O texto discute o uso da antropologia e do folclore na história. Aponta que estudos folclóricos foram negligenciados, mas podem revelar novas perspectivas quando questionados com novas perguntas e contextualizados na sociedade total. Também debate a aplicação de teorias da antropologia na história, questionando generalizações sobre práticas sociais entre culturas diferentes.
O texto discute o uso da antropologia e do folclore na história. Aponta que estudos folclóricos foram negligenciados, mas podem revelar novas perspectivas quando questionados com novas perguntas e contextualizados na sociedade total. Também debate a aplicação de teorias da antropologia na história, questionando generalizações sobre práticas sociais entre culturas diferentes.
O texto discute o uso da antropologia e do folclore na história. Aponta que estudos folclóricos foram negligenciados, mas podem revelar novas perspectivas quando questionados com novas perguntas e contextualizados na sociedade total. Também debate a aplicação de teorias da antropologia na história, questionando generalizações sobre práticas sociais entre culturas diferentes.
Srgio. (orgs.) As peculiaridades dos ingleses e outros artigos. Campinas: Editora da Unicamp, 2001.
Folclore, antropologia e histria social (pp. 227-267).
O autor inicia o texto dizendo que em sua carreira se deparou muitas vezes com temas, como cultura popular e ritual, que se aproximam mais da antropologia social do que da historia econmica, mas que antropologia no seu campo de estudos especializado. Mas que esse limite entre disciplinas (ou estudos comparados) ainda um problema para a tradio marxista e discutir justamente esta questo do ecletismo. Ele exemplifica uma discusso de Hildred Geertz contra Keith Thomas, acusando-o de ter usado em sua pesquisa escolas antropolgicas incompatveis, o que pode gerar oportunismo e amadorismo. (p. 227-228). [O texto foi apresentado num congresso de historia na ndia, e vrios exemplos que seguem falam da ndia].
Thompson se posiciona ao lado de Thomas (e de Natalie Zemon Davis), na medida em que para ele estudos antropolgicos no precisam oferecer categorias explicativas positivistas ou utilitaristas ou modelos, mas servir de identificao de novos problemas, na visualizao de velhos problemas em novas formas. (p. 229). O autor aponta que se deparou com esta questo quando, a partir de sua pesquisa sobre a classe operaria inglesa no sculo XVIII, decidiu orientar pesquisas que focavam em tempos anteriores aquele ja estudado, e nesse recuo, na chamada sociedade pr-industrial, com uma sociedade ainda no acelerada pelo ritmo de mudana da indstria, mas com uma sociedade ainda governada pelo costumes agrrios e prticas costumeiras de artes e ofcios, papeis sociais, modos de trabalhos, desejos e necessidades. (p.230). Sobre o tema dos costumes, o autor aponta que so temas transmitidos em grande parte oralmente, e que as fontes disponveis so compilaes de folcloristas insatisfatrias (John Brand) vistos sob o ponto de vista masculino e superior de fronteira de classe e no por sua situao ou contexto, bem como transmitidos mecanicamente como relquias remotas de uma antiguidade, sem uma discusso sobre seu uso corrente - mas que estabeleceram padres de pesquisas etnogrficas usada por todo o sculo XIX com as pesquisas lingusticas que investigavam raas de culturas por meio do folclore (Max Muller) - e encontrada ainda no sculo XX. (p. 230-1), como a possvel herana ariana dos povos indo-europeus que remontaria ndia, que despertou o interesse de etngrafos e indlogos europeus. Mas com resultados adversos para os estudos folclricos, pois, com o objetivo de descobrir ligaes consanguneas ou de contato entre povos que poderiam ter tido uma origem comum, sobreveio uma classificao com atributos