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1.

Introdução

O presente trabalho intitulado „‟ noções sobre sexualidade entre os crentes do islão ”


constitui uma mini-etnografia enquadrada na disciplina de Cultura e sexualidade pelo
qual procuramos perceber quais as noções que os crentes da religião islâmica possuem
acerca da sexualidade.

Partimos de princípio que coexiste diversas instâncias que transmitem valores, normas
podendo ser a família, a religião, a televisão e estas por sua vez definem os padrões a
seguir consoante um quadro de expectativas que é transmitida por via da socialização.

Na mesma ordem de ideias a sexualidade sendo um campo ou valor estruturante das


relações sociais atravessa pelos diversos campos ou agencias socializadoras, cada uma
com os seus códigos específicos na maneira de como se deve olhar a sexualidade.

Importa referir que apesar de cada agência socializador possuir códigos específicos de
leitura sobre a realidade não quer dizer que estes campos diferentes de socialização não
se comunicam entre si, pois há um a interferência de valores das diversas instancias que
moldam os indivíduos na maneira de olhar o campo da sexualidade.

Neste sentido iremos analisar a maneira como os actores sociais crentes do islão olham
a sexualidade tomando em conta que estes alternam por vários campos de socialização
que na perspectiva de Bordieu seria o habitus como forma de demonstração de que as
posturas sexuais não são estáticas mas sim estão em constante construção e
reconstrução.

As construções ou reconstruções sobre as noções ou percepções sobre a sexualidade


decorrem devido ao vasto campo de interacções a que os indivíduos atravessam como a
escola, a rua, a televisão, a família, a religião entre outros.

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2.Problema de Estudo

O nosso problema de estudo passa por uma análise de discurso laborado por Sheik-
Amenudim Muhammad1 que no dia referente a entrada ao período de Ramadão
construíu um discurso que falava sobre a postura que os muçulmanos possuem e devem
possuir relativamente a praticas ligadas a sexualidade, restrições alimentares, a
frequência de alguns espaços. Retiramos um dos trechos do discurso no que refere a
sexualidade, ora vejamos:

“ …Os muçulmanos foram desde a época do profeta Muhammad indivíduos que


normalmente respeitaram os códigos prescritos no alcorão quando se fala sobre o sexo
é algo reservado aos casados e nunca se faz fora do casamento e agora que os nossos
crentes que estão a celebrar a entrada ao Jejum estão a demonstrar a forte capacidade
de perpetuar os nossos valores transmitidos pelo profeta Muhammad”.

Fazendo uma analise ao discurso do representante do representante da religião islâmica


pudemos depreender que ele olha os crentes do islão como sendo actores isolados que
somente se relacionam entre si entanto que muçulmanos.

Ainda por um lado olha estes actores como pessoas passivas mero receptores dos
valores transmitidos pela religião islâmica e não olham estes indivíduos como seres que
fazem escolhas que lhes convêm consoante o capital social que estes mesmos crentes
incorporam devido aos diversos campos de interacção que atravessa.

Na mesma linha de pensamento encontramos Mossuz- Lavau (2005), refere que dentro
de uma mesma religião de origem as pessoas podem possuir condutas ou ter noções
diferenciadas sobre o campo da sexualidade, onde as praticas sexuais é concebido
consoante as interacções que os indivíduos estabelecem em diversos campos social.

1
Discurso laborado no âmbito da entrada ao período da entrada ao jejum pelos crentes, como forma de
alerta durante o período sagrado também conhecido por mês de Ramadão. O mesmo encontra-se
disponível no Jornal “A Verdade” do dia 22/08/09.

3
Partindo do pressuposto que os actores sociais se diferenciam dentro de um determinado
contexto sociocultural, devido ao habitus2 que incorporam ou seja partindo de princípio
que a incorporação de normas ou valores ligados a sexualidade são feitas de forma
selectiva pelos actores formulamos a seguinte questão de partida:

Que noções ou percepções os jovens muçulmanos possuem sobre a sexualidade


tomando em conta que estes entanto que actores sociais permeiam pelas diversas
instancias de socialização que retratam sobre a sexualidade?

