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Índice

......................................................................................................................4

Introdução .....................................................................................................5

Conceitos essenciais......................................................................................6

Património Cultural.......................................................................................................6
Cultura.......................................................................................................................6
Património.................................................................................................................6
Identidade Cultural........................................................................................................7
Património cultural imaterial.........................................................................................7
Contextualização...........................................................................................8

Vindimas antigas.........................................................................................10

O “apalavrar”...............................................................................................................10
Trajes dos trabalhadores..............................................................................................10
As rogas.......................................................................................................................11
Alimentação ................................................................................................................12
Cantigas.......................................................................................................................12
Os Cestos.....................................................................................................................13
Lagaradas ....................................................................................................................13
Oferta do ramo.............................................................................................................15
Vindimas na actualidade.............................................................................17

Apalavrar vs empreiteiros ...........................................................................................17


Roupa de trabalho........................................................................................................17
Rogas actuais...............................................................................................................18
Alimentação................................................................................................................18
Cantigas.......................................................................................................................19
Cestos de vime vs cestos de plástico...........................................................................19
Lagaradas.....................................................................................................................21
Comparação.................................................................................................22

Conclusão ...................................................................................................24

Bibliografia .................................................................................................25
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Introdução

A formação da Região Demarcada do Douro ocorre já desde há vários séculos,


assumindo-se, no presente, como uma das mais belas paisagens mundiais, possuindo
mesmo a classificação de Património da Humanidade, e concorre actualmente para o
estatuto de Maravilha da Natureza.
Nos nossos dias, foi gerada a ideologia de que a região Duriense é somente
pura beleza, capaz de deslumbrar qualquer pessoa, ignorando-se, desta forma, o facto de
a actualidade ser resultado de muito suor, sangue e lágrimas por parte de tantos homens
durienses. Várias gerações foram trabalhando esta região ao longo dos séculos, com o
seu esforço e através das suas próprias mãos. A mão e a face do Homem Duriense é o
próprio rosto desta maravilhosa região. Muito esforço e dedicação foi necessária para
atingir a beleza paisagística actual. Este cenário torna-se, assim, o resultado de um
perfeito equilíbrio entre o binómio Homem - Natureza. A paisagem do Douro é cultural
e afirma-se como um tipo de paisagem viva e evolutiva com o passar do tempo.
Visto o Douro ser tão simples nas suas paisagens, mas ao mesmo tempo tão
complexo na forma como foi trabalhado, iremos abordar este tema focando as nossas
atenções, em particular, para a actividade das vindimas. Este trabalho encontra-se
dividido em duas grandes partes: numa primeira fase focamos as vindimas antigas e,
posteriormente as vindimas na actualidade. Explicadas e até mesmo recordadas, todas as
tradições que envolveram (e ainda envolvem) as vindimas, elaborando uma pequena
comparação, concluindo as diferenças constatáveis, entre estes dois tempos.

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Conceitos essenciais

Património Cultural

Cultura

Ao olhar para a expressão património cultural, inicialmente cabe-nos indagar:


“O que é cultura?”, “O que é património?”, conceitos cujo desenvolvimento é de
extrema utilidade para a compreensão da enorme diversidade cultural a ser preservada.
A origem etimológica da palavra cultura remonta ao final do século XVIII e
princípio do seguinte, do termo germânico Kultur, utilizado para simbolizar todos os
aspectos espirituais de uma comunidade, enquanto a palavra francesa Civilization
referia-se principalmente às realizações materiais de um povo. Ambos os termos foram
sintetizados por Edward Tylor no vocábulo inglês Culture que “tomado no seu sentido
etnográfico é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis,
costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como
membro de uma sociedade”.
Ao longo da história, a palavra “cultura” variou de conceito em função de
escolas de pensamento, da evolução da sociedade ou das diversas épocas, assim como
da sua aplicação a um ou outro campo de estudo, sendo que, as tentativas de delimitá-la
conceitualmente não têm chegado a avanços significativos.

Património

O património, por sua vez, é uma bela e antiga palavra que estava, ligada às
estruturas familiares, económicas e jurídicas de uma sociedade estável, enraizada no
tempo e no espaço. Requalificada por diversos adjectivos (genético, natural, histórico,
etc...) que fizeram dela um conceito nómada. Nos dias de hoje, este conceito segue uma
trajectória diferente.
Designa um bem destinado ao usufruto de uma comunidade, constituído pela
acumulação contínua de uma diversidade de objectos que se congregam pelo seu
passado comum: obras e obras-primas das belas artes e das artes aplicadas, trabalhos e

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produtos de todos os saberes. Numa sociedade mutante, constantemente transformada
pela mobilidade, a noção de património remete a uma instituição e a uma mentalidade.
A institucionalização do património nasce no final do século XVIII, com a visão
moderna de história e de cidade. É na época das Luzes que o património histórico,
constituído pelas antiguidades, tem uma renovação iconográfica e conceitual.

