1?. dos
T.. 158, 219).
O sentido da solução e) é indefensável diante das regras da lei.
4.CÔNJUGE SOBREVIVO E SONEGAÇÃO. O cônjuge meeiro, não herdeiro, não está incluído como pessoa
que tem o
dever a que se refere o art. 1.780 do Código Civil (í.~ Turma do Supremo Tribunal Federal, 17 de dezembro de
1945; 43 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 14 de junho de 1939; 23 Câmara Cível do Tribunal
de Apelação de Minas Gerais, 18 de agôsto de 1945, 1?. dos 7’., 121, 198, e 159, 817; 13 Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de maio de 1950, 187, 201; 53 Câmara Civil, 20 de abril de 1951, 192, 695;
sem razão, a 1.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 17 de julho de 1989, A. J., 53,
58, e as Câmaras Conjuntas do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 23 de setembro de 1938, 116, 718).
A 23 Turma do Supremo Tribunal Federal, a 24 de julho de 1951 (19. daj. de 6 de agôsto de 1951), confundiu
“cônjuge meeiro” com herdeiro.
6. PARTILHA EM VIDA. Se houve partilha em vida, o inventário, que se faz após a abertura da sucessão, e a
partilha dos bens posteriormente adquiridos têm de referir-se ao que foi partilhado em vida.
Se fora feita partilha amigável de alguns bens, sem qualquer discrepância, e depois se inventariaram outros bens e
se fêz outra partilha, o fato de se não mencionarem, no inventário e na nova partilha, alguns bens ou algum bem ou
todos os bens amigâvelmente partilhados, não é sonegação <Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, 30 de
julho de 1953. J.eD., 11, 158).
1.TEXTO LEGAL. Diz o Código Civil, art. 1.781: “Além da pena cominada no artigo antecedente, se o
sonegador for o próprio inventariante, remover-se-á, em se provando a sonegação, ou negando êle a existência dos
bens, quando indicados”.
Para o Código Civil, há sonegação se o herdeiro deixa de dar a descrição dos bens que tinham de figurar no
inventário, se estão em sua posse ou tença, ou, com ciência sua, na posse ou tença de outrem, ou bens que tenham
de ser levados à colação, ou restituidos. Não se falou de inventariante; falou-se em não haver descrição no
inventário, O art. 1.781 aludiu à sonegação pelo inventariante, apenas como uma das hipóteses.
A sonegação pode ser de um bem, ou de dois ou mais, ou de todos (e. g., o decujo só deixou pedras preciosas no
cofre e o herdeiro, sabedor disso, não o comunicou ao juízo, ou ao inventariante, ou aos outros herdeiros).
Qualquer herdeiro é atingido pelas regras jurídicas sôbre sonegação; e não só, como no direito romano, heredes
sui et necessarn.
2.DUALIDADE DE PENAS. A pena cominada no artigo 1.780 do Código Civil é a de perda do direito relativo ao
bem sonegado ou aos bens sonegados. Uma vez que há a universalidade, a perda é do valor do bem sonegado, ou
dos bens sonegados, valor que se deduz do quinhão do herdeiro sonegador. O bem sonegado volta ou os bens
sonegados voltam, mas o sonegador somente recebe o que seria o monte sem o bem sonegado ou sem os bens
sonegados. Se sonegou toda a herança, nada recebe.
No art. 1.781 do Código Civil alude-se à pena que atinge o herdeiro, assunto do artigo anterior, e prevê-se a
espécie em que coincide ser herdeiro sonegador a pessoa que exerce a inventariança. Será removido o
inventariante herdeiro, se houve prova da sonegação, e o mesmo acontece se alguém indicou algum bem e êle
negou a existência do bem. Interpretemos a regra jurídica como abrangente dos casos de negar o inventariante que
o bem seja do monte hereditário.
No art. 1.781 apenas se cogitou do inventariante, que é herdeiro. Por isso, é absurdo tirar-se do texto legal que há
pena de sonegação para o inventariante que não é herdeiro, como entender-se que incorre em sonegação o
inventariante que não é herdeiro.
A remoção do inventariante, que não é herdeiro, rege-se pelos princípios do direito processual civil. Para que se
possa invocar o art. 1.781 do Código Civil, é preciso que o inventariante seja herdeiro e tenha havido a sentença
na ação de sonegação. Se transitou em julgado tal sentença, removido, destituído, está, automáticamente, tal
inventariante (cf. 23 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 8 de outubro de 1944, 1?. dos 7’., 158,
688).
1. TExTo LEGAL. Lê-se no Código Civil, art. 1.782: “A pena de sonegados só se pode requerer e impor em ação
ordinária, movida pelos herdeiros, ou pelos credores da herança”. E no parágrafo único: “A sentença que se
proferir na ação de sonegados, movida por qualquer dos herdeiros, ou credores, aproveita aos demais
interessados”.
A regra jurídica sôbre a ação de sonegados de modo nenhum afasta que se requeira ao juízo a inclusão de algum
bem ou de alguns bens que estão na posse ou tença do herdeiro, mesmo inventariante, ou de terceiro. A penalidade
pela sonegação é que somente pode ser decretada em sentença que se profira em ação ordinária
Não há decretação de sonegação, de que resulte pena, sem ter havido sentença, em que se aprecie a omissão da
pessoa. Se o herdeiro não deu para descrição o que tinha consigo, como possuidor, ou como tenedor, ou o que,
com ciência sua estava na posse da tença de outrem, entende-se que o fêz de má fé. Se ciente estava, tinha o dever
de dá-lo para a descrição, ou comunicar ao inventariante ou ao juízo. O ônus da prova de que não tinha ciência ou
de que não deixara de comunicar sem má fé, dolo, ou culpa., é do demandado, e mio do demandante.
8.CÔNJUGE MEEIRO OU COM PARTE EM ALGUM BEM COMUM. O cônjuge que não tem comunhão
matrimonial de bens, seja ou não universal, está fora da legitimação ativa para a ação de sonegação. A dúvida
surgiu no tocante ao cônjuge que tinha bens comuns com o falecido e agora os tem com os herdeiros. Mas a
solução é, diante do texto da lei, no sentido negativo. Se o cônjuge sobrevivente não é herdeiro, nem credor, falta-
lhe legitimação ativa para a ação de sonegados. legitimado, como qualquer comuneiro, às ações de vindicação e de
restituição (e.g., ação reivindicatória, ação de vindicação da posse, ações possessórias). Cf. 1.a Câmara Cível do
Tribunal de Apelação de Goiás, 26 de fevereiro de 1945 (R.G.deJ. e L., 1, 35).
4. TRIBUTOs E SONEGAÇÃO. A ocultação de bens pelos herdeiros para evitamento de paga de tributos não dá
legitimação à ação de sonegação (l.ª Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Goiás, 17 de julho de 1944, E. dos
T., 157, 805; e 23 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 24 de abril de 1945, 156, 688; contra, a 83
Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 20 de novembro de 1940, 134, 171). O que se há de entender
é que incidem as regras jurídicas fiscais de penalidade.
Se a Fazenda Pública é credora de algum herdeiro e pode executar bens do herdeiro, ou cobrar-lhe a dívida, é
credor como qualquer outro, e pode propor a ação de sonegação. Se era credora do decujo e ainda o é dos
herdeiros, pode propor a ação condenatória contra esses, ou a ação executiva. Se algum herdeiro retira da herança
bem ou bens, bastam à Fazenda Pública a alegação e prova de que o bem ou os bens são da herança, e contra eles
exercer a ação executiva. Não se há de confundir a espécie com a de sonegação pelo herdeiro (ei. 1.a Câmara
Cível do Tribunal de Apelação de Goiás, 17 de julho de 1944, E. dos 7’., 157, 805).
Se, em vida, o decujo distribuiu bem, inclusive ações, apólices ou dinheiro, não cabe à Fazenda Pública a ação de
sonegação (2.ª Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 24 de abril de 1945, E. dos 7’., 156, 688).
O impôsto de transmissão é pago pelo herdeiro. Se êsse não tem bens suficientes, conforme a partilha, e houve
sonegação de bens, pode ser proposta a ação de sonegação pelos co-herdeiros (cf. 83 Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 20 de novembro de 1940, E. dos T., 134, 171).
1.TEXTO LEGAL. Diz-se no Código Civil, art. 1.783: “Se não se restituirem os bens sonegados, por já os não ter
o sonegador em seu poder, pagará êle a importância dos valôres, que ocultou, mais as perdas e danos”.
Com o trânsito em julgado da sentença que condenou o sonegador, tem de ser restituído o que foi sonegado. Para
isso, basta o requerimento ao juiz da ação, porque há eficácia imediata executiva na sentença proferida e trânsita
em julgado. Se a restituição in natura não pode ser feita, por tê-los alienado, ou perdido, ou destruído o sonegador,
ou outrem por êle, há de ser pago o valor, mais as perdas e danos.
2. INDENIZAÇÃO. A restituição ou é in natura, ou em dinheiro. Quem, com a posse ou a tença, causou perdas e
danos, mesmo se in natura a restituição, tem de prestar perdas e danos. A regra jurídica do art. 1.783 do Código
Civil apenas foi explícita a respeito da restituição do valor, de ordinário em dinheiro. Não se trata apenas de
prestação de valor e juros de mora.
A restituIção há de ser feita ainda que a sentença tenha decidido que não houve má fé (e. g., que o herdeiro não
sabia que o bem ou os bens eram da herança). Quanto à indenização, aí, não se rege pelo art. 1.783, mas sim pelos
princípios de direito das coisas, concernentes à restituição de bens alheios. Cf. Tribunal de Justiça de Alagoas, 26
de agôsto de 1940 (OD., 65, 264).
O art. 1.784 do Código Civil de modo nenhum permite que se acuse de sonegação o inventariante que não é
herdeiro. Se não é herdeiro e omite, o caso não é regido pelos arts. 1.780- -1.784do Código Civil, mas sim pelas
regras jurídicas sôbre atos ilícitos e as de direito penal.
O efeito da sentença é de remoção, não de perda de bens, pois que, ex hijpothesi, não herdara.
2.MOMENTO INICIAL PARA A ARGUIÇÃO. O herdeiro inventariante somente se expõe à ação de sonegação
depois de se ter encerrado a descrição, com a declaração, que é pressuposto necessário do encerramento, de não
haver outros bens para inventariar. O herdeiro, que não é inventariante, ou teve ocasião de declarar que os não
possui, ou deles não há tença, ou que outrem não tem posse nem tença, ou fêz a declaração por ter havido
interpelação, ou pergunta em depoimento. Somente após a negativa é que pode ser proposta a ação de sonegados.
CAPÍTULO IV
1.PRECISÔES E DADOS HISTORIGOS. Deve-se evitar dizer que a massa, o espólio, a herança, responde pelas
dívidas e outros deveres transmissíveis. Houve a sucessão com todos os efeitos da saisina. Há a comunhão
hereditária. Comuneiros são os sucessores. Eles é que respondem. A transmissão é do patrimônio, sem que se
possa distinguir o sucessor legítimo e o sucessor testamentário, o sucessor legítimo necessário e o simples
sucessor legítimo (= não-necessário) . A responsabilidade, ôbviamente, só existe quanto ao que foi transmitido.
Pelo dever pessoalíssimo, ou legalmente intransmissível, ou intransmissível em virtude de cláusula negocial, de
modo nenhum é responsável o sucessor, ou qualquer sucessor. As objeções e as exceções transmitem-se como as
dívidas e os demais deveres.
Deve-se repelir a proposição “o herdeiro representa o decujo”. Não há representação. O herdeiro está ou os
herdeiros estão no lugar do decujo, que faleceu e, pois, nenhum direito tem mais.
A dispensabilidade da colação faz iws dispositivum o princípio do dever de colação. Para que haja dispensa, é
preciso que o valor do bem caiba na metade disponível. O que se calcula conforme o momento da doação é o valor
do bem, a respeito do qual se pró-exclui o dever de colação. Tal pré-exclusão pode estar implícita na cláusula em
que preestabeleceu a partilha ou em que deu instruções para isso (cf. EMAGNUS, fie Au.sgleiehungspfUoh,t naeh
dem RGB., 11 s.). Não só em tais casos pode bastar a implicitude (cf. JoH. FRIEDR. HUNGER, Das rúmisefle
Erbrecht, 519; EDUARD FEIN, Das Reeht der Kollation, 395 e 400).
À diferença do que ocorria no direito civil anterior ao Código Civil, não há responsabilidade ultra vires
hereditatis. Aceitar a herança não significa assumir as dívidas além do que está na massa hereditária. Não há a
antiquada continuação da pessoa do defunto; há apenas sucessão.
No direito romano, o Pretor havia criado benefício para os credores do,monte, se concorriam com os credores do
herdeiro (beneficium separationis). Isso muito antes de Justiniano.
No direito territorial prussiano, o herdeiro que aceitava a herança, sem que renunciasse o benefício de inventário,
era tido como se só a tivesse aceitado com o benefício (Preussisefles All.qemeines Landrecht, 1, 9, 413, 414, 420 e
421), razão por que só respondia pelas dívidas da herança até o limite do monte (1, 9, 422>. Havia prazo legal para
inventariar, findo o qual o herdeiro perdia o benefício (1, 9, 422). Cf. Código Civil austríaco, §§ 802 e- 803, e o
Código Civil francês, artigos 793-810.
No direito brasileiro, a feitura do inventário não mais tem a função que se lhe atribuía para a limitação da
responsabilidade do herdeiro.
No direito alemão, a solução que se deu ao problema da responsabilidade do herdeiro ou dos~herdeiros foi
desacertada e cheia de complicações. Há o princípio da responsabilidade ilimitada do herdeiro, com ensejos para
que se limite: a) com a intimação dos credores do monte (Código Civil alemão, § 1.973) b) com ordenação de
administração da herança (§ 1.975) c) com abertura do concurso de credores (§ 1.975). No direito brasileiro, o
principio da responsabilidade limitada não pode ser pré-excluído pelo decujo. Cp. Código Civil austríaco, § 803,
onde se explicita que o testador não pode privar o herdeiro do beneficio de inventário, nem vedar-lhe a confecção
de inventário.
O herdeiro somente responde pelo que lhe coube na herança. A herança dá o limite à responsabilidade, razão por
que se diz, no art. 1.796 do Código Civil, em má terminologia, que a herança “responde”. Feita e julgada a
partilha, cada um dos herdeiros responde dentro da parte que lhe coube.
No direito romano, a responsabilidade do herdeiro era ilimitada, com duas exceções: a favor dos soldados e de
quem ficou herdeiro sem querer (respectivamente, L. 22, pr., e § 15, C., de jure deliberandi et de adeunda vel
adquirenda hereditate, 6, 30, e L. 1, §§ 6 e 18, D., de separcttionibus, 42, 6).
Depois, houve a declarabilidade de adição cum beneficio inventarto.
No Código Civil, art. 1.796, não há adição com benefício de inventário (cf. APOLE BECHMANN, Die Haftung
des Benefieialerben fitr die Schulden der Erbschaft nach rõmisohem und gemeinem Reeht, 38 s.).
2. OUTRAS PRECISÕES. Se bem que se empregue “responsabilidade da herança”, “dividas da herança”, o que
em verdade se nomeia é responsabilidade de quem recebe a herança, o patrimônio, aludindo-se à separata
bonorum, à distinção dos patrimônios, distinção que só se apaga quando não há mais o monte, ou dele já saiu o
que foi a algum herdeiro. ou legatário, definitivamente. O herdeiro sucede ao decujo e é participe, se não é o
único, das dívidas da herança, isto é, das dívidas que se vão solver com o ativo da herança. As dividas ditas da
herança são dívidas dos herdeiros, ou do herdeiro, mas ainda distintas das dívidas do herdeiro, ou de cada
herdeiro.
Se somente há um herdeiro e as dívidas da herança absorvem todo o ativo, nada recebe. Se há dois ou mais
herdeiros e as dividas absorvem todo o ativo, nada recebem. Mas, se algum deles entende que deve pagar alguma
dívida ou algumas dívidas, algo resta no ativo e tem de ser partilhado.
Segundo o Código Civil, art. 1.796, responde a herança (digamos “respondem todos os herdeiros”) pelas dívidas
do falecido. Isso significa que a ação é contra os herdeiros, mas há de ser citado o inventariante, mesmo se dativo.
Diferente o que se passa noutros sistemas jurídicos, como o alemão, o que muito importa se algum herdeiro é
credor da herança (cf. RIa-lAR» HEINRICE, Der Miterbe ais Nachlass≤zWubiffer nach dem RGB., 19 s.).
Quando algum herdeiro exige que se proceda à partilha, em verdade não se trata de litisconsórcio necessarlo.
Litiscon sórcio necessário existe nas ações dos credores contra os herdeiros, contra a comunhão dos herdeiros (cf.
L. DUNCKER, Das Gesammteigenthum, 16 s., porém com a referência que ao elemento extra-romano fêz C. G.
HOMEYER, Des Sachsenspiegels zweiter TeU, II, 464). Os herdeiros não podem alienar partes de bens singulares,
pôsto que qualquer herdeiro possa alienar o quinhão ou parte do seu quinhão Nem credor de herdeiro pode
penhorar algum bem; a penhora é no rosto dos autos e atinge o quinhão do herdeiro devedor. Os credores do
decujo, que passaram a ser credores dos herdeiros (ditos “credores da herança”) não sofrem as limitações dos
credores de cada herdeiro. Os quinhões hereditários são, até certo ponto, patrimônios especiais. Tudo se passa no
plano do direito material (cf. W. KROLL, Klage und Finrede nach deutschem Recht, 184; JAKOB SMJZ,
Beitráge zur Lehre vou der Erbenhaftung vou der Naehlassteilung, 40; cp. E. WACKENFELD, Die notwendige
Streitgenossenschaft, 60; M. HACHENBURG, Die besondere Streitgenossen.SÉihaft, 97).
