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MANAUS, UMA GEOHISTÓRIA NO PERIODO ÁUREO DA BORRACHA

Carla Cristina Vasconcelos Batista1

Resumo:

Em meados do século XIX e XX, Manaus sofreu várias transformações com a


economia da borracha. Este texto procura responder algumas questões referentes à
produção e reprodução do espaço urbano vivenciados neste período, assim como a
administração de Eduardo Ribeiro. A cidade de Manaus dinamizou tanto a economia
quanto à sociedade manauense em detrimento ao homem e natureza, numa
proposta de periodização, no que diz respeito ao espaço-tempo do cotidiano
histórico.

Palavras-chave: produção e reprodução do espaço, borracha, periodização.

Abstract:

In meads of secular XIX and XX, Manaus has soffred a lot of transformations with
economy of the rubber. This text procure answerer some questions referents the
production and reproduction of the space the urban one lifer on this period, so as the
administration in the Eduardo Ribeiro. The Manaus city in dynamicity the economy as
the “manauense” societies on detriment in the man and nature, under the propose of
the period, in what speaks respect on the space-tempo in the quotidian historic.

Key-words: Production and reproduction of the space, rubber, period.

A paisagem urbana numa cidade dos trópicos comporta-se moradias da natureza,


porém se perdem com o tempo. É provável que a capital amazonense esteja
inserida neste contexto com a chegada da economia gomífera. A cidade de Manaus
em relação ao homem com a natureza foi fortemente atuada no período áureo da
Borracha. Os laços de envolvimento homem/natureza deixaram seus marcos apenas
no imaginário, ainda que os suntuosos monumentos existentes nos remetam a
cidade pretérita. É, portanto, na óptica do cotidiano que pode-se compreender a
produção do espaço. Já que espaço-tempo no sentido de que “o homem se apropria
do mundo como apropriação do espaço”, segundo Ana Fani (2001, p.12); começa a
reprodução das relações sociais na cidade urbana. Então, no final do século XIX e
início do século XX, a cidade de Manaus pode ter sido uma cidade ribeirinha? A
administração de Eduardo Ribeiro contribuiu para construção de uma cidade

1
Historiadora. Cursando Pós-Graduação em Geografia da Amazônia Brasileira – UFAM/2006.
E-mail: carlanjobatista@yahoo.com.br
urbana? E a sociedade manaura se beneficiava do embelezamento/urbanismo da
cidade de Manaus?

Na tentativa de responder as questões citadas acima que este texto foi elaborado. O
propósito da espacialidade e as relações sociais dão eixo a visão geográfica do
ocorrido na cidade de Manaus previsto num período curto, de 1890 a 1910, como
afirma Oliveira (2003, p.20). A partir da periodização de um lugar, proposto por
Roberto Lobato Corrêa (1987, p.40) ajudará a reconstruir o papel geohistórico
datado na cidade de Manaus.

A periodização espacial é a reconstrução do tempo espacial, isto é, a


colocação em evidência dos momentos diferenciados que caracterizam o
processo de elaboração da organização espacial. (Corrêa, 1987, p.40)

Verifica-se com a periodização uma espacialidade desigual, na seqüência de


tempos. Desse modo, o extrativismo da borracha não é permanente dentro de uma
escala temporal curta. No início do século XIX, Manaus tinha uma relação íntima
com o rio e com a natureza, pois era localizada “no meio da floresta amazônica, às
margens do rio Negro e cercada por cursos d’água antes cristalina” (Oliveira, 2003,
p. 23). O viés econômico ligava Manaus a outras cidades vizinhas através dos rios,
mesmo porque só poderiam chegar a outros lugares através das embarcações numa
dinâmica sócio-espacial.

A cidade ribeirinha, isto é, cidades as margens do rio, com aspecto econômico,


cultural e de subsistência, são uma grande parcela na região amazônica como, por
exemplo: Tefé. Porém, nem todas as cidades que estão às margens do rio são uma
cidade ribeirinha. Utilizando a periodização, no âmbito da rede urbana a
diferenciação é marcada pelo segmento “velho” – formas espaciais consolidadas e
relações sociais cristalizadas (tempo espacial longo) – e pelo “novo” – o que não é
permanente (tempo espacial curto) – a cidade de Manaus pode ser considerada uma
cidade ribeirinha no curto período posterior e inicial da economia gomífera, quando a
borracha não havia tomado grandes proporções para se construir um aeroporto
(exemplo: Ponta Pelada), uma rodovia ou uma ferrovia (estrada de ferro Madeira
Mamoré idealizada pelo Barão de Mauá que ficou terminada juntamente com a
decadência da borracha) e, conseqüentemente, deixando de ter uma economia
voltada somente para subsistência.
Na metade do século XIX, ocorrem vários acontecimentos que modificam a
paisagem amazônica e acabam determinando a malha urbana do Amazonas, de
acordo com Oliveira (2006).

