Este estudo investigou como três professores de educação física em uma escola pública utilizam recursos materiais alternativos devido à falta de equipamentos. Através de entrevistas e observações de aulas, descobriu-se que os professores constroem seus próprios materiais para superar a escassez de recursos, sugerindo transformações na prática docente diante de limitações.
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A UTILIZAÇÃO DE RECURSOS MATERIAIS ALTERNATIVOS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA.docx
Este estudo investigou como três professores de educação física em uma escola pública utilizam recursos materiais alternativos devido à falta de equipamentos. Através de entrevistas e observações de aulas, descobriu-se que os professores constroem seus próprios materiais para superar a escassez de recursos, sugerindo transformações na prática docente diante de limitações.
Este estudo investigou como três professores de educação física em uma escola pública utilizam recursos materiais alternativos devido à falta de equipamentos. Através de entrevistas e observações de aulas, descobriu-se que os professores constroem seus próprios materiais para superar a escassez de recursos, sugerindo transformações na prática docente diante de limitações.
Luciane Lima Sebastio* Elisabete dos Santos Freire** RESUMO A falta de recursos materiais um grande problema enfrentado pelos professores de Educao Fsica da rede pblica de ensino. Os objetivos deste estudo foram (1) compreender a organizao e a utilizao desses recursos nas aulas de Educao Fsica e (2) identificar os materiais alternativos utilizados pelos professores. Neste estudo de caso, entrevistamos e observamos aulas de trs professores de uma mesma escola. Foi possvel verificar que os trs professores utilizam a construo de materiais alternativos para solucionar o problema da escassez de recursos materiais, resultados que expressam uma realidade incomum na Educao Fsica, sugerindo transformaes na interveno docente. PALAVRAS-CHAVE: Ensino da Educao Fsica; Recursos Materiais Alternativos; Planejamento Educacional. INTRODUO A atividade de planejar se apresenta na vida de todos. Programa-se o dia, organiza-se a agenda de compromissos, planeja-se uma viagem, a compra de um imvel, a carreira profissional. Nessas prticas de planejamento, buscamos a concretizao de nossos objetivos. Em diversas atividades, fundamental que o planejamento seja sistemtico para tornar-se mais eficiente. Assim, complementamos a imaginao e os planos mentais, colocando no papel tudo aquilo que pretendemos fazer. Quando nos voltamos para o mbito escolar, a necessidade de planejar torna-se mais evidente, pois o trabalho pedaggico envolve a elaborao de um projeto. Para Machado (1997), ao elaborar um projeto definimos todo o caminho que a escola pretende percorrer para atingir seu objetivo. Ao projetar, so propostas tambm algumas solues para possveis problemas futuros, ou seja, h uma antecipao dos acontecimentos. Nesta perspectiva, a palavra projeto significa algo lanado para frente, designando tanto aquilo que se quer realizar como o que ser feito para atingir tal meta. Quando nos referimos educao, palavra associada ao ato de conduzir a finalidades socialmente prefiguradas, presumimos a existncia de projetos coletivos. Silva (2000) enfatiza que esses projetos so determinados pela busca da globalidade, com a superao de expectativas pessoais em prol do coletivo, gerando uma responsabilidade mtua entre os participantes. com o auxlio do projeto que se constri os planejamentos especficos de cada componente do currculo escolar. O planejamento educacional envolve um processo de reflexo e deciso, constitudo por vrias etapas para permitir maior controle e organizao dos acontecimentos. Pode tornar- se mais eficiente quando elaborado em conjunto com outros professores, pois evita repeties ou ausncia de determinada temtica. Alm disso, como salienta Vasconcellos (1995), o envolvimento dos alunos tornar o processo de ensino-aprendizagem