formais passando por cima de abismos culturais e temporais (como as classificaes taxonmicas das cincias do XIX) (p. 231-2). Esta classificao incorreta feita pela antropologia folclore como relquia mstica descolada do contexto de uma cultura total - fez com que esses estudos cassem em descredito nas universidades inglesas (e no britnicas, pois h estudos folclricos em Esccia, Gales e Irlanda, diferente do caso francs. (p. 232). A isso se soma a desconfiana que os estudos dos costumes passaram a ter por parte dos pesquisadores marxistas quando da ascenso do fascismo costume como ideologia reacionria/ racista. (p. 233). O autor aponta que o retorno aos estudos folclricos se deu fora do ambiente acadmico, s chegando naqueles ltimos anos. Com isso, o autor compara os estudos folclricos em ambiente acadmico na Inglaterra e na ndia afirmando que o folclore na Inglaterra um apanhado de compilaes literrios de sculos passados, o que no caso indiano ele aponta uma pesquisa contempornea que, em pesquisa de campo, conseguiu centenas de canes, provrbios, historias. (p. 234). Desta forma, Thomson conclui que para estudar o folclore na Inglaterra, o que deve ser feito interrogar o material disponvel com novas perguntas e os tipos de questes que tem que ser colocadas. Assim, na medida que mudamos o foco das questes, outros atores sociais podem aparecer nas respostas, aumentando os costumes perdidos e crenas, como no caso das mulheres, que dependendo do modo como formulamos nossa pergunta para o objeto de pesquisa, elas nem ao menos apareceram como atores sociais, mas que se visto por outro lado, no podemos entender o sistema agrrio ... sem investigar praticas hereditrias... as obrigaes e reciprocidades do parentesco... que so encontradas nos encargos particulares das mulheres. (p. 234-5). Como forma de descobrir normas surdas estudas casos atpicos, nos quais a exceo evidencia as normas vigentes no perodo, permitindo entender melhor os hbitos de considerao que foram quebrados. (p. 235). Como seu tema na poca era as relaes sexuais e maritais na Inglaterra no sculo XVIII, ele exemplifica com uma mostra atpica: o registro de uma pratica de venda de esposas nos sculos XVIII e XIX, que, evidentes de que eram tidos como uma pratica natural pela comunidade operaria, restava ainda alguns comentrios inslitos, em jornais e em poucos folcloristas, lidos como uma pratica barbara de escravido, condenado moralmente (p. 236-7). Mas se analisado por outro lado, temos que esta pratica era uma encenao de uma forma de divorcio, do antigo marido para o novo, com o consentimento da esposa, onde a transao ocorria em publico com gestos de boa vontade de todos. (p. 237). Com isso, demonstrava-se a complexidade do ritual: um simbolismo de subordinao feminina adaptado aos novos propsitos de regulao da troca de parceiros consensual. Nesse sentido, o atpico pode servir para sondar as normas [...] O significado de um ritual pode ser interpretado quando as fontes deixam de ser olhadas como fragmento folclrico .. e so reinseridas no seu contexto total. (p. 238). Ritual como parte da vida social e politica que tem recebido novos olhares dos historiadores. Isso tambm para os historiadores marxistas que, influenciados pelo conceito de Gramsci de hegemonia, tem olhados com novos olhos as formas de dominao e controle das classes dominantes, que no mantem sua autoria muito tempo sem mediao pensar o controle do sculo XVIII como teatro, como hegemonia cultural, controle como imagens de poder e autoridade e mentalidades de subordinao (p. 239-240). Esse tema leva Thompson ao problemas de contabilizar os dados quantitativos, estatsticos de crimes no caso da historia econmica, quando na verdade deve levar em considerao a importncia qualitativa/ simblica da violncia, que no possui