Identidade Cultural
A identidade cultural caracteriza as pessoas pelo modo de agir, de falar, é
como se as “rotulasse” a partir dos modos específicos da sua cultura. A cultura é fruto
da miscigenação de diferentes povos que introduziram os seus hábitos e costumes, com
o contacto de uma cultura e outra, podendo gerar uma cultura ainda mais diferenciada e
variada.
A identidade cultural move os sentimentos, os valores, o folclore e uma
infinidade de itens impregnados nas mais variadas sociedades do mundo, apresentando-
se como o reflexo da convivência humana.

Património cultural imaterial


Representa um conjunto de elementos ou expressões da cultura tradicional,
que uma comunidade considera parte da sua identidade colectiva, que preservam para as
gerações futuras, reconhecendo como parte integrante do seu património cultural.
Os saberes, os modos de agir e fazer, formas de expressão, celebrações e
festas, danças e jogos populares, lendas, músicas, costumes, rituais, práticas sociais -
por vezes relacionadas com a natureza – a língua, conhecimentos e aptidões, a
gastronomia, os pregões, a medicina tradicional, os instrumentos, objectos, artefactos e
espaços culturais, as tradições orais, o artesanato tradicional e mesmo os próprios
ofícios típicos ou tradicionais, constituem-se como uma herança cultural.
Todos estes elementos são utilizados pelo Homem para sobreviver unido
enquanto sociedade, sendo por isso necessária a transmissão, para que a sua
sobrevivência, e se possível a sua proliferação, seja assegurada.

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Contextualização

A origem do nome Régua produziu diversas correntes de opinião: se para uns


historiadores o nome da cidade deriva de “vila regula”-casa de campo romana – visto ter
sido invadida e posteriormente habitada por romanos e bárbaros, para outros, pode ter
surgido de “regra”, em alusão ao direito de os descendentes herdarem as terras dos seus
antepassados, baseando-se esta teoria na doação de terras feita pelo Conde D. Henrique
a D. Hugo, no ano de 1903 que, por sua vez, doou a D. Egas Moniz. Assim, “regra”
originaria a palavra “Régoa” que, mais tarde viria a transformar-se em “Régua”. Muitas
outras teorias foram avançadas sobre este assunto e, como não existiu consenso,
nenhuma possui total aprovação. Da mesma forma que entre os historiadores não existiu
unanimidade em relação à palavra Régua, também a proveniência da palavra Peso deu
origem a enormes divergências. As correntes mais válidas incidem sobre a possibilidade
de derivar do lugar onde as mercadorias eram pesadas e cobrados os impostos, ou na
probabilidade de o nome ter surgido de “Penso”, lugar onde os animais de transporte
eram alimentados ou pensados.
O Peso da Régua é, actualmente uma cidade moderna, facto que se deve
sobretudo à produção do conceituado vinho da região, que se iniciou na época
pombalina com a criação da Companhia Geral das Vinhas do Alto Douro, em 1956.
Podemos considerar a produção vinícola como sendo o grande motor para a nomeação
desta região como Património Mundial.
O reconhecimento desta região como Duriense, data aproximadamente 400
anos, aquando da invasão de um número elevado de pessoas que se deslocaram até aqui
para trabalharem as terras como forma de sustento. A região foi-se alargando e a criação
de vinhas aumentou. Actualmente o concelho do Peso da Régua abrange 96,12 km² de
área, com 17 492 habitantes. Actualmente é frequente o pensamento de que o Douro se
resume á sua beleza natural, mas é um facto que a construção da região tal e qual a
conhecemos, é obra de um trabalho enorme e sobre-humano, onde até algumas vidas
foram perdidas.
A altura do ano em que esta região recebe mais visitantes é, sem dúvida, na
época das vindimas (final de Agosto até Outubro). O concelho é invadido por turistas
que desejam participar nesta actividade tão fascinante.

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As videiras estão prontas a dar os seus frutos aos trabalhadores, que durante
horas a fio enfrentam o tórrido calor e as oscilações dos terrenos Durienses. Ao longo
dos tempos as tradições foram-se alterando e perdendo, mas a dedicação e o esforço do
Homem Duriense continua patente nos seus trabalhos.