3.Relevância do estudo

O campo da sexualidade constitui hoje em dia um debate recorrente nas diversas áreas
de saber tais como a sociologia, medicina entre outras e a Antropologia não fica alheia
aos debates e a mesma segundo Mott (s/d) possui quadros analíticos que interpretam
questões intrínsecas a sexualidade tais como o naturalismo, construtivismo entre outros.

A escolha do presente tema deve-se pelo facto de a sexualidade ser um campo bastante
vasto onde diversas instâncias de socialização concorrem para inculcar aos indivíduos
posturas sobre como os indivíduos se devem relacionar e que esses mesmos indivíduos
não se fazem valer apenas de um quadro normativo para expressão sexualidade.

A escolha do islão para efectuar o presente trabalho deve-se pelo facto de este campo
possuir um tipo ideal de ver a questão da sexualidade e que este mesmo quadro é
incorporado de formas diferenciadas pelos crentes onde uns seguem prescritivamente o
quadro ideológico da religião e outros apropriam e recriam.

O Presente trabalho vai ser concebido pelo facto de olharmos o campo da sexualidade
como um campo dinâmico e fluido, onde a representação social sobre o mesmo não é
uniforme e que os actores sociais vão incorporando de formas diversificadas, devido aos
diversos campos que o mesmo frequenta.

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Segundo Bourdieu (1985), são disposições ou conhecimento adquirido que um agente social tem
dentro de um campo específico, que varia de individuo á individuo devido ao capital que detêm
podendo ele ser económico, cultural, simbólico.

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4.Objectivos

4.1.Objectivo Geral

 Compreender as noções ou percepções individuais dos crentes do islão sobre a


sexualidade.

4.2.Objectivos específicos

 Identificar a partir de discursos as percepções, sentimentos e experiencias que se


tem sobre a sexualidade.

 Descrever a maneira como os crentes do islão incorporam e interpretam a


sexualidade.

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5.Quadro conceptual

Segundo Rocher (1986) a socialização é um processo pelo qual ao longo da vida a


pessoa humana aprende e interioriza os elementos sócio-culturais do seu meio integra-
os na estrutura da sua personalidade sob a influência de experiências de agentes sociais
significativos e se adapta assim ao ambiente social em que se deve viver.
Para Berger & Luckman (1985) analisam a socialização como construção social,
vivência singular, seja na família, escola, trabalho, religião ou em qualquer instituição.
Segundo os mesmos autores “a socialização nunca é total, nem esta jamais acabada”.
O conceito de socialização de Berger & Luckman (1985) será o ideal para o trabalho em
alusão pelo facto de olhar a socialização como um processo dinâmico que esta em
constante (re) construção demonstra claramente que o indivíduo por estar em contacto
com os diversos campos sociais vai incorporando parcialmente os valores de cada
instância socializadora.

Fazendo analise a definição acima proposta acima pudemos depreender que as diversas
instancias socializadoras concorrem para moldar um individuo no que refere aos
comportamentos sexuais se olharmos a socialização entanto que um projecto inacabado.

Sexualidade

Foucault (1998) olha a sexualidade entanto que experiência historicamente singular


composto por três dimensões que são nomeadamente a formação dos saberes sobre a
sexualidade, os sistemas de poder que regulam a prática da sexualidade (Religião,
Estado e Família) e as formas segundo as quais os indivíduos podem e devem
reconhecer-se como sujeitos dessa sexualidade.
Casimiro et all (2002), também nos apresenta uma definição de sexualidade que será
usada no nosso trabalho. Para as autoras, “a sexualidade é um campo de vida social que
se insere num sistema de crenças, valores, representações sociais, sexo, organização
familiar e de subsistência que só fazem sentido quando referidos a essa globalidade de
disposições sociais”.

Ambos conceitos serão usados consoante os objectivos do trabalho, mas o conceito que
bastante se enquadra no nosso trabalho é o da Casimiro et all pelo facto de a
sexualidade possuir uma complexidade e a maneira como os crentes do Islão vivem este
6
campo encontra-se para além da dimensão religiosa pois aqui existem um conjunto de
disposições sociais pela qual os indivíduos vão accionando consoante os contexto
devido a sua capacidade de criar ou recriar os valores.

Percepção.