Oobjeto da petição de herança, da ação de herança, éuniversitos inris. Se o demandado alienou bem da herança, de
má fé, responde pelo preço da alienação, ou pelo valor do bem, conforme avaliação, ou valor do mercado, o verum
pretium, à escolha do demandante (cf. W~ FRANCKE, Exegetisch-dõgm«tischer Kommentar ilber die
Pandektentitel de hereditatis petitione, 254; F. VON SCERÓDER, Commodum hei der Erbschaf Isklage, 16, nota
3; G. A. W. DU BOI, Noch einige Bemerkungen úber actio in rem und adio in personctm, ius in re und obligatio,
Archiv fitr die civílistische Prazis, VI, 308). Não se deve deixar de pensar em que o possuidor da herança se põe
na posição de gestor de negócios alheios e que as regras jurídicas sôbre responsabilidade, em caso de negotiorum
gestio, são invocáveis (E. voN MONROY, Die voilmachílose Ausiibung fremder Vermàgensreckte, 92 s.). A
discriminação da boa fé e da má fé prende-se ao Seuatus Consultum Iuventianws (assim chamado, pelo nome de
um dos seus autores, P. JUVÊNCIO CELSO, cônsul no ano 129). Cf. HERMANN LAMMFROMM (Zur
Geschichte der Erbschaftsklage, 141 s.).
1.COMUNHÃO NO PASSIVO. Quando se diz que se condena a herança ao pagamento de divida, apenas se
alude ao estado de bens e de dívidas pro indiviso, por ainda não se haver julgado a partilha. A penhora recai, então,
em qualquer ou em quaisquer bens da herança, salvo se algum interessado alega que os outros bens bastam e o que
se ia penhorar ou se penhorou é gravado com cláusula de inalienabilidade, ou de impenhorabilidade, ou que se
trata de bem legado. Cf. 3~a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 17 de junho de 1948 (J.,
30, 406 s.>.
Todas as dívidas, ativas ou passivas, têm de ser descritas. Na descrição dos bens e das dividas tem de ser
declarada a data dos vencimentos. Tem-se de descrever o próprio crédito de que falta documento, ou não está
documentado, crédito que entra na classe dos créditos duvidosos.
2.FUNÇÃO no INVENTARIANTE. O inventariante tem de cobrar, imediatamente, as dívidas ativas (os créditos),
mesmo se o devedor for herdeiro, legatário ou testamenteiro,
290
De qualquer modo, antes e depois da partilha, não há herança que seja sujeito passivo ou sujeito ativo. Os
credores, antes e depois, são credores dos herdeiros; os devedores, devedores dos herdeiros. Apenas, com a
partilha, deixou de haver o monte, a titularidade das partes indivisas.
No direito brasileiro, o patrimônio do herdeiro não é atingível por dívidas da massa hereditária. Mas, proposta
contra êle a ação, tem de alegar a responsabilidade limitada. Idem, na ação de execução de sentença contra êle, se
a sentença não foi explícita (cf. K. SCHEFoLD, fie erbrech,tliche Haftungsbeschránkung uná der Civilprozess, 14
s.).
1. TEXTO LEGAL. No Código Civil, art. 1.796 está dito: “A herança responde pelo pagamento das dividas do
falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte, que na herança lhe
coube”. No § 1$: “Quando, antes da partilha, for requerido no inventário o pagamento de dividas constantes de
documentos revestidos de formalidades legais, constituindo prova bastante da obrigação, e houver impugnação,
que se não funde na alegação de pagamento, acompanhada de prova valiosa, o juiz mandará reservar em poder do
inventariante bens suficientes para solução do débito, sôbre os quais venha a recair oportunamente a execução”.
No § 29: “No caso figurado no parágrafo antecedente, o credor será obrigado a iniciar a ação de cobrança dentro
do prazo de 30 dias, sob pena de se tornar de nenhum efeito a providência indicada”.
No dizer-se “a herança responde” está impropriedade gritante, porque só responde pessoa, e não há personalidade
da herança, antes patrimônio do defunto. Se os bens deixados não bastam para o pagamento das dívidas, ninguém
mais deve:
porque o devedor se extinguiu, e não há transmissão de bens, ou não há transmissão de bens suficientes.
O texto do art. 1.796 do Código Civil desatende a que não há, no sistema jurídico, o que havia no direito comum, a
separação entre delação e aquisição da herança. A delação era o oferecimento da herança ao herdeiro, ou aos
herdeiros. Semente com a adição se adquiria a herança. A exceção que havia era a favor de Sul heredes, com a
automaticidade, ressalvado o beneficium abstinendi. Isso com a influência histórica do direito germânico, passou a
todos os herdeiros, no rnstema jurídico brasileiro. Daí não haver, em verdade, hereditas iaeens, a despeito do
defeito de terminologia do Código Civil. O Estado é herdeiro legítimo.
O herdeiro responde, e não podia deixar de ser assim, pelas dividas da herança. O que se lhe transmitiu foi o que
era do testador, como se passa também na sucessão legitima; portanto, o ativo menos o passivo.
2. TRANSMISSÃO LEGAL DE DIVIDA. Quem assume dívida, qualquer que seja, obra por moto próprio. Daí a
impropriedade da expressão “assunção legal de divida”. Mas a impropriedade é a mesma que se censurou à cessio
legis: quem cede também obra de moto próprio. Mais se atende, numa e noutra espécie, à eficácia do que à fonte.
A transmissão legal de dívida ou seopera pela transmissão de patrimônio a outra pessoa, ou pela transmissão de
algum direito que esteja gravado, ou sôbre o qual haja obrigação ligada ao bem, ou por força de lese specialis. Em
todos os casos, o devedor deixa de ser devedor, e outrem, que o não era, passa a dever. De regra, transmitem-se o
direito, as pretensões e as ações, porém não é de afastar-se, a priori, que só se transfira o direito, extinguindo-se as
pretensões e ações. ou só as pretensões ou as ações.
As dívidas compreendidas no patrimônio do decujo transmitem-se, ainda se há testamento em que diversamente se
disponha, aos herdeiros universais. ‘A herança”, diz o art. 1.796 do Código Civil, “responde pelo pagamento das
dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros cada qual em proporção da parte, que na
herança lhe coube”. O testador pode dizer que a dívida tal será paga com os bens tais, de modo que a herança
somente responde se os bens apontados não bastarem. De qualquer modo, no que se atribuiu ao herdeiro ou
legatário, não se pode falar de transmíssao legal.
A transmissão legal das dívidas do falecido, respeitado o art. 1.587, la parte, do Código Civil, é ins cogens.
No direito brasileiro, o patrimônio, em si, pode ser objeto de negócio jurídico, inclusive de ato de disposição. O
art. 57 do Código Civil tem alcance que lhe dá situação particular em direito comparado. Outrossim, o art. ‘714. O
direito sôbre o patrimônio é transmissível, por ato unitário, e apenas a eficácia transitiva, quanto a determinados
bens e dívidas, depende das regras jurídicas especiais. Em geral, as dívidas transferem-se, legalmente, sob a forma
de assunção cumulativa de dívidas. Desde o momento da conclusão do contrato, os credores podem exercer as
pretensões que no momento existirem, quer contra quem foi o titular, quer contra quem o é no momento (sucessor
no patrimônio). A responsabilidade do adquirente limita-se ao que lhe foi cedido, como ativo. Tal responsabilidade
é de direito cogente.
1. DESCRIÇÃO E REQUERIMENTO Não basta que as dívidas da herança sejam descritas para que se proceda
ao seu pagamento. Os credores têm de requerê-lo, para que haja a concordância dos herdeiros e dos outros
interessados no importe da herança.
Dizia JOAQUIM INÁCIO RAMALHO (Instituições orfanológicas, 288) que, se os credores não se apresentam,
embora descrítos os seus créditos no inventário, se procede à partilha dos bens como se as dívidas não existissem
Acolheu isso a 83 Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 20 de maio de 1943 (R.F., 97,
689). Mas sem razão. Há dívidas que, enquanto não forem pagas, têm juros, ou penas, além dos juros da mora, e
dívidas que, não pagas, dão ensejo a resoluções, ou resilições, ou denunciabilidade Mais ainda: há dividas em que
é do interesse dos herdeiros, por outros motivos, que se pague logo.
2.CONCURSO DE CREDORES DA HERANÇA. Não se pode dizer, como alguns (cf. Orro HACEN, Die
Haftung ftir Nachlassverbindlíchkeíten, Jherings Jahrbúcher, 42, 99), que o concurso de herança seja diferente
apenas teõricamente, e não na pratica, do concurso civil de credores em geral (certo. ERNST JÂGER, fie
Voraussetzungen eines Nachlctsskonk~tr ses, 1 s.).
Se foi aberta a falência da firma do decujo, ou outro concurso de credores, antes ou depois da morte, os créditos
referentes a inventário, funerais, tratamentos de doenças (médicos, radiologistas, medicamentos, operações,
transportes e hospitalização), são créditos com privilégio geral. Os herdeiros e os legatários são interessados no
processo concursal, pôsto que somente possam receber o que reste, depois de atendidos os credores.
4. PESSOAS FAMILIARES. No direito brasileiro, não há o chamado mês de graça, a trintena, o Dreissigste do
direito germânico, que passou ao Código Civil alemão, § 1969, alínea 1~a (a 23 refere-se aos legados).
Mas é costume, no Brasil, os herdeiros darem prazo, como se fossem proprietários locadores, para a saída das
pessoas familiares, isto é, para o uso da habitação e dos objetos da casa. Se o decujo era locatário, o que êle pagou,
ou tinha de pagar, permite que se considere devido pela herança o uso da habitação. Se o pagamento ainda não
ocorrera, há de fazê-lo o herdeiro, isto é, trata-se de dívida do decujo e, pois, da herança.
Se o bem imóvel ou os bens móveis, ou o bem imóvel ou os bens móveis foram legados, tem-se de entender que
até aí vai o costume. O prazo há de ser o que teria o locatário.
Pessoas familiares são os parentes, mesmo afins, e os que, embora estranhos, estavam na casa como se fossem
membros da família.
1. PRECISÕES. Se há legado, o legatário não responde pelas dívidas, salvo se o legado absorve toda a herança.
Se há dois ou mais legados e todo o espólio foi distribuído em legados, há o rateio entre os legatários conforme o
valor de cada legado. Dá-se o mesmo se havia herdeiros e a massa não deu para atendê-los e as dívidas têm de ser
pagas pelos legatários.
A responsabilidade dos co-herdeiros é comum. A responsabilidade dos legatários, se há, também o é, e há a
escolha, para o legatário, ou para os legatários: deixar que, quanto à herança, seja executada a dívida, ou solvê-la
para retirar o objeto legado ou os objetos legados. Aliás, também o podem fazer os herdeiros se não há outras
dívidas da herança, ou se são pagas.
Se as dívidas reduzem a herança, a ponto de não caberem na porção disponível as liberalidades, o legado é
diminuído, ou são diminuídos os legados, pôsto que possa o legatário ou possam os legatários depositar a
diferença para receber o legado.
Se o legado é de determinado bem e há legados de quotas, os legatários das quotas é que respondem pelas dívidas
da herança. Desde o momento em que se apartaram valôres para o pagamento das dividas, os legatários ficam fora
da legitimação passiva (ÁLvARO VALASCO, Decisionum Consultationum «e Rerum iudicatarum, II, 265 s.).
Assim, em princípio, o legatário não responde pelas dívidas da herança. Se responde, a responsabilidade é limitada
ao valor do legado, ao tempo em que tem de ser entregue e o é, e não ao do tempo da abertura da sucessão. O
titular do direito contra a massa está diante dessa, e não se tem de ligar ao valor do dia da morte: o valor pode ter
crescido, ou diminuído, ou permanecido tal qual era. A responsabilidade do legatário é eventual. O ter de pagar
dívidas da herança só se prende ao fato de que ao legatário apenas fica a possibilidade de conseguir o objeto
legado se a massa hereditária, coberto o passivo, tem margem ativa suficiente para que se atenda à cláusula
testamentária.
Se o legatário solve as dívidas que teriam de ser pagas pelos co-herdeiros, ou pelo herdeiro a que incumbia a
entrega do legado, tem êle direito, pretensão e ação para o reembôlso. Se, antes de pagar as dívidas, o herdeiro
presta o legado, e a massa é insuficiente para atender aos credores, há ação desse contra o legatário. Se o legado
tinha de ser com a extinção da hipoteca, ou do penhor, e o legatário solve a dívida para evitar as consequências da
execução, tem êle ação regressiva contra o herdeiro que havia de extinguir o direito real de garantia, ou contra os
co-herdeiros, se da massa havia de sair o pagamento.
2. LEGADOS E DÍVIDAS. Quanto aos legatários, o que se lhes deixou somente é atingido pelas dívidas da
herança, se a diminuição é tal que se esgotou o que foi deixado em he. rança. Aí, há a redução. O legatário não
responde, própria-mente dito; ao legatário deixou-se o que se podia deixar, e não o que se disse deixar.
Cumpre, porém, advertir-se que, se o bem legado está gravado de direito real limitado, ou são devidos impostos e
outros tributos, no momento da morte do testador, sem que o testamento a eles se refira para que se entenda
transferida a propriedade com os gravames e os tributos, da porção disponível é que se hão de retirar as quantias
para os pagamentos.
Se a porção disponível não dá para isso, o legatário recebe o bem com o que não pôde ser pago. Há, aí, redução do
legado.
Se houve execução que atingiu o bem e foi alienado, os herdeiros respondem pelo preço e pelas perdas e danos
causados ao legatário. Se o gravame foi a favor de terceiro, responde êsse; mas ao testamenteiro cabe tomar as
providências que acautelem o interesse do legatário, bem assim ao herdeiro onerado.
Legatário, em princípio, não responde por dívidas irradiadas antes da abertura da sucessão, mesmo se relativas ao
bem legado (impostos e outros tributos, foro, renda imobiliária, juros, despesas de melhoramentos feitos até a data
da morte do decujo, prestações do preço do bem legado, indenizações a vizinhos por fato anterior à abertura da
sucessão). Já ULPIANO fora assaz explícito (L. 89, § 5, D., de legatis et fideicommissis, 30) “Heres cogitur legati
praedii solvere vectigal praeteritum vel tributum vel solarium vel cloacarium vel pro aquae forma”. Ao herdeiro
cabe pagar o impôsto do prédio legado, ou o tributo, ou o tributo solário (solariutn, solário, impôsto do solar), ou
do esgôto, ou do aqueduto.
Diga-se o mesmo quanto ao legado de uso, de fruição, de usufruto, de habitação, ou qualquer outro direito real
limitado, ou realiforme.
Se o herdeiro onerado faleceu, o seu herdeiro é que responde.
O cônjuge meeiro, ou qualquer herdeiro pode pedir adjudicação dos bens que foram separados para pagamento das
dívidas, impostos e custas, mediante, o depósito das quantias necessárias para a solução das dívidas, ou a juntada
dos documentos de quitação.
Os danos causados por bens da herança, sem que já tenha passado ao herdeiro a posse imediata (e. g., danos
causados por animal, ou por arrombamento de depósito de água), têm de ser considerados ressarcíveis pelo monte,
e não pelo herdeiro. Se o herdeiro já tinha a posse imediata, então responsável é êle (JuLns BINDER, fie
Rechtsstellung des Erb eu, II, 48; Erbrecht, Enzyklopãdie der Rechts- und Staatswissenschaft, 2,a cd., 71). Se só
houve culpa do herdeiro, que não tinha a posse imediata, responsável é êle, e não a herança. Na falta de prova da
culpa do herdeiro, responde o monte, e não êle.
Se o herdeiro, gestor ou administrador, reconhece, negocialmente, haver dívida da herança, cumpre verificar-se se
tinha poderes, por lei, ou por outorga dos outros herdeiros, para o reconhecimento de dívida. Dá-se o mesmo se
entende denunciar a locação, em que era locatário o decujo; ou se denuncia a em que era locador o decujo. A falta
de denúncia, essa, impõe omissão de quem tivesse poderes, e tem como consequência a prorrogação. Por isso não
se precisa apurar quem os tinha e não cabe qualquer discussão como a que houve no direito alemão (cf.
TREODOR RIrp, Erbrecht, Lehrbuch, § 73, nota 22).
Nas despesas que hão de ser pagas pelos bens da herança estão os honorários do procurador judicial, como os
demais gastos por atos ratione muneris (Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 8 de abril de 1940, 1?. dos 7’.,
132, 708; 1?. 1’.. 84, 136; 23’ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 8 de abril de 1947, E. dos 7’.,
169, S85). Se o testamenteiro teve de outorgar poderes em juízo a advogado, os honorários são pagos pelos bens
da herança (2.a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 21 de novembro de 1938, 118, 162, e 13’
Câmara Civil, 22 de janeiro de 1945, 157, 665; mesmo se o testamenteiro é um dos herdeiros ou um dos
legatários, 43’ Câmara Civil da Côrte de Apelação de São Paulo, 12 de agôsto de 1936, 105, 595). Com razão, a
53’ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 15 de março de 1933 (86, 79), que pôs os honorários do
advogado constituído para simples representação no inventário (cf. Tribunal de Justiça de São Paulo, a 22 de
novembro de 1926, 60, 378).
3.HERANÇA E PENAS PECUNIÁRIAS. A responsabilidade por pena ou por multa por parte dos herdeiros, se a
pena ou multa foi anterior ou posterior à abertura da sucessão, apresenta alguns problemas. Um deles é o da
execução nos bens da herança.