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Vindimas antigas
As primeiras vindimas na Região Duriense eram revestidas de diversas
tradições: desde o “apalavrar” da população das aldeias por parte do feitor, até às tão
célebres “lagaradas”, verificando-se esta época como uma das mais desejadas e envolta
de uma enorme festa.

O “apalavrar”
Em tempos passados, antes de a vindima começar o dono das vinhas ou, por
vezes, o feitor da quinta, ia até às aldeias vizinhas para apalavrar os habitantes, a fim
de, conseguir trabalhadores para vindimarem as suas terras. Homens, mulheres e até
crianças, eram convidados para se deslocarem até às propriedades do Senhor e
permanecer aí até as vindimas acabarem. As poucas horas que tinham para dormir, eram
nos velhos cardenhos junto aos lagares ou aos armazéns. Trabalhavam cerca de 12 horas
sob um sol tórrido seguido de lagaradas pela noite dentro.

Trajes dos trabalhadores


As vestes das pessoas que participavam na vindima possuíam características
tradicionais e variavam consoante a função desempenhada, deste modo existiam os
seguintes trajes:

• Homem do cesto1 – As calças utilizadas eram de cotim, camisa lisa aos


quadrados ou às riscas, sem colarinho. Botas grossas em sola cardada
ou alpercatas. Tinha um carapuço tipo saco, normalmente em
serapilheira, para que o mosto não estragasse a roupa, bem como um
adereço denominado “cabeçada”, que tinha como função equilibrar os
cestos às costas do Homem pelas íngremes encostas do Douro. Para se
equilibrar ao logo dos caminhos era também utilizada uma vara.

1
Consultar anexo 1

10
• Homem da pousa (do lagar) – Usava ceroulas arregaçadas ate ao meio
da coxa e camisa às riscas. Em alguns casos vestia calças velhas
cortadas por cima dos joelhos. Utilizava também um boné ou boina
preta. Antes de entrar no lagar usavam socos, abertos atrás.
• Mulher vindimadeira2– Trajava saia de roda ate ao tornozelo, blusa e
avental. Em alguns casos usava colete às riscas ou de fazenda. A blusa
era metida por dentro da saia, com lastro na cinta. Como adorno
utilizava um lenço sem franja, de lã ou às riscas. Utilizava chinelas,
socos ou alpercatas, com meias de algodão. Estas vestes eram
igualmente utilizadas pela cozinheira e pela rapariga responsável pelo
transporte da alimentação dos trabalhadores.

As rogas

Em Setembro os homens deixam as eiras da Terra Fria e descem, em rogas, a


escadaria do lagar de xisto. Cantam, dançam e trabalham. Depois sobem. E daí a
pouco há sol engarrafado a embebedar os quatro cantos do Mundo.

Torga in Portugal (Um Reino Maravilhoso – Trás-os-Montes).

A chegada dos trabalhadores às terras prontas a serem vindimadas era feita em


animadas rogas, onde homens e mulheres cantavam e faziam uso de instrumentos
típicos da região: bombos, ferrinhos, acordeões e concertinas.
As mulheres traziam um cesto, à cabeça, com a sua roupa, merenda e a cesta
para onde cortavam as uvas, no braço. Por sua vez, os homens traziam uma trouxa e um
sachinho para segurarem o cesto vindimo. Quando chegavam a casa dos patrões, faziam
uma grande roda e começavam a cantar dando as vivas ao patrão, ao feitor e ao rogador.
No fim, o patrão, dava de beber a todo o pessoal, apelidado de mata-bicho – bagaço
com açúcar – e um naco de broa de milho e centeio

2
Consultar anexo 2

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Entre os homens existia um grupo, que através da ajuda dos já referidos
instrumentos típicos, tentavam alegrar a vindima, apesar de serem igualmente
responsáveis pelo transporte dos cestos. Entre os homens, existia um que tinha um
assobio com o qual orientava o passo dos mesmos, pois andavam em fila e com o passo
certo.