Segundo Chaui (1996) define a percepção como sendo a forma como os actores sociais
dão significado as coisas, valores tomando em conta as normas e categorias de um
determinado contexto.

Na perspectiva de Lobo (2004) concebe a percepção como a representação do mundo


exterior tomando em conta as impressões sensíveis, pois é através da percepção que os
indivíduos apreendem e interpretam de forma coerente o mundo.

A definição correspondente ao trabalho é a do Lobo, pelo facto de o presente trabalho


procurar compreender as diversas formas de como os crentes do Islão interiorizam e
interpretam o mundo do que lhes rodeia pelo facto daqueles permutarem em diversos
campos sociais3.

3
Segundo Bordieu (1985) campo ou espaço social é um lugar que decorrem um conjunto de relações de
poder no qual os agentes procuram de uma maneira se enquadrar para tirar ganhos e passa por um
conhecimento relativamente profundo de cada um dos campos.

7
6.Enquadramento teórico

O quadro teórico que será usado no presente trabalho será a teoria construtivista que
olha os comportamentos sexuais como um construto social onde os actores sociais
fazem ou assumem diferentes formas de interpretar a sexualidade apesar de haver um
quadro normativo que guia as acções dos indivíduos sendo neste caso particular a
religião islâmica.

A perspectiva construcionista segundo Mott (s/d) apela por uma não universalização de
atitudes ou comportamentos sexuais, olhando mais para as relações sociais correntes do
que as regras prescritas em códigos normativos impostos pela sociedade.

Ainda Mott (s/d) o modelo construtivista apela por uma análise dos significados
subjectivos que são atribuídos aos comportamentos sexuais como forma de evitar
generalizações de atitudes sexuais ou transposição de modelos de uma forma
descontextualizada.

Outro pormenor ressaltado pelo autor acima deve-se pelo facto de fazer uma distinção
entre as esferas do comportamentos e a ideologia e neste trabalho seria fazer a distinção
entre o comportamento dos indivíduos sobre a sexualidade na relação que estabelece
com o quadro ideológico religioso.

Como forma de reforçar esta teoria no presente trabalho será trazido ao debate a noção
de habitus na perspectiva de Bordieu (1985) como forma de demonstração de que as
pessoas incorporam as lógicas de uma estrutura diferentemente consoante o capital
social que vai adquirindo durante a vida pois os crentes passam a frequentar diversas
instâncias socializadoras que retratam a sexualidade.

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7.Revisão de Literatura

7.1. A (re) construção do campo da Sexualidade.

No presente trabalho pretende-se discutir a maneira como foi concebida a sexualidade


desde a idade média ate quase ao período correspondente a actualidade e para nossa
discussão traremos vários autores discutem a temática em alusão.

Segundo Foucault (2001) olha a sexualidade numa perspectiva de relações de poder


onde são produzidas discursos como forma de ordenação do mundo e refere ainda que
no início do século XVII a sexualidade era mapeada através de repressões, interdições
onde as relações de sexo e poder eram intrínsecas e a bíblia era a base de discursos e o
sexo era concebido apenas para a reprodução da espécie humana.

Na mesma linha de pensamento Bozon (2004) refere que a sexualidade era confundida
com a procriação ou seja o sexo era confundido com sexualidade pois o campo da
sexualidade era visto como um espaço somente de reprodução biológica e este era feito
somente no casamento havendo deste modo um conjunto de regras onde não eram
permitidos jogos de linguagem relativo ao sexo e a exposição da nudez era vista como
transgressão dos princípios morais.

Sobre a nudez Bataille (1980), refere que na época medieval na civilização ocidental
era algo proibido porque encontrava-se na esfera do sagrado pois revelava a essência
do homem e carregava consigo um valor simbólico na relação homem e Deus, e essa
exposição somente deveria ser exposta de uma forma sacralizada que seria na copula
entre marido e mulher.
Durante as épocas subsequentes assiste-se a uma mudança de discursos sobre a
sexualidade segundo Bozon (2004), onde novos elementos começaram a ser
valorizados que antes não eram tomados em conta como a escolha de parceiros com
base no amor e afecto e o sexo já não eram vistos como um elemento ligado
directamente com a reprodução mas sim houve um olhar separado entre os dois
campos.
Giddens (1993) refere que na actualidade a separação existente entre o campo da
reprodução e do sexo evidenciou-se mais na actualidade havendo uma cisão aquando da
introdução de tecnologias da biomedicina tais como a fecundação in-vitro.