Dentre os acontecimentos estão: a elevação do Amazonas à categoria de


Província em 1850, a introdução da navegação a vapor em 1853, a
exploração extensiva dos seringais e o movimento revolucionário dos
cabanos, a Cabanagem que foi a mais importante revolução popular da
Amazônia ocorrida entre 1834 a 1840. (Oliveira, 2006)

Com isso a exploração do látex intensificou-se cada vez mais, e a paisagem urbana
entra num processo de produção e reprodução do espaço. O espaço urbano da
cidade de Manaus toma formas, funções e estruturas com suas significações
introduzidas por Lefebvre (1994). E para suprir escassez de mão-de-obra, milhares
de nordestinos paupérrimos vieram para a capital mundial da borracha com o intuito
de melhorar suas condições de vida. Mas, esse fluxo migratório prejudicou
substancialmente Manaus, pois não possuía infra-estrutura suficiente para atender a
demanda de pessoas, deixando-as as margens da cidade. Além de ter transformado
o índio em trabalhador urbano. A “modernidade” arrasou tudo que era considerado
feio e atrasado. Segundo a historiadora Francisca Deusa Sena da Costa,
anteriormente a natureza era vista como paraíso, mas no século XVIII, sobretudo no
XIX, essa idéia muda, o homem passa a ver a natureza como algo depreciável. Por
isso, que a relação com a Europa influenciou não somente na econômica, mas
também nos moldes da cidade, pois Manaus era considerada feia para o modelo
europeu. Enfim, era necessário embelezar a cidade para atrair os estrangeiros
negociantes da borracha e estabelecerem-se na cidade. Os administradores locais
se incumbiram de tal feito.

A produção do espaço em Manaus se dá através das políticas públicas do Estado,


“promovendo as áreas de reprodução do capital das condições necessárias a sua
produção em detrimento de outras” (Oliveira, 2003). O Estado torna-se um
mecanismo de controle diante das desigualdades sócio-espaciais e “baseado nos
princípios universais, num sistema válido para todos” (2003). Há, portanto, uma
criação e recriação do espaço urbano em Manaus relacionada à natureza e a
cultura. Nesta perspectiva que Eduardo Ribeiro, no final do século XIX, concebe
Manaus na seguinte frase: “encontrei uma aldeia e dela fiz uma cidade moderna”.
Insere, então, o conceito de que a cidade é o concreto que pode se medir, localizar;
e o urbano é o subjetivo, sinônimo de pessoas, modo de vida e modo de ser da
sociedade com o capitalismo. As transformações na cidade iniciadas por Eduardo
Ribeiro fazem de Manaus um espaço de produção e reprodução do espaço, mas
que a dinâmica da sociedade são partícipes desta relação homem e natureza, tempo
e espaço.

Sendo assim, foi na administração de Eduardo Ribeiro (1892-1896) que ocorreram


diversas construções suntuosas na área central da cidade, as principais foram: o
Palácio da Justiça e o Teatro Amazonas (este inaugurado no governo seguinte,
Fileto Pires). O urbanismo erguido pelo Estado expandiu nas dimensões pretéritas,
tanto naturais quanto sociais, assinalando um papel de violência contra a natureza e
especialmente contra a cultura, de acordo com Oliveira (2003). “As obras
concretizadas na administração de Eduardo Ribeiro e mesmo as que serão
finalizadas nos anos subseqüentes alteraram a concepção do espaço urbano e a
relação com a natureza” (Daou, 1998: 191/Oliveira, 2003, p. 75). Somando isso a
infra-estrutura portuária, o porto flutuante, a Biblioteca Municipal, o Reservatório de
Água Mocó entre outros prédios públicos que na grande maioria as peças foram
importadas da Europa.

Entretanto, segundo Dias este período é marcado por uma efervescência cultural e
intelectual chamada de modernidade, que foi irradiada pela França refletindo nos
paises ocidentais, a Belle époque (2001).

A Belle époque em Manaus substituiu a madeira pelo ferro, o barro pela


alvenaria, a palha pela telha, o igarapé pela avenida, a carroça pelos bondes
elétricos e pelos automóveis, a iluminação a gás pela luz elétrica, expande a
navegação, desenvolve a imigração, civiliza índios. (DIAS, 2001)

Destarte, “Manaus estava ligada ao Rio de Janeiro, comercialmente dependia de


Londres, e culturalmente, em parte, de Paris” (Santos, 2002). Mas, na tentativa de
transformar Manaus na Paris dos trópicos inicia-se um processo de exclusão social.
A modernização da cidade no modelo europeizado trouxe um impacto sobre a
população pobre que se viu excluída desse momento, sendo obrigada a se afastar
do centro urbano da cidade para periferia. A outra parcela consistia numa sociedade
de fachada (de modernidade) européia, previsto no Código de Postura. Pois, as
mudanças ocorriam na modificação predial em que as casas deveriam ter ao menos
sua fachada de alvenaria e o resto poderia ser de madeira. Manaus não possuía um
projeto urbano no que resultou caos urbano, moradia e transporte, assinala Costa
(1997). Assim, entende-se que nem a cidade como espaço da dinâmica das
relações sociais nem o modo de vida da população manauense era compatível com
o europeu. A infra-estrutura urbana estava concentrada na área central, justamente
pelas empresas e a moradia da elite.