O direito penal e o direito administrativo estabelecem penas pecuniárias e multas, mais do que os outros ramos do
direito. Porém o direito privado também as comina, ou acolhe as manifestações de vontade que as críam.
Se se trata de título executivo, extrajudicial, tudo se passa como se o decujo estivesse vivo. No tocante aos títulos
judiciais, os pressupostos também são os mesmos, quer a decisão ou sentença houvesse transitado em julgado
durante a vida do decujo, quer não. Os prazos para a irrecorribilidade são os prazos que se teriam de observar em
vida do decujo. Se tramitou em julgado a sentença ou outra decisão, nenhuma questão surge. Se não tramitou, tem
de tramitar.
Se a pena pecuniária é só pessoal (o que seria exceção criada por lei), não há o elemento patrimonial indispensável
para a executividade na herança. Não se pode reputar pessoal a pena que em verdade é patrimonial, nem se há de
acolher a corrente que tentou pôr como princípio básico a inexecutabilidade das penas pecuniárias (e. g., M.
SCHERER e PRENNER). Não se justifica, sequer, separar-se, na herança, das outras dividas a dívida pela pena
pecuniária (cf. F. OETKER, Konkursrechtliche Crundbegriff e, 1, 162). A pena pecuniária e a multa atingem o
patrimônio desde logo; antes, pois, da executabilidade (cf. PRENNER, Voltstreckung der Gelei si rajeu in deu
Nachlass, 46). O patrimônio do decujo transmite-se, ipso iure, aos herdeiros. Tem-se de liquidar o acervo, para se
saber o que foi aos herdeiros e aos legatários, e só dentro da herança há responsabilidade dos sucessores:
respondem, pelo que receberam (cf. Orro KUIILMEY, fie Haftung des Krben, 81-51; HEINRICH CLAUSSEN,
fie Haftung des Erbeu fúr die Nachlassverbindlichkeiten, 11; com alusão a exceções legais, CAEL
MÚNCHMEYER, Hajtung des Erbeu, 52 sj. Pode ocorrer o concurso de credores e tem-se de atender às regras
jurídicas especiais concernentes às dívidas ligadas a penas pecuniárias e multas (JosEr WEBER, fie Voll.streckung
vou Vermõgensstraleu in deu Nachluss, 16 s.). A cobrança da dívida que resultou da condenação é sôbre os bens,
ou algum bem, seja corpóreo, seja incorpóreo, sôbre coisas e direitos, pretensões e ações. Não se vai
executivamente contra o patrimônio do decujo, porém contra os bens que dele fazem parte, inclusive outros
patrimônios, como o da empresa que era do decujo.
Tem-se de distinguir do ato de confisco que foi anterior à abertura da sucessão, o ato de confisco posterior a ela.
No primeiro caso, o bem confiscado, como foi já não estava na herança. Havia saído. No segundo, há a aplicação
da pena depois da morte do decujo. Aliás, o art. 100 do Código Penal é de incidência antes e depois da morte, pela
objetividade da ilicitude. Diz o Código Penal, art. 100: “O juiz, embora não apurada a autoria, deve ordenar o
confisco dos instrumentos e produtos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte
ou detenção constitui ato ilícito”. O confisco é só sôbre bens, à diferença do direito romano e do direito penal
alemão, § 40 (cf. EMIL NIETHAMMER, J. vou Olshausen’s Kommentar zum Strafgesetzbuch, 113’ cd., 146 s.).
Se o bem que compõe a ilicitude permanece no acervo, mesmo se apenas mostra a possibilidade do delito, há conf
iscabilidade (O. KÕBNER, fie Einziehung, 61 sj. O que se confisca são os instrumenta e -os producta seeleris,
objeto e produtos que possam ser um dos elementos do suporto fáctico do delito, razão por que se proibem (cf. A.
E. BERNER, Lehrbuch des Deutsehen Strafreehts, 1, 113’ ed., 227; VORBERO, Die Einziehung der Werkzeuge
unei Produkte ejues Delikts, 79). A lei atribui ao juiz só ao juiz (Código Penal, art. 100) a função de confiscar,
para que êle aprecie os fatos e os objetos, e não permita entrar-se no patrimônio sem a sua decisão (C. STooSs,
Zur Natur der Vermõgensstrafen, 39) : é êle que manda, que “ordena”, como se diz no texto legal.
Não se há de dizer que o confisco apenas seja, e sempre seja, medida legal presuntiva, como já entendiam F. VON
LISZT (Lehrbueh des Deutschen Strafrechts, 93’ ed., 252), A. E. BERNER (Lehrbuch dez Deutschen Stra.frechts,
17.~ ed., 226),
O. K6BNER (fie Massregel der Einziehung, 6), M. FRTEDLÁNDER (Das objektive Verfahren naeh dem
Reichsstrctfprozessrechie, 14 s.) e outros. Há penas, dizem outros, mesmo que não se fale de quem incorreu na
falta e se cogite de processo objetivo (E. v. HOLTZENDORFF, Handbuch dez Deutsehen Siral
prozessrechts, II, 458; JOSEF KOHLER, Handbuch des deutschen Patentrechis, 575 s.). Mas a confiscação, para
outros, ou épena ou é medida policial, pelo procedimento objetivo (HUGO MEYER, Lehrbuch dez Dentschen
Strafrechts, 392; KARL BINDING, Handbuch dez Strafrechts, 1, 497; cf. VORBERG, fie Emziehun.q der
iVerkzeuge und Produkte ejues Delikts, 17). Para GRÚTER (Zur Lehre vou der Einziehung, 9), nem se trata de
pena, nem de medida policial, mas no confisco vê-se que o objeto poderia dar ensejo ao delito.
5. DESPESAS FUNERÁRIAS. Se alguma pessoa, como terceiro, faz despesas necessárias, como as de enterro,
tem direito ao ressarcimento. Se algum herdeiro o confia a alguma empresa funerária, as despesas são despesas do
monte, mas houve também assunção de divida pessoal, que pode atingir o patrimônio do herdeiro mesmo se a
quota não basta (cf. GusTAV BOEHMER, Erbfolge wnd Erbenhaftung, 119 5.; ZAI-IN, fio Haftunq aus
Rechtsgeschtif teu dez Erbeu ín Verwaltung dos Naehlctss, 6 s.).
O herdeiro, ou o testamenteiro, ou outra pessoa, mesmo estranha, que presta despesas funerárias, tem direito a que
se lhe faça o pagamento, tirando do monte o que for suficiente. Dá-se o mesmo com os sufrágios por alma, se o
testador ordenou que se pagasse com os meios da herança. Se não o estabeleceu, nenhum dos herdeiros é obrigado
a contratá-los. Algo pode ser vendido, com pressa, se não há outros meios, sem que exsurjam as questões da L. 49,
D., famiiiae erciscundee, 10, 2 (cf. OSCAR TH. 5. BINSEEL, In Fr. XLIX fam. ercise. Commentatio, 16 s. e 56
s.).
6.PAGAMENTO DE IMFÔSTO. Só após o cálculo, com a total dedução das dívidas, é que se sabe qual o
impôsto que se tem de pagar. Se houve reserva para pagamento de dívida, e não foi julgado procedente o pedido
do credor, ou dos credores, incide o impôsto sôbre o restante, como parcela do que se teria pago se reserva não
tivesse havido.
Se o decujo devia à Fazenda, tem-se de abater do acervo o importe devido, para que o impôsto sôbre o monte não
seja superior ao que tinha de ser (cf. 4ª’ Câmara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, 11 de fevereiro de
1954, R. dos T., 222, 802).
Se os bens foram doados, em adiantamento da quota legitima necessária, nem sôbre eles podem ir ações dos
credores da herança, nem execução fiscal, porque a transmissão já antes se fizera. A lei apenas exige que as
doações não sejam de todos os bens do doador, sem reserva de parte ou de renda suficiente para a subsistência do
doador, nem atinjam as quotas legítimas necessárias.
O que legalmente foi doado de modo nenhum responde pelas dividas da herança. O que pode ocorrer é a
decretação de anulação da doação por fraude contra credores (cp. 53’ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, 6 de maio de 1949, R.dosT., 180, 754).
7.BENS DOADOS E RESPONSABILIDADE POR DIVIDAS. Se houve partilha em vida, com adiantamento de
legitimas, quando o decujo era devedor, os credores se ainda não prescreveu a ação podem ir contra os herdeiros
como poderiam ter ido contra o decujo, por fraude contra credores (Código Civil, arts. 106-118), se o decujo já
era insolvente, ou se tornou insolvente com a alienação. Injusta e confusa a decisão da 13’ Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, a 7 de fevereiro de1950 (R. dos T., 185, 876) ; certa, a da 53’ Câmara Civil, a 6
de maio de 1949 (180, 754). Bens doados, inclusive como adiantamento de legitima, não ficam sujeitos a dívidas
do decujo. Bens colacionados escapam ao passivo e apenas se tem por fito, com a colação, a igualdade entre os
herdeiros. O que pode persistir é ação de anulação por fraude contra credores.
8.DESPESAS QUE TÊM DE SER PAGAS. A massa de todos os bens do decujo, com o ativo e o passivo
portanto, ainda ilíquido é o moute-mor, o monte global, o espólio. Monte liquido é o ativo. Não se deve chamar
monte partivel, porque. as dívidas também se partilham.
Se o decujo deixou cônjuge, a massa dos bens não é só herança porque há o patrimônio herdado e o patrimônio do
cônjuge. As dívidas que o decujo podia contrair, ou que o cônjuge sobrevivo podia contrair, com repercussão na
comunhão, são dividas da massa dos bens dos cônjuges, de modo que tênça de ser computadas na massa dupla.
As despesas com o funeral apanham todo o acervo hereditario (legítimo e testamentário), de modo que só após o
abatimento se calculam as legítimas necessárias. (As despesas de sufrágios por alma só obrigam os herdeiros se
ordenadas pelo testador. Podem eles acordar em que sejam feitas com dinheiro do monte.)
As dívidas por despesas com o luto do cônjuge sobrevivo e dos filhos do decujo, se moderadas, são pagas pela
massa hereditária, e não só pela parte disponível (cf. Código Civil, art. 1.599, III).
Também entram no passivo da herança os gastos com a doença de que faleceu o decujo, sem que se possa
distinguir doença ocasional ou crônica. Não importa quando foram feitas as despesas, porque a diferença entre as
dos últimos seis meses anteriores à morte e as anteriores somente concerne ao privilégio geral (Código Civil, art.
1.569, IV). Cf. 2.~ Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 11 de outubro~ de 1929 (R. de D., 69,
407). Privilégio geral só existe se as despesas foram com a doença de que faleceu o decujo; não, se relativas a
outra doença. Tem-se de alegar e provar a causalidade São despesas que se incluem no passivo da herança o que o
decujo teria de pagar de aluguer, a empregados (cozinheiras,, ou que se pagasse com os meios da herança. Se não
o estabeleceu, nenhum dos herdeiros é obrigado a contratá-los. Algo pode ser vendido, com pressa, se não há
outros meios, sem que exsurjam as questões da L. 49, III, familiae ereiseundae, 10, 2 (cf. OSCAR TH. 5.
BINSEEL, In Fr. XLIX fam. ercise. Commentatio, 16 s. e 56 s.).
3.SUFRÁGIOS POR ALMA DO FINADO. Se as despesas de sufrágio por alma do finado foram ordenadas em
testamento, são dívidas da herança, e compreendem os ofícios religiosos conforme os costumes, o anúncio pela
imprensa e pelo rádio (cf. 6.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 19 de setembro de 1952, 11. dos
T., 205, 267).
Todas as pessoas que teriam obrigação de alimentar têm-na de pagar ou contribuir para as despesas funerárias
(SAMUEL STRYK, Usus moderni Pandectarunv, L. II, Título 7, §§ 41 e 42), se não restaram bens para isso,
atendida a primariedade de tais despesas da herança.
É missão do Estado defender, em direito penal e cominaférias de direito privado, as sepulturas, contra
profanações, injúrias e roubos, regular a venda das sepulturas e punir extorsões.
O testador não pode dispor quanto às despesas funerárias além do que razoável e de costume, salvo se, a despeito
do exagêro, não atingem a quota dos herdeiros necessários.
1.APRESENTAÇÃO AO INVENTÁRIO. Os credores podem requerer a habilitação dos seus créditos para que
sejam pagos.
A separatio bonotum, de origem pretoriana, foi medida inicial a favor do herdeiro necessário contra as dívidas
ultra~ vires, e dos credores para evitar a confusão do ativo. Com a bonorum venditio, havia duas porções do preço,
a dos bens da herança e a dos bens do herdeiro. Assim, os credores daquela não vinham contra essa. Mas tudo isso
passou, com a responsabilidade ilimitada dos herdeiros, com o afastamento eventual pela aceitação com beneficio
de inventário. Depois, teve-se a responsabilidade limitada, de modo que a separação passou a ser somente
protetora dos credores.
Se o herdeiro introduziu no seu patrimônio o bem herdado, ou os bens herdados, ou o preço, os credores podem ir
contra o valor correspondente ao que foi atribuido ao herdeiro.
2.LEGITIMAÇÃO nos CREDORES. Os credores, que podem requerer a habilitação da separatio bonorum, são
quaisquer credores. O crédito há de ser certo e líquido, embora só de uma ou de algumas prestações. Pode ser
garantido com direito real limitado (hipoteca e penhor), com crédito quirografário, privilegiado, eventual,
condicional ou a termo, de fiança, ou de aval.
O próprio testamenteiro pode requerer a habilitação. Aliter, os titulares de ação de reivindicação, ou de vindicação
de posse.
De modo nenhum se há de exigir que o credor alegue e prove que há perigo na demora, ou eventual dificuldade de
adimplemento.
O requerimento de habilitação pode ser feito por um, ou dois ou mais credores, sem que tenha qualquer relevância
a divergência entre eles, ou a manifestação de qualquer deles perante o juiz.
Se o ativo é inferior ao passivo, a solução é a de se pedir a abertura do concurso de credores. Somente depois de
solvidas as dividas do decujo é que se pode ir contra os bens atribuidos ao herdeiro por suas dívidas. Se as dívidas
do decujo esgotaram os bens da herança podem atingir os legados, exceto se o herdeiro é necessário e há sobra do
que se transmitiu por força de lei.
A habilitação para a bonorum separatio nada tem com os credores dos herdeiros ou legatários. Herdeiros e
legatários só sucedem no ativo e no passivo da herança; solvidas as dívidas da herança, é que podem ir contra os
bens herdados os credores do herdeiro. Enquanto não se faz e se julga a partilha, com trânsito em julgado, pode o
credor do herdeiro obter a penhora no quanto herdado, no rosto dos autos do inventário.
O credor da herança pode requerer a discriminação do patrimônio do decujo e do patrimônio do herdeiro, quando
só há um ou quando há dois ou mais.
A habilitação dos credores em inventário independe de vencimento das dívidas ou da dívida. Haveria confusão se
se confundisse a divida com a pretensão, ou com a ação. Razão teve a 4.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação
de São Paulo, a 13 de setembro de 1939 (E. dos T., 124, 122), em reformar sentença de primeira instância, em que
se exigiu estar vencido o título.
3. PROVA DÁS DivInAs. As dívidas deixadas pelo decujo têm de ser provadas, conforme os princípios. Assaz
relevante é a regra jurídica que limita, quanto à prova exclusiva-mente testemunhal, a admissibilidade (Código
Civil, art. 141; Lei n. 1.968, de 18 de dezembro de 1952). A prova testemunhal subsidiária ou complementar é
sempre permitida (artigo141, parágrafo único). Isso não obsta a que os herdeiros, se todos capazes, e a Fazenda
concordem com o pagamento.
No inventário, processa-se, em separado, cada habilitação (cf. Avisos de 13 de agôsto de 1834 e de 9 de março de
1872; Relação de Ouro Prêto, 1.0 de março de 1878). As custas são pagas pelos credores (Relação de Minas
Gerais, 23 de março de 1904).
Se o testador disse, no testamento, dever a alguém, com a menção ao quanto, ou ao objeto, e nenhuma prova se
tem da verdade da declaração, entende-se que se trata de legado, que se põe após os outros. ~ preciso que caiba na
porção disponível, se há herdeiros necessários. Se há alguma prova, e. y., o testamenteiro devia honorários ou
preço, porque contratara serviços, oralmente, ou por escrito, ou comprara à pessoa que se apantou como credora,
há confissão de dívida, com os elementos a mais para a prova.
As dívidas a empresas comerciais podem ser provadas com a conta-corrente (5.~ Câmara Cível da Côrte de
Apelação do Distrito Federal, 23 de abril de 1931, A. J., 18, 242), sem que se afaste a possibilidade de prova
contrária.
Se a prova da dívida consta de sentença (e. g., por ter havido arbitramento, ou ação contra o decujo ou seus
herdeiros), tem de ser junta.
Se a dívida corresponde a contra-prestações sucessivas (e.g., de serviços), tem de ser feita a prova do
adimplemento, para que o juiz a aprecie. Se o juiz tem dúvida sôbre a existência da dívida, ou a validade do
documento, ou a liquidez, tem de indeferir o pedido, e remeter o credor à via ordinária, porque os elementos da
certeza e liquidez são indispensáveis.
Quanto aos créditos não vencidos, há a habilitação sem a exigência do pagamento, porque êsse só se há de fazer
após o vencimento. Excepcionalmente, é cobrável o crédito ainda não vencido se há concurso de credores, se os
bens gravados de direito real limitado forem penhorados por outro credor, ou se cessarem, ou se tornarem
insuficientes as garantias do crédito e o devedor, intimado, se negar ao reforço.
