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FÔSSEMOS M. ABRAMOVIC /
PARA ARQUIVOS ESPECIAIS
DA ABRAMOVIC FOUNDATION
/ SETEMBRO DE 2012 (DATA
PREVISÍVEL DE POUSO EM
HUDSON)
Quanto ao belo, não diria já não mais importar, não mais haver.
Mesmo no que temos chamado de arte contemporânea, o belo importa.
Continua importando. Pode ser um dos mais vigorosos problemas de
uma certa obra, aquele que permite vislumbrar a rede de questões (a
forma, o informe etc). Problema seriíssimo em uma postulação teórica
da arte, sobre a arte: o que faz ou não faz o belo ali, por que o belo
(o que por tal compreendemos) resolveu aparecer ou desaparecer, ou
transtornar toda a obra (pôr seu avesso, em casos) ou transtornar-nos.
Entretanto, o belo – o caráter do belo – já não atende nem procura nossa
calmaria ‘interior’, não se entrega ao conforto de nossa contemplação;
surge sim como conceito, urdidura, astúcia, estratégia, vontade de
distúrbio e de exame. Não gostaria de usar a afirmativa presente em
estudiosos de arte diversos sobre existir hoje uma outra Estética,
nomenclatura a alternar-se com a de Teoria da Arte. Qualquer que
seja a atitude atual de uma Teoria da Arte a constituir-se far-se-á por
relações de ruptura com a Estética, embora tendo de dialogar com o
vasto conjunto de proposições que a própria Estética expunha como
fundamentais à sua feitura, tópicos de pensamento que retornam
diferidos e em circunstâncias e contingências histórico-artístico-
culturais bastante particulares. Já não estamos no mesmo solo, já não
lidamos com as mesmas pulsões, logo os fatores não são os mesmos.
Como não são os mesmos os fatores epistêmicos que permitiriam
conduzir este ou aquele valor para este ou aquele lugar de compreensão
e de interesse. A multiplicidade e a complexidade (não que antes não
houvesse ambas) atuais dos saberes a nos atingirem trazem, dentre
outros campos de olhares havidos, a Estética para a cena dos usos. Uma
Teoria da Arte não é uma rubrica outra da Estética. Uma Teoria da
Arte reconhece (e cuida de) as mutações da Estética, sem com esta
confundir-se ou ser uma de suas metamorfoses. E pode-se afirmar
que, embora o termo belo sempre tenha estado presente nas grandes
organizações da Estética, seja hegeliana ou kantiana, o problema
jamais foi o de averiguá-lo. E sim o de interrogar nossas relações com,
relações de impacto entre seres e seres, entre seres e coisas. Relações a
serem mediadas tanto pelo vocábulo belo, quanto por vocábulos como
sagrado, sublime, horror, espírito e outros. Vocábulos a perseguirem-
nos, a serem repostos, enquanto o Ocidente insistir em manter-se.