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Capítulo 154
Câncer de testículo –
epidemiologia e história natural
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único sintoma, provocada por hemorragia intrates- de não-seminomatoso e, portanto, o tratamento deve
ticular ou orquiepididimites. A presença de massa ser mais agressivo. A deidrogenase láctica não é espe-
supraclavicular é sugestiva de extensão da doença, cífica e relaciona-se com a massa tumoral. Nos semi-
tosse e dispnéia nas metástases pulmonar, dores nomas, a fosfatase alcalina placentária pode ser o único
ósseas e lombossacral, anorexia, náuseas, vômitos e marcador alterado em 27% dos pacientes, especial-
sinais de comprometimento do sistema nervoso mente não-fumantes.
central são manifestações que podem ocorrer nas O estudo dos marcadores é de grande impor-
metástases distantes desde a origem da neoplasia. A tância para o diagnóstico e o prognóstico das falhas
hidrocele está presente em 25% das neoplasias testi- do tratamento.
culares e no diagnóstico diferencial deve-se lembrar Há 24 anos, a história natural foi sintetizada por
de hérnias, torção do cordão espermático, orquite Whitemore, cujos conceitos são válidos até hoje:
granulomatosa, hematoceles e malacoplasia testicular. 1) É excepcional a regressão espontânea completa
A sobrevida dos pacientes depende do estadiamento, dos tumores de células germinativas;
do volume do tumor na ocasião do diagnóstico e 2) Todos os tumores de células germinativas no
da eficácia do tratamento. Nos tumores não-semino- adulto devem ser considerados malignos,
matosos, a velocidade de duplicação celular é muito inclusive os teratomas;
alta e aqueles pacientes com doença avançada têm 3) A túnica albugínea testicular é uma barreira
pior prognóstico. No momento do diagnóstico, cerca natural, que impede a progressão local do tumor;
de 75% dos seminomas estão restritos ao testículo e 4) Os tumores de células germinativas propagam-
25% têm metástases nos linfonodos retroperitoniais. se através dos vasos linfáticos, embora o corio-
Considerando que o seguimento e a vigilância são carcinoma puro quase sempre dissemine por
de fundamental importância no tratamento de via hematogênica;
pacientes com tumores não-seminomatosos do 5) Na grande maioria dos pacientes em que há
testículo, a acurácia no estadiamento clínico é vital; disseminação sistêmica por via hematogênica,
isto porque estima-se que há cerca de 20% a 30% de sempre há invasão inicial retroperitonial dos
erros, quando o estadiamento clínico é comparado linfonodos.
com os achados histopatológicos após a linfadenec-
tomia retroperitoneal.
Daí a importância do exame físico, dos estudos Leitura recomendada
de imagem e a determinação dos níveis séricos de
alfafetoproteína, da subunidade B da gonadotrofina 1. Droller, M J. Cancer of the testis. An overview. Urol. Clin.
North Am. l980, 7: 731-3.
coriônica humana e a deidrogenase láctica. A alfafeto-
2. Strohmeier T, Ackermann. Oncogenes and molecular
proteína está aumentada em 60% a 70% dos tumores genetics of urological tumors. Churchill Livingstone,
não-seminomatosos. A betagonadotrofina coriônica Eddinburgh, 1992, pp. 43-9.
pode estar aumentada em ambos os tipos histo- 3. Thompson J, Willians CJ, Whitehouse JMA, Mead GM.
Bilatateral testicular germ cells tumors: an increasing incidence
lógicos, embora eleve-se apenas em 8% dos semino-
and prevention by chemotherapy. Brit, J Urol. 1988, 62: 374.
matosos. O aumento de alfafetoproteína em semi- 4. Richie JP. Neoplasm of the testis. In: Campbell’s Urology,
nomas puros sugere a presença de um tipo oculto W. B. Saunders Co, Philadelphia, 6th, 2a ed., 1992.
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Capítulo 155
Classificação, patologia e
estadiamento
Helio Begliomini
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Figura 1: Incidência dos tumores de células germinativas e não- Figura 3: Freqüência dos tumores de células germinativas do
germinativas do testículo de adultos testículo de adultos
Patologia
Seminomas
Desenvolvem-se no túbulo seminífero em células
germinativas maduras. Exibem morfologia homo-
gênea e podem ser classificados histologicamente
como clássico ou típico (80%), anaplásico (10%) e
espermatocítico (10%). O seminoma clássico pode
conter células sinciciotrofoblásticas em 10% a 15%
dos casos que respondem pela produção da fração
beta da gonadotrofina coriônica (beta-HCG). A
incidência maior é na quarta década (Figuras 4 e 5).
