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Edison L. M. Rodrigues
Introdução
Lidamos hoje diariamente com calculadoras sofisticadas e computadores, muitíssimo bem-
vindos, que tornam nossas tarefas mais rápidas e bem feitas. Jamais poderemos viver
novamente sem eles e já há uma geração que nunca o fez. Muitos jovens nunca ficaram
frente à frente a uma máquina de escrever e nunca viram uma régua de cálculo. Quando
ainda crianças nos ensinam a fazer contas decorando os algarismos, a tabuada e as técnicas
para efetuar as operações de tal maneira que tudo fica tão automatizado que não nos damos
conta do que está implícito no que fazemos e, não raro, muitas pessoas , segundo elas
mesmas, “não são boas de conta” e a matemática costuma ser uma matéria temida nas
escolas.
Penso que seria útil se em algum momento posterior voltássemos a rever esses conceitos
preliminares sob uma ótica mais abrangente e apreciar com mais vagar e maturidade esses
velhos caminhos.
O que se segue não pretende ensinar ninguém a fazer contas, quem desejar fazê-lo deve
procurar um dos bons livros didáticos existentes para esse fim, mas apenas proporcionar
uma nova viagem por paisagens que já vimos e às quais dirigiremos um novo olhar.
A. Ponderações sobre os números
Contar parece ser uma necessidade que remonta aos princípios da organização humana.
É provável que o engenho humano tenha recorrido a muitos artifícios e técnicas para
contar e conferir quantidades antes de criar números. O pastor poderia guardar num
saco de pele um pequeno seixo para cada ovelha que possuísse e conferir quando
desejasse se para cada seixo correspondia uma ovelha.
Dizer, como Pitágoras e vários outros desde então, que o Universo é matemático parece
ser excessivamente antropocêntrico... é justo supor que deve haver outras maneiras não-
matemáticas e igualmente eficientes para interpreta-lo. O que não descura da enorme
utilidade da matemática entre nós.
Um atributo fascinante da mente humana, que foi objeto dos estudos de Jung, é sua
capacidade de criar e lidar com símbolos que parece ser algo intrínseco à nossa natureza
e remonta às nossas origens. Daí parece natural que se criassem símbolos para
representar quantidades, símbolos diferentes para quantidades diferentes com os quais
se inicia a criação de uma linguagem: a linguagem matemática.
Criar símbolos não é difícil e assim é que muitos povos os criaram para representar
aquelas quantidades definidas que viemos a chamar de números. Dois exemplos estão
abaixo:
O sistema chinês:
O sistema Romano
Note que os romanos repetiam até três vezes cada símbolo e que um traço horizontal
sobre o símbolo o multiplicava por mil. Além disso um símbolo de valor menor ao lado
esquerdo de outro indicava uma subtração (XC = 100 -10) ao lado direito representava
uma soma (VII = 5 + 2). O número todo era composto por somas. O sistema romano
privilegia o valor 5 e seus múltiplos e não exibe símbolo para o vazio, ou seja, o valor
zero.
O sistema chinês, ainda usado atualmente, tem notação para designar individualmente
os dígitos de um a nove e possui caracteres para os múltiplos de dez (10, 100, 1000,
etc). Os números são grafados registrando uma seqüência de produtos e somas. O
sistema chinês privilegia o valor 10 e seus múltiplos. Como o romano, não exibe
símbolo para o zero.
Os romanos foram um povo muito prático que desenvolveu uma grande capacidade
para administrar seu vasto território, administração essa que exigia meticulosa
contabilidade dos bens e recursos, das tropas e das populações. Como exemplo desse
empenho administrador lembremo-nos que o relato bíblico nos conta que Jesus nasceu
em Belém porque para lá se dirigiram seus pais que deveriam cadastrar-se por ocasião
de um censo populacional que Roma fazia realizar na Judéia ocupada. Esse espírito
eminentemente prático não viu necessidade de criar novos símbolos para designar os
números, adotando para eles letras do seu alfabeto. Seu sistema de codificação de
números presta-se muito bem para registros contábeis de valores porém deixa bastante a
desejar quando se trata de fazer cálculos.