Alimentação
Ao longo de um dia de trabalho, que normalmente consistia entre 10 a 16 horas,
o patrão das propriedades fornecia a alimentação aos trabalhadores, desde as
vindimadeiras aos homens dos cestos. Era normalmente distribuída por três refeições: o
almoço, o jantar e a ceia.
Ao almoço, correspondente ao pequeno-almoço, era oferecido normalmente aos
homens dos cestos, uma tigela com batatas cozidas e uma posta de bacalhau frito.
Enquanto que aos vindimadores era fornecida uma tigela de sopa e uma sardinha. No
jantar, equivalente ao nosso almoço, era servido a todos os trabalhadores o mesmo:
podia variar entre arroz, batatas e frango; arroz de feijão com peixe frito; massa de
bacalhau, entre outros. Esta refeição verificava-se rica em hidratos de carbono, para dar
energia aos trabalhadores. A última refeição não era partilhada por todos, ou seja,
apenas os homens que iam pisar as uvas noite dentro, teriam direito à ceia.
O pão, caso os trabalhadores desejassem, teria de ser trazido pelos próprios, pois
o patrão apenas fornecia o vinho.
A má confecção e a escassez de géneros alimentícios, faziam destas comidas um
tipo de alimentação que, pelo aspecto e cheiro, mais parecia ração destinada aos
animais.

Cantigas
Para alegrar este trabalho, considerado por muitos como um esforço sobre-
humano, as vindimadeiras entoavam cantigas tradicionais, geralmente relacionadas com
o amor ou com as próprias vindimas. A mais ouvida e também mais conhecida, cantada
ainda na actualidade, dá pelo nome de “Fui ao Douro às Vindimas”3. Outras como
3
Consultar anexo 3

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“Chora a Bideirinha”, “Não se me dá que vindimem”, “A Videirinha” e “Videira” ,
também eram cantadas durante dias a fio no tórrido calor de Setembro.
A maior parte das canções, cantadas pelas vindimadeiras, tinham o amor pelo
sexo masculino explícito nas suas cantigas, mesmo sendo o tema principal as vindimas
ou os trabalhos nas vinhas. Também eram cantadas músicas que, naquele tempo,
estavam em moda.

Os Cestos
Os grandes cestos de vindima em vime, são um dos produtos mais típicos da
Região Demarcada do Douro, mais propriamente das vindimas, visto representarem o
esforço e árduo trabalho que caracterizavam o trabalho sobre-humano que era exigido
nas vindimas no Douro. As melhores varas de castanho, para a produção de cestos
vindimos, eram provenientes das Beiras e de Trás-os-Montes, sendo que a sua qualidade
definia a longevidade do cesto. Um vime para os cestos demorava cerca de duas horas a
fazer, a madeira tinha que ser tratada e trabalhada de uma maneira muito própria, onde
primeiramente decorria o corte, em seguida a madeira era rachada para ser posta a secar,
para posteriormente ser humedecida, com o objectivo de ser mais flexível e fácil de
manobrar sem quebrar. A melhor época para cortar a madeira era durante o mês de
Abril e por vezes no mês de Agosto.
Estes cestos foram utilizados durante varias décadas para o transporte de uvas,
durante a vindima, sendo que a sua capacidade era geralmente de 70kg, por isso,
podemos tentar calcular o esforço efectuado pelo Homem Duriense no transporte destes
enormes cestos com uvas. Estes cestos vindimos eram a única forma de fazer chegar aos
lagares as uvas cortadas nos íngremes e inacessíveis socalcos e patamares na região
duriense. Devido á sua importância, tornaram-se portanto num símbolo desta linda
região.

Lagaradas
As lagaradas4 constituíam-se como a parte festiva do dia de vindima,
ocorrendo no período nocturno, nos lagares. Começavam cerca das 20 horas e
4
Consultar anexo 4

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prolongavam-se pela noite dentro, isto depois de um dia esgotante de trabalho sob o
tórrido e esgotante sol, que banhava os rostos de suor dos trabalhadores nas quintas.
Os homens responsáveis por esta tarefa, retiravam as botas e os seus meiotes,
arregaçando as ceroulas enquanto passavam os pés por água para entrar no lagar.
Devido ao frio, muitas vezes bebiam aguardente para aquecer não só o corpo, como
também para ganhar força e aquecer a alma -como muitas vezes é ouvido - para a
cansativa tarefa que iriam desempenhar. Existia o mandante, que era o homem que
definia o ritmo da lagarada e que comandava os outros, que respondia perante o caseiro,
e que geralmente era o homem mais velho ou o que mais experiência detivesse.
Abraçavam-se uns aos outros e moviam-se ao mesmo ritmo para que a lagarada fosse
bem realizada. Ao chegar ao fim do lagar, davam meia volta e voltavam para trás,
sempre no mesmo ritmo. Após algumas voltas, o mandante proferia o grito de
“Liberdade”, ao que os homens respondiam com uma salva de palmas, porque
constituía um momento de descanso para eles. Aproveitavam para limpar o suor e
dirigiam-se à beira do lagar, onde o caseiro tinha uma travessa com uma posta de
bacalhau para cada elemento, acompanhada de um pouco de água-pé para dar energia
aos humildes homens. Após comida a posta de bacalhau, era hora de voltar ao trabalho e
de chegar o homem da concertina e restantes elementos para animarem a lagarada,
porque só podiam começar a tocar após o, já referido, grito de “Liberdade”. E é então
que entram as mulheres e crianças, para tornar a lagarada uma bela festa e animar o
árduo trabalho dos homens que pisam as uvas.
Após os homens pisarem bem as uvas e o vinho se encontrar bem mexido, o
caseiro media o grau do vinho para aferir a sua qualidade. Por vezes o patrão visitava
também a lagarada para saudar os seus trabalhadores e marcar presença na festa. Mas
não pudemos esquecer que esta “festa” era realizada no final de um dia de esgotante
trabalho, carregando os cestos vindimos de 70kg de uvas para os lagares sob calor
intenso e terrenos sinuosos, tornando isto como uma nota de enaltecimento às
qualidades da humilde gente das vindimas Durienses.