mais significativo. A definio dos espaos e materiais que sero utilizados em cada aula, tarefa cotidiana de todos os professores, independente de sua rea de conhecimento, constitui uma das etapas do planejamento. Na Educao Fsica, os recursos materiais merecem uma ateno destacada diante das especificidades existentes. As aulas, normalmente realizadas em ambiente aberto como quadras e ptios, esto sujeitas s variaes metereolgicas. Essa inconstncia, por vezes utilizada para justificar o cancelamento de aulas e atividades, s evidencia a relevncia do planejamento ainda mais elaborado, pois nele sero previstas atividades e espaos alternativos, caso haja a impossibilidade da utilizao dos meios convencionais, como a quadra. Ao analisar livros ou propostas pedaggicas existentes na rea, percebe-se o destaque atribudo aos recursos materiais. Freire (1997), por exemplo, descreve atividades nas quais a utilizao de bolas, arcos, bastes, cordas e at mesmo materiais feitos com garrafas e copos descartveis, so indispensveis para proporcionar ao aluno a troca com o meio e atribuio de novos significados ao brinquedo. importante que esses materiais sejam diversificados quanto ao peso, tipo, cor e tamanho, exigindo do aluno constantes adaptaes e ajustamentos de conhecimentos previamente adquiridos. Batista (2003) tambm exemplifica, na descrio de algumas atividades, a utilizao de diversos materiais para trabalhar equilbrio, habilidades com a bola e atividades em grupo. Venncio e Carreiro (2005) descrevem atividades como ginstica artstica e lutas, nas quais a utilizao de materiais indispensvel. Dessa forma, podemos afirmar que o professor ter mais condies para realizar um trabalho de melhor qualidade, se a escola em que atua lhe oferecer espaos e recursos materiais adequados. Na realidade social brasileira, h uma quantidade grande de escolas, principalmente pblicas, que no apresentam espao fsico adequado ou quantidade suficiente de materiais. Segundo Soler (2003), o espao existente para as aulas de Educao Fsica, muitas vezes se resume a ptios e salas de aula. Essa m distribuio do espao fsico acontece logo na construo de uma unidade escolar, quando no est entre as prioridades a alocao de espao prprio para as aulas de Educao Fsica (BATISTA, 2003). Estas observaes podem ser complementadas com dados apresentados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), os quais indicavam que, em 2006, das 159.016 escolas de Ensino Fundamental no Brasil (pblicas e particulares), apenas 44.763 possuam quadra poliesportiva (BRASIL, 2006), o que representava 28% do total, aproximadamente. Comparando com os indicadores de 1999, apresentados por Matos (2005), houve um crescimento no nmero de estabelecimentos de ensino que possuem quadras. No entanto, o crescimento ainda insuficiente. Diante dessa situao, muitos profissionais alegam que sem recursos materiais no h condies para a preparao e aplicao de aulas adequadas (SOLER, 2003) e frequentemente excluem determinadas atividades de seu programa de ensino (FREIRE, 1997). Pelo exposto, ao iniciar as atividades de estgio em escola da rede pblica de ensino na cidade de So Paulo, a expectativa existente era de encontrar um ambiente no qual a ausncia de recursos materiais fosse marcante. Acreditava-se tambm que essa situao pudesse ser utilizada pelos professores para justificar a elaborao de aulas menos diversificadas, a negligncia de determinados contedos, ou mesmo a falta de participao dos alunos nas atividades propostas.