De modo geral, os eventos da borracha não atingiram sequer toda cidade de


Manaus quanto mais do Estado. A borracha para Amazônia brasileira deixou marcas
de “evolução” tanto em Manaus quanto em Belém tornando-as centro comercial
mundializada. Mas, não pode ser comparada à economia agrícola distribuída em
todo país. Viu-se, assim, a vulnerabilidade da expansão da borracha, no ponto de
vista histórico e geográfico, principalmente na decadência da economia gomífera. O
que nos resta são os resíduos do imaginário coletivo ou o patrimônio histórico
propriamente dito.

Cabe mencionar um trecho escrito por Oliveira:

A resistência, em diferentes épocas, constitui-se, do ponto de vista sócio-


espacial, no inconformismo com as novas relações sociais de produção que
se impunham. Esse processo é continuo, mas não-linear, no tempo e no
espaço e reflete-se múltipla dimensões da vida que se desenrolam no espaço,
das quais ficaram resíduos na paisagem urbana. (OLIVEIRA, 2003, P. 21)

Desse modo, a cidade de Manaus entrelaçou-se numa dinâmica espaço-temporal no


ter e no que estar por fazer. E como habitantes partícipes da construção do espaço
e da própria cidade urbana, a população estava de fora dos locais públicos de
cultura e lazer, ou seja, estão exclusos, enquanto a elite e os investidores da
borracha são os alvos para tais mudanças.

Considerações finais:

As determinações das políticas públicas e das relações sociais de produção fazem


da paisagem urbana uma paisagem citadina cheia de vida, emoções, sentimentos
traduzidos no cotidiano das pessoas, concretizando em espacialidades da cidade
real ou imaginária, segundo Oliveira (2003). Não existe espaço sem sociedade e
sociedade sem espaço. Afinal, cidade é produto social, datado, que se transforma
por meio das técnicas, utensílios, hábitos, costumes, tradições...
A paisagem não é só produto da história, ela reproduz a História, bem como a
concepção de que o homem tem e teve do morar, do habitar, do trabalhar, do
comer e do beber, enfim, do viver. (OLIVEIRA, 2003, P. 29)

Na visão da geohistória, Manaus produziu e reproduziu o espaço, de cidade


ribeirinha a cidade urbana, traduzida nas construções públicas, moradias de
palacetes e fachadas no centro, e palafitas na periferia da cidade. Período de grande
prosperidade para Manaus e Belém, no final do século XIX e nas primeiras décadas
do século XX com a economia gomífera, mas que não trouxe transformação
fundamental na sociedade amazônica. Onde há instituições regionais, nacionais e
até internacionais, influenciando de forma direta ou indireta a dinâmica da cidade
(Oliveira, 2006). As cidades amazônicas são tempo e espaço produzidos a partir do
especifico, tendo dimensões gerais (Oliveira, 2006). O processo de modernização e
de urbanização da cidade de Manaus no período áureo da borracha configurou-se
em relações conflituosas nos níveis econômico, social, cultural e espacial. Afinal,
concordando com Oliveira, o espaço é a realização da História.

Referências bibliográficas:

CARLOS, Ana Fani Alessandri. Espaço-tempo na metrópole: a fragmentação da vida


cotidiana. São Paulo: Contexto, 2001.

CORRÊA, Roberto Lobato. Periodização da rede urbana da Amazônia. Revista


Brasileira de Geografia. Rio de Janeiro, 49(3): 39-68, julho de 1987.

COSTA, Francisca Deusa Sena da. Quando viver ameaça a ordem urbana. PUC-
São Paulo: Dissertação de Mestrado, 1997.

DIAS, Edinea Mascarenhas. In: Santos, F. J. & Sampaio, P. M. (Orgs) Estado do


Amazonas em Verbetes. Editora Novo Tempo: Manaus, 2001.

LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. São Paulo: Editora Novaes, 1994.

OLIVEIRA, José Aldemir de. Manaus de 1920-1967. A cidade doce e dura em


excesso. Manaus: Editora Valer. Governo do Estado do Amazonas. Editora da
Universidade Federal do Amazonas, 2003.

OLIVEIRA, José Aldemir de. Tempo e espaço urbano na Amazônia no período da


borracha. Script Nova. Revista electrónica de geografia y ciências sociales.
Barcelona: Universidad de Barcelona: 1 de agosto de 2006, vol. X, núm. 218 (35).

SANTOS, Francisco Jorge dos; NOGUEIRA, Amélia Regina B.; NOGUEIRA, Ricardo
J. B. História e Geografia do Amazonas: Ensino Médio. Manaus: Novo Tempo, 2002.
Anexos:

Teatro Amazonas, imagem reproduzida do Governo do Estado do Amazonas.

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