correlao direta com quantidades (p. 240). [O autor cita exemplos de massacres de Peterloo e Jallianwala Bag]. As quantidades devem ser vistas dentro do contexto total, incluindo o simblico, com ateno aos gestos do ritual como contribuies para o conhecimento histrico. (p. 241). O terror como teatro de controle de classe visvel na poca, com a cerimonia de execuo e a publicidade feita na comunidade, oralmente e com folhetos. [Pensando no sculo XX, com seus meios maiores de compilao de publicidade tv, radio, circulao de massas, o efeito bem maior de controle do terror, em casos de impacto nacionais. (p. 242)]. Outro modo de perguntar os dados de fontes de novas maneiras foi usado tambm quando Linebaugh recolheu os relatos do agravamento do terror com a punio de exposio dos corpos mutilados apos a morte pela cidade por meio de hbitos funerrios compilados por folcloristas, ativando novos ingredientes da historia social (p. 242). O autor resume o que foi exposto at o momento como justificativas suficientes de maneiras e relaes novas e criticas que a historia tem de aproximao com os folcloristas e com a antropologia (p. 243). Porm, para ele justamente nesse momento que dificuldades tericas maiores se impem: como a possibilidade da antropologia fazer descobertas no s particulares, como gerais, enquanto que a histria uma disciplina do contexto e do processo (novas funes pra velhas formas) (p. 243). Exemplo com o trabalho de Gareth Stedman Jones Outcast London - sobre a periferia londrina no final dos Oitocentos, especificamente em um capitulo que o autor analisa as atitudes da classe media ante a pobreza e a caridade. Ele faz esta analise pela noes da sociologia de Weber e a noo de sacrifcio do Mauss. [o caminho de inverso da ddiva do doador em smbolos de prestigio e depois em formas de controle social daquele que recebeu]. (p. 244). A analise de Thompson vai no sentido de problematizar o que Stedman coloca dessa pratica de caridade em todas as sociedades tradicionais conhecidas e por isso ser possvel isolar trs traos estruturais inerentes ao ato de doao (p. 244). Thompson esmiuando ponto e a ponto e verificando que os contextos sociais, religiosos e ideolgicos so mais diversos para caberem em traos estruturais em sociedades tradicionais. O autor percebe com isso que a proposta de Stedman feita a partir de cima, e que se fosse feita a partir de baixo, outros aspectos poderiam ser levantados (p. 245), ou seja, que a estrutura das relaes entre ricos e pobres so de mo dupla e pode ser girada e vista de outro ponto de vista: que o pobre pode extrair vantagens da ddiva pela culpa que o doador sentir caso ocorra a recusa dela. o grau de subordinao assegurado pela caridade pode depender de um calculo das vantagens em jogo(p. 246). Quando analisado em um contexto moderno definido, mais aspectos diferentes aparecem [o autor oferea diversas alternativas especficas] (p. 246-7).
Sendo assim, Thompson contesta a constncia que Jones diz existir no dom de doar, afirmando que h de se encontrar a estrutura na particularidade histrica ... das relaes sociais esse modo de transpor concluses da pesquisa antropolgica para a histrica est errado (p. 248). Mas, mesmo diante das criticas sobre o trabalho de Jones rigidez do modelo sincrnico - , ele levanta ainda que seu trabalho contribuiu com novas formas de pesquisa, trazendo discusso temas com controla de classe que diversas outras historias escritas sobre as caridades no haviam prestado ateno, e que s foi revelado aqui por ter sido realizado por meio de uma tipologia como a montada por Jones. O autor ainda d um curto exemplo sobre o insulto pblico infratores feitas pela charivari/ rough music, opondo-se ao achado antropolgico de Lvi-Strauss com uma funo, ou significado transcultural. (p. 249).