Contudo, a realidade observada causou grande surpresa: havia uma professora que, diante da ausncia de materiais, procurava estratgias para superar as dificuldades, utilizando recursos alternativos. A professora confirmava as afirmaes de Bento (1998), para quem a falta de estrutura fsica e material no pode justificar o trabalho pedaggico descompromissado, pois, mesmo em condies relativamente simples, possvel aplicar boas aulas de Educao Fsica. Seria o comportamento da professora uma exceo? Ao estabelecer contato com dois outros professores de Educao Fsica da escola, a pergunta inicial foi respondida: eles tambm se utilizavam de materiais alternativos nas aulas. No entanto, outras dvidas surgiram. Qual a origem do comportamento desses professores? Quais os materiais utilizados? Como os materiais so construdos? A utilizao de recursos diferenciados resulta de um planejamento coletivo ou parte de iniciativas individuais? Partindo de todos esses questionamentos, o presente estudo teve como objetivos: Compreender como se organiza a utilizao de recursos materiais na prtica pedaggica da Educao Fsica, na escola apresentada; e Identificar os recursos materiais utilizados pelos professores durante as aulas. MTODOS A presente pesquisa do tipo descritivo seguiu uma abordagem qualitativa. O modelo adotado foi o estudo de caso, visando obter o mximo de informaes e permitir um conhecimento amplo e detalhado de evidncias da prtica do professor de Educao Fsica diante das possveis dificuldades que encontra com a escassez de recursos materiais. Apesar deste tipo de estudo no permitir a generalizao dos dados obtidos (GIL, 1999), consideramos adequado para o delineamento da pesquisa, pois a anlise dessa realidade especfica poderia trazer dados relevantes para o trabalho de outros profissionais da rea. A amostra no probabilstica e intencional foi restrita a trs professores de uma escola pblica estadual de Ensino Fundamental I, localizada no bairro de Perus, So Paulo, tendo populao de classe mdia em algumas regies e classe mdia baixa em outras. Para coleta de dados, utilizamos entrevista semi-estruturada, apoiada em roteiro com questes previamente elaboradas e observao assistemtica no participante, na qual o registro dos fatos aconteceu de maneira informal e espontnea, sendo o pesquisador um espectador (LAKATOS; MARCONI, 1999). Antes de iniciar a coleta de dados, uma carta de informao e um termo de consentimento foram entregues ao diretor de escola e aos sujeitos, para que tomassem conhecimento sobre os objetivos e procedimentos da pesquisa. Eles no s consentiram, como contriburam prontamente. Na entrevista e na observao, foram usados dispositivos mecnicos, aps consentimentos dos professores pesquisados. Durante a entrevista, o recurso do gravador de voz foi indispensvel para que nenhuma informao se perdesse, permitindo uma transcrio literal. Na observao, a mquina fotogrfica foi utilizada para o registro dos materiais.
As entrevistas foram realizadas na prpria escola. Os trs professores participantes so concursados, sendo um do sexo feminino, aqui denominado P1 e dois do sexo masculino, respectivamente P2 e P3. O P3 trabalha na escola selecionada h aproximadamente cinco anos, sendo o mais antigo entre os trs. O P1 e o P2 ingressaram no mesmo ano e atuam na escola h aproximadamente dois anos. Todos os entrevistados foram bastante receptivos e atenciosos, colocando-se disposio para outros questionamentos que pudessem surgir depois da entrevista. Desde o primeiro contato, o entrevistador seguiu as orientaes de Lakatos e Marconi (1999), mantendo uma conversa amistosa com o entrevistado, criando um ambiente agradvel e que permitisse respostas espontneas e naturais. Os dados coletados foram estudados, compilados e apresentados com a aplicao da tcnica de anlise de contedo, descrita por Trivios (1987). RESULTADOS E DISCUSSO As observaes aconteceram durante 18 meses, num total de 89 aulas observadas, como se apresenta na Tabela 1. Nela, as aulas esto separadas por professor e por srie. Verifica-se tambm que, em algumas turmas, nenhuma aula foi observada. Isso aconteceu porque P1 no responde por aulas para a 4 srie, P2 para a 3 srie e P3 para a 1 srie. Segundo P1, a diviso das aulas e sries acontece seguindo preferncias e disponibilidade de cada professor. Tabela 1: Aulas observadas, separadas por professor e srie. 1 Srie 2 Srie 3 Srie 4 Srie TOTAL P1 18 20 26 00 64 P2 03 03 00 05 11 P3 00 02 04 08 14 21 25 30 13 89