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Oferta do ramo
No último dia de vindimas, quando as forças pareciam estar no fim, ainda
existia ânimo e energia, por parte dos trabalhadores, para a última festa que envolvia
esta actividade Duriense: a oferenda do ramo ao (s) patrão (ões) da quinta.
A rapariga mais "jeitosa" da roga era incumbida de ir entregar o ramo. Junto
iam escritos uns versos como forma de agradecimento ao patrão pela hospitalidade. Este
dava dinheiro para dividir por todos os trabalhadores, ou oferecia um lanche para todos.
Depois cantava-se e bebia-se vinho generoso. Durante esta faina o ar transbordava de
alegria e cantigas.
O ramo podia ter diversas formas, sendo o mais usual, o que se apresentava
com duas canas em cruz com efeitos de papel ou seda, flores e dois cachos de uvas (um
branco e um preto).

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Vindimas na actualidade

As tradições que faziam das vindimas uma festa com enorme alegria no fim do
trabalho realizado, têm sido esquecidas, diminuindo a alegria deste lindo processo que é
vindimar. Costumes como as rogas, que visavam alegrar o trabalho tão doloroso de
dezenas de trabalhadores, as lagaradas, as refeições servidas aos trabalhadores, entre
tantas outras tradições, têm-se perdido ao longo dos tempos.
Já não é conferida importância aos rituais porque, tal como os tempos
mudaram, os valores mudaram igualmente, sendo que, aquilo que actualmente tem mais
importância, é descobrir qual o processo que permite mais lucro, ignorando as tradições,
tradições essas que produziram a imagem reconhecida de um povo, o povo Duriense.

Apalavrar vs empreiteiros
Há uns anos que os feitores das quintas, ou os próprios proprietários, deixaram
de ir às aldeias vizinhas apalavrar a população para ajudarem no corte das uvas.
Actualmente essa tarefa compete aos empreiteiros, que têm uma equipa de trabalhadores
já contratados e oferecem os seus préstimos aos proprietários.
Os donos das quintas, na sua maioria, vivem nas grandes cidades, como é o caso
do Porto, e deixam a quinta à responsabilidade do caseiro durante o ano. As pessoas
contratadas pelos empreiteiros são as que exigirem menos dinheiro, sendo que nos dias
que correm, já homens de leste realizam as vindimas em terras do Douro porque, como
sabemos, sujeitam-se a condições que actualmente os portugueses, orgulhosos, não se
admitem.

Roupa de trabalho
Actualmente é facilmente constatável que já não existem trajes de trabalho na
vindima, ou seja, os trajes típicos deixaram de ser utilizados, e foram substituídos por
roupa velha de cada pessoa, que sirva para usar especificamente para um trabalho árduo
e sujo. Não existe uma roupa específica para vindimar sendo que, cada pessoa usa as
roupas que acha mais cómodas e apropriadas.

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Rogas actuais
A evolução da humanidade, produziu também nesta linda tradição efeitos
negativos, ou seja, a sua extinção. Podemos verificar que na actualidade não existe
rogas nas quintas Durienses, o que retirou a alegria e a especificidade da festa que
antigamente se verificava nas vindimas desta região. Através da evolução do ser
humano, foram inventados os rádios, e mais recentemente os leitores de cds, os mp3,
entre outros aparelhos que foram substituindo as cantigas das rogas. Desta forma, os
trabalhadores utilizam um rádio ou outro aparelho que lhes permita distrair. As rogas
foram desaparecendo, porque a rapaziada nova também não confere grande interesse em
andar a cantar musicas tradicionais pelas vindimas.
Mais uma tradição de relevante beleza que foi extinta pela evolução do
conhecimento por parte da humanidade e por desinteresse relativamente à causa da
preservação deste rico e belo património imaterial.