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Giddens chamou isto de sexualidade plástica pelo facto de já poder haver reprodução
sem haver cruzamento de genitais a sexualidade autonomizou-se relativamente ao sexo.

Bozon corroborando com Giddens refere que a sexualidade ganhou novos contornos
passando a ser já um elemento fluido e dinâmico com a revolução sexual contraceptiva
que decorreu na década de 1960 onde as praticas sexuais nos imaginários dos indivíduos
não se limitava somente a reprodução biológica, mas sim o sexo poderia decorrer mas a
gravidez, pois elementos preventivos de gravidez tais como pílulas, preservativos,
esterilização tanto masculina e feminina passou a limitar a relação directa existente
sobre a noção ligada sexualidade e reprodução que desde a época medieval foi
alimentando o imaginário das pessoas.

Importa referir que ao trazermos a discussão acima exposta que está é a história
universal da sexualidade mas sim constitui apenas uma história do ocidente cristão e
usamos neste trabalho para procurarmos perceber as dinâmicas sociais inerentes ao
campo da sexualidade.

7.2.Concepções de sexualidade no Islão.

O islão entanto que um sistema cultural tem a sua forma de olhar a sexualidade e a sua
ideologia encontra-se transposto no alcorão onde foi criado um conjunto de normas
prescritas de como se deve manifestar os comportamentos sexuais.

A sexualidade no alcorão é concebida para a procriação e constitui um valor


estruturante dos laços matrimoniais passando a desempenhar um papel importante de
coesão dentro do espaço familiar e esta informação está patente no alcorão, nos escritos
laborados pelo profeta Sunnan Abu Dawud 11:2166.

Na mesma linha de pensamento encontramos no 210ª Surata que olha a pratica ou


manifestação da sexualidade como sendo restringindo no espaço familiar (matrimónio)
onde menciona o seguinte “…Mas mesmo o natural e lícito exercício do sexo é
restringido aos limites do casamento, sob o qual os direitos de ambas as partes são
devidamente regulamentados e mantidos”.
No alcorão também encontramos a uma naturalização ou especialização dos sexos na
58ª Surata mencionando que “ Se a distinção dos sexos, que é uma distinção fornecida

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pela natureza, não conta em questões espirituais, muito menos contarão, certamente, as
distinções artificiais…”

A partir da citação em epígrafe pode-se depreender que o alcorão entanto que um


código estruturante das relações não reconhece outras formas de atitude ou condutas que
não esteja estruturada numa relação binária (homem/mulher) e segundo os escritos os
comportamentos que se encontram fora destas esferas são consideradas artificiais
(profanas) pelo facto de violar as regras impostas pela religião.

O islão através do alcorão criou um conjunto de normas de proibicoes ligadas ao campo


da sexualidade tais como a prostituicao que segundo Sahi- Al- Bhukari 3:34:439 „‟ allah
proíbe o ganho proveniente da prostituicao e do advinho pois as pessoas que assim se
comportam são como cães” e refere ainda no mesmo trecho que o adultério é um ultraje
e um mau caminho e o indivíduo que cometer tal acção vai pagar com cem golpes de
chicote e as mulheres serão apedrejadas ate á morte.

No 300ª surata assistimos de uma forma generalizada que a violação dos códigos
prescritos passa por uma punição dos infratores dos códigos que passa pelo acoites,
apedrejamento entre outras formas de punição e ainda importa referir que a aplicação
das penas varia consoante a natureza ou gravidade da infracção cometida.

Durante uma rápida exploração ao alcorão encontramos um conjunto de regras e


restrições sobre a sexualidade que se fossem colocadas neste espaço poderia levar muito
tempo a apresenta-lo, mas o que importa reter é que existe no islão um código prescrito
sobre a sexualidade no islão e o presente trabalho não vai se cingir apenas aos códigos
atrás referenciados, mas sim o trabalho é procurar perceber como os jovens crentes do
islão incorporam a lógica do islão tomando em conta que existem outros códigos de
como olhar processos ligados a sexualidade como a família, a televisão entre outros.