Durante a observao, os pesquisadores registraram os materiais utilizados pelos professores, bem como a estratgia de aplicao, enfatizando os materiais alternativos. No Quadro 1, os dados foram separados por professor e agrupados por srie, de acordo com o objetivo da atividade. Nesse quadro, os materiais alternativos aparecem em negrito. Srie Atividade / Objetivo Materiais P1 1 Fantasia Dramatizao Dana aparelho de som / cds / fitas cassete Manipulao Locomoo Equilbrio leno / saquinho de areia Jogos bexiga / dama / corda / colete / saquinho de areia / bola de meia / garrafas pet / bola de borracha / bola grande de e.v.a. / lenol Brincadeiras aparelho de som / arco / saquinhos de areia / bola de meia / coletes/ bola de borracha / leno / garrafa pet / corda / vai-e- vem / bexiga / saco de estopa / 2 Fantasia Dramatizao Dana aparelho de som / cds / fitas cassete Manipulao Locomoo Equilbrio colchonete Jogos colete / bola de borracha / placa de E.V.A. / saquinho de areia/ bola de meia / garrafa pet / damas Brincadeiras bolinha de gude / perna de pau / p de lata / raquetes de tnis, frescobol, plstico e cabide / bolinhas de tnis e frescobol / corda / bexiga Esporte bola de basquete / colete / cadeira / cone 3 Fantasia Dramatizao Dana aparelho de som / cds / fitas cassete Manipulao Locomoo leno Equilbrio Jogos placas de E.V.A. / garrafa pet / bola de borracha / saquinhos de areia / bola de meia / colete / corda / domin / damas Brincadeiras perna de pau / p de lata / corda / bolinha de gude Esporte bola de basquete / colete / cadeira / bola grande de E.V.A. /lenol P2 1 Manipulao Locomoo Equilbrio minitrampolim / pneus / arcos / colchonetes pequenos / barreirinhas / bolinhas de tnis / minigols / traves de equilbrio / colcho oficial de ginstica artstica / lousa e giz / atlas do corpo humano (esqueltico e muscular). 2 Brincadeiras pneu / colcho / corda 4 Manipulao Locomoo Equilbrio skate / bicicleta Jogos freesby / raquete de frescobol / bola de tnis / cone / colete / bola de futebol / bola de vlei (praia) / bola de basquete. P3 2 Brincadeiras colete / bola de basquete 3 Esporte colete / bola de vlei (praia) / bola de basquete 4 Esporte colete / cone / bola de basquete / bola de vlei (praia) / bola de futebol / arcos Quadro 1: Materiais utilizados nas aulas de acordo com o objetivo das atividades Para classificar o que seria considerado material alternativo, foram seguidos dois critrios: Construo e adaptao de equipamentos a partir de materiais reciclveis ou de baixo custo financeiro, para substituir outro material (oficial): O P2, utilizou pneus para substituir arcos ou como obstculos para a realizao de determinadas atividades. Alm disso, empregou materiais por ele construdos, como o minitrampolim, a barreirinha e a trave de equilbrio que fizeram parte de diferentes circuitos no decorrer das aulas. O minigol foi utilizado em jogo, no qual as crianas deveriam acertar o alvo, rolando bolinhas de tnis pelo cho. O P1 usou garrafas pet para a construo do vai-e-vem e para substituir os pinos no jogo de boliche e de tiro ao alvo. As bolas de meia serviram como munio nesta ltima atividade. Os saquinhos de areia auxiliaram no trabalho de fora, coordenao e em atividades como o jogo da velha humano e a amarelinha. Corrida de saco com saco de estopa, vlei cooperativo com lenol e bola de E.V.A. e Base 4 com as placas de E.V.A., tambm fizeram parte do hall de atividades deste professor. Para as atividades pega o rabo e sensoriais (estou em suas mos = olhos vendados), foram utilizados lenos ou tiras de tecido e, nas aulas livres, alm de alguns materiais j descritos, apareceram tambm perna de pau, p de lata e raquetes feitas com cabide de roupas (metal) e meia fina. Adaptao de outros materiais oficiais e/ou disponveis na escola: O P1 utilizou a cadeira como cesta no jogo de basquete, no qual um aluno ficava em p sobre a cadeira (localizada abaixo da cesta oficial quebrada) e ao receber a bola de basquete,sem deix-la cair, a equipe marcava ponto. Outra adaptao foi feita pelo P3, que utilizou a bola de vlei (praia) no jogo de handebol.