Os bens da herança são atingíveis pelos efeitos dos atos ilicitos ou dos fatos ilícitos do decujo, inclusive pelas
multas fiscais que se prendem ao tempo em que o testador vivia. Aliter, as multas de direito penal.
4.PROPORCIONALIUADI~ E MOMENTO DA DISTRIBUIÇÃO. Desde o momento da abertura da sucessão, a
responsabilidade dos herdeiros pelas dividas é conforme a proporção com as suas quotas. Tudo mais se passa, até
que se julgue a partilha, apenas formaliza a distribuição. Se algum herdeiro é credor de algum credor do decujo,
pode haver a compensação, conforme os propósitos. Se o herdeiro sofreu a compensação, além do que lhe tocava
na dívida do espólio, tem ação regressiva contra os outros herdeiros.
Os juros correm até que se paguem as dívidas vencidas. No dia em que transita em julgado a sentença de partilha,
cada herdeiro é responsável pelos juros contratuais correspondentes à sua parte, porque o credor anuiu em que se
aguardasse o julgamento da partilha. a opinião que afasta qualquer responsabilidade pelos juros moratórios porque
nau houve demanda. A divida, com os juros, pode resultar de delito, de modo que o devedor incorre em mora
desde que o perpetrou:
bem como de inadimplemento de obrigação positiva e liquida. Se não houve a mora, o simples requerimento, no
inventário, não a gera; mas isso é outro assunto, concernente à eficácia do simples requerimento, sem interpelação,
notificação ou protesto, se necessário in casu, e sem propositura de ação, com a citação.
A quota do impôsto de transmissão da propriedade a causa de morte é relativa à importância líquida de cada
herança ou do legado.
Nenhuma dívida pode ser considerada afastável se teve de ser paga (ei. 4.” Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, 11 de fevereiro de 1954, E. dos T., 222, 302).
1. HABILITAÇÃO. O credor tem de requerer a habilitação, com o título ou a justificação da divida; e são ouvidos
os interessados. Não se trata de ação declaratória típica, que faça coisa julgada, mas de medida anexa ao processo
de inventário, com efeitos de interrupção da prescrição, ou de interpelação dentro do prazo preclusivo, e de
reconhecimento da vida pelos herdeiros ou outros interessados que concordaram.
Tem-se de frisar que há dois fatos eventuais: a) concordarem todos os herdeiros e mais interessados em que se
pague a dívida; b) algum ou alguns dos herdeiros discordarem. O evento b) dá ensejo a reserva, que é ato do juiz.
2. PROCEDIMENTO. Requerida a habilitação dos credores, têm de ser ouvidos o cônjuge, os herdeiros, os
representantes de incapazes, ou, os assistentes dos incapazes e esses, e a Fazenda Pública. Só se atende aos
créditos se todos os interessados concordam. Se o único divergente é a Fazenda Pública, e o credor, ou o herdeiro
paga a dívida fiscal, de conformidade com o que alega a entidade estatal, pode ser acolhido o requerimento do
credor. Mas podem os herdeiros, em unanimidade, aguardar o momento para pagar à Fazenda Pública o que lhe
seria devido se razão tivesse para a discordância, e pagar ao credor ou aos credores que pediram a habilitação e
contra cujo crédito ou contra cujos créditos se manifestou a Fazenda Pública.
O fato de se não haver incluído alguma dívida na descrição, que se há de fazer no inventário, de modo nenhum
atinge o direito, a pretensão e a ação do credor. Se há divergência dos interessados quando têm de falar sôbre o
requerimento de habilitação, fica ao credor a margem para requerer a reserva de bens, com a propositura da ação
de cobrança, no prazo da lei (Código Civil, art. 1.796, § 2.0).
3.EFICÁCIA DA HABILITAÇÃQ~ A habilitação cobre a linha divisória entre ativo e passivo. Não há, porém,
efeito de preferencialidade: os créditos privilegiados continuam como são; os quirografários, também; idem, os
créditos com garantia real. Apenas se discrimina o que é dívida da herança e se afasta a mistura de bens que
estavam no patrimônio do herdeiro e de bens que êle herda. O herdeiro expõe-se a que atos seus sejam ilegais e
possa o credor exercer pretensão a medidas cautelares (e.g., arresto, sequestro) e à decretação de invalidade ou de
ineficácia de gravames pelo herdeiro (e. g., penhor, hipoteca).
Nenhuma eficácia tem a habilitação que altere a colocação dos créditos, conforme a lei ou o negócio jurídico.
4.VENDA DE BENS PARA PAGAMENTO Durante o inventário, se têm de ser vendidos bens imóveis para
pagamento de dívidas da herança, a venda é ato de processo de inventário, em consequência do reconhecimento
das dívidas
Se um herdeiro reconhece a dívida e depois falece, os seus sucessores não podem retirar o reconhecimento, porque
rece. bem o processo no estado em que se acha. Isso não significa que não possa ser proposta pelos sucessores
ação de nulidade ou de anulação, ou mesmo ação declaratória de inexistência do trédito, uma vez que sucederam
na legitimação ativa.
1.CONCEITO. A reserva de bens para pagamento de credor ou de credores supõe que os créditos satisfaçam os
pressupostos e não tenha havido unanimidade na manifestação dos herdeiros quanto ao pagamento
2.TEXTO LEGAL. Depois de se dizer, no Código Civil, art. 1.796, que os herdeiros (“a herança”) respondem
pelo pagamento das dívidas do decujo, estatui o art. 1.796, § li’:
~‘Quando, antes da partilha, for requerido no inventário o pagamento de dívidas constantes de documentos,
revestidos de formalidades legais, constituindo prova bastante da obrigação, e houver ímpugnação, que se não
funde na alegação de pagamento, acompanhada de prova valiosa, o juiz mandará reservar, em poder do
inventariante bens suficientes para solução do débito, sôbre os quais venha a recair oportunamente a execução”.
3.PRESSUPOSTOS DA RESERvA. Para a reserva de bens de que cogita o art. 1.796, § 1.0, do Código Civil, o
crédito há de constar de documento revestido ou de documentos revestidos de “formalidades legais” Não se exigiu
liquidez da dívida. Pode ocorrer que haja prova equivalente ao documento assinado pelo devedor, como se o caso
é de documento em que só assina o credor, como ocorre com as contas de médicos, ou de dentistas, ou de outros
serviços prestados (cf. Côrte de Apelação do Piauí, 20 de fevereiro de 1936, E. dos 2’., 109, 749). Aliter, simples
relatório do médico (cf. ~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 31 de agôsto de 1938. 13 de março
de 1941 e 6 de fevereiro de 1945, 116, 625, 139.
579, e 155, 633). Um dos pressupostos, aí, é o de saber-se qual o montante da dívida.
(A propósito das contas de médicos, de dentistas, ou de outros serviços prestados, para os quais não se exige
contrato escrito, cumpre advertir-se que os serviços hão de ser mencionados com os preços. Não basta, por
exemplo, que no papel se diga: “Serviços médicos prestados no mês de janeiro, x”. Aliter, “Serviços de consultas
nos dias 1, 2 e 3 de janeiro, i9’. Não se trata de pagamento, mas sim de reserva.)
Se algum herdeiro é obrigado a colação e o que tem de colacionar absorve a quota., ou quase a absorve, e está
insolvente, os credores da herança têm todo o interesse em que haja a reserva de bens para o pagamento.
As provas das dívidas são quaisquer, respeitados os princípios sôbre prova de dividas. As cartas missivas são
documentos particulares, que podem provar (cf, 2ª Câmara Cível da Côrte de Apelação de São Paulo, 18 de março
de 1936, R.dos 2’., 104, 186).
4.BENS E RESERVA. Se houve reserva para pagamento, o credor pode admitir que lhe seja adjudicado algum
bem, ou. lhe sejam adjudicados alguns bens. Não são obrigados à adjudicação Os bens, que não sejam dinheiro,
têm de ser postos em hasta pública, para que se façam os pagamentos.
A reserva há de ser, preferentemente, de dinheiro. Na falta de dinheiro, ou de insuficiência, é que se reservam bens
móveis, ou imóveis, conforme o interesse da operação para os herdeiros Não há trato especial para a Fazenda
Pública.
5. COBRANÇA E RESERVA. A despeito de ter requerido a habilitação e de ter sido deferido o requerimento
pode o credor propor a ação de cobrança, ou qualquer outra que caiba, inclusive a ação declaratória Não há lide;
portanto, não se poderia falar de litispendência, nem, pois, de prevenção de jurisdição. Cf. Relação da Côrte, 9 de
dezembro de 1873; Relação de Minas Gerais, 24 de fevereiro de 1880, 18 e 23 de junho de 1906.
Se ao credor que requere a habilitação se indefere o requerimento, não obstante o crédito constar de documentos,
revestidos de formalidades legais, que constituem prova bastante da dívida, sem que se tenha alegado já estar
paga, deve o juiz mandar reservar, em poder do inventariante, bens suficientes para a solução, bens sôbre os quais
venha recair ou possa recair a eventual execução forçada.
lima vez que há os elementos probatórios suficientes e se não alegou estar solvida a dívida, há o direito à reserva.
Outras alegações como a de ser anulável o negócio jurídico, ou a de estar prescrita a pretensão ou a ação, ou
mesmo estar precluso algum prazo, não pré-exclui a determinação judicial da reserva, O juiz não julga, exceto
para saber se há de haver reserva, ou se não há de haver.
Se a dívida ainda não estava vencida, nem se venceu no interregno, de ordinário o juiz não faz a reserva; mas a
proximidade do vencimento pode tornar aconselhável a reservação.
Mas, se somente sentença, em ação adequada, poderia fazer certa e líquida a dívida, é de denegar-se a reserva. A
sentença, a que nos referimos, há de ter passado em julgado.
Não há reserva depois de feita a partilha (2.~ Câmara da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 4 de agôsto de
1926; Câmaras ReUnidas, 28 de janeiro de 1927 e A. 1., II, 71).1?. de D., 68, 190,
O inventário, em que se há de fazer a reserva, é o do decujo devedor, e não aquele em que o devedor é herdeiro ou
legatario ou cessionário
Quanto à dívida prescrita, se houve concordância de todos os herdeiros, pode ser feita a habilitação e paga a
dívida. Se houve discordância, o juiz não deve fazer a reserva. Se o credor pleiteia contra os herdeiros aquele que
não se opuser à exceção de prescrição tem de satisfazer. Se houve a concordância e se partilhou a dívida, a
exceção de prescrição foi posta de lado no momento em que os titulares concordaram.
6. PRAZO PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO. Há prazo, de trinta dias, para que o credor proponha a ação. O
prazo é contado da data do despacho que determinou a reserva (2.ª Câmara Cível da Côrte de Apelação do Distrito
Federal 25 de janeiro de 1927), razão por que, se, excepcionalmente, o juiz a admitiu antes do vencimento, se tem
de entender que fixou outro prazo que não perturbe o procedimento do inventário e da partilha.
Lê-se no art. 1.796, § 2.0, do Código Civil: “No caso figurado no parágrafo anterior”, isto é, no § 1.0, que trata da
reserva, “o credor será obrigado a iniciar a ação de cobrança dentro no prazo de trinta dias, sob pena de se tornar
de nenhum efeito a providência tomada”. Não há “obrigação”; o termo “obrigado” foi impróprio. O credor, em
caso de reserva, tem o prazo de trinta dias para a propositura da ação. Automaticamente, expirado o prazo, deixa
de haver reserva.
A ação pode ser proposta após a expiração do prazo. antes ou depois da sentença de partilha.
O prazo de trinta dias conta-se da data em que o juiz faz a reserva dos bens para o pagamento da dívida. Mas
temos de advertir que a dívida pode estar vencida, ou ainda não estar vencida. No primeiro caso, o requerimento
de habilitação interrompe a prescrição, porque se há de considerar o que explicitamente se estatui no Código
Civil, art. 172, III, a propósito da interrupção de prescrição “pela apresentação do titulo de crédito em juízo de
inventário, ou em concurso de credores”. No segundo caso, o credor não pode cobrar a dívida, porque não se
venceu, e faltam, assim, a pretensão e a ação.
Temos de interpretar o art. 1.796, § 2.0, como se dissesse:
se foi deferido o requerimento de reserva, o credor tem de propor a ação de cobrança no prazo de trinta dias, a
contar do dia em que se fêz a reserva, em se tratando de dívidas vencidas naquele dia, ou úntes; ou a contar da data
do vencimento, se vencida ainda não estava.
Na luta entre julgados que iam à própria negação da reserva se não vencido o titulo (e. g., 5•a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 17 de maio de 1933, R. dos T., 88, 393) e os que permitem o requerimento de
reserva, com o prazo a contar do vencimento (5.~ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 19 de
dezembro de 1934, 94, 592; 4•a Câmara Civil, 13 de setembro de 1939, 124, 122), tem-se de atender ao que
sustentamos desde antes e expusemos acima. Observe-se, porém, que ao último acórdão citado, que em parte
estaria certo, há vacilações.
7. EFICÁCIA DA RESERVA. Nenhum efeito tem a reserva no tocante a direito sôbre os bens reservados. Não os
pode alienar, nem dar em garantia, o credor. Na praça, pode êle fazer lance; se não há arrematante, pode pedir a
adjudicação. Os herdeiros e demais interessados podem concordar com a adjudicação sem a hasta pública, salvo se
algum herdeiro é incapaz (cf. Aviso de 7 de julho de 1770; Relação de São Paulo, 26 de maio de 1892).
Se o herdeiro está sob pátrio poder, há de haver para o titular do pátrio poder autorização judicial (Código Civil,
artigo 386). Se sob tutela, a hasta pública é indispensável (artigo 429) se o bem é imóvel; mais a autorização
judicial, o que também se exige se móvel o bem (art. 427, VI). Idem, em se tratando de incapaz sob curatela (art.
453).
8. CESSAÇÃO DA RESERVA. Não atendido o credor, e feita a reserva, tem êle o prazo de trinta dias para dar
início à ação. Se o não faz, cessa a reserva. A força maior pode dilatar o prazo, em casos como o de moratória
legal a favor do devedor (2.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 6 de junho de 1940, 1?. dos T.,
133, 123).
9.IRRECORRIBILIDADE. O credor que requere habilitação não tem legitimação para qualquer recurso. Tem de
propor a ação adequada. Aliter, o credor que requere discriminação, e não na obtém. Por aí se vê como é diferente
a situação do legitimado ao requerimento de habilitação e a do legitimado ao requerimento de discriminação:
aquele fica dependente da concordância; êsse pode exigir que se discriminem os patrimônios. Quanto à reserva, o
juiz tem de mandar que. se reserve, se os pressupostos para isso foram satisfeitos.
10. AçÃo DOS CREDORES. Após o trânsito em julgado da sentença de partilha, a ação dos credores sómente
pode ser contra os sucessores, e não mais contra eles, como comuneiros no monte-mor, salvo se a dívida não foi
descrita e distribuída. Mesmo se não houve a tradição da posse imediata dos bens aos sucessores, isso não permite
que no processo de inventário e partilha credores se habilitem. Errada foi a solução que deu o Supremo Tribunal
Federal, no Agravo de Petição n. 11.085, do Rio Grande do Sul, de que DIMAS RODRICUES DE ALMEIDA
(Repertório de Jurisprudência do Código Civil, Direito das Sucessões, II, 737 s.) transcreveu parte do voto
vencedor.
TrAnsita em julgado a sentença que decidiu quanto à partilha, os credores têm ação contra os herdeiros a que
foram distribuídos os bens da herança. Se algum herdeiro cai em insolvência, o credor, cujo crédito foi pôsto na
quota do herdeiro, sofre as consequências. Dai a vantagem da separação dos patrimônios, com a reserva, e da
discriminação, no que evita qualquer confusão.
O credor não pode propor ação de cobrança somente contra o testamenteiro, nem contra o inventariante. A ação é
contra os herdeiros, com a citação daqueles, se é necessário, ou aconselhável pelas circunstâncias. Se o testador
deu ao testamenteiro, ou ao inventariante, o encargo de pagamento de determinada dívida, ou de determinadas
dívidas, a ação de cobrança é contra o testamenteiro, ou contra o inventariante, e contra os herdeiros, porque a
dívida é do monte.
A ação do credor de modo nenhum depende da partilha, nem, sequer, da descrição dos bens. Se houve reserva de
bens para pagamento, o prazo para a propositura da ação apenas concerne à reserva: se não foi proposta a ação,
cessa a reserva. Se propõe, depois, a ação, os bens atingidos são quaisquer, atendida, apenas, a distribuição feita
em partilha, ou, se não a houve, a legitimação passiva de todos os herdeiros.
Se contra o decujo já havia proposta a ação de algum credor, no processo têm de habilitar-se os herdeiros e outros
interessados. Dá-se o mesmo se foi o decujo que propusera a ação como devedor. Se já se havia proferido a
sentença, favorável ou desfavorável, contra o decujo, contra os herdeiros pode ir a ação de execução, ou outra que
daquela se origine.
O pagamento das dívidas supõe, de regra, que tenham sido descritas, que existam, estejam vencidas, tenha havido
requerimento do credor, ou dos credores e os herdeiros hajam concordado, bem como os outros interessados,
inclusive curadores de incapazes.
1~ aconselhável, se credores não se apresentaram, a despeito de terem sido descritas as dívidas, não se distribuir o
passivo; mas isso depende da concordância dos herdeiros, mesmo se algum credor ou alguns credores não se
apresentaram. Desde que há credores, descritos, ou não, os seus creditos, a despeito de ter faltado, ou não,
habilitação, a ação do credor é contra os sucessores, em proporção (cf. 3!- Câmara Cível do Tribunal de Apelação
do Rio Grande do Sul, 20 de maio de 1948, 1?. F., 97, 689).