Segundo Boudhiba (2000), a sexualidade no islão encontra-se descrito encontra-se


ancorada no alcorão, neste sentido este constitui o único guia das práticas relacionadas
as condutas sexuais dos indivíduos pertencentes a este universo simbólico.

Ainda este autor refere que o campo da sexualidade no islão por encontrar-se plasmado
no alcorão que possui uma longa tradição neste sentido dificilmente os crentes deste
grupo se corrompe com os valores de outros povos existentes. O seu ethos cultural de
carácter fechado não permite uma comunicabilidade com os diversos actores.
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O autor supracitado apresenta o que deveria ser o islão e não diz o que está acontecer
pois ele reduz a cultura islâmica e os seus actores como sendo algo fechado que não se
relacionam com outros povos e fazem trocas ou empréstimos culturais.

Nas palavras de Laraia (2001) Boudhiba incorre a perspectiva determinista cultural na


lógica funcionalista de olhar culturas como sendo estanques cujos actores são meros
reprodutores da cultura, na mesma linha de pensamento de Bayart (2005) diz que não
devemos olhar as culturas como entidades fechadas entanto que um corpus de
representações estáveis mas sim como um espaço de fluidez e dinâmicas sociais onde os
actores não incorporam da mesma maneira os valores propostos pela estrutura social.

A sexualidade sendo uma forma de expressão de identidade cultural e potencialmente


contextual necessita de ser olhado numa perspectiva crítica proposta por Bayart, Laraia,
e Bordieu.

12
8.Metodologia

A metodologia adoptada para a realização deste trabalho será de carácter


eminentemente qualitativa pelo facto de segundo Minayo (1987) a componente
qualitativa aprofundar o mundo dos significados das acções e relações humanas.

E com o método qualitativo que vai nos ajudar, a compreender os discursos e decifrar
jogos de linguagem que vão se encontrar nas entrevistas semi-estruturadas, pois se
formos a ver Minayo refere que a análise qualitativa completa interpreta o conteúdo dos
discursos ou fala quotidiana dentro de um quadro de referência, permitindo que se
aprofunde o olhar sobre a realidade, decifrando deste modo o que se encontra num
estado de latência total.

Como forma de materializar a abordagem qualitativa, usaremos técnicas como


entrevistas para puder colher informações no campo tais como as experiências,
percepções sobre os comportamentos sexuais.

A técnica a ser empregue para puder identificar as opiniões, sentimentos, do nosso


objecto de estudo serão as entrevistas semi-estruturadas, que nos dizeres de Richardson
(1985) são entrevistas não estruturadas, e para este autor este tipo de entrevistas são
profundas em colectar dados pelo facto da sua estrutura permitir o entrevistado dizer a
sua maneira mas detalhadamente como este olha as coisas que o rodeia e permite que a
informação flua de uma maneira que o entrevistado exprima um conjunto de
sentimentos sobre o determinado fenómeno que acompanha o seu quotidiano.

A escolha do grupo jovem deveu-se por razoes de exequibilidade pelo facto de haver
um tabu, no que refere a sexualidade no campo religioso, onde os mais velhos4 vêem
como uma esfera do sagrado, e que a sua profanação passa pela conversa informal que
as pessoas tem.

O grupo alvo do nosso trabalho são dois jovens moradores do bairro central crentes e
praticantes do Islão, um deles vive na residência universitária n°1 da UEM
comummente chamada por Self e o outro vive no com os Pais numa vivenda e ambos

4
Pais, Sheiks da mesquita.

13
rezam na mesquita Masjid Taqwa cita na avenida Eduardo Mondlane e estes cumprem
os cincos rituais diários de reza plasmados no alcorão.

O presente estudo foi concebido em dois momentos sequenciados a mencionar:

 Consulta bibliográfica sobre o que de uma forma directa ou indirecta discutem a


temática em alusão.

 Segundo momento compreendeu a recolha de dados que ocorreu na cidade de


Maputo durante dois dias, fez-se uma mini-etnografia trabalhando-se com 2
crentes.