O seminoma anaplásico tem maior capacidade para
produção de beta-HCG e apresenta maior agres-
sividade biológica que o tipo clássico. A faixa etária é
similar ao seminoma clássico (Figura 6).
O seminoma espermatocítico ocorre na maioria
das vezes em homens com mais de 50 anos de idade.
Apresenta melhor comportamento biológico com
raras chances de metastatização (Figura 7).
Sarcomas
Os vários subtipos perfazem 1% a 2% das
neoplasias testiculares. Figura 4: Seminoma – na superfície de corte o tumor substitui o
Os tumores de células germinativas são subdivididos parênquima testicular. A coloração é branco-acinzentada,
em dois grandes grupos: seminomas (45% a 50%) e podendo conter focos de necrose e hemorragia. A túnica albugínea
não-seminomatosos (35% a 45%) (Figura 3). não costuma apresentar invasão grosseira pelo tumor
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Não-seminomas
Incidem mais na terceira década com pico ao redor
dos 25 anos de idade. Desenvolvem-se a partir de células
germinativas imaturas ou totipotenciais. O carcinoma
embrionário tipo adulto (15% a 20%) é oriundo de
células em estágios mais preliminares de evolução Figura 8: Carcinoma embrionário – o testículo é completamente
(Figuras 8 e 9). Em fases mais tardias pode diferenciar- substituído por tumor com focos de hemorragia e necrose. Há
se em componentes somáticos ou trofoblásticos, cujos extensão tumoral através da túnica albugínea
tumores daí resultantes constituem-se, respectivamente,
no teratoma (8% a 10%) (Figuras 10 e 11) ou terato-
carcinoma (20% a 25%) (Figura 12), coriocarcionoma A maior parte dos tumores não-seminomatosos
(1%) (Figura 13) ou tumor do saco vitelino (1%) (Figura tem rápida velocidade de crescimento e maior
14), que é considerado variante infantil do carcinoma agressividade biológica quando comparados aos
embrionário (Tabela 1). seminomas. Produzem marcadores tumorais, tais
Na criança, o tumor do saco vitelino representa como: alfafetoproteína (AFP), proteína peculiar do
50% a 70% dos casos; os tumores de células não- início da vida embrionária (células trofoblásticas) e
germinativas (20% a 40%) e os teratomas cerca de gonadotrofina coriônica humana (HCG), sintetizada
12% (Figura 15). na placenta (células sinciciotrofoblásticas) (Tabela 2).
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Estadiamento
Figura 11: Teratoma exibindo microscopicamente estrutura tu- A disseminação inicial dos tumores de células
moral formada por áreas císticas mescladas com áreas sólidas germinativas é para os vasos linfáticos do cordão
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Prognóstico
Dependerá do estadiamento clínico da neoplasia
ao diagnóstico, como também do tipo histológico
do tumor. De uma maneira geral, a sobrevida em
dez anos para o seminoma é de 92%; teratocarcinoma,
74%; teratoma, 72%; carcinoma embrionário, 64%
e coriocarcinoma, 44%.
Os pacientes com tumores seminomatosos e não-
seminomatosos, que após o tratamento não tiverem
disseminação da doença, respectivamente, durante
cinco e dois anos, são considerados curados.
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Capítulo 156
Como fazer o diagnóstico e estadiar
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Estadiamento
O estadiamento de tumores de testículo na infância
é apoiado nos marcadores tumorais (AFP, BHCG,
DHL), na histologia da peça cirúrgica e na TC de
abdome, pelve e tórax para avaliar a presença de metás-
tases (Tabela 4).
Leitura recomendada
1. Krege S, Souchon R, Schmoll HJ. Interdisciplinary consensus
on diagnosis and treatment of testicular germ cell tumors:
result of an update conference on evidence-based medicine
(EBM). Eur Urol 2001, 40:372-91.
2. Richie JP, Steele GS. Neoplasma of the testis. In: Walsh PC,
Retik AB, Vaughan ED, Wein AJ. Campbell’s Urology.
(American Joint Committee on Cancer) Saunders. Philadelphia, 2002, pp. 2876-919.
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3. Spermon JR, Debruyne FM, Witjes JA. Important factors in Srougi M, Simon SD. Câncer urológico. Platina. São Paulo,
the diagnosis and primary staging of testicular tumors. Curr 1995, pp. 375-432
Opin Urol 2002, 12: 419-25. 5. Grady RW. Current management of prepubertal yolk sac
4. Srougi M, Simon SD.Tumores germinativos de testículo. In: tumors of the testis. Urol Clin North Am 2000, 27: 503-8.
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Capítulo 157
Histopatologia – fatores prognósticos
Nas últimas três décadas houve um grande avanço e/ou linfática; invasão de epidídimo ou cordão
no tratamento dos tumores de testículo, devido princi- espermático, presença ou ausência de neoplasia
palmente aos novos esquemas quimioterápicos e ao germinativa intratubular no tecido normal.