Um dos inconvenientes de se não partilhar o passivo é o de ir a Fazenda Pública contra os herdeiros ou legatários
para pagamento de impôsto ou de tributo ou taxa, pelo valor do ativo sem haver dedução. Há todo interesse em
que se liquide o monte, a fim de cada sucessor pagar o que é justo que pague.
1. PRECISÕES. Os credores da herança podem exigir que se discrimine do patrimônio do decujo o que é
patrimônio do herdeiro, para que credores do herdeiro não executem nem exerçam pretensão a medidas cautelares
contra os bens da herança sem estarem pagas as dívidas da herança. Não se trata. aí, da habilitação para a reserva,
mas apenas de discriminação, o que supõe que aleguem e provem ser herdeiros da herança. Para isso, só se há de
apurar a certeza do crédito, porque os créditos ainda sem liquidez permitem o requerimento de discriminação.
Advirta-se que o Código Civil, art. 1.799, por sugestão de ANDRADE FIGUEIRA, legitimou a êsse requerimento
os legatários.
Antes da partilha, os credores exercem a pretensão à cobrança contra os herdeiros, de modo que são os bens da
herança que têm de suportar a execução ou as medidas cautelares. A reserva separa, não partilha. A discriminação
designa, sem separar; a fortiori, sem partilhar.
3.LEGITIMAÇÃO DOS LEGATÁRIOS. No Código Civil, art. 1.799, estatui-se: “Os legatários e credores da
herança podem exigir que do patrimônio do falecido se discrimine o do herdeiro e, em concurso com os credores
deste, ser-lhes-ão preferidos no pagamento”. A fonte foi o revogado Código
Civil italiano, art. 1.032. Hoje, o Código Civil italiano (1942), art. 490, 2!’ alínea, 3), supõe a aceitação da herança
com benefício de inventário, e diz: “i creditori dell’eredità e i legatari hanno preferenza sul patrimonio ereditario
di fronte ai creditori dell’erede” E logo a seguir: “Essi perô non sono díspensati daí domandare la separazione dei
beni, secondo le disposizioni deI capo seguente, se vogliono conservare questa preferenza anche nel caso che
l’erede decada daí beneficio d’inventario o vi rinunzi”.
A expressão “preferenza”, como “preferidos”, que está no art. 1.799 do Código Civil, é imprópria. A medida
discriminatoria, como a medida de reserva, nenhuma preferência atribui. Apenas a discriminação, como a reserva,
evita que haja invasão do patrimônio hereditário pelos credores do patrimônio do herdeiro ou dos patrimônios dos
herdeiros.
O herdeiro fideicomissário e o herdeiro fiduciário não são legitimados a requerer a discriminação. São-no o
legatário fideicomissário e o legatário fiduciário.
2. EXCLUSÃO DA AÇÃO REGRESSIVA. Se houve partilha amigável e algum herdeiro se obrigou a pagar as
dívidas, de seu bôlso, não há ação regressiva. Idem, se os herdeiros distribuíram entre si as dívidas da herança,
proporcionalmente aos seus quinhões, ou não.
4. DÍVIDAS D’O HERDEIRO. De modo nenhum vão a colação as dívidas dos herdeiros necessários. Dívida de
herdeiro necessário é dívida como a de qualquer estranho. O princípio •da partilha é geral. Há o art. 1.800 do
Código Civil, que diz: “Se o herdeiro for devedor ao espólio, sua dívida será partilhada igualmente entre todos,
salvo se a maioria consentir que o débito seja imputado inteiramente no quinhão do devedor”. Não importa a
vontade do herdeiro devedor, se a maioria deliberara incluir a dívida no quinhão do devedor (2.~ Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de São Paulo, 24 de maio de 1949, E. dos T., 181, 708). Se só dois são os herdeiros e o devedor
está insolvente, é justo que se inclua no seu quinhão a dívida.
Se a dívida do herdeiro é ao patrimônio comum que se extingue com a abertura da sucessão, partilha-se a dívida
entre o cônjuge sobrevivente e o herdeiro ou os herdeiros, proporcionalmente. Para que a metade só se incluísse
no quinhão do herdeiro devedor, seria preciso que a maioria dos herdeiros concordasse (cf. 4!’ Câmara Civil do
Tribunal de Apelação de São Paulo, 18 de fevereiro de 1943, fl. dos T., 143, 189; 4•~ Câmara Civil da Côrte de
Apelação de São Paulo, 23 de setembro de 1936, 107, 160, que frisou ser sem relevancia se o herdeiro é casado
sob o regime da comunhão de bens, ou se o não é). Advirta-se que, se o herdeiro deve ao monte sem comunidade
da dívida, e o que herda passa ao cônjuge, por haver a comunhão de bens, é sem relevância a situação: quem herda
é o devedor; o cônjuge adquire a metade do que o devedor herdou. Se quem herda é um dos cônjuges, sem haver
comunhão de bens, e a dívida é dos dois cônjuges, tem-se de verificar quanto deve cada um: o cônjuge que não é
herdeiro tem de pagar o que lhe toca; a dívida do outro, que é herdeiro, é que pode ser imputada na herança, ou
partilhada pelos herdeiros.
As dívidas dos herdeiros de modo nenhum vão à colação. Os descendentes têm de conferir as doações e os dotes,
ou os seus valôres. As dívidas, essas, partilham-se entre os herdeiros; salvo se a maioria dos herdeiros consentir
em que o débito seja imputação ao quinhão do devedor (Código Civil, art. 1.800; já assim, antes; cf. 3!’ Câmara
Cível da Côrte de Apelação do Distrito Federal, 20 de dezembro de 1926; 4!’ Câmara Civil do Tribunal de
Apelação de São Paulo, 23 de setembro de 1936, 1?. dos 7’., 107, 160). A deliberação pela maioria pode ser
contrária à vontade do devedor (2!’ Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 24 de maio de 1949, 1?.
dos 7’., 181, ‘7438). Se os outros herdeiros entendem que o herdeiro devedor é insolvente o que lhes cabe é
imputar, por maioria, ao quinhão do devedor o que êle deve; Porém, sem a maioria, tal solução é contra a lei (sem
razão, a 4.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 26 de julho de 1945, Ldosq’. 158, 227).
Se a dívida está prescrita e há impugnação do devedor, máxime se foram os interessados remetidos às vias
ordinárias, não pode a maioria deliberar a imputação ao quinhão do devedor, nem, sequer, partilhá-la (3.~ Câmara
Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 11 de julho de 1945, 1?. dos 7’., 158, 211).
Na interpretação do art. 1.800 do Código Civil, o que se há de exigir para a imputação, é a deliberação da maioria,
da qual pode não fazer parte o devedor (sem razão, a 4!’ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 18
de fevereiro de 1943, 1?. dos 7’., 143, 189, que falou de “proposta do devedor e acôrdo dos interessados”).
Quanto ao herdeiro que é casado com regime da comunhão de bens, tem-se de saber se houve comunicação da
dívida (se é do herdeiro e do cônjuge, mesmo se a assunção foi somente por um dos cônjuges).
Se a dívida do herdeiro era ao falecido e ao cônjuge meeiro, ou há partilha entre o cônjuge meeiro e o herdeiro ou
os herdeiros, ou a maioria dos herdeiros delibera que se impute no quinhão do herdeiro devedor a metade
(ambígua a decisão da 4!’ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo,, a 18 de fevereiro de 1943, 1?. dos
7’., 143, 189, que parece ter permitido que a parte do cônjuge sobrevivo seja imputada no quinhão do devedor).
CAPÍTULO V
1. PRECISÕES. Lê-se no Código Civil, ad. 1.801, que, “julgada a partilha, fica o direito de cada um dos
herdeiros circunscritos aos bens do seu quinhão”. Existe, porém, partilha que não é julgada por sentença, o que se
passa com a partilha amigável feita em escritura pública. O direito de cada um dos herdeiros é circunscrito aos
bens do seu quinhão, desde que se inicia a eficácia da partilha, qualquer que seja.
2.EvIcçÃo DE BEM OU DE BENS DO QUINHÃO. A partilha atribui aos herdeiros o que se pôs nos seus
quinhões. A universalidade está extinta. Partilhou-se o monte hereditino. Diz o ad. 1.802 do Código Civil: “Os co-
herdeiros são reciproca.mente obrigados a indenizar-se, no caso de evicção, dos bens aquinhoados”.
Se algum bem pôsto em quinhão de herdeiro é tomado por evicção, há a obrigação recíproca dos co-herdeiros
quanto à indenização. Houve a retirada, e o herdeiro, em cujo quinhão, ou os herdeiros, em cujos quinhões se
inserira o bem, sofreriam com a ofensa ao principio da igualdade, ou ao do respeito às disposições testamentárias.
Todos os co-herdeiros têm de sofrer a perda. O valor da indenização é o que foi dado, na avaliação, que serviu à
partilha, ao bem evicto.
A ação é pessoal e somente prescreve no prazo ordinário, que é de vinte anos, contados da data da evicção.
Há um ponto que é preciso esclarecer-se. Se bem que tenha havido a partilha e o bem esteja no patrimônio do
herdeiro, e não mais no patrimônio comum, a situação jurídica em que se põe o herdeiro demandado em ação de
evicção, é oriunda do tempo em que havia ou o patrimônio do decujo ou o dos co-herdeiros. Há o interesse dos
outros herdeiros em que se faça a defesa, porque a eles a sentença vai atingir. Há litisconsórcio necessário e têm de
ser citados todos aqueles contra os quais, em caso de sentença favorável ao autor, iria a ação regressiva.
Uma das consequências é ter o co-herdeiro que pode sofrer a evicção de chamar os outros à ação que contra êle foi
proposta. Aí, é fácil ficar provado que nenhuma culpa teve êle e que a perda do bem se originou de causa anterior
à partilha. Não é de afastar-se a hipótese de algum dos herdeiros (e. g., o que estava mais em contacto com o
decujo, nos negócios jurídicos de aquisição) ter dados mais valiosos para a defesa do co-herdeiro na ação de
evicção. Talvez dois ou mais possam concorrer para a decisão pela improcedência, total ou parcial, da demanda.
Com a indenização, o quinhão fica igual aos dos outros herdeiros. Não se transfere propriedade de bem ou de
bens, mas apenas se presta em dinheiro o que foi retirado ao quinhão. Nem se há de pensar em nova partilha. O
valor é o do momento em que se avaliaram os bens da herança e a que se referiu a partilha.
Mas há outro ponto que se tem de pôr em relêvo. Além da restituição do bem evicto, pode ter havido condenação a
indenização. O importe é dividido por todos, respeitada a proporção.
4.PRÉ-EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE. Pode ter havido conhecimento do que se passava com o bem
ou com os bens expostos a evicção. Daí poder ser feita convenção com que se pré-exclua a responsabilidade dos
outros herdeiros. Aquele herdeiro, ou aqueles herdeiros, em cujo quinhão se incluem os bens suscetiveis de
evicção, assumem o risco. Não importa se, com essa assunção, receberam o bem ou os bens com valor menor do
que aquele que seria se não houvesse a probabilidade de dano (Código Civil, art. 1.803, 13 parte: “Cessa esta
obrigação mútua, havendo convenção em contrário”).
Se a evicção ocorreu por culpa do evicto, ou por fato posterior à partilha, não há pensar-se em responsabilidade
para a indenização. Evicção não teria havido sem o ato ou a omissão do herdeiro, ou dos herdeiros que a sofreram.
Dá-se o mesmo se o fato gerador da evicção foi posterior à partilha (Código Civil, art. 1.802, 23 parte: “. . .e bem
assim dando-se a evicção por culpa do evicto, ou por fato posterior à partilha”).
5. PERDA OU DESVALORIZAÇÃO DE CAUSA ANTERIOR À PARTILHA. No Código Civil brasileiro; não
há regra jurídica especial concernente à perda ou desvalorização, de causa anterior à partilha, ignorada pelos co-
herdeiros, ou pelo co-herdeiro a que tocou o bem. Só se referiu à evicção. O que pode ocorrer é que haja vício, que
o herdeiro ignorou, e algum ou alguns tenham procedido de má fé; porém não se há de estender a regra jurídica
sôbre evicção, uma vez que não se incluiu a referência que outros Códigos Civis fazem. Se o outro co-herdeiro, ou
os co-herdeiros, ou algum ou alguns co-herdeiros procederam de má fé, ou foram culpados na escolha do bem
pelo herdeiro que sofreu o dano, houve ato ilícito, e cabe a ação contra os culpados ou culpado.
No tocante a vícios redibitórios do bem que se pôs no quinhão do co-herdeiro, pode ocorrer que com êle se haja
pago ao co-herdeiro o que êle prestara em solução de dívida da herança. Ai, tem êle ação de redibição ou de
abatimento do preço, porque houve a relação jurídica de contrato comutativo.
1.DivisÃo. Até que transite em julgado a sentença de partilha, há a comunidade hereditária, a universalidade; cada
um dos herdeiros é titular de parte indivisa. Por isso, os credores de um dos herdeiros somente pode pedir a
penhora no rosto dos autos do inventário, para que recaia sôbre o que tocará ao herdeiro. Com a partilha, o que
era direito sôbre parte indivisa passa a ser sôbre parte divisa e, com o trânsito em julgado da sentença, a divisão,
para os efeitos da penhora, é automática.
É erro dizer-se que a partilha só tem efeito declarativo, ou mesmo preponderantemente declarativo Certamente,
declarou-se o direito de cada herdeiro; mais: a partilha constituiu, pois tornou diferente o objeto do direito; o que
era parte abstrata, pela indivisão, se fêz parte concreta, parte divisa.
(Mais uma vez frisemos que a eficácia preponderante é, de regra, executiva. Temos apenas de atender a questões
que surgem na lide e se inserem nas soluções dadas pela sentença.)
Se algum herdeiro entende vender bem ou bens compreendidos na herança, bem ou bens que êle crê que lhe
venham a tocar, vende sob condição, ou assume os riscos de não ir ao seu quinhão o bem vendido, ou de não irem
ao seu quinhão os bens vendidos. Se o bem vendido foi ao quinhão do herdeiro, ou os bens vendidos foram ao
quinhão do herdeiro, somente há ação real contra o herdeiro se houve compra-e-venda e acôrdo de transmissão da
propriedade e da posse. Fora daí, a ação é sempre pessoal, é a ação de condenação. Não houve transmissão da
propriedade. Se tivesse havido (compra-e-venda, mais acôrdo de transmissão da propriedade e da posse), teria sido
condicional: à data da partilha que colocou o bem ou colocou os bens no quinhão do herdeiro vendedor e
transmitente, dá-se a transmissão. O que pode haver é compra-e-venda, com transmissão da propriedade e da
posse da parte indivisa, com resolução se o bem ou os bens não passarem à parte divisa. Aí, tudo é diferente.
1. RECUSA DE ENTREGA. Se o inventariante ou co-herdeiro recusa a entrega dos bens ao herdeiro, ou a alguns
herdeiros, ou aos herdeiros, cabe simples requerimento de entrega. Com a sentença de partilha, trânsita em
Julgado, pode o herdeiro tomar a posse imediata, ou a posse mediata intercalar (e. g., a de locador do bem) ; se há
óbice, cabe a execução (cf. ~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 18 de julho de 1940, 1?. dos
T.., 130, 126).
1. PRELIMINARES. A partilha é ato que supõe resolvidas todas as questões concernentes aos direitos dos
herdeiros, dos legatários e de quaisquer outros beneficiados. Algumas são extremamente delicadas. Damos aqui
alguns exemplos. O assunto das colações, de que já tratamos, é um dos mais relevantes. Dele já cogitamos no
Tomo LV, §§ 5.683-5.643; mas, aqui, temos de frisar alguns pontos.
A deliberação da partilha judicial é comunicação de decisão do juiz, envolvendo, porém, resolução de questões,
despachos e requerimentos dos interessados (comunicações de vontade das partes), e resoluções declarativas
quanto às pretensões hereditárias e aos quinhões dos herdeiros, a pretensões e pagamento dos legados e às
pretensões dos encargos (pretensões modais). Vê-se bem quanto é compósito o ato judicial. 1 J. C. PEREIRA E
SOUSA (Primeiras Linhas sôbre o Processo Civil, IV, 78) chamava à deliberação “determinação da partilha”.
Expressão feliz, que evitava o sentido próprio de “deliberar”, que ai é um tanto destoante.
2.COLAÇÃO E PROBLEMAS QUE SURGEM. A colação espontânea deve dar-se antes das avaliações. Se o
herdeiro colaciona, ou se, em vez dele, o inventariante procede ao relacionamento dos bens ou valôres, tais bens
têm de ser avaliados, antes do termo final do inventário. Colação é a execução do dever de dar a inventário o que
se recebeu, a titulo gratuito, do decujo,durante a vida desse. Na evolução do instituto, encontram-se reflexos do
sistema gera] de patrimônio familial e de herança. A forma mais antiga concernia aos emancipados que recebiam
bens. No período imperial, o pensamento já é diferente: a igualização apanha os descendentes (EDUARO FEIN,
lias Recht der Coilatiou, 284 s., que ainda é a obra mais importante sôbre a colação). O que renunciava a herança
nem era obrigado a conferir, nem podia pretender colação. O direito de vir a herdar e o dever de colacionar
transmitiam-se juntos (D. BURKARD WILHELM LEIST, em CHR. FR. VON GLÚCK, Ausflihrliche
Erliiuterung der Pandecten, 87-38, III, 402). Seja como for, o fundamento psicológico da colação está na
tendência da ordem material e do espírito à simetria, conforme temos mostrado em todos os nossos livros. Os
próprios textos romanos aludem à ao quitas. O principio presidiu à coliatio emancipati, à colíatio bonorum e à
coltatio dotis. A segunda não apareceu cedo, pôsto que o jurisconsulto CASSIUS já a conhecesse (era crista). A
colíatio dotis é de origem pretoriana, assaz sutil ao tempo do direito de família sob que se criou. Posteriormente,
operou-se a igualização dos herdeiros por direito pretoriano e por direito civil; e Justiniano incluiu os herdeiros
testamentários. São essas linhas inflexíveis as únicas leis de sociologia verdadeiramente científica.