Assim, o autor se desculpa por no oferecer ao publico indiano exemplos indianos, e que deixa este trabalho a eles, com suas prprias fontes. Mas afirma que em ambos os casos, tanto os pesquisadores britnicos quanto os indianos se deparam com problemas semelhantes: a distncia entre as classes dos pesquisadores e daqueles cuja cultura recolhida para estudo muitas vezes os pesquisadores no conseguem adentrar nos significados dos dados que recolhem. (p. 250). O autor retoma o tema do dialogo entre histria e antropologia, ao afirma que, se ao estudar costumes, rituais, parentesco, a historia social necessita/pressupe a disciplina da antropologia social, esta preocupao tambm deve estar no modo como essa unio conduzida, ou seja, deve ter em conta que pesquisas assim podero interromper processos histricos para que se faa analises estruturais sincrnicas e estticas (p. 251). Assim, o autor afirma que a relao entre as disciplinas no pode ocorrer que qualquer maneira, mas que deve ser posicionada do ponto de vista especifico de cada um (p. 252). O autor segue uma discusso que diz respeito ao seu tema: a relao com a tradio marxista (ou seja, que ele no poderia usar conceitos da sociologia sem que sejam revestidos de ambivalncia dialtica, mas que, entretanto, se ele for usa conceitos da antropologia marxista, ter que abandonar conceitos como base e superestrutura, que por sua vez possui relaes com o econmico. Thompson aprofunda a discusso com um exemplo do materialismo histrico e os modos que lida com o modelo de superestrutura, determinismo econmico, e o retorno recente da relao recproca entre base e superestrutura, bem como o uso da noo de determinao (p. 253). O problema, para o autor, est na analogia com o econmico, em Marx (que usou o termo de maneira muito diversa para o processo histrico (p. 253-4), usando- o, por exemplo, no como primazia do econmico sobre o cultural, mas como a simultaneidade da manifestao de relaes produtivas particulares em todos os sistemas e reas da vida social. Thompson coloca em questo, desta forma, a ideia de um modo de produo em termos econmicos, colocando de lado conceitos como cultura, normas, vistos como secundrios na organizao de um modo de produo. (p. 254). O autor problematiza, pois, a utilizao de determinados conceitos quando testados em sociedades reais, que so mais complexas, e que os sistemas de parentesco, relaes de poder, direito, propriedade, norma culturais, tem que ser levadas em considerao tanto quando a economia., nos termos de base e superestrutura. (p. 255-6). Por mais sofisticada que seja a ideia, por mais sutil que tenha sido o seu emprego nas mais vrias ocasies, a analogia base e superestrutura radicalmente inadequada reducionismo/ determinismo econmico vulgar (p. 256) sendo que assim podem se alinhar com posies positivistas ou utilitaristas que no so marxistas, mas burguesas. Assim como um breve critica ao materialismo histrico e cultural de Althusser (de autonomia relativa e de determinao em ultima instncia (p. 256).
O autor chega questo da crise da categoria economia, que no universal (todos pensamos saber o que queremos dizer com o termo...(p.257), mas que cada sociedade o termo assume uma acepo diferente. Assim, Thompson se pergunta, se no pela base-superestrutura, nem pela noo de econmico, em que sentido me inspiro na tradio marxista?. Responde que pelo sentido de Marx se inseria e no pelos reducionistas e economistas marxistas. (p. 258). O autor aponta que foram dois grandes erros da tradio marxista reduzir todo modo de produo ao econmico e confundir a ideologia e cultura de classe dominante com toda a cultura. (p. 259), retomando a ideia de classe como conceito tanto econmico quanto cultural, pois uma relao de pessoas no decurso do tempo (p. 260-1), o que faz com que estas categorias no sejam estanques, e que em muitos momentos a cultura e os valores das comunidades de baixo podem opor-se ao sistema de dominao e controle (p. 261). Desta forma, o ser social se revela em congruncias expectativas as quais as pessoas vivem relaes produtivas particulares, modos de lidar com o status quo; contradies - conflito entre modo de viver e normas da sociedade; e mudana involuntria mudanas na vida material lavouras, comercio, descobertas, epidemias, invenes, que so involuntrias e alteram as relaes produtivas (p. 262). Isso significa que a transformao histrica acontece no por uma dada base ter dado vida a uma superestrutura correspondente, mas pelo fato de as alteraes nas relaes produtivas serem vivenciadas na vida social e cultural, de repercutirem nas ideias e valores humanos e de serem questionadas nas aes, escolhas e crenas humanas (p. 263).