Alimentação
A alimentação, também um aspecto tão típico e tradicional desta linda região,
sofreu enormes alterações com o passar do tempo. Como muitas vezes se ouve, mudam-
se os tempos, mudam-se as vontades, e hoje em dia as refeições já não são idênticas
àquelas que eram fornecidas aos trabalhadores antigamente. Podemos verificar que o
tipo de comida que é fornecida já é melhor, sendo alvo de melhores condições na sua
confecção, porque hoje em dia as pessoas exigem, também, melhor alimentação e
renumeração para se sujeitarem a determinados trabalhos. A alimentação fornecida
pelos patrões já não se verifica. Os trabalhadores trazem as suas próprias refeições ou,
em caso de serem contratados por empreiteiros, estes, por vezes, tratam de alimentar os
seus operários. Desta forma, aquelas comidas típicas ricas em hidratos de carbono
deixaram também elas de ser servidas nas tradicionais cabaças e a alimentação possui
mais qualidade e variedade.

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Cantigas
Como já referimos, em relação as rogas, as cantigas começaram também elas a
deixar de existir, porque as pessoas que trabalham não constituem um grupo tão unido
como antigamente. Repare-se que até imigrantes trabalham nas nossas quintas. Tudo
isto contribui para o desaparecimento de alguma mística na faina das vindimas.
Antigamente as mulheres eram as responsáveis pelo corte as uvas, e eram elas que
cantavam e que produziam juntamente com as rogas, a alegria durante as vindimas,
sendo que actualmente, como já é indiferente o sexo ou idade para o processo do corte,
os homens não se encontram dispostos a cantar enquanto cortam as uvas. Por isso com o
passar dos anos, com o corte na transmissão das cantigas para as gerações que
provinham, as cantigas tradicionais das vindimas foram desaparecendo e caindo no
esquecimento.

Cestos de vime vs cestos de plástico


Os cestos de vime, que constituem um símbolo da região, e do esforço do
Homem Duriense perante as adversidades do doloroso processo que caracterizava as
vindimas, foram sendo substituídos, com o passar do tempo, por baldes ou caixas de
plástico. Esta mudança deve-se ao facto de as caixas de plástico serem mais higiénicas,
porque são mais facilmente laváveis. Outra vantagem inerente a esta mudança, baseia-se
no facto de as caixas terem um peso muito inferior que os cestos de vime: enquanto que
antigamente o homem que carregava os cestos tinha de suportar um peso na ordem dos
70kg, actualmente as caixas de plástico não ultrapassam os 30kg. Esta é, sem dúvida,
uma mudança positiva. Após a entrada em vigor desta lei, os cestos de vime deixaram
de ser utilizados, e o transporte é hoje completamente efectuado através dos baldes
plastificados ou das caixas.
Os cestos de vime, actualmente, apenas são usados como decoração ou em
exposições.

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Lagaradas
O serviço do Homem no lagar foi também ele alterado com a evolução do ser humano e
da própria tecnologia. Neste caso concreto o triturador substituiu em grande parte o
trabalho árduo do Homem Duriense no lagar após o dia de trabalho na quinta.
Por isso nas lagaradas já não se encontra tanta gente, nem as pessoas responsáveis pela
sua animação, o que originou a perda da festa e do misticismo em volta das célebres
lagaradas.
Hoje em dia as lagaradas vivem de grupos em excursão que se dirigem às
quintas para participar, muitas vezes grupos estrangeiros, que têm curiosidade em
observar como é feito o delicioso “néctar” do vinho do porto.
Podemos então constatar que a evolução, conseguiu penetrar fundo no coração desta
maravilhosa tradição e fazê-la extinguir-se sob os moldes em que antigamente se
desenrolava.

Maquinaria

Actualmente o serviço do homem no processo das vindimas foi alterado,


através da maquinaria, do triturador por exemplo, dos tractores, das carrinhas, ou seja,
o trabalho do Homem foi facilitado pelo uso das máquinas. O trabalho é feito por
máquinas e, por isso, não é necessária a presença de tantos homens para a realização de
processos como o transporte e o pisar das uvas no lagar, deixando de existir
inevitavelmente também, as pessoas responsáveis por alegrar o árduo trabalho que se
desenvolvia antigamente. Por isso, foram perdidas maravilhosas tradições festivas do
processo das vindimas, devido á evolução tecnológica que afectou o referido processo.
Actualmente os proprietários das quintas optam pelo uso de máquinas, que
substituem o esforço dos homens, por ser um método mais rápido e mais lucrativo, visto
ser esse o grande interesse por parte dos proprietários…o lucro.