Discutiu-se modernamente a natureza da colação. Pensou-se a) em obrigação da herança, em relação ao falecido,
em vez de obrigação entre co-herdeiros, e o Projeto de Código Civil alemão (§ 2.117) ia caindo em tal erro.
LUTJWIG SCHIFFNER (Pflichtteil, Erbenausgleichung und die sonstigen gesetzlichen Vermãchtnisse, 115)
recorreu b) à idéia de legado legal, como se fosse possível pensar-se em ter-se de igualar por força de legado. Não
se confunda a questão da natureza jurídica da colação com a questão do seu fundamento histórico ou sociológico.
Ésse é a lei de simetria, o princípio irrefreável de igualização. Aquela, com que tentaram resolver as construções
acima referidas, só diz respeito à caracterização da relação jurídica. Em verdade, a colação apenas é o) modalidade
de partilha (assim, OTTO BÀHR, Zum Erbrecht des bflrgerlichen Gesetzbuchs, Archiv filr Bilrgerliohes Recht,
III, 219), como bem se colocou no Código Civil brasileiro. Não se trata de colação real, mas de colação ideal: o
que se leva à colação não se faz parte material, e sim parte em valor. Tanto assim que, se os herdeiros, levando os
bens ou os seus valôres à colação, nada têm a receber da herança, são herdeiros que já receberam. (E é verdade
que existe o art. 1.790 do Código Civil, regra jurídica que tem o seu quê de revelador.)
A pretensão a que alguém traga bem, ou valor, à colação não é relação de direito das obrigações; seria imprópria
qualquer ação de condenação, ou executiva, ou de mandamento, mas cabe a ação declaratória (Orno
WARNEYER, Kommentar, II, 1102). Infringindo o dever, então, sim, é de pensar-se na ação constitutiva do art.
1.782 do Código Civil. Além dessa ação constitutiva, na ação de inventário e partilha, como incidente, o dever de
colacionar impõe aos herdeiros, que estão no caso dos arts. 1.786-1.794 do Código Civil, a conferência; e os
outros herdeiros podem, em virtude da sua pretensão a que aqueles colacionem, requerer que o juiz ordene a
colação pelo inventariante O Código de Processo Civil, art. 488, § 1/’, veio subordinar, não êsse requerimento,
mas o ato espontâneo do inventariante, à aquiescência da “maioria dos interessados presentes”. A existência da
anuência só se refere à execução do dever de colacionar, por ato alheio ao herdeiro, conforme a inovação do art.
488, § 13’, verbis “sê-lo-ão, pelo inventariante”. Não se derrogou o Código Civil. Tudo se passa no plano do
direito processual. Têcnicamente, é execucão por outrem que o obrigado, criada em lei. Uma vez que a lei
arquitetou essa execução por outrem, convém fixar-lhe a natureza. O inventariante não é bem um terceiro:
representa a herança. A lei faz elemento integrante da colação, em tal caso, a anuência da maioria, o que reforça o
argumento contra se entender que o inventariante obre como sendo representante-executor (Erfiillungsvertretor)
do herdeiro ausente. Nenhum ato autorizativo partiu desse. Nem, ainda, se há de pensar em relação de origem
convencional (à semelhança daqueles negócios ditos “acreditivos”, que surgiram no comércio em grosso, depois
da guerra mundial), ainda que se baseasse em gestão de negócio, ou mandato tácito. Não é a regra Solvendo quis
que pro alio licel invito a ignorante liberat cum que está em causa (Código Civil, art. 930, parágrafo único). É a
representação da herança (Código de Processo Civil, art. 85), com efeitos de liberação do devedor (ausente, não
culpado de sonegação). Na relação jurídica interna, o inventariante pratica o que se chama “intervenção” de direito
material, razão por que pode reclamar do herdeiro ausente o que despender com a colação (Código Civil, art.
1.840). Uma das consequências da inovação do Código de Processo Civil, art. 488, § l.~, é a de cobrir-se a
responsabilidade do ausente, ainda que estivesse de má fé, na medida em que a, colação se operou. Se faltou
alguma parte dos bens e havia má fé, o ausente está exposto à ação de sonegados (Código Civil, arts. 1.780, 1.782
e 1.788). A inovação confirma a concepção da colação como modalidade aa partilha.
a) O que se tem por fito com as colações é a igualização das legítimas necessárias dos descendentes. Sem elas,
poderiam as doações e os adiantamentos de legítima aos herdeiros necessários, descendentes, frustrar a igualdade
dos quinhões necessários. O que se colaciona é qualquer liberalidade, inclusive o que o decujo pagou por divida
do herdeiro necessário, descendente, ou como fiador, ou por outro vínculo obrigacional ou de direito das coisas. O
decujo não pode pré-excluir o dever de colacionar, com ofensa à porção necessária, nem é preciso que o haja
previsto (cf. 8,a Câmara do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, 4 de janeiro de 1944, R.F., 98, 871). Com
&colação, aumenta a massa da herança, porém sem que aumente a porção disponível. A chamada “dispensa de
colação” (Código Civil, art. 1.788), que só se refere a dotes e doações, e não a adiantamentos de legítima, nem a
partilhas em vida sem a transmissão, supõe que o excesso caiba na porção disponível. Advirta-se, porém, que a
colação não aumenta a porção disponível.
Com a partilha em vida, com ou sem a transferência imediata dos direitos, ficam subordinados os herdeiros à
colação, porque se tem de atender ao principio de igualdade das legítimas dos descendentes, O decujo não quis
partilhar a porção disponível, nem parte dela. O que êle quis foi partilhar a porção necessária. Aí está a razão por
que a colação não pode aumentar a metade disponível.
Se em testamento o decujo partilhou bens como componentes da porção necessária dos descendentes, ou os
partilhou ou a favor deles apontou de tal maneira que se haja de entender que partilhou a porção necessária, ou
distribuiu os bens como quinhões hereditários, tem-se de interpretar, na dúvida que os descendentes ficam sujeitos
à colação. No Código Civil brasileiro, não há tal regra jurídica explícita, mas é de acres-sentar-se que resulta do
que se conceituou como colação. Tem-na o Código Civil alemão, § 2.052. Para afastar que assim se decida, tem o
testador de referir-se à porção necessária e a. porção disponível, ou afastar, em cláusula testamentária, o dever de
colação.
Enquanto, no art. 1.785, o Código Civil conceituou a colação como relativa às legítimas necessárias, o art. 1.786
limitou o dever de colacionar aos herdeiros necessários descendentes. Daí a interpretação que se dá aos arts. 1.785
e 1.786 para que não se choquem: o segundo atinge o primeiro.
Lê-se no Código Civil, art. 1.786, que os descendentes, que concorrerem à sucessão do ascendente comum, são
obrigados a conferir as doações e os dotes, que dele em vida receberam. A regra jurídica limita o dever, de origem
legal, aos descendentes herdeiros necessários; porém isso não proibe, que o decujo insira a cláusula de colação, ao
dotar, ou doar, ou de qualquer modo fizer liberalidade a ascendente, ou ascendentes, ou parentes colaterais,
herdeiros legítimos, ou mesmo pessoas estranhas às legítimas. Assim, torna êle colacionável o que era
incolacionável (e. g., doou a C, seu afilhado, e fêz colacionável a doação por ter no testamento instituído herdeiro
testamentário o donatário).
Tem de ser colacionado o que o decujo doou ou deu em dote a alguém, que depois foi julgado, em ação de
reçonhecimento, filho do decujo, ou o decujo reconheceu a filiação, ou alguém que foi reconhecido, judicialmente
ou voluntàriamente, filho de algum descendente do decujo. Bem assim quem o decujo, depois da liberalidade,
adotou.
Se o decujo beneficiou, em vida, algum descendente, e esse faleceu, ou por outra causa não pode suceder, tem de
colacionar o descendente do beneficiado, que o representa na sucessão. Não importa se o bem ou os bens que
foram objeto da liberalidade se acham na herança que o descendente beneficiado deixou, ou se o representado
nada herdou do ascendente falecido, por outra causa, ou fora da sucessão. O representante somente herda o que o
representado herdaria. Se há dois ou mais representantes somente herdam o que o representa.
b) Os descendentes do deserdado não ficam excluídos da sucessão. A deserdação afasta a ezi.sténeia do herdeiro.
Razão tinha, evidentemente, GEORG FROMMHOLD (tiber das gesetzliche Erbrecht der Abkõmmlinge des
Enterbten, Archiv fiir Búrgerliches Ilecht, 12, 305 5.; THEOIIoR Rípp, Das Erbrecht, G.PLANCK, Lehrbuch
des Biirgerlichen R.echts, ~ BA Parte, 30; sem razão, ERNST HEYMANN, Crundziige des gesetzlichen
Verwandten-E’rbrechts, 53). Na deserdação não há exclusão, mas pré-exclusão; de modo que os descendentes do
deserdado existem, sem se porem no lugar do deserdado: herdam conforme o grau, porque o deserdado nunca foi
herdeiro, nem premorreu. O renunciante da herança, tem de colacionar.
Se um herdeiro legítimo é excluído da sucessão, ou renuncia a herança, a herança transmite-se como se tal
excluído ou renunciante não existisse. Não se há de falar, aí, de acrescimento, erro em que muitos juristas
incorreram. Dá-se o mesmo se o nascituro nasce morto (cp., para o direito romano, GEOLIO Ramo, Delatiou der
Erbschaft im Faile ciner Todtgeburt, 29 5.; ENCELBERT RIDDER, Kinfluss von llelation und Acquisition auf
das Accreszenzrecht der Intestaterben, 10 s.).
Se o testador instituiu herdeiro ou legatário algum nascituro, e êsse nasce morto slepois da abertura da sucessão,
ou antes, a deixa foi ineficaz. Se morreu antes do testador um dos co-herdeiros, ou um dos co-legatários, sendo
conjunta a deixa, há o acrescimento, caso assaz diferente da deixa ao nascituro que nasceu morto, antes ou depois
da abertura da sucessão.
c) Com a descrição e o inventário dos bens, por vêzes éindispensável a individuação materialmente feita, e. g.,
com sinais, além das medidas de guarda (cf. RARL WILHELM ROCKEROLS, fie Naehlassbehandlung, 42 s.).
O possuidor da herança não pode escapar, perante o herdeiro, às ações relativas aos bens singulares, e a
individuação dos bens muito concorre para o êxito do demandante (cf. KAaL MARTIN, Die Grundzúge der
Erbschaftsklage nach dem BGB., 74 s.).
d) Se o testador dispôs do que não era seu ao tempo da feitura do testamento, mas à abertura da sucessão o havia
adquirido, há eficácia da disposição testamentária. Idem se o terceiro atribuiu poderes para o ato do testador, ou
veio a atribui-los (cf. ERwIN BATHE, fie Foígen der Testamentsanfechtung, 20). A data do testamento é de grande
relevância para se saber se o testador tinha como seu o bem, ou se tinha por fito adquiri-lo (e. g., remetera carta ao
dono, para pré-contrato, ou para a aquisição definitiva), sem que se haja de afastar a hipótese de falta de data (cf.
WILHELM GÓSSLER, Zur Lehre von der Datierung des eigenhtindigen Testaments, 13 s.).
e) Se a cláusula testamentária estabeleceu que haverá acrescimento dos quinhões dos fiduciários falecidos aos
fiduciários sobreviventes, ainda não se deu, com a morte daqueles, a transmissão aos fideicomissários (cf. 4•a
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 28 de maio de 1948, R. dos T., 175, 205). Mas é preciso que
tenha havido os pressupostos para o acrescimento, principalmente terem sido chamados conjuntamente à herança,
em quinhões não determinados.
3.POSTERIOR DESCOBRIMENTO DO BEM COLACIONAvEL. Pode ocorrer que somente após a partilha se
haja descoberto que havia bem sujeito a colação. A ação contra o herdeiro éproponível enquanto não prescreve a
ação de petição da herança.
A regra jurídica incide mesmo se em vida houve liberalidade a favor de herdeiro necessário, descendente, incluída
na porção disponível.
Se o ascendente fêz liberalidade ao descendente, dizendo que saía da metade disponível (e nela cabia), mas,
depois, lhe adiantou legítima necessária, perguntou-se se o excesso (isto é, o que diminuiria a metade disponível
ao tempo da morte) é regido pelo princípio da inaumentabilidade da porção disponível. Respondeu-se
negativamente, mas, a sorte das liberalidades que nada têm com as legitimas necessárias é uma, conforme o direito
das obrigações; e a das legítimas necessárias e da porção disponível ao tempo da morte é outra. O princípio incide
se há colação. Aliás, o que, a respeito das liberalidades, que foram regidas pelo direito das obrigações, pode ter
ocorrido, é a nulidade,
Convém frisar-se que o principio é de profundeza e de relevância, que se há de estimar na apreciação do nível do
sistema jurídico.
O herdeiro pode dispor da sua quota, antes ou depois que outro colacione, e há de haver interpretação. Se todos
dispuseram do patrimônio herdado, só a discriminação do contetido pode afastar a inclusão.- Aí, há litisconsórcio
necessário (cf. 1<. II. SCHWAB, Die Voraussetzungen der notwendigen Streitgenossenschaft, Festschrift
FRTEDRICH LENT, 271 s.; ARwED ELOMEYER, Einzelanspruch und gemeinschaftlicher Anspruch von
Miterben und Miteigentuni, Archiv fiir die civilistisehe Praz is, 159, 386 s.).
CAPÍTULO VI
1.TEXTO LEGAL. Lê-se no Código Civil, art. 1.805: “A partilha, uma vez feita e julgada, só é anulável pelos
vícios e defeitos que invalidam, em geral, os atos jurídicos (art. 178, § 6.0, n. V)”. No art. 178, § 6.~, V, diz-se, a
propósito da prescrição, que prescreve em um ano: “A ação de nulidade da partilha; contado o prazo da data em
que a sentença de partilha passou em julgado”. Errada terminologia, porque, no artigo 1.805, se faia de ser
“anulável”, em vez de se dizer ser “inválida”, isto é, nula ou anulável, e no art. 178, § 6.% V, de “ação de nulidade
de partilha”, em vez de “ação de anulação de partilha”. Ora, a ação de nulidade da partilha é imprescindível (Tomo
VI, §§ 678. 12, 707, 4, e 717, 1); a ação de anulabilidade é que prescreve.
2.DIFERENÇA ENTRE AS PARTILHAS. Há diferença inafastável entre a invalidade da partilha amigável, feita
em escritura pública, e as outras partilhas (judicial ou homologada), como há entre essas. Se houve julgamento, ou
por se tratar de partilha judicial (nela, judicialmente se partilha), ou por ter sido homologada a partilha amigável
(nela, judicialmente se homologou a partilha amigável), tem-se de propor a acão de invalidade da sentença,
mesmo quando se tenha de apreciar o que concerne à partilha amigável como ato jurídico. Houve coisa julgada e
só se propõe a ação de invalidade (de nulidade ou de anulação), ou a ação rescisória, que, essa, sempre só é
concernente à sentença. Por exemplo: se houve erro, de modo que se omitiu, por involuntária falta, algum
herdeiro, há de ser proposta a ação de anulação por Outro, ação que se refere à partilha, talvez amigável, mas, de
qualquer maneira, coberta pelo ato judicial (cf. 2~a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, 12 de abril de
1949, Paraná J., 50, 46; 1.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 28 de agôsto de 1941, R. E.,
90, 450).
1. PRECISÕES. O primeiro cuidado, quanto se trata de verificação da validade da partilha, tem de ser no tocante
à existência da partilha (e. g., é inexistente a partilha que não consta dos autos e à qual se refere a sentença), à
nulidade, ou à rescindibilidade. Admitido que existe, tem-se de saber se não é nula, ou se o é. Depois, se não é
nula, tem-se de saber se é anulável.
A partilha é inválida, como ato jurídico de direito privado, nos mesmos casos em que o é qualquer negócio
jurídico. A sentença de partilha é nula, ou rescindível, nos mesmos casos em que o são as outras sentenças. À
anulabilidade refere-se o artigo 1.805 do Código Civil, que diz: “A partilha, uma vez feita e julgada, só é anulável
por vícios e defeitos que invalidam, em geral, os atos jurídicos (art. 178, § 6.0, V) “. A prescrição é de um ano, à
diferença do que se passa com outros atos jurídicos (art. 178, § 99, V).
Se o processo de inventário e partilha correu contra o louco, que foi citado, nula foi a citação e nula é a sentença.