9.Resultados e Discussão dos dados recolhidos.

O trabalho será apresentado consoante os objectivos específicos pelos quais nos levou
ao campo, pelo facto destes constituírem o guia ou norteador da presente mini-
etnografia.
Quanto as entrevistas, durante o trabalho de campo notamos que o formulário das
questões não foi seguido como fora modelado pelo simples facto das perguntas serem
interligadas e por vezes 2 ou mais perguntas eram respondidas numa só.
Na mesma ordem de ideias a apresentação dos dados será baseada através dos
objectivos que cerceiam o presente trabalho.
Os crentes são nomeadamente Rassul Jalilo e Ridwan Nacapa ambos estudantes de
ensino superior e pertencentes a instituições diferentes a mencionar UEM5 e ISCTEM6
respectivamente.

9.1.Discursos sobre percepções que os crentes do islão tem sobre a sexualidade.

No presente sub-capitulo pretendemos perceber a maneira como as pessoas percebem a


sexualidade ou elementos inerentes ao campo da sexualidade.

5
Significa esta sigla Universidade Eduardo Mondlane.
6
Significa a presente sigla Instituto superior de Ciências e Tecnologias de Moçambique.

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Na mesma ordem de ideias Ridwan durante a entrevista mencionou o seguinte „‟ Na
minha humilde opinião visto que tou com um perito da sexualidade (risos), a
sexualidade seria mais ou menos algo que esta fora do sexo e engloba muitas coisas,
jogos de sedução, amor, paixão e na minha opinião sexualidade é mais que fazer
sexo……” ainda o entrevistado refere que ” a primeira vez que ouvi sobre sexualidade
não me lembro, mas acho que ouvi provavelmente com amigos quando era criança
quando fazíamos asneiras7 ou talvez tenha visto em programas de televisão que de uma
forma directa ou indirecta falam de sexualidade tais como novelas ou publicidades mas
não me lembro tão bem… mas o que importa é que tenho algum conhecimento sobre
sexo, pois o que aconteceu na madrassa8 é que não nos permitiam conhecer
profundamente apenas nos proíbiam em fazer ou pensar manter relações intimas com
uma mozubia9 e só nos diziam e dizem que só depois de a malta casar é que podemos
fazer… é lixada essa cena serio… de você ver outros gajos acelerados nessa cena de
sexo’’.
Fazendo um mapeamento em torno dos discursos acima proferidos podemos depreender
que os campos de socialização que transmitem saberes sobre a sexualidade a este crente
é bastante vasto na medida em que ele descreve vários espaços onde aprendeu sobre o
que é a sexualidade e a religião apenas reprimia os desejos ou vontades de saber sobre a
sexualidade se seguirmos o pensamento de Foulcaut. Pegando Bordieu (1985) o
presente autor demonstra que este autor atravessou pelos diversos campos que abordam
a sexualidade e essa possibilidade de permear em diversos campos fornece-lhe um
conjunto de saberes pelos quais usa para nortear a sua vivencia.

9.2. Discursos relativo a experiencias individuais ligada a sexualidade.

Rassul nos seus dizeres refere que “ eu agora tenho muitas damas que nem consigo
gerir, não esta fácil, mas sei que é errado fazer isso pelo simples facto de a minha

7
Neste contexto refere-se as relações sexuais que são estabelecidas entre crianças que normalmente é
olhada pelos adultos como brincadeira de mau gosto.
8
Centros ou Escolas onde se ensinam doutrinas islamicas e normalmente a base de ensino constitue o
alcorao.
9
Calao de origem Angolana que normalmente se usa para designar a uma mulher e como evidencia
encontramos no filme angolano intitulado Assalto em Luanda.

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religião ser contra essas cenas de namorar, fazer sexo a não ser se for casado ou a
família tem que saber…tas a ver? E que as religiões não olham pra essas cenas de
bradas e se ve é no sentido de dizer temos que fazer bons amigos…..sempre a mesma
ladainha’’ ainda refere “ pra ser sincero eu comecei a namorar já há cinco, de
principio não era nada fácil eu fazia tudo nas calmas e nas escondidas pra ninguém me
censurar e fazia isso pra não me chamarem de matreco pelas outras pessoas e já tive
mandar abortar uma das minhas damas… mas agora já peguei a onda tou mais
relaxado principalmente por estar longe dos meus Pais ok10…’’.

