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A avaliação dos docentes e das escolas

Aos poucos a opinião pública e a opinião que se publica começam a perceber que entre
o discurso governativo sobre a educação e o que se passa e vai passar nas escolas vai
um mundo de diferenças.
É claro que ainda subsiste em muitos espíritos a ideia de que o governo é que tem razão,
apenas pelo facto de ser governo e por acusar os que o contrariam de serem uns
tenebrosos corporativistas.

A este tipo de argumentação não faz falta uma reflexão sobre a fundamentação teórica e
científica das decisões políticas. Decide-se porque se manda e isso basta.
O saber e o conhecimento são coisas que dão muito trabalho a conseguir, e nos tempos
que correm nem sequer garantem um empregozito.

Apesar de saber isso penso que os professores não podem desistir da sua verdadeira
missão, que é a de levar o conhecimento a quem não o tem.
Por isso não basta afirmar que somos contra o decreto lei que regulamenta a parte do
estatuto da carreira docente relativa à avaliação dos professores. É fundamental explicar
porque estamos contra e como pensamos que o processo se deve desenrolar.

Antes de mais, convém clarificar conceitos e explicar que o que nos afasta do DR
2/2008 é o facto de o seu objectivo ser o de classificar professores e não o de os avaliar.
Consultando qualquer dicionário da língua portuguesa encontraremos como sinónimos
de avaliar os seguintes: determinar a valia ou o valor de; apreciar o merecimento de;
aquilatar, reconhecer a força de, a grandeza de; estimar, prezar. Já como sinónimos de
classificar encontraremos os seguintes: distribuir em classes; arrumar; ordenar;
qualificar; determinar as categorias (de um conjunto); atribuir valores a.

Quem se der ao trabalho de ler o articulado do DR 2/2008 verificará que o que está em
causa não é determinar a valia ou o valor de cada professor, apreciar o respectivo valor
ou merecimento, mas sim distribuí-los em classes, arrumá-los, ordená-los. No fundo
tudo acaba por ficar condensado no articulado seguinte:

Artigo 21 º - Sistema de classificação

1 — A avaliação de cada uma das componentes de classificação e respectivos subgrupos é feita nos
termos do disposto no artigo 46.º do ECD.

2 — Sem prejuízo do disposto no n. º 5, o resultado final da avaliação do docente corresponde à


classificação média das pontuações finais obtidas em cada uma das fichas de avaliação, e é expresso nas
seguintes menções qualitativas:
Excelente — correspondendo a avaliação final de 9 a 10 valores;
Muito bom — de 8 a 8,9 valores;
Bom — de 6,5 a 7,9 valores;
Regular — de 5 a 6,4 valores;
Insuficiente — de 1 a 4,9 valores.

3 — As menções qualitativas referidas no número anterior correspondem ao grau de cumprimento dos


objectivos fixados e ao nível de competência demonstrada na sua concretização, tendo em conta os
princípios orientadores que forem formulados pelo conselho científico para a avaliação de professores
para a definição dos respectivos padrões.
4 — A diferenciação dos desempenhos é garantida pela fixação de percentagens máximas para a
atribuição das classificações de Muito bom e Excelente, por agrupamento de escolas ou escola não
agrupada, mediante despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da
educação e da Administração Pública, as quais terão obrigatoriamente por referência os resultados
obtidos na respectiva avaliação externa.

5 — A atribuição da menção qualitativa de Excelente fica, em qualquer caso, dependente do


cumprimento de 100 % do serviço lectivo distribuído em cada um dos anos escolares a que se reporta o
período em avaliação.

6 — A apreciação do cômputo do serviço lectivo referido no número anterior é efectuada de acordo com
o disposto nos n.os 7 e 8 do artigo 46.º do ECD.

7 — Quando, para efeito da atribuição da menção de Excelente ou de Muito bom for necessário
proceder ao desempate entre docentes que tenham a mesma menção qualitativa, relevam
consecutivamente as avaliações obtidas nos parâmetros «Realização das actividades lectivas» e
«Relação pedagógica com os alunos».

Como se verifica, todos os procedimentos que professores e avaliadores terão que


desenvolver irão determinar a "arrumação" dos professores em cinco classes -
Excelente, Muito Bom, Bom, Regular e Insuficiente. Sob o pretexto de uma avaliação
do desempenho procura-se distribuir os professores em classes, de acordo com as quais
se permitirá a sua progressão na carreira, se determinará a sua estagnação, ou até o seu
despedimento. É a história da cenoura e do burro. No caso em que o burro não for
suficientemente lesto a correr atrás da cenoura, ameaça-se com a vergastada do
despedimento.
Só que este procedimento não garante que os alunos venham a aprender mais e melhor.
Em primeiro lugar porque não fica garantida melhor formação profissional para os
professores só com a aplicação deste diploma; em segundo lugar porque nada garante
que um professor a quem não se renova o contrato seja substituído por outro mais
competente, até porque o novo docente ainda terá que passar por um período probatório
para determinar se está ou não apto para o desempenho das funções.

Isto leva-nos à substância da questão. As organizações são realidades complexas em que


a eficiência dos processos e a eficácia na obtenção dos resultados não dependem de um
só factor.
As escolas são organizações de uma complexidade ainda maior. Porque os processos
que determinam os seus resultados dependem de muito factores como são as decisões de
um conselho de administração (assembleia de escola/conselho geral), ou a qualidade da
gestão quotidiana das políticas definidas, ou as expectativas dos seus alunos, dos pais e
da comunidade e não apenas a qualidade científica e profissional dos seus docentes.

Em resumo, podemos dizer que a avaliação dos professores é necessária como


componente da avaliação organizacional da Escola e não como forma de carimbar bons
e maus professores. Só haverá utilidade em medir o desempenho dos professores se isso
servir para determinar e corrigir os factores que os impedem de ensinar melhor. Tanto os
factores de ordem pessoal (formação de base e formação contínua) como os factores
organizacionais (qualidade das instalações e equipamentos escolares, qualidade da
gestão, qualidade da regulação local, da regulação intermédia e da regulação nacional da
educação).

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