refinamento da técnica cirúrgica, com menor morbi- É fundamental que o patologista analise todo o
dade e mortalidade. Atualmente os tumores de testí- testículo devido à elevada incidência de dife-
culo são os tumores sólidos mais freqüentes em ho- rentes tipos histopatológicos associados.
mens entre 18 e 45 anos de idade, e também os com 3)Estadiamento patológico de acordo com
maior taxa de cura. Vários fatores de risco se relacionam TNM 1997.
com o desenvolvimento de tumor testicular: história
familiar, criptorquidia, infertilidade, síndrome de Kline-
felter, presença de tumor contralateral, neoplasia testicular Fatores prognósticos
intratubular, e principalmente intersexo. pós-orquiectomia
Uma vez realizado o diagnóstico, a abordagem
inicial deve ser sempre orquiectomia via inguinal com Tumor não-seminomatoso
ligadura prévia do cordão, que dependendo do estadia-
mento TNM, tipo histológico, estudos de imagens do O tratamento atual do tumor de testículo sempre
tórax e retroperitôneo, e dos marcadores tumorais, visa a cura, mesmo nos estágios mais avançados. A
devemos associar linfadenectomia retroperitoneal, escolha da melhor terapia depende do tipo tumoral,
quimioterapia ou radioterapia. presença ou ausência de fatores de risco patológicos
(estágio l), e fatores prognósticos (doença metastática).
Para pacientes com tumor não-seminomatoso em
Patologia estádio l, o risco de metástases ocultas é de 30%, sendo
que em pacientes com e sem invasão linfovascular é de
Após a orquiectomia, deve-se constar da avaliação
50% e 10% respectivamente, o risco de recorrência
patológica do testículo:
ganglionar quando só tratados com orquiectomia.
1) Macroscopia: lado, tamanho testicular, tamanho
Naqueles com presença de mais de 50% de carcinoma
tumoral e achados macroscópicos do epidí-
embrionário, a taxa de recorrência chega a 35%. Quan-
dimo, cordão espermático e túnica vaginal.
do se associa com componente teratomatoso, a recor-
2)Microscopia: tipo histológico (especificar com-
rência é menor, em torno de 10%, sua ausência eleva
ponentes individuais e estimar porcentagem);
este valor a 40%. Outros fatores de risco importantes
presença ou ausência de invasão tumoral venosa
são: a presença de componente de tumor de saco
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vitelínico, invasão de albugínea e/ou epidídimo (estádio outros subtipos tumorais (mas não de células germi-
pT ≥ 2), e marcadores elevados pré-orquiectomia. nativas) podem progredir mais freqüentemente, e
devem ser submetidos à quimioterapia de resgate.
Tumor seminomatoso
Devido às altas taxas de cura, quase 100%,
alcançados no tratamento do tumor seminomatoso
Leitura recomendada
estádio l com orquiectomia e observação, aplica-se 1. Albers P, DeRiese WT, Ulbright TM, Donohue JP, Foster RS.
radioterapia somente na recorrência; porém existem Prognostic factors in patients with pathological stage l non-
poucos estudos quanto aos fatores de risco neste seminomatous testicular germ cell tumors and tumor recurrence
during follow-up. Urol Res (1995) 23: pp. 211-3.
grupo de tumores. Os fatores de risco para recor- 2. Laguna MP, Pizzocaro G, Klepp O et al. EAU guidelines on
rência são: tumor seminomatoso anaplásico, tumor testicular câncer. Eur Urol 2001, 40: pp. 102-10.
> 3 cm, presença de invasão linfovascular e beta- 3. Warde P, Specht L, Horwich A et al. Prognostic factors for
HCG alto pós-orquiectomia. relapse in stage l seminoma managed by surveillance: a pooled
analysis. J Clin Oncol 2002; 20: pp. 4448-52.
Os pacientes submetidos à quimioterapia 4. Walsh PC, Retik AB, Vaughan ED Jr, Wein AJ. Campbell’s
podem apresentar massa residual retroperitoneal: Urology, 8th ed., Philadelphia, 2002.
necrose, fibrose e teratoma que são associados a 5. Ulbright TM. Testis risk and prognostic factors-the pathologist’s
baixo risco de progressão; já as que contêm tumor perspective. Urol Clin of North Am 1999, p. 26(3).
de células germinativas não-teratomatosa ou
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Capítulo 158
Seminoma estádios I e II
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Capítulo 159
Tumores não-seminomatosos –
tratamento
O tratamento dos tumores germinativos não-semi- linfadenectomia retroperitoneal, devem ser obedecidos
nomatosos do testículo (TGNST), após a orquiec- critérios bastante rígidos de seleção dos pacientes. Isto
tomia por via inguinal, tem o objetivo de prevenir a se deve às dificuldades de ordem socioeconômica e,
ocorrência de metástases quando limitados ao estádio muitas vezes, pelas restrições decorrentes de nosso
I e melhorar as taxas de sobrevida em pacientes com sistema de assistência médica.
doença metastática. Para a escolha da melhor forma O fator preditivo de recorrência em pacientes
de tratamento deve ser levada em consideração a submetidos ao protocolo de seguimento é a presença
histopatologia do tumor original, a presença ou não de invasão vascular (IV) no tumor original. Cerca de
de fatores de risco no estádio I e os fatores prog- 70% dos pacientes em estádio I não apresentam
nósticos quando se trata de doença metastática. invasão vascular e o risco de recorrência é apenas 15%
Fatores de risco no estádio I: comprometimento a 20%, comparados a 50% de recorrência nos casos
do cordão espermático e/ou epidídimo, percentual em que há invasão vascular. Quando a linfadenectomia
de carcinoma embrionário > 40%, ausência de retroperitoneal nerve-sparing (LRP-NS) é adequadamente
elementos do saco vitelino, invasão vascular e/ou empregada, o risco de recorrência ao nível de
linfática no tumor original e marcadores tumorais retroperitôneo é extremamente baixo. Em 40% a 50%
elevados antes da orquiectomia. dos casos a LRP demonstra linfonodos positivos, já
se tratando de pacientes em estádio II.
Outra forma de tratamento do estádio I nos
TGNST TGNST, após a orquiectomia, nos casos de alto risco,
seria o emprego de dois ciclos de quimioterapia (QT)
Estádio I com o esquema PEB (cisplatina, etoposide e
bleomicina), obtendo-se índices de cura igualmente
Após a orquiectomia, até 30% dos pacientes elevados. Todavia, o risco de crescimento lento de
clinicamente diagnosticados como estádio I já apre- elementos teratomatosos no retroperitôneo, resis-
sentam micrometástases e na seqüência podem tentes aos esquemas de QT, e os próprios riscos da
desenvolver recorrência da doença, geralmente em QT devem ser levados em consideração quando se
retroperitôneo. Assim, a conduta padrão é a linfade- pensa em utilizar este tratamento.
nectomia retroperitoneal (LRP) modificada. O principal objetivo da LRP reside no fato de
Se forem submetidos apenas ao esquema de segui- que as metástases iniciais localizam-se em linfonodos
mento (surveillance), o qual tem sido empregado em retroperitoneais tornando o procedimento curativo
diversos centros com resultados semelhantes aos da nos estádios N1 e N2. Com esquemas conserva-
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Algoritmo I
Algoritmo II
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Leitura recomendada 3. Richie JP, Einhorn LH, Foster RS, Jewett MAS, Studer UE.
Testis Cancer: Options in a land of plenty. Contemporary
Urology, 13(5) May 2001, pp. 26-45.
1. Böhlen D, Borner M, Sonntag RW, Fey MF, Studer UE. Long-
4. Richie JP, Steele GS. The indications for RPLND in patients
term Results Following Adjuvant Chemotherapy in Patients
with testicular tumors. Contemporary Urology, 12(8) Aug
with Clinical Stage I Testicular Nonseminomatous Malignant
2000, pp. 12-26.
Germ Cell Tumors with High Risk Factors. J Urol, 161, pp.
5. Laguna MP, Pizzocaro G, Klepp O, Algaba F, Kisbenedek L,
1148-52, April 1999.
Leiva O. EAU Guidelines on Testicular Cancer. Eur Urol
2. Hanna N, Loehrer PJ. Testicular Cancer Therapy: Progress and
2001; 40: pp. 102-10.
Problems. Contemporary Urology, 13(12) Dec. 2001, pp. 13-26.
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Capítulo 160
Massa residual pós-QT
Valdemar Ortiz
Camilo Jorgetti
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Capítulo 161
Seguimento clínico nos
tumores testiculares
Giacomo Errico
Após o tratamento definitivo para tumor testicular, A anamnese deve ser completa, avaliando provável
os pacientes devem ser acompanhados regularmente. queixa do paciente em relação à dor lombar, dor
Em cada visita, o paciente deve ser examinado cuida- abdominal, alteração nos mamilos e tosse.
dosamente com atenção voltada para presença de O exame físico deve ser detalhado na investi-
nódulos supraclaviculares, exame de tórax, abdome e gação de linfonodos, tórax, abdome e testículo
testículo contralateral. remanescente.
Seminoma estádio I
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Não-seminoma estádio I
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Capítulo 162
Tumores de testículo na
infância – particularidades
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