Das 89 aulas observadas, em 35 foi utilizado material alternativo; em 40, material oficial e, em apenas 14, no houve a manipulao de qualquer tipo de material. Estas 14 aulas foram aplicadas por P1, nas quais props brincadeiras cantadas e outras atividades, utilizando o prprio corpo do aluno para atingir o objetivo da aula, como proposto por Soler (2003). Percebemos maior frequncia na utilizao de materiais alternativos nas sries iniciais do Ensino Fundamental, talvez por existir, nesse perodo, maior preocupao com a diversidade de materiais no auxlio ao desenvolvimento da criana, como afirmam Batista (2003), Freire (1997), Soler (2003) e Santos (2004). Os autores ressaltam a necessidade de oferecer criana, nessa faixa etria, oportunidade para manipular diferentes objetos e transformar as experincias em smbolos, alm de proporcionar uma aula mais atraente para o aluno. importante lembrar tambm que a presena de material alternativo apresentada acima, no impede o uso de outros materiais oficiais, como o caso do P2 que utilizou bolas, raquetes, freesby, entre outros. Para obter mais detalhes sobre a utilizao dos materiais alternativos, realizou-se entrevista com os trs professores. Ao iniciar a entrevista perguntou-se se eles acreditavam que os recursos materiais existentes na escola eram suficientes e estavam em bom estado. Todos eles responderam negativamente, confirmando afirmao de Soler (2003), para quem as escolas pblicas raramente apresentam espao e material adequado para as aulas de Educao Fsica. Alm do P2 enfatizar que falta material, e os materiais que tem, alguns esto assim danificados, P1 e P3 disseram que a compra de materiais para as aulas de Educao Fsica no uma prioridade para a escola. Na segunda questo, os entrevistados deveriam dizer se utilizam materiais alternativos em suas aulas. Novamente houve uma unanimidade na resposta. Todos disseram que j utilizaram e continuam utilizando materiais alternativos. P1 afirma que compra alguns materiais e, como tambm trabalha em outra escola, troca equipamentos entre elas. P3 complementa, dizendo: so vrios brinquedos que a gente mesmo produz pra substituir aqueles que a gente no tem. Porm, estes materiais construdos no foram utilizados durante a observao das aulas deste ltimo professor.
Todos os recursos apresentados foram construdos a partir de materiais baratos ou reciclveis (sucata), comprovando afirmaes de Freire (1997), Soler (2003), Santos (2004), Batista (2003) e Venncio e Carreiro (2005). Enquanto P1 e P3 apenas citaram os materiais, P2 explicou como foi a construo, bem como a finalidade de seu uso. Alm disso, mostrou todos os materiais por ele citados, j que o acesso a eles estava facilitado, pois a entrevista foi realizada na sala de materiais. Os professores identificaram os meios de pesquisa utilizados para criar os materiais citados anteriormente. Percebe-se que a troca de ideias com outros profissionais e o uso da prpria criatividade para criar materiais que atendam s suas necessidades de contedo foram citadas por todos os professores. Soler (2003) enfatiza que essa criatividade importante para a construo de mais materiais a cada aula, pois a variedade torna o aprendizado da criana mais agradvel. A unanimidade tambm se confere atualizao em cursos e seminrios, pois P1 participa de cursos de orientaes tcnicas, P2 participou de seminrio em Universidade pblica e o P3 participa de grupo de estudos da diretoria de ensino, como destacado anteriormente. Confirma-se assim, a importncia da formao continuada na interveno docente (FILGUEIRAS, 2007).
interessante destacar que a televiso tem influncia sobre alguns professores para a criao de estratgias de aula e materiais alternativos. P1 afirma que se inspirou em programas de TV para criar jogos, como o chamado futebol intelectual, uma alternativa para os dias de chuva, sendo um jogo de perguntas e respostas. J o P3 se inspira em programas do canal educativo. Os trs professores declaram que no obtiveram qualquer auxlio para confeccionar os materiais utilizados. Porm, aos poucos aparecem, no discurso deles, informaes que contradizem parcialmente esta resposta. Por exemplo, P1 declara obter auxlio de alguns professores da escola, pois eles permitiram a utilizao de materiais que no mais necessitavam, principalmente a professora de Artes, como fica evidente na frase: [...] ento voc faz uns garimpos em algum lugar e voc acha o que no esto usando mais, a voc pega. O envolvimento dos alunos na construo dos materiais relatado pelo P2, sendo que a participao se resumiu confeco de uma fita adaptada. Os outros materiais, ele explica que construiu sozinho, pois como utiliza martelo, serrote, prego [], tem receio que os alunos se machuquem. Por sua vez, P3 afirma que, em 2006, os alunos ajudaram na elaborao do p de lata, raquete e bilboqu, com materiais que eles prprios trouxeram. E a percepo que o professor teve com essa prtica foi que: [...] quando eles fazem, eles do mais valor, quando voc traz, a maioria deles no d tanto valor, porque no uma coisa deles. Assim, esse professor confirma o que j haviam afirmado Freire (1997), Venncio e Carreiro (2005) sobre a importncia da participao dos alunos, tanto no planejamento, quanto nas atividades e construo de materiais. Mas, alm de estimular a construo desse valor destacado por P3, o envolvimento dos alunos na produo dos materiais a serem utilizados nas aulas pode ainda ser uma estratgia para a discusso de outros temas, como as mudanas ambientais e a necessidade de reciclagem do lixo produzido.