Se, ao transitar em julgado a sentença, ainda era louco o citado, nenhuma sanação ocorreu. Ê nula, e não só
rescindível a sentença. A respeito, escrevemos nos Comentários ao Código de Processo Civil (II, 487 s.) : “A
citação é necessária à angularidade; não à relação jurídica processual, que pode ser em linha singela. Se a relação
jurídica processual tinha de ser angular, e não foi, a angularidade não se formou, mas é inegável que o juiz se
obrigou à prestação jurisdicional e, proferindo a sentença, cumpriu o prometido. Sentença há. O réu, que foi
condenado sem ter sido parte, pode alegar a inexistêneia da relação em ângulo quanto a Me, e, pois, a nulidade da
sentença quanto a êle. O art. 1.010, J, lª parte, do Código de Processo Civil, tem tal nulidade como ipso iure, uma
vez que o processo correu à revelia, isto é, não se sanou a nulidade. Porque a tem como tal, dispensa-lhe a rescisão
(arts. 798-801). No sistema do Código de Processo Civil, que corresponde às convicções científicas, a relação
jurídica processual pode constituir-se entre autor e juiz, sós. A relação jurídica entre o autor já morto ao despachar-
se a petição e o juiz é inexistente;
a relação jurídica entre o juiz e o réu não-citado pode ser existente vias é nula (art. 1.010, 1). Os argumentos acima
aduzidos quanto à falta de citação valem para os casos de nulidade, e com mais forte razão. Citação existiu, e é
nula. Não se sanou a nulidade da citação, nem, portanto, a sentença é escorreita; de modo que o legislador tinha de
escolher entre a) fazer depender de rescisão o pronunciamento do juiz sôbre o vício e b) permitir o
pronunciamento de plano, sem a ação de rescisão. Optou por 6), exigindo, porém, que se observe, quando se tratar
de execução de sentença, o rito dos arts. 1.008, 1.009, 1.010, 1, e 1.~16”.
Se não foi dado curador ao louco, o próprio juiz, diante da prova de que estava louco, durante o processo, o
herdeiro, pode decretar a nulidade da partilha, porque a sentença, iii tasu, é nula. O juiz somente não tem mais
cognição se da sentença já foram intimados os herdeiros, inclusive o louco, devido à devolução da cognição à
instância superior, onde a apreciação da nulidade se faz no julgamento do recurso.
O direito brasileiro repeliu a teoria dos intervalos lúcidos.
Quem é louco, ou é louco ou não é. A loucura continua ou cessa; não há louco a que se admita capacidade em
intervalos lúcidos, nem pessoas capazes que sejam incapazes em inter-valos de loucura. Por outro lado, a
interdição não faz louco quem o não é, nem é preciso que se interdite o louco para que êle se torne incapaz. Se a
sentença foi proferida, no processo de partilha, dando-se por citado, inicialmente, e ouvido, durante o processo, o
louco, tal sentença é nula, e não corre contra o titular da pretensão constitutiva negativa por nulidade o prazo da
ação rescisória, nem, tão-pouco, o de prescrição da ação de anulação•da partilha, a que se refere o art. 1.805 do
Código Civil. As ações de nulidade das sentenças são imprescritíveis.
2. INCAPACIDADE. A anulabilidade por incapacidade somente concerne à incapacidade relativa. A lei exige a
partilha judicial, mas pode ocorrer que tenha faltado assistente ao relativamente incapaz, ou que tenha êle
manifestado concordância com a partilha judicial sem se dizer que era incapaz. Outra questão que surge: se a
partilha foi amigável, ;há anulação por infração da regra jurídica sôbre capacidade, ou há nulidade porque não
podia ter essa forma?
No art. 1.774 do Código Civil, estatui-se que a partilha será sempre judicial se algum dos figurantes é incapaz
(“menor, ou incapaz”). Se algum o era, e foi feita partilha amigável, ou se o relativamente incapaz, que figura na
partilha judicial, não foi assistido conforme a lei, há anulabilidade e nulidade da partilha amigável, ou
rescindibilidade da sentença de partilha judicial. Se absolutamente incapaz, há nulidade por falta de representação,
mesmo se judicial a partilha.
A respeito das anulabilidades por incapacidade, diante da regra jurídica que diz ser de um ano a prescrição,
contado o prazo da data em que a sentença transitou em julgado, pretendeu-se levantar a questão de ser injusta a
lei para os menores e as outras pessoas relativamente incapazes. Mas esses incapazes têm de ser vàlidamente
intimados para que a sentença passe em julgado,> bem assim os seus assistentes.
3.COAÇÃO. A anulabilidade por violência ou coação pode resultar de coação exercida contra algum herdeiro, ou
alguns herdeiros, ou mesmo contra todos os herdeiros, que fizeram partilha amigável, quer por escritura pública,
quer por termo nos autos, quer por escrito particular, homologada pelo juiz. Mesmo na partilha judicial pode ter
havido coação, inclusive de juiz ou de funcionário da Justiça, e nasce a ação de anulação por violência.
4. Se na partilha foi considerado partilhável algum bem que não mais era dos herdeiros, ou do cônjuge meeiro e
dos herdeiros ou herdeiro, ou alguma parte não no era, e houve erro, pode qualquer dos figurantes pedir a
decretação da anulação. A sentença de partilha não atribui propriedade a quem não a tem: partilha-se o que se tem.
Por isso, se se faz o registo, para efeitos contra terceiros, a qualquer interessado toca a legitimação ativa para a
retificação. Aliás, a lei de registo faz exigências relativas a datas dos títulos e da apresentação e supõe dúvidas por
parte do oficial público. Cf. 2•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de fevereiro de 1954 (1?.
dos T., 223, 308).
absurdo pensar-se em meter-se na classe dos erros invalidantes, dos erros causa de anulabilidade, o error ivris, o
erro de direito (sôbre isso, espaçadamente, Tomo IV, § 430, 9). Quando, por exemplo, a 5•a Câmara Cível da Côrte
de Apelação do Distrito Federal, a 20 de novembro de 1931 (A. 3%. 22, 45), disse serem herdeiros necessários os
irmãos, cometeu erro grave, que daria ensejo a recursos, inclusive ao recurso extraordinário, ou a ação rescisória
de sentença, porém de modo nenhum se justificaria a ação de anulação de partilha, como, erradamente, queria
CARLO.S MAxIMILIANO (Direito das Sucessões, III, 455).
O erro pode consistir em figurar na partilha pessoa que não tinha direito, ou em se ter considerado herdeiro o
legatário, ou vice-versa, ou ter-se partilhado bem que não era nem é da herança. Aliás, em tais casos, pode ter
havido dolo.
Se o testador estava em erro quanto ao conteúdo da declaração de vontade, ou não lho teria dado se conhecesse a
situação que existia, há a ação de anulabilidade da disposição, ou da cláusula, por ter errado. Dá-se o mesmo se
contava com ocorrência que de modo nenhum existiu, ou de modo nenhum veio a existir.
Mas aí a ação é contra a interpretação do testamento, de modo que se vai contra a cláusula testamentária, contra a
declaração unilateral de vontade, em que se revela a anulabilidade por erro. O erro foi do testador. Nada há, aí,
quanto à partilha, pôsto que, com a coisa julgada da sentença de anulação, se possa exercer a ação de anulabilidade
da partilha. O prazo prescripcional somente pode ser contado para essa ação, da data da res indicata da sentença
que anulou a cláusula testamentária.
A 4~a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 28 de novembro de 1945 (R. dos T., 161, 677),
entendeu que, confessando todos os herdeiros o erro da partilha e feita a retificação, pode o juiz homologá-la, por
equivaler o pedido a ação declaratória, embora não formalizada com os requisitas da ação. A retificação, a que a
4~a Câmara Civil se referiu, de modo nenhum seria equiparável, com a homologação, à ação declaratória, pois
seria absurdo que se considere retificar, que é modificar, declaração. Tratar-se-ia, apenas, de negócio jurídico
posterior à sentença de partilha, para o qual a homologação seria para eficácia desejada pelos herdeiros.
5. DoLo. O dolo pode ter consistido em operações para diminuir o que tocaria ao quinhão de algum herdeiro, ou
de alguns herdeiros, ou de todos os herdeiros, como a compra a alto preço, fictício ou injustificável, de bem que
fora legado com indicação específica (não, para diminuir o valor do monte, porque não está em exame a partilha,
a despeito de o incluírem erradamente, alguns juristas franceses e brasileiros), ou colocar-se no quinhão a o que se
estava deteriorando e no quinhão b o que estava em bom estado (teria de ser partilhado com igualdade).
7. AÇÃO DE ANULAÇÃO. A ação de anulação tem de ser proposta contra todos que foram figurantes da
partilha, mesmo se algum ou alguns nada têm com a coação, o erro ou o dolo. Para terceiros, a partilha é res inter
alios acta. Se algum bem ou alguns bens de terceiros foram incluídos, sem que houvesse requerimento ou ação do
terceiro, a coisa julgada da partilha apenas é entre os figurantes; e o terceiro continua com o direito, a pretensão e
a ação de reivindicação, ou de posse, bem como às medidas concernentes aos registos.
A propósito da invalidade das partilhas, é de todo interesse exprobrar-se o erro imperdoável do emprêgo da
expressão “rescisão”, que aparece em muitos julgados, confundindo-se ação de rescisão de sentença de partilha,
ação de nulidade da partilha e ação de invalidade (e. g., 3•a Câmara Civil da Côrte de Apelação de São Paulo, 5 de
junho de 1936, 1?. dos IX, 103, 148).
A ação de sonegados não pode ser cumulada à de anulaçáo da partilha (2.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de
São Paulo, 11 de novembro de 1949, 1?. dos T., 184, 70).
8.PRESCRIÇÃO DE AÇÕES DE INVALIDADE. No mesmo sentido da solução que demos, apesar do erro de
terminologia do art. 178, § 6.0, V, do Código Civil (Tratado dos Testamentos, 1, 223-226, eno Tomo LVI, § 5.688,
3), está, explícito, no Código Civil italiano (1942), art. 624: “La disposizione Testamentária puô essere impugnata
da chiunque vi abbia interesse quando é l’effetto di errore, di violenza o di dolo. L’errore sul motivo, sia esso di
fatto o di diritto, é causa di annullamento della disposizione Testamentária, quando il motivo risulta dai testamento
ed é ii solo che ha determinato ii testatore a dispore”. Tal o que está na 1•a alínea e na 2•a• Na g~a, acrescenta-se:
“L’azione si prescrive in cinque anni daí giorno in cui si é avuta notizia della violenza, dei dolo o dell’errore”.
No direito brasileiro não há a anulação por érro de direito. O que pode ocorrer é que se componha pressuposto
para a ação rescisória de sentença.
Um dos problemas que surgem é o da cognição pelo legitimado ativo antes da abertura da sucessão. Seria absurdo
lógico que o prazo da prescrição corra antes da morte do decujo (SALvATORE PUGLIATTI, Dell’Istituzione di
erede e dei legatti, Codice Civile, 49), razão por que se há de considerar iniciado o prazo prescripcional, em tal
caso, na data da abertura da sucessão (cf. ANTONIO flor, Le Successioni, 388).
No texto italiano, fala-se de “si é avuta notizia”, o que levou a crer-se que se trata de locução impessoal. De modo
nenhum se haveria de admitir tal interpretação. Ao legitimado ativo é que importa a. notícia. A notícia, que êle
teve, é que determina o comêço do prazo para a propositura da ação. Por outro lado, repila-se que baste o
conhecimento do conteúdo do testamento. O legitimado ativo pode conhecer o testamento e ainda não saber se
houve dolo, erro ou violência, como pode saber disso sem conhecer o ato testamentário (ou só o conhecer em
parte). Além disso, um ou outro fato pode ser anterior ou simultâneo ou posterior à abertura da sucessão.
No direito italiano, discute-se se a regra jurídica sôbre prescrição atinge as invalidades por defeito de forma (cf.
qualquer regra jurídica especial. A inobservância de princípios de direito internacional privado podem dar ensejo à
rescindibilidade. Porém as infrações de regras jurídicas processuais são as causas mais frequentes. Demos alguns
exemplos, que se referem a lei pessoal estrangeira.
2.REGRA JURÍDICA DE FORMA DA PARTILHA. Se a forma da partilha tinha de ser a judicial e foi a da
amigável, há infração pela sentença, e cabe a ação rescisória.
4. REGRAS JURÍDICAS SÔBRE Á PARTILHA. Deve-se aquinhoar a todos no bom e no mau, regra que
MANUEL ÁLVARES PÉGAS consignava e a jurisprudência repetiu (Côrte de Apelação do Distrito Federal, 7 de
junho e 22 de outubro de 1895, 019., 72, 196; 18 de maio de 1928, E. de 19., 89, 591). Se todos impugnaram a
dívida, ou se reserva bem para pagá-la, ou (Côrte de Apelação do Distrito Federal, 7 de dezembro de 1899, O D.,
83, 450; Tribunal da Relação de Minas Gerais, 27 de setembro de 1926, E. F., 48, 163) se partilha por todos os
herdeiros, como se faria ao objeto que todos não quisessem. Só se deixa de dividir materialmente o bem se é
indivisível ou não admite divisão cômoda (Côrte de Apelação do Distrito Federal, 31 de julho de 1917, E. de 19.,
46, 884; Tribunal de Justiça de São Paulo, 20 de abril de 1926, E. dos T., 58, 170). A partilha, que não observou o
princípio do Código de Processo Civil do art. 505, 1, não é nula, mas rescindível (sem razão, o Tribunal de
Apelação de Santa Catarina, a 18 de maio de 1944, J., 1944, 236) a sentença, por violação de lei, ou anulévet
(Código Civil, art. 1.805).
Mas seria errôneo tomar esses dizeres como regras jurídicas abstratas. Todos os acórdãos e trechos de doutrina
aludiam ao caso em julgamento, às circunstâncias. Assim é que a reposição serve a igualar, se é da conveniência
do herdeiro receber o bem de mais alto preço (Tribunal de Justiça de São Paulo, 8 de agôsto de 1894). O dar de
tudo parte aos herdeiros redundaria, muitas vêzes, em incomodidade para todos os herdeiros (Tribunal da Relação
de Minas Gerais, 15 de janeiro e 16 de março de 1921) a comunhão continuaria, e é de evitar-se (Côrte de
Apelação do Distrito Federal, 7 de junho e 22 de outubro de 1895). Demais, se algum interessado tem benfeitorias,
óbvio é que se lhe assine o bem (Tribunal de Justiça de São Paulo, 28 de maio de 1918, 1?. dos 2’., 26, 211). A
antiga Côrte de Apelação do Distrito Federal frisou que a composição dos quinhões deve ser feita com os bens que
forem mais proveitosos aos herdeiros, atendendo-se à idade, profissão, ou ocupação (19 de novembro e 6 de
dezembro de 1921, 1?. de 19., 63, 531). Pelas circunstâncias é que o juiz há de saber se essa ou aquela dívida ativa
há de ser partilhada entre os herdeiros, ou entre alguns somente (Tribunal de Justiça de São Paulo, 20 de julho de
1915, 1?. deR, 14, 316). A eqúidade não obsta, antes aconselha, a que se atribua a parte do bem ao herdeiro que já
tem a outra, ou outras (Tribunal de Justiça de Pernambuco, 16 de junho de 1981,~ R. de J. de P., 1, 467), tal como
se evitaria a comunhão, máxime se entre pessoas notôriamente desavindas (Tribunal da Relação de Minas Gerais,
15 de janeiro de 1921 e 8 de maio de 1925, 1?. F., 35, 565; 64, 591; Côrte de Apelação do Distrito Federal, 8 de
maio de 1933, A. J., 29, 47; Pará, 28 de abril de 1917). Aos incapazes devem ser assinados, de preferência, bens de
raiz (Tribunal de Justiça de São Paulo, 6 de julho de 1934, A. J., 31, 407). Sôbre a comunhão, a regra é a de ser
evitada, se não a querem os interessados (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 12 de março de 1926, 1?. da 1?.,
2, 26). A equidade, ou igualdade, no art. 505, está, portanto, no sentido, explícito no art. 114, de eqUidade, que
atende às circunstâncias. Não é um “como tivesse” fosse legislador o juiz; nem, sequer, um “como se” fosse o
decujo. O fundamento do Código de Processo Civil, art. 505, é a asseguração da5 legitimas, e não a presunção da
vontade do falecido; tanto que, ainda se o pai, ou mãe, deixou partilha feita, essa pode ser posta de lado no que
infringe as regras da sucessão necessária. Outro fundamento, secundário, é o da relatividade dos direitos e das
pretensões, razão por que também se recomenda ao juíZo que parta o acervo no sentido de evitar lutas futuras e
incomodidades dos herdeiros.
A igualdade recomendada não se ofende se se atribui à meeira, que vive de alugueres, o prédio alugado, sem
prejuízo para os outros interessados (Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará, 6 de março de 1950, cf. 1a
Turma do Supremo Tribunal Federal, 12 de novembro de 1951), ou bem imóvel ao incapaz (Tribunal de Justiça do
Ceará, 10 de dezembro de 1952, J. e L, VIII, 248).
A igualdade “maior possível” a que se refere a lei é a igualdade que não prejudicaria a algum dos herdeiros; é
igualdade que sirva, e não que dessirva; é igualdade que atende às circunstâncias e aos bens do monte, e não
igualdade cega; é a igualdade que respeita as regras que recomendam não se fragmentar demasiado a propriedade,
nem se darem dois bens em comum a dois herdeiros, se melhor seria dar um a um herdeiro e o outro a 0utro.
Velha regra juridica, a do art. 505, TI, do Código de Processo Civil, e reafirmada pela jurisprudência (e.g.,
Superior Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de maio de 1903, G. J., 32, 84). O juiz tem de examinar o caso, com
certa imaginação, para prevenir os choques. O atribuir a um herdeiro todo o prédio evita rixas e discórdias, como
advertia JOSÊ PEREIRA DE CARVALHO (Primeiras linhas sobre o Processo orfanológico, 1, 100), que
acrescentava servirem ao mesmo fim o precisarem-se as confrontações, dos prédios e o referirem-se com exatidão
as servidões.