Por essa razão não temos um símbolo específico para o dez como, por exemplo,
possuíam os romanos e chineses. Quando queremos escreve-lo o que fazemos é
registrar uma dezena e zero unidades.
A grande vantagem operacional desse sistema (felicidade por termos dez dedos nas
mãos) é a enorme facilidade de cálculo que dele resulta. Saltar de uma ordem de
grandeza para a outra é efetuar multiplicação por dez, operação que é feita pela simples
adição de um zero (símbolo importante!):
1 dezena 10
1 centena 100
1 milhar 1000
e assim por diante. Freqüentemente quando desejamos contar uma grande quantidade de
coisas, primeiro as separamos em grupos de dez e depois contamos quantos grupos
formamos e quantas unidades restaram.
Da mesma forma que para os valores inteiros as ordens de grandeza saltam de dez em
dez pela inclusão de um zero adicional após a vírgula. Essas operações expressam as
divisões por dez que ficam assim grandemente facilitadas. Ficam dessa forma
estabelecidas como regras básicas as seguintes:
23 x 10 = 230
765 x 10 = 7650
7 x 100 = 700
É conveniente atentar para uma operação especial que decorre da multiplicação sucessiva
de um número por si mesmo. Façamos alguns produtos dessa natureza utilizando, por
exemplo, o número 3:
Para representar esse tipo particular de multiplicação foi criada uma notação chamada
Potenciação. Nesse tipo de notação, registra-se à direita e pouco acima do número que
se repete, a quantidade de vezes em que se repete. Ao número mais elevado chama-se
potência ou expoente e ao número que se repete base. Assim, no exemplo anterior,
3 3 9 32
3 3 3 27 33
3 3 3 3 81 34
3 3 3 3 3 243 35
Ficou estabelecido por definição que:
e assim por diante notando que o expoente registra o número de zeros que seguem o
algarismo 1.
Já se viu que o sistema decimal torna-se muito prático devido ao fato de que as operações
mentais de multiplicação e divisão por dez são muito simples. Da mesma forma ficam
muito simples as quatro operações básicas. A quase totalidade dos países do mundo adota
hoje sistemas decimais, não apenas para grafar números mas também nos seus sistemas de
pesos e medidas.
Desde que um quilograma (1 Kg) tenha mil gramas (1 000 g) e um Real (R$ 1,00) tenha
cem centavos fica muito fácil saber quanto nos irá custar 100 g de um produto que custa R$
8,00 por Kg.
O Sistema Binário
Será binário um sistema cuja base seja o valor dois (2). Para construir tal sistema
lembremo-nos de que no sistema decimal criamos um símbolo para o zero e um símbolo
para cada dígito, exceto o décimo, que passava a ser representado pela dezena.
Um sistema binário terá, pois, um símbolo para o zero e outro para a unidade. O valor dois
será representado pela primeira ordem de grandeza do sistema.
Para grafar números no sistema binário façamos uma analogia com o que sabemos do
sistema decimal:
As regras da multiplicação são as mesmas. Quando duas ordens de grandeza diferentes são
multiplicadas entre si, a ordem de grandeza resultante é encontrada pela soma dos
expoentes:
Um sistema binário só possui dois símbolos, que como vimos, podem ser quaisquer.
Podemos também, se o desejarmos, interpretá-los como “sim” e “não”. Uma seqüência de
lâmpadas acesas ou apagadas poderia representar um número binário:
O sistema binário é plenamente utilizado em informática pela significação de um bit
ativado ou não que possibilitou a criação e desenvolvimento de hardware e software.
Vamos fazer algum uso do primitivo, mas eficiente, ábaco hindu mencionado no início.
Com seu auxílio vamos registrar o número 132 e depois somar a ele o número 84,
lembrando que a composição desses números é, respectivamente
132 84
1 centena
3 dezenas 8 dezenas
2 unidades 4 unidades
Ao final podemos ler a soma que perfaz 216. O que realizamos nesse
ábaco foi uma operação conceitual pois ficamos atentos à estrutura de um número decimal.