Considerando ainda que a Educao Fsica escolar deve ter como objetivo a preparao dos alunos para a utilizao autnoma de seu potencial motor (FREIRE; MARIZ DE OLIVEIRA, 2004), confeccionar material durante as aulas um recurso para que eles compreendam a necessidade de adaptao do ambiente para a realizao da prtica motora adequada s suas caractersticas e que, em seu percurso escolar, sejam capacitados para criar equipamentos alternativos, respeitando suas possibilidades e potencialidades. Perguntou-se aos professores se a cultura de construo de materiais foi iniciada por eles ou se j existia antes de ingressarem na escola. Com base no ano de admisso dos professores, percebe-se que h uma certa discrepncia nas respostas, j que os professores que iniciaram em 2006 (trs anos depois do P3), deram respostas divergentes. Enquanto P3 afirma que construiu essa cultura na escola, P2 afirma: Ns no tnhamos nem pneu aqui. A incerteza quanto ao uso de materiais alternativos por outros professores pode remeter hiptese de que a resposta mais fidedigna seja a do P1, ressaltando a ideia de que o P3, ao ingressar junto com os professores na poca, criou essa cultura de construo de materiais, que existe at hoje. De qualquer forma, a incerteza indcio de que eles no conhecem bem o trabalho realizado pelos colegas.
Eles afirmam tambm que iniciaram a construo de materiais antes de ingressarem na escola investigada. Com isso, anula-se a hiptese de que a cultura de construo de materiais tenha sido transmitida de um professor para o outro dentro dessa escola, pois eles j traziam consigo essa prtica. No entanto, possvel que a convivncia entre eles tenha alguma influncia, pois todos afirmam que se baseiam tambm em experincias de outros professores para elaborar seus materiais, como apresentado anteriormente. Os professores foram questionados sobre o que motivou a construo do primeiro material alternativo. A falta de materiais disponveis foi citada por todos os entrevistados. P3 acrescenta outros motivos, como as condies precrias dos materiais e o grande nmero de alunos. P1 explica que o problema nem sempre a carncia de material. Exemplifica ao afirmar ter trabalhado em escola privada que contava com bom nmero de equipamentos, mas que muitos deles eram inadequados s caractersticas dos estudantes das sries iniciais do Ensino Fundamental. P2 destaca ainda a necessidade de levar aos alunos estmulos diversificados.
Percebe-se ento que, para esses professores, a origem da prtica de construo de materiais alternativos foi a necessidade de encontrar instrumentos para realizar seu trabalho. Entretanto, essa necessidade se apresenta a inmeros professores de Educao Fsica, que tambm enfrentam a falta de recursos materiais apropriados para suas aulas, mas que no adotam as atitudes apresentadas pelos sujeitos desta pesquisa.
Assim, esse no pode ser o nico motivo para explicar os resultados verificados no estudo. Acredita-se que a principal motivao dos professores entrevistados seja o comprometimento com seu trabalho e com a formao continuada. O compromisso com a realizao de um trabalho de qualidade pode ser percebido no discurso do P2, apresentado abaixo: O ponto positivo foi poder ver as crianas desenvolverem uma habilidade de equilbrio, de uma forma que elas no estavam habituadas a fazer. Uma coisa pintar uma linha no cho e pedir para ela andar em cima, e outra coisa voc fazer em cima da trave, com uma distncia do cho. Ento nesse ponto, deu pra ver a evoluo, as crianas conseguiram desenvolver um pouquinho mais essa habilidade. J o compromisso com a formao continuada percebido quando se verifica que, como apresentado anteriormente, os trs participam de cursos ou grupos de estudo e valorizam a busca de novos conhecimentos. Identificam-se assim algumas competncias que caracterizam o professor bem sucedido, apresentadas por Galvo (2002). Quando questionados sobre a insero dos recursos materiais no planejamento de ensino, os professores enfatizam que h um plano geral, no qual so definidos temas e eventos comuns. Porm, a previso dos materiais a serem construdos ou utilizados no aparece nesse planejamento, nem nos planos de aula de cada professor. Percebe-se que a elaborao das aulas e a utilizao dos recursos materiais so pouco influenciadas pelo coletivo, partindo das iniciativas individuais. Parece que o planejamento elaborado no incio do ano serve apenas para cumprir uma etapa burocrtica, confirmando afirmaes de Vasconcellos (1995).