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Comparação
As tradições que faziam deste doloroso processo uma festa com enorme
alegria no fim do trabalho realizado, tem sido esquecidas e isso vai diminuindo a alegria
deste lindo processo que é vindimar.
As vindimas são um espectáculo imperdível, que toda gente deveria ter direito
a aceder, mas infelizmente isso não é possível e existem muitas pessoas que não
conhecem e ignoram as vindimas, produzindo uma quebra na importância desta região,
porque apesar da cidade da Régua (aquela que estamos a estudar mais
pormenorizadamente) ter mais pontos de interesse, sabemos que ela se encontra no
estado actual devido ao justo reconhecimento internacional da qualidade ao nível da
produção do vinho, nomeadamente o vinho do porto.
Actualmente temos conhecimento que estrangeiros pagam, para puderem
participar neste processo das vindimas e deslocam-se à nossa região para participar e
observar, enquanto os portugueses não se interessam por ele, não lhe conferem a justa
importância, e assim, o que outrora fora uma identidade cultural, vai-se apagando e
deixando de existir. Se a mentalidade não for sendo incutida nos descendentes,
provavelmente daqui a uns anos não se efectuará a vindima através da participação do
Homem Duriense, nem Português, mas sim de maquinaria e talvez de povo estrangeiro.
As vindimas na actualidade são efectuadas de uma forma mais mecânica, exigindo
muito menos esforço ao trabalhador e talvez aumentando ainda mais a qualidade do
vinho produzido, porque sabemos que ele foi sofrendo evoluções ao longo dos anos e
séculos, mas retirou alguma da festividade inerente a esta grande festa, que acaba por
ser o processo da vindima nesta região.
Os donos das quintas, nos dias que correm, já quase não as visitam, e talvez
por isso, se perderam algumas tradições, como por exemplo, a oferenda de um ramo por
parte dos trabalhadores ao patrão no fim da vindima, demonstrando não só o objectivo
cumprido, como também a vontade de receber a merecida renumeração pelo seu árduo
trabalho.
Antigamente existiam tarefas de acordo com o sexo ou idade da pessoa,
actualmente isso não possui relevância porque seja jovem ou mais velho, mulher ou
homem, toda a gente corta as uvas e se necessário carrega cestos. Os cestos, as
lagaradas, que deram origem á cultura e identidade de um povo deixaram de existir, por

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exemplo, no caso dos cestos encontra-se actualmente proibido a utilização de cestos
com capacidade superior a 30kg, quando antigamente como sabemos os homens
transportavam nas suas costas cestos com 70kg, sendo que em vez de serem fabricados
em vime, são plastificados. Os sistemas mecânicos efectuam a tarefa dos homens que
pisavam as uvas nas lagaradas pelas noites dentro, eliminando uma das tradições mais
lindas e alvo de maior festa durante o período das vindimas. Os tractores e máquinas
substituíram em grande parte o trabalho manual do Homem, não só nas lagaradas, como
já foi referido, mas por exemplo também na eliminação da utilização dos carros de
bois5, em detrimento do uso de tractores.
Os horários actualmente são melhores, visto que não se trabalha de sol a sol
como antigamente se encontravam sujeitos os trabalhadores, e a alimentação aumentou
de qualidade, bem como a renumeração inerente, porque hoje em dia é pequena a
percentagem de pessoas que se submete a trabalhos tão forçados. Mas muitas mais
coisas deixaram de existir, as rogas e as cantigas tão tradicionais foram substituídas ou
por rádios, ou pelo silêncio de pessoas às quais a música não cativa tanto interesse, a
roupa de trabalho já não é específica como antigamente. Enfim, o trabalho desenvolvido
actualmente é menos duro sem dúvida, mas muito menos festivo e tradicional….