Costumamos traduzir esse procedimento num algoritmo muito simples quando realizamos
nossas somas com lápis e papel:
Cada vez que a soma numa coluna ultrapassa o valor nove (11 por
exemplo) deixamos nela o algarismo da direita e levamos o outro para
somar na próxima coluna, sucessivamente. Aprendemos a dizer: “vai 1”.
Esse procedimento é automático e igual para todas as somas e constitui
um algoritmo. Muitas vezes, tão habituados ao algoritmo, esquecemos a
essência do que estamos fazendo. Todos os nossos cálculos são realizados através de
algoritmos.
Quando dizemos “três vezes quatro” estamos significando que o grupo de quatro unidades
se repete três vezes como mostra a figura. Para contar os seixos resultantes, fazemos uma
nova distribuição do total agrupando em conjuntos de dez unidades e o que sobrar.
Encontramos uma dezena e duas unidades, ou seja: 12. Essa é a natureza de uma
multiplicação.
Da mesma forma que no caso anterior, repetimos agora 12 grupos de 15 seixos cada. Após
alguma observação percebemos que podemos reagrupá-los em 12 conjuntos de 10 seixos e
outros 12 conjuntos de 5 seixos cada. Se lembrarmos que 15 são 1 dezena e 5 unidades ou
10 + 5 percebemos que a operação acima contém algo como:
Essa descoberta nos faz olhar novamente o total de seixos e perceber que:
Ou seja, cada uma das ordens de grandeza de um número multiplica uma por uma
todas as ordens de grandeza do outro e as parcelas assim obtidas são ao final somadas.
Concluindo:
Resta agora efetuarmos uma divisão. Dividir é o mesmo que partir em grupos
de igual conteúdo e verificar quantos grupos assim obtivemos. Se quisermos dividir 12 por
3 podemos tomar 12 seixos, separá-los em grupos de 3 e verificar quantos obtivemos.
É fácil perceber que a divisão é uma espécie de subtração na qual se retiram quantidades
sempre iguais. Dos 12 seixos vamos retirando de 3 em 3 e verificamos quantas retiradas
podemos fazer. Cumpre notar que 12 divididos por 3 “deu certo”, isto é, retiramos 4 grupos
de 3 e nada sobrou. Dizemos que foi uma divisão exata. Nem sempre é assim:
Se tentarmos dividir 13 por 3 veremos que conseguimos efetuar 4 retiradas mas sobra um
seixo. Dizemos que foi uma divisão com “resto”. Vamos olhar as divisões acima como
resultados de subtrações sucessivas
1. Múltiplos e Submúltiplos
Como a divisão é a operação inversa da multiplicação é evidente que 36 terá divisão exata
quando dividido por 2, 3 , 4, 6, 9, 12 e 18. Dizemos então que esses números são divisores
de 36 e como 36 36 = 1 o conjunto de divisores de 36 também inclui o 1. Na verdade
como todo número pode ser dividido por si mesmo, o número 1 é divisor de todos os
números. Os divisores são também chamados submúltiplos.
O número 2 e todos os seus múltiplos são chamados pares, os demais chamam-se ímpares.
Examinemos agora os números 7, 11 e 13. Se tentarmos dividir qualquer um deles por
outro número menor não obteremos nenhuma divisão exata, exceto quando os dividirmos
por 1 ou por si mesmos. Há uma classe de números que não são divisíveis por nenhum
outro exceto pela unidade. Esses números são chamados primos. Vale notar que nenhum
número par pode ser primo com exceção do 2 que só é divisível por 1 e por si mesmo.
Algo notável a respeito dos números primos é o fato de que todo e qualquer número inteiro
pode ser expresso como resultado do produto entre outros números primos.
Os números primos por, sua vez, podem ser expressos como resultados dos produtos entre
eles mesmos e o número 1.