O conceito de comodidade é vasto. Mas o juiz tem de restringir-se à realidade, ~O caso concreto, em suas
circunstâncias. Os exemplos clássicos são os que trouxe DIOoo GUERREIRO CAMA-0110 DE ABOIM (De
Divisionibus eI Partitionibus in octo Libros distributus, in que tornos divisus, Livro II, Capítulo 14, n. 21, VI,
Capítulo 13, n. 27, 31) : o de atribuir-se o prédio, ou parte dele, ao que tem prédio contíguo; o de atribuir-se ao
dono do prédio serviente o prédio dominante; o de partilhar-se de tal forma que todos tenham água, ou de assinar-
se o predio que a tem ao dono do prédio que não a tem; o de atribuírem-se ao cônjuge sobrevivente os bens com
que entrou para o casal.
Se o bem não oferece divisão cômoda, não se deve partilhar a dois ou mais interessados: ou cabe no quinhão de
um deles (o que é recomendável, 2.” Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 3 de maio de 1948, R.
F., 129, 502), ou algum deles pede a adjudicação e se lhe adjudica, ou há pluralidade de pedidos e se provê à
licitação, ou se vende na forma do Código de Processo Civil, arts. 704-706.
Pertenças não se devem afastar do bem a que se ligaram (1.” Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 28
de novembro de 1948, 11. dos 2’., 178, 836).
A lei não se referiu à sorte, que a doutrina anterior admitia, para se determinar a quem caberiam os quinhões,
prática assaz velha (que passou mais tarde ao Código Civil francês, art. 834). FRANcIscO DE CALDAS incluiu-a
no direito e depois, em 1832, se readotou em Portugal. Só se admite isso, entre nós, se todos os herdeiros forem
capazes e o requererem; tratar-se-ia de processo para determinar, escolhido por acôrdo das partes. O juiz, só por si,
ou por simples sugestão não unânime, está adstrito ao princípio de igualdade. Mas atendidas as circunstâncias
A respeito de comunhão, já a jurisprudência, no intuito de afastar o entendimento da regra de igualdade como
regra de necessàriamente se inserirem todos os herdeiros em cada bem, profligara as comunhões, salvo se a
queriam os interessados. E é êsse o ponto principal: pois a partilha não “divide” necessâriamente (divisão no bem
ou entre bens) ; nem discrimina (“partilha”), necessâriamente, em cada bem. Não tem sempre o efeito da communi
dividendo; nem o da divisão no valor (venda) ; nem o de dividir materialmente bens; e às vêzes só o de simples
transformação da comunhão hereditária em comunhão entre vivos.
A execução, que a ação de partilha tem por fito, depende do interesse das partes e da atuação do juiz, velando
pelos incapazes e pela integridade das legítimas. Por isso mesmo, só se evitará dividir as terras em partes ideais,
isto é, só se evitará dividir as terras em partes ideais, isto é, só se evitará a comunhão de terras do monte, quando
isso não for da conveniência dos herdeiros, ou dos herdeiros e legatários. Assim entendida, a norma de
determinação de partilha, que se contém no Código de Processo Civil, art. 506, aliás, como as outras do mesmo
artigo e seus parágrafos, não se aplica somente à sucessão legítima, como também a do art. 505, 1. É geral a
todas as sucessões, legitimas e testamentárias. Quanto a essas, a regra que equivale à do art. 505, 1, é a de ser
atendida a vontade do testador; na falta, cabem as regras jurídicas dos arts. 505, II e III, e 506.
Não se tire do art. 506, 2? parte, que o Código de Processo Civil prefere que se desglebe o terreno. Deixou de falar
tia divisão natural por ser assunto da ação communi dividundo, tipo geral de ação divisória (aliás, Código de
Processo Civil, arts. 515 e 516) ; e na ação de divisão tem de atender-se ao pressuposto precípuo de não ser
indivisível e não ser incômoda a divisão do bem (arts. 415, 405 e 410). Por isso mesmo, tratando-se por exemplo,
de fazenda que se desvalorizaria com a divisão, dividi-la desde logo seria contra-senso (Tribunal de Justiça de São
Paulo, 22 de fevereiro e 20 de dezembro de 1895, G. J., 12, 49; 15 de abril de 1926; R. dos 2’., 58, 876). O próprio
Código de Processo Civil, vencendo a relutância (descabida) da jurisprudência anterior, no tocante ao juízo
communi dividtrnulo nas ações de inventário e partilha, seguiu a corrente a que sempre pertencemos e também
prevaleceu no Estado do Rio de Janeiro (Superior Tribunal de Justiça, 81 de maio de 1929) ; a de que o juízo do
inventário pode “dividir” (cp. Código de Processo Civil, arts. 515 e 516). Naturalmente, sempre que tenha de
aplicar os arts. 516 e 516, o juiz há de partilhar as terras em partes ideais, em vez de evitá-lo, como estabelece o
art. 506, 2.” parte. Porém, fora desse caso, ainda não se atende ao art. 506, 2.” parte, se: a) os herdeiros quiseram a
comunhão; b) se há entre eles incapaz e conveniência em não se vender o bem; o) se dois ou mais licitaram e
ficaram com o bem. Portanto, ainda que não se tenha de recorrer à “divisão”.
Mais alguns pormenores. Quanto às confrontações e às servidões, a recomendação vem-nos dos velhos juristas
portuguêses, como cautelas. A regra é cogente e completa. Se os interessados acordam diferentemente, entende-se
que deixaram indivisos os bens.
Advirta-se que a regra jurídica do art. 506, § 1.0, do Código de Processo Civil corresponde à política jurídica
hostil à comunhão, se se partilham os bens. Os arts. 515 e 516 completam o pensamento do § 1.0 e da proposição
final do art. 506.
A divido exige que se satisfaçam os pressupostos para se dividir; mas há a divisão dos imóveis de que só se tem
posse.
Como pode dar-se que uma das glebas fique a dois ou mais herdeiros, a lei estatui que essa gleba deve ser
localizada (Código de Processo Civil, art. 506, § 1.0). Mas a parte inicial contém regra jurídica dispositiva: se as
terras foram avaliadas por glebas, e não houve o acôrdo a que nos referimos, entende-se que houve divisão, - e os
arts. 515 e 516 podem ser invocados. Ou pedida, noutro juízo, a demarcação.
1. PRECISÕES. Se a partilha atendeu a testamento que foi revogado, tem-se de verificar se ainda há
proponibilidade da ação de petição de herança. Já tratamos da revogação dos testamentos (Tomo LIX, §§ 5.937-
5.950). Porém é conveniente insistirmos em alguns pontos.
Revogação de testamento, como’ qualquer revogação, é retirada da vox. Vozes do testador estão em todo o
testamente. A retirada pode ser de todas as vozes (revogação do testamento), ou só de alguma disposição
testamentária, ou de parte dela.
Nenhum óbice pode haver à revogação total ou parcial se o testador ainda é capaz de testar. O testador não pode
submeter-se a restrições, ou exigências; a fortiori, renunciar o direito de revogar, que é espécie de direito de testar.
Dai dizer ULNANo que a vontade do testador é ambulatória, até que ela saia, no momento último, do número dos
vivos (L. 4, 1)., de adimendis vel trans ferendis legatis vel fideicommissis, 284, 4: “ambulatoria enim est voluntas
defuncti usque ad vitae supremum exitum”). No texto, dever-se-ia ter dito que ambulatória foi a vontade do
defunto. O próprio testador não pode vincular-se a si mesmo, dizendo, por exemplo, que a deixa a
ou a C, continuará, por ser irrevogável, porque, no assunto, ninguém pode frear a si mesmo a liberdade de testar,
como não o poderia quanto à de outrem. Sôbre a inafastabilidade da liberdade de revocar, HERMOGENIANO foi
explícito: “nemo enim eam sibi potest legem dicere, ut a priori ei recedere non liceat” (L. 22, D., de legatis et
fideicommissis, 32). Ninguém pode estabelecer para si mesmo a regra de que não se possa separar daquilo que
antes disse. O testador, em cada momento, pode testar, e, com o que diz, retirar a voz anterior.
Em vez do princípio do direito romano, segundo o qual testamento posterior rompia o anterior, o direito brasileiro
afastou tal revogação e a integralidade do ato revogatório. Tal o conteúdo do art. 1.747 e do parágrafo único. Se
há, ou se não há incompatibilidade entre dois ou mais testamentos, é questão de interpretação do testamento, de
indagação da vontade do testador. Se há incompatibilidade entre a intenção do testador no primeiro ou qualquer
anterior testamento e a intenção no posterior, ressalta que houve revogação. Se as duas podem coexistir, ambas
têm de ser respeitadas (Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 22 de janeiro de 1988, 1?. dos
2’., 114, 762).
2.CASOS ESPECIAIS. Se os pressupostos do art. 1.750 do Código Civil foram satisfeitos, em se tratando de
reconhecimento de filho ou de adoção, e no testamento anterior ao retonhecimento judicial ou voluntário o
reconhecido ou o adotado era contemplado testamentàriamente, não se afasta, com isso, o rompimento (cf. 8?
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 18 de agôsto de 1947, O D., 50, 383).
A alegação de que o reconhecimento posterior do filho nascido, antes da feitura do testamento, não rompe o
testamento e o mesmo se daria com a adoção posterior de pessoa anteriormente nascida, é falsa. Não havia
herdeiro necessario. O testador, embora não ignorasse a existência de filho, não o havia reconhecido, nem ocorrera
a sentença de reconhecimento, de modo que não havia descendente, herdeiro necessário. No caso da adoção, só o
ato posterior fêz filho adotivo a pessoa, que existia, porém de modo nenhum se poderia considerar filho. Sem
razão, quanto ao reconhecimento, as Câmaras ReUnidas do Tribunal de Apelação do Rio Grande do Sul, a 17 de
agôsto de 1939 (1?. dos 2’., 132, 781), e a 3? Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 16 de
novembro de 1942 (146, 629-634).
As revogações podem ser explícitas ou implícitas. A expressão consiste em declaração de retirada da voz que
estava em testamento anterior (e. g., “fica revogada a cláusula do testamento anterior em que leguei a B a casa
tal”, “tenho dois testamentos e faço este agora, para revogar o que, no primeiro, deixo a B a casa da rua tal, e o
que, no segundo, consiste em deserdação de C”, “revogo a cláusula de inalienabilidade que, no testamento
anterior, estabeleci para os bens que a E couberem”).
A expressão pode ser explícita ou implícita. Se o testador revogou a deixa a E e a C, explícita foi a revogação. Se
êle apenas disse que instituía a C seu herdeiro único, E, que era um dos herdeiros no testamento anterior,
implicitamente deixou de ser herdeiro.
Se o testador abriu ou dilacerou o testamento cerrado ou o testamento particular, <ou se foi aberto ou dilacerado
por outrem em cumprimento da sua vontade, há revogação material. (O art. 1.749 do Código Civil só se refere ao
testamento cerrado, mas havemos de entender que o mesmo se passa com o testamento particular.)
Há a revogação em virtude de lei, dita revogação legal, que em verdade é oriunda de circunstâncias objetivas que
se ligam ao conhecimento delas pelo testador: se sobrevém descendente sucessível ao testador, ou se êle, ao fazer
o testamento, desconhecia a existência do descendente; se o testador ignorava a existência de outros herdeiros
necessários, descendentes ou ascendentes. Tem-se, porém, de atender a que é requisito indispensável para que se
invoque a regra jurídica sôbre ruptura estar viva, ao tempo da abertura da sucessão, a pessoa a favor de quem se
edicta a regra jurídica.
Não há revogação de testamento inserta em codicilo. Nem em declaração perante testemunhas, nem em escritura
pública que não seja testamento público.
Se o testamento foi revogado segundo a lei pessoa?4 do testador, mesmo que o ato se pratique no Brasil, vale a
revogação. Se a revogação desatendera à lei pessoal, ainda que cota conforme a lei do Brasil, não vale a
revogação.
A lei pessoal do Brasileiro tem de reger a revogação como rege a testamentificação.
O testamento revogatório tem de satisfazer os Pressupostos de validade, que aos outros testamentos se exigem, o
testamento particular pode revogar o testamento Público cerrado, ou o particular, ou o especial (marítimo). O
testamento público ou o cerrado pode revogar outro; e o mesmo ocorre com o especial. Se mudou a lei pessoal do
testador, tem êle de atender à nova lei que lhe pressupostos
Como para a testamenticação, para revogação há de haver a pessoalidade do ato. Nenhuma outorga de Podêres é
permitida.
A cláusula revogatória pode ser concernente a alguma cláusula de anterior testamento, ou a algumas cláusulas de
anterior testamento ou de dois ou mais anteriores testamenteiros ou a todo um testamento. Pode só atingir parte de
alguma cláusula, ou partes de algumas cláusulas.
Se o testador sabia que tinha herdeiros necessários há apenas a redução das disposições testamentárias, para que
se respeite a porção necessária. Não há ruptura.
3.VALIDADE DA REVOGAÇÃO. Os pressupostos ~e validade do testamento são comuns à revogação. Há a
nulidade por incapacidade, por ilicitude, por impossibilidade e homologação de regra jurídica que estabeleça a
invalidade. Há a anulabilidade por erro, dolo, coação ou fraude. Se, no lugar de quem fora beneficiado pela
cláusula revogada, se põe quem não podia ser contemplado ou se a nova deixa é inválidade se afasta a revogação,
porque revogar e instituir herança ou legatário outra pessoa são atos diferentes. Idem, se \ beneficiado pela
cláusula substituinte renuncia a herança, ou se caduca a liberalidade, ou se a nova deixa é revogante Se a deixa
testamentária pode ser condicionada, e ~ no foi, a cláusula revogatória pode consistir em Simples alteração pela
inserção da condição. Em verdade, não se revogou a deixa; apenas se acrescentou algo, o que só em parte retirou a
vox.
Se a condição superveniente é ilícita, nula é a cláusula revogatória, de modo que não há revogação, uma vez que o
nulo não produz efeito. Dá-se o mesmo se a condição é ilícita, ou infringe regra jurídica cogente.
4. PRESSUPOSTOS. Não basta ter advindo outro testamento para que o anterior se tenha como revogado, mesmo
se perfeito e sem qualquer vício o posterior. Na L. 2, D., de znzusto reputo irrito facto testamento, 28, 3,
IILPIANO dizia: “prius testamentum rumpitur, cum posterius rite perfectum est”. Princípio romano, êsse, que não
passou ao direito luso-brasileiro, nem ao brasileiro. Repelido foi, portanto, o que estava no livro ad Sabinum de
ULPIANO e no § 2, 1., quibus modis testamenta infirmantur, 2, 17 (“Posteriore quoque testamento, quod iure
perfectum est, superius rumpitur”).
preciso que o testamento posterior em tudo seja diferente do anterior, que nada do que antes se dispôs seja
compatível com que depois foi disposto. Se o testamento posterior só em parte contradiz o que estava no anterior,
somente se considera revogado o que foi atingido pela disposição ou cláusula do posterior testamento.
Se a disposição posterior é diferente da anterior, pôsto que o beneficiado seja a mesma pessoa, no que há
contradição prevalece a posterior.
Se não há contradição entre a disposição do testamento posterior e a do anterior, há duas disposições, que se
acumulam ou se combinam.
6. APRESENTAÇÃO EM JUÍZO. Discutiu-se se, feita a revogação do único testamento que existia, tem de ser
apresentado a juízo, para cumpra-se e para registo, bem como para nomeação de testamenteiro. A 4•a Câmara Civil
do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 27 de abril de 1944 (1?. dos 2’., 150, 578), frisou: .... . a disposição de
última vontade, que se limita a revogar uma outra anterior, a fim de que sejam observadas, quanto à sucessão, as
disposições gerais de direito, embora quanto à sua parte formal deva obedecer aos requisitos exigidos para um
testamento, não é um testamento em sua acepção e sentido jurídicos”; “.. . tornar-se-ia injustificável a nomeação
de um testamenteiro, que teria de pugnar,- não por uma medida de exceção consequente do cumprimento de uma
disposição de última vontade, mas pelos princípios gerais. Evidente que em tal situação haveria desvirtuamento
das atribuições do testamenteiro”. Em parte, certo. Se há ação de nulidade ou de anulabilidade do testamento
revogatório, a missão do testamenteiro, na defesa do ato de última vontade, é necessária. Aliás, se havia
testamenteiro, para o testamento anterior, tem êle de ser ouvido; e pode, até, propor ação de invalidade do
testamento posterior.
9. DECLARAÇÃO DE MORTE E REVOCAÇÃO. A declaração de morte (Código Civil, art. ~Q, 2A parte) pode
suscitar problemas jurídicos de delicadas soluções. Após a data da presunção legal da morte, as heranças são
definitivas, mesmo em se tratando de fideicomissários. Se o ausente aparece, encontra tudo como se em verdade
houvesse morrido. Talvez nada tenha para viver. A aparição restaura as ações de alimentos, oriundas do direito de
família (Tomo IX, §§ 1.000-1.010) ou de direito de obrigações ou de direito das sucessões. Se passa à sociedade
conjugal, o que exige registo, para que se tenha como restaurada a situação jurídica anterior (pois o vinculo
conjugal cessara), e não se ter casado o cônjuge do ausente declarado morto, há as ações de alimentos e quaisquer
outras ligadas ao vínculo matrimonial. Com a restauração, se havia comunhão de bens, essa volta a existir, com os
bens que adquiram e com os que são do ausente e do outro cônjuge, mesmo se herdara daquele pela sucessão
definitiva.
A exposição que acima fizemos mostra como é cheio de problemas o direito dos inventários e partilhas, mas, para
as soluções, concorreram praxes e estudos de séculos que o direito brasileiro acolheu, com emendas onde se fêz
necessário.