You are on page 1of 4

LIBERAÇÃO ENDOSCÓPICA DO TÚNEL DO CARPO PELA TÉCNICA DE AGEE COM INSTRUMENTAL MODIFICADO

Liberação endoscópica do túnel do carpo pela


técnica de Agee com instrumental modificado*
MAURI CORTEZ1, LUