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FATORES CONDICIONANTES DA DESARTICULAÇÃO DAS POLÍTICAS

PÚBLICAS INCIDENTES NA ZONA COSTEIRA BRASILEIRA


Polette¹, M; Vieira², P. F; Filardi², C. L.; Rebouças², G. G

¹Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI/CTTMar – Laboratório de Gestão Costeira Integrada – rua Uruguai 458,
Itajaí - SC email:mpolette@univali.br

²Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC/NMD – Florianópolis – SC email: phfvieira@yahoo.com.br

RESUMO
O presente trabalho busca levantar e analisar os fatores condicionantes da desarticulação das
políticas públicas na zona costeira, tendo foco central o Plano Nacional de Gerenciamento
Costeiro. A presente avaliação foi realizada tendo como base uma série de entrevistas com
pesquisadores que atuam na zona costeira brasileira. Foi possível levantar os condicionantes
técnicas, administrativas, sociais e acadêmicas que impedem uma implementação efetiva desta
importante política pública no Brasil.

Palavras chave: Políticas Públicas, PNGC, avaliação institucional

INTRODUÇÃO
A lei de gerenciamento costeiro (Lei 7661/88) foi amplamente repensada por meio de
Resoluções e Decretos com a finalidade de
e
stabelecer um processo de gestão, de forma integrada, descentralizada e participativa, das
atividades sócio-econômicas na zona costeira, de modo a contribuir para elevar a qualidade de
vida de sua população, e a proteção de seu patrimônio natural, histórico, étnico e cultural. No
entanto, apesar dos esforços dos últimos anos no sentido de implementar um programa de
gestão fica claro que um dos grandes desafios deste processo está na integração de políticas
públicas a fim de que se possa realmente obter um processo integrado, participativo e mais do
que nunca comprometido com mudanças de uso e ocupação do solo e do mar.
Com o intuito de entender os fatores condicionantes da desarticulação das políticas públicas
incidentes na zona costeira brasileira foi realizada uma avaliação do Programa Nacional de
Gerenciamento Costeiro por meio de um amplo levantamento com entrevistas junto a 76
pesquisadores que estão diretamente relacionados com projetos e ou programas de gestão
costeira em 17 estados litorâneos brasileiros. Destaca-se o caráter independente da pesquisa,
ou seja, esta não foi realizada sob efeito de consultorias ou de processos contratuais do próprio
ente a ser avaliado.
A pesquisa foi realizada pelos Laboratórios de Gestão Costeira Integrada da Universidade do
Vale do Itajaí - UNIVALI/CTTMar e pelo Núcleo de Meio Ambiente e Desenvolvimento da
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC (Polette & Vieira, 2006). Fica claro por parte
dos entrevistados que os fatores condicionantes da desarticulação das políticas públicas
incidentes na zona costeira (Política Nacional de Recursos Hídricos - PNRH, Estatuto da
Cidade, Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC, entre outros) é sem dúvida
um dos entraves à articulação entre as políticas ambientais que giram em torno da dinâmica de
funcionamento dos órgãos públicos responsáveis pela implementação das mesmas.
Em uma análise mais fina pode ser hipotetizado de que não existe também dinamismo
integrador no próprio tecido da comunidade cientifica – que parece assumir uma postura de
dependência com relação aos impulsos vindos do próprio nível governamental.

MATERIAIS E MÉTODOS
A presente proposta metodológica foi construída tendo como base no enfoque analítico
da gestão costeira integrada, do ecodesenvolvimento e da governança a fim de avaliar o
estágio atual do Programa Nacional de Gerenciamento Costeiro nos diferentes estados
costeiros brasileiros. Para subsidiar a análise da Política Nacional de Gerenciamento
Costeiro foram realizadas entrevistas com pesquisadores dos 17 estados brasileiros. O
sistema de Plataforma Lattes do CNPq e suas diversas ferramentas de busca, as
publicações nacionais específicas sobre o tema (e.g. anais de eventos científicos,
publicações oficiais), e as linhas de pesquisa de laboratórios e núcleos das universidades
brasileiras foram fontes usadas para o levantamento dos pesquisadores.
Ao mesmo tempo, a elaboração das entrevistas semi-estruturada baseou-se na fase
exploratória (revisão da literatura e experiência prática dos pesquisadores envolvidos) e nas
perguntas norteadoras da pesquisa pré-estabelecidas.
As entrevistas foram enviadas por correio convencional (já com selo e envelope para resposta)
e correio eletrônico para 223 pesquisadores dos quais 76 responderam. A amostra está
distribuída de forma heterogênea entre os estados, concentrando principalmente
pesquisadores dos Estados de Santa Catarina, São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.
Destaca-se que houve exemplos em que determinado pesquisador, por seu envolvimento ou
interesse na temática da pesquisa, contribuiu mais significativamente do que vários outros
entrevistados juntos. Foi possível desta forma estabelecer uma problemática e construir um
modelo de análise que possibilitou a avaliação do Programa de Gerenciamento Costeiro no
Brasil, bem como uma análise de governança conforme demonstram os resultados e discussão
deste trabalho.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Pode ser analisado que existe um consenso entre os pesquisadores dos diferentes estados
quanto a real falta de articulação entre as políticas ambientais incidentes na zona costeira.
Entre os condicionantes técnicos e administrativos tendo como origem os órgãos públicos
responsáveis por colocar em pratica tais políticas, se destacam: i) Número insuficiente de
técnicos; baixa capacitação, baixos salários, predominância de critérios políticos e pessoais
sobre os técnicos nas posições chaves; ii) Predominância de políticas de governo setorizadas,
muitas vezes sobrepostas ou conflitivas; iii) Falta de integração metodológica, conceitual e de
ações entre as diferentes escalas administrativas; iv) Falta de visão, conhecimento e vontade
política dos governantes; v) Descontinuidade das ações, vulneráveis às instabilidades políticas;
vi) Suscetibilidade das políticas aos interesses econômicos, pessoais, eleitorais e partidários;
vii) Centralização, falta de participação e distanciamento dos níveis local e municipal; viii) a falta
de efetividade, de recursos financeiros e de prioridade das políticas ambientais no contexto dos
Programas de governo em todos os níveis; viii) Problemas ligados à legislação (e.g. excesso,
incompatibilidade, não aplicação, falta de fiscalização e punição, não cumprimento pelos órgão
públicos); e, finalmente, ix) Falta de transparência e de divulgação maciça das políticas, sua
importância e dados associados.
Entre os entraves de natureza técnica e administrativa nos órgãos públicos segundo os
pesquisadores cabe ressaltar: os diretamente relacionados ao quadro técnico: pouca
capacitação; insuficiência de técnicos; baixos salários (desmotivação); predominância de
critérios políticos sobre os técnicos nas chefias; a falta de visão / vontade política /
conhecimento dos governantes; a falta de integração institucional trans-escalar (metodologias,
conceitos, ações) e políticas de governo diversas, setorizadas, sobrepostas e conflitivas; a falta
de planejamento urbano, ambiental, e de crescimento econômico; as políticas muito
abrangentes; descontinuidade das ações e mudanças políticas; políticas suscetíveis aos
interesses econômicos, pessoais, eleitorais, e partidários; a falta de transparência os GERCOs
estaduais e principalmente do Federal nas tomadas de decisões; políticas centralizadas, não
participativa e distante do nível local; falta de efetividade, seriedade e de recursos quanto a
implementaçao das políticas públicas; os processos decisórios burocratizados;
incompatibilidade na resolução de conflitos; a falta de planejamento estratégico para atingir os
objetivos; falta de integração do governo com os outros setores sociais envolvidos; os
problemas quanto a legislação (não aplicação, falta de fiscalização e punição, não cumprimento
pelos órgãos públicos); excessiva regionalização no nível estadual; falta de divulgação das
políticas públicas; falta de uso da produção científica; políticas inadequadas e mal elaboradas;
falta de gerência, coordenação, e nas diretrizes prioritárias em nível federal e estadual; visão
compartimentada dos gestores; falta de investimento na educação e de sensibilização dos
atores; falta de organização estrutural dos grupos de trabalho; a criação e Planos de Manejo de
UCs inadequados; e ainda a falta de apoio às populações extrativistas.
Em termos de condicionantes sociais da não integração das políticas públicas, os
pesquisadores realçaram a falta de informação, conscientização, educação, e articulação entre
os atores sociais dos diferentes setores envolvidos com a dinâmica de implementação das
políticas públicas ambientais; e também destacaram o peso de interesses econômicos como
um fator crucial de obstrução das mesmas.
Entre os entraves relacionados à esfera acadêmica correspondem basicamente à falta de
articulação, um maior compartilhamento de informações e uma maior integração das ações dos
pesquisadores atuantes na problemática ambiental e nas linhas de pesquisas ligadas à zona
costeira brasileira. As propostas neste sentido ficam em torno da formação de uma rede ou de
um fórum nacional de gerenciamento costeiro. Devem, portanto ser destacados: Falta de um
Fórum Nacional Independente para o debate e a proposição de ações harmônicas entre as
políticas públicas incidentes na zona costeira; a supervalorização das ONGs e desvalorização
das universidades no atual governo; e a falta de uma rede de pesquisadores em gestão
costeira.
De acordo com a maioria dos pesquisadores consultados, o principal papel do Governo Federal
está na construção de um programa efetivo de gestão costeira no Brasil, mas este deve estar
na definição e implementação de macro-políticas e diretrizes de ação, além da coordenação e
regulamentação geral do programa. Dentro desta categoria, o uso e ocupação do solo; o
desenvolvimento sócio-econômico sustentável e a definição de áreas de intervenção prioritária
são exemplos dos campos de ação que demandam com urgência a implementação de macro-
políticas e diretrizes governamentais federais. Num segundo plano, os pesquisadores
apontaram como relevante os papéis de balizamento e apoio legal aos programas de gestão
costeira, tais como por meio da compatibilização e atualização legal e da execução de ações
específicas, tais como uma centralização efetiva e integrada das informações ambientais.

CONCLUSÕES
A presente avaliação constitui em importante trabalho para tomadores de decisões, ONG’s e
pesquisadores que pretendem entender os possíveis entraves à eficiência do Programa
Nacional de Gerenciamento Costeiro em relação a outras políticas públicas que também se
inserem na gestão da zona costeira brasileira. Fica claro que a integração das mesmas
envolvem ameaças político-institucionais (i.e. os fatores ligados à dinâmica política nas esferas
de governo e sua influência sobre o funcionamento das instituições governamentais de gestão
ambiental); ameaças técnico-científicas, que são representados pelos problemas inerentes ao
desempenho das funções técnicas, dentro das instituições de gestão, no processo de
implementação do GERCO; e ameaças sociais, econômicas e ambientais, que correspondem a
problemas externos ao meio governamental. As ameaças político-institucionais foram
consideradas as mais relevantes pelos pesquisadores consultados. Estas incluem a influência
dos interesses políticos sobre o Programa (e.g. pressão dos setores econômicos e falta de
interesse quanto sua implementação nos órgãos governamentais); a falta de recursos
financeiros e humanos; a descontinuidade administrativa, devido às constantes mudanças nos
quadros técnicos e nas prioridades institucionais; e a falta de integração entre as políticas
governamentais, expressa muitas vezes pela adoção de políticas conflitantes em diferentes
setores da esfera governamental. Quanto as de natureza técnico-científicas incluem: o reduzido
diálogo com a sociedade e o baixo grau de participação nas ações do programa; o problema da
excessiva centralização da gestão costeira nos órgãos governamentais, relacionado com
concentração de poder em técnicos e consultores “eternos”; e, secundariamente, nas ameaças
relativas ao baixo grau de capacitação dos quadros técnicos nas instituições e à insuficiência
do processo de divulgação dos Programas por meio de seus dados, metas e ações. Apoio:
CNPq

REFERÊNCIAS
Polette, M.; Vieira, P, F. 2006. Avaliação do processo de gerenciamento costeiro no Brasil:
Bases para discussão. UFSC. Tese de Pós doutoramento. 286p.

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