Para P1, a falta de material pode impedir o tratamento de alguns contedos durante as aulas. Ele afirma que deixou de abordar determinados temas e precisou improvisar em diversos momentos por no poder utilizar o espao mais adequado. J P2 e P3 acreditam que possvel abordar todas as temticas. Contudo, P2 salienta que, em algumas situaes, necessrio reorganizar o planejamento e cita um exemplo: ano passado, eu tive que trabalhar com ritmo, dana e a escola tem pouco aparelho de som disponvel, e a eu no tenho na minha casa e tive que esperar a professora terminar de usar. Encerrando a entrevista, constata-se que os professores reconhecem a necessidade da variabilidade de materiais para a faixa etria em que esto trabalhando e que, embora no acreditem contar com recursos financeiros e nem com a devida valorizao de seu trabalho por parte dos gestores da escola, no se incomodam em construir os materiais. Entendem que essa construo facilita o seu trabalho e ainda auxilia no desenvolvimento das potencialidades da criana. Tambm tm conscincia de que essa prtica, com o objetivo de suprir a escassez de materiais, no deve ser prolongada, j que o poder pblico deve fornecer verba para a compra de materiais e a direo da escola precisa distribuir igualmente os recursos financeiros existentes.
CONSIDERAES FINAIS Este estudo de caso foi realizado com os objetivos de compreender como se organiza a utilizao de recursos materiais na prtica pedaggica da Educao Fsica e identificar os recursos materiais utilizados pelos professores durante suas aulas. Foi possvel verificar que os professores criam e utilizam materiais alternativos como estratgia para solucionar, mesmo que momentaneamente, o problema da escassez de recursos materiais. Os materiais alternativos apresentados surgiram de ideias prprias, em cursos, seminrios e grupo de estudo sobre o assunto, programas de TV e da troca de experincias com outros professores. Os professores raramente envolvem os alunos na construo desse material. A utilizao de materiais alternativos foi justificada pela ausncia, falta de diversidade ou reduzida quantidade de materiais para as aulas de Educao Fsica, colocando em evidncia a preocupao dos professores em garantir uma aula com estmulos variados. Porm, os materiais que utilizaro no decorrer do ano no aparecem no planejamento geral, que feito em conjunto entre os professores e nem na elaborao individual das aulas, dando indcios de que esse planejamento seja feito de forma burocrtica. Como essa prtica no respaldada por um projeto coletivo e sim por iniciativas individuais, levanta-se a hiptese de que a construo de materiais seja uma tendncia atual entre os professores. Outra hiptese levantada que, nas sries atendidas, a maior necessidade de estmulos variados estimula o professor a utilizar materiais alternativos. Assim, espera-se que outros estudos possam ser realizados para que essas hipteses sejam comprovadas ou refutadas. O caso investigado apresenta resultados interessantes, medida que eles se distinguem da realidade geralmente esperada para a Educao Fsica, na qual grande parte dos professores, ao enfrentar a ausncia de recursos materiais, se deixa limitar pela situao e exclui de sua interveno determinados temas. Esta realidade retratada nos trabalhos de Soler (2003) e Freire (1997). Exemplos como os aqui apresentados so relevantes, evidenciando que transformaes tm acontecido na rea. Muito ainda precisa ser transformado, sendo que a anlise de realidades especficas e os relatos de experincias bem sucedidas podem contribuir para a disseminao de novas prticas pedaggicas.