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A DEMOCRACIA VIRTUAL

A discussão sobre o impacto da informática na produção e do mundo já gerou


um conjunto extremamente significativo de teses, análises, teorias e conceitos
que nos possibilitam ter uma visão mais clara sobre a sua profundidade.
Inicialmente é fundamental compreender que o e-mail ou o e-commerce são
apenas aspectos modestos da transformação causada pela chamada “revolução
virtual”. Ela se inicia com Turing e John Von Newmann chegando até a
Microsoft, passando por Wiener, Shannon, Von Bertalanffy, o transistor, o
EINIAC, o chip e a Internet.

A base dessa revolução é uma nova forma de tratar a informação, uma nova
estrutura de comunicação, de comando (cibernética), de organização, entre
outras tecnologias, que implicam de modo essencial numa nova forma de
dinâmica econômica. Toda essa nova nebulosa (Depuy), que se inicia durante
o esforço de guerra americano em 1939-40, muda a face da economia mundial
e continua mudando.

No ano passado a revista Veja (Veja Digital de dezembro) diz que existem 14
milhões de brasileiros conectados na internet. Não se sabe de onde a revista tirou
esses dados. De acordo com o IDC (www.idc.com), um dos mais respeitados
institutos de pesquisa sobre internet, só conseguiremos 10 milhões de usuários em
2003. Esse dado é citado também por um artigo sobre o Brasil, publicado pela
Universidade de Stanford (www.stanford.edu), “Nature and Opportunity of Internet
Access”, que constata o rápido crescimento de usuários no país. Em 1995, diz o
artigo, tínhamos 158 mil usuários e, em 1999, data da sua publicação, chegamos a
3,8 milhões. No Brasil, o COMITE GESTOR DA INTERNET, (www.cg.org.br),
com dados completamente defasados, informa que, em 1997, estávamos com
1.310.001 (essa unidade deve ser para demonstrar o rigor da apuração).

A pesquisa mais recente, publicada pelo CyberAtlas (http://cyberatlas.internet.com)


e pelo Nua Internet Surveys (www.nua.ie) foi feita pela Media Metrix
(www.mediametrix.com), que informa serem 8 650 000 brasileiros conectados na
rede. A pesquisa é de setembro de 2000 e informa que 90% dos usuários possuem
um Pc e apenas 9,1% possui mais de um computador. 1% possui mais que três
computadores. 68,8% comprou seu computador nos últimos seis meses, com a
intenção de ligá-lo na internet. 56.7% dos internautas são homens e 43,3% mulheres.
45% dos usuários da rede têm crianças em casa.

Evidentemente a metodologia de aferição do número de usuários deve divergir. Dos


14 milhões da Veja, para os 8 milhões da Media Metrix, passando pelos 9 milhões
da Rede Globo (Jornal Nacional sobre revolução da tecnologia), há variações
razoáveis, mas acredito, temos mesmo algo em torno de 9 milhões de usuários.
Quem são eles ?

Evidentemente, esses usuários não fazem parte desses 60.615.000 de brasileiros,


que, de acordo com o IBGE, ganham até 450 reais por mês ou US$ 7,6 por dia. De
cara, 38,44% da população brasileira fica excluída do mundo digital, porque a renda
que possuem custa para dar conta da própria sobrevivência.

Outros 39,9%, 61 631 000, com uma renda que chega a R$ 750,00, podem se
aventurar a comprar um Pc a prestação, para conectar na internet. Pagando em 36
vezes, algo em torno de 75 reais, para um computador de preço a vista de R$ 1
500,00. Esses R$ 75,00, para os que ganham até 5 salários mínimos, vão representar
exatamente 10% da renda.

Agora, chegamos à classe média baixa, de acordo com as nomenclaturas de


mercado. São 48 415 000 de pessoas, que representam 30,70% da população, e
possuem uma renda mensal até R$ 3 000,00. Um computador com fax/moldem
custa a metade da renda familiar, R$ 1 500,00.

Finalmente, restam 6,43% dos brasileiros, 10 135 000 de pessoas, que ganham
acima de 20 salários mínimos. Entre essas 10 milhões de pessoas, estão aquelas 106
000 que possuem um patrimônio declarado igual ou acima de um milhão de dólares
(Veja 12/07/2000) e entre esses últimos, estão aqueles 9 cidadãos que, com um
patrimônio de quase US$ 200 milhões, ganham 900 mil reais por mês. Esses, são os
que declaram suas riquezas ao fisco.

Além dos dados relativos a renda, para concluirmos nossa análise sobre o acesso a
internet, falta sabermos sobre os telefones. Afinal, quantos possuem telefones no
Brasil ? Ora, o número total de telefones instalados é de 31,1 milhões, de acordo
com a ANATEL, dado de março de 2000. O número de celulares é de 16 574 000.
Esses números não especificam os assinantes residências e comerciais e muito
menos os assinantes que possuem mais de uma linha

Por fim, se lembrarmos que a concentração de renda no Brasil é uma das piores do
mundo, já que a renda per capita dos 20% mais pobres é 32 vezes menor que a dos
20% mais ricos (Pnud), não seria muito exagerado pensar que a internet é,
prioritariamente, mais um patrimônio daqueles 6% da população brasileira que
ganham além de 20 salários. Esse grupo, que já possui os carros, o lazer, os
shoppings, os médicos, a educação, entre tantas coisas, é o mesmo que vive e usufrui
os bônus da globalização. Evidentemente as várias camadas sociais caracterizadas
acima possuem pessoas que participam desse “paraíso” das elites - usam a internet
em casa, na escola ou na empresa, mas não é uma realidade do seu grupo.
A internet não será nunca um fator de democracia exatamente porque é um efeito.
Ela não causa nada que possa transformar as estruturas da sociedade, muito menos o
seu caráter democrático. Ela é sim causada por uma estrutura social marcada pela
triste realidade daquelas milhares de pessoas que iniciam o mês com um salário de
três dígitos, geralmente dinheiro já comprometido, esses são compatriotas de alguns
poucos que iniciam o mês com uma renda de seis dígitos.

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