Fazendo uma analise ao trecho da entrevista acima exposto pudemos perceber que há
um reconhecimento de que haja um quadro normativo religioso relativo ao
comportamentos sexuais mas os indivíduos não se apropriam de uma forma directa pelo
facto de o individuo fazer escolhas consoante os seus desejos mas sempre condicionada
pela estrutura vigente.
Como forma de consubstancia ora vejamos Ridwan dizendo que “lá na mesquita
ensinam-nos muita coisa boa, mas a vida nos proporciona outras coisas que não
coadunam com a religião e nos gostamos”. Ainda refere que “ as experiencias que
tenho com a minha parceira é nice pelo facto de nos partilharmos emoções, como
carícias, conversas e sexo entre outros pormenores que fundam uma relação”.

9.3.Informações relativas a incorporação e interpretação do quadro normativo


islâmico.
No presente subcapítulo pretendemos descrever a forma como esses actores entanto que
crentes vivem a sua sexualidade dentro do quadro do islão.
Ridwan e Jalilo foram unânimes em referir nas entrevistas anteriores mencionadas
reconhecem de que há um quadro normativo que cerceia a vida deste mas eles não se
limitam apenas a vivenciar o modelo imposto pela religião os mesmos aprendem de
outras pessoas ou instituições sociais que debatem com questões ligadas a sexualidade.
Se formos a ver estes actores não incorporam de forma acrítica os valores da
sexualidade, eles vão (re) construindo consoante os campos de sociabilidade que cada
um destes autores frequenta.

10
Agora residente na residência universitária.

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10.Consideracoes Finais
Pretendemos crer que com o presente trabalho intitulado noções sobre sexualidade entre
os crentes do islão tenhamos conseguido atingir os objectivos plasmados pela mini-
etnografia apesar dos constragimentos que a natureza da pesquisa passou pois o que
senti durante a minha fase de exploração no sentido de construir grupos alvos senti que
a maneira como as pessoas tratam este assunto constitui um tabu.

De acordo com a análise dos resultados obtidos pudemos depreender que a construção
da sexualidade dos crentes do islão não se baseia somente no quadro normativo que é a
religião ou seja várias instâncias de socialização concorrem no sentido de moldar os
indivíduos na maneira de pensar e agir na sexualidade.

Importa referir ainda que estes actores sociais vivem numa constante tensão entre o
indivíduo (crente com as percepções individuais) e sociedade (islão com a consciência
colectiva), na medida em que as pessoas procuram fazer escolhas no sentido fulminar a
tensão entre os dois campos.

Finalmente pudemos depreender que os indivíduos não são meros receptáculos daquilo
o que a cultura os fornece ele faz escolhas consoantes os contextos em que se inserem
no sentido de encontrar enquadramento possível dentro de cada campo social.

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11.Bibliografia

BATAILLE, Georges (1980). O erotismo: o proibido e a transgressão. Lisboa: Moraes


editores.

BERGUER, Peter; Luckuman Thomas (1985). A construção social da realidade.


Petrópolis: Vozes.

BOUHDIBA, Abdelwahab (2000). A Sexualidade no Islã: A visão Islamica da


Sexualidade. Editora Globo.

BOURDIEU, Pierre. (1985).‟ the social space and the génesis of groups” in Theory and
Society, Vol 14, nr.6 723-744.

BOZON, Michel. 2004. Sociologia da Sexualidade. Rio de Janeiro: FGV Editora, pp,
13-59.

CHAUI, Marilena (1996). Convite a Filosofia. São Paulo. Atlas Editora.

FOULCAUT, Michel (1976). The history of sexuality: Na Introduction (The will to


knowledge). Rio de Janeiro: Editora Graal.

GIDDENS, Anthony. (1993) A transformação da intimidade: sexualidade, amor e


erotismo nas sociedades modernas. São Paulo: UNESP.

LARAIA, Roques B.(2001). Cultura: Um conceito Antropológico. XIV Ed, Rio de


Janeiro: Jorge Zahar.

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