5
Consultar anexo 5

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Conclusão

Algum sangue, muitas lágrimas e imenso suor… foi assim que a Região do
Douro nasceu e se tornou no paraíso terrestre que é nos dias de hoje, como se verifica
ao longo do nosso trabalho. Autênticos jardins suspensos que, aliados ao rio, por entre
montanhas e vales, vai escavando a sua própria rota.
Actualmente a região do Douro em geral, Peso da Régua em particular, é um
lugar evoluído, moderno, que fornece aos seus habitantes as condições necessárias para
viverem, pois existe uma grande preocupação, por partes dos autarcas, em combater a
desertificação do Douro.
Com a chegada dos primeiros raios de sol da Primavera, chegam também os
primeiros cruzeiros às águas do rio Douro e, com eles, centenas de turistas atentos e
curiosos que se querem deixar envolver no misticismo que cobre esta região. Mas o
turismo intensifica-se aquando dos primeiros corte de uvas. São as vindimas o ponto
mais alto da região. Todos querem participar nesta actividade, como vimos, tão
dolorosa, e até pagam para poderem passar um dia nos socalcos do Douro a vindimar.
Este tipo de promoção, entre outras actividades, como idas ao Museu, passeios
pela região, devem ser apoiados e colocados em prática pois, só assim, o Douro poderá
conseguir passar de uma simples paisagem bonita a visitar, a uma região interactiva,
moderna, onde o binómio Homem – Terra funcione na totalidade.

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Bibliografia

Livros:

• ROSEIRA Luís, Uma Vida Pelo Douro, 1992 Edições ASA


• BARRETO António, Douro, 1993, Edições INAPA S.A.
• CAMPOS Maria Emília, O Douro – Músicas Danças e Cantares
• Câmara Municipal de Lamego, As Vozes do Douro, Antologia dos textos
Durienses, Tomo 2
• CARVALHO, Manuel, Ilha de Xisto, Guia do Douro e do Vinho do Porto, 2006
Edição Pedra da Lua

Sites:

• http://www.lusowine.com/displayarticle174.html
• http://sol.sapo.pt/blogs/oserrano/archive/2007/05/17/Respingos-do-Douro-
_2D00_-A-Gastronomia-na-Vindima.aspx
• http://terradouro.blogspot.com/search/label/Festas%20do%20Douro
• http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=4&id_news=295267
• http://www.douronet.pt/default.asp?id=57&mnu=57
• http://www.eb1-favaios-n2.rcts.pt/trabalhos.html
• http://sol.sapo.pt/blogs/oserrano/archive/2007/05/17/Respingos-do-Douro-
_2D00_-A-Gastronomia-na-Vindima.aspx
• http://www.noticiasdevilareal.com/noticias/index.php?
action=getDetalhe&id=2255
• http://sol.sapo.pt/blogs/oserrano/archive/2007/05/11/Respingos-do-Douro-
_2D00_-A-lagarada.aspx
• http://sonoridades.catus.net/Documentos/musicatradicionalportuguesa.htm
• http://www.unesco.pt/cgi-bin/cultura/temas/cul_tema.php?t=9
• http://olhares.aeiou.pt/antes_das_vindimas_tambem_se_lavam_os_cestos/foto793
713.html
• http://terradouro.blogspot.com/2007_10_01_archive.html

25
• http://olhares.aeiou.pt/vindimas_2006___douro/foto853384.html
• http://cardoso-penajoia.blogspot.com/2007/07/cestos-da-vindima-os-cestos-de-
vindima.html
• http://www.douronet.pt/default.asp?id=57&mnu=57
• http://www.eb1-paco-amarante.rcts.pt/trabalhos1.htm

Artigos de Revistas:

• Revista de Vinhos, pp.104 a 108, Nº 179, Outubro 2004

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Anexo 1

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Anexo 2

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Anexo 3

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Chora a bideirinha
ela chora, chora,
pelo seu amore
que se bai imbora.
(...)
pelo seu amore, que se bai embarcare.
E:
Chora a bideira,
deixa-a chorare
chora a bideira
pois quer amare.
Chora a bideira
não chora não,
chora a bideira
meu coração.

34
Ó bideira, dá-me um gacho,
ó silba, dá-me uma amora,
ai ai ai, amor dá-me o teu retrato,
ai ai ai, quero bê-lo a toda a hora.

35
Lá vai o comboio, lá vai
Lá vai ele à’sobiar,
Lá vai o meu rico amor
Par’à vida militar.

Par’á vida militar,


Par´áquela triste sina
Lá vai o comboio, lá vai
Leva pressa na subida.

Leva pressa na subida,


Leva pressa no andar,
Lá vai o meu rico amor
Par’à vida militar.

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Deitei meus olhos ao rio,
Para ver teu brio.
Estavas a lavar.

Lava, lava, lavadeira


Estás na brincadeira,
Estás a namorar.

Deitei meus olhos ao rio,


Para ver teu brio.
Estavas a torcer.

Torce, torce, lavadeira


Tua roupa branca,
Que se pode ver.

Deitei meus olhos ao ar,


Para ver de que lado
O sol estav’à dar.

Para nesse lindo arame,


Estender tua roupa,
Para a ver secar.

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Anexo 4

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Anexo 5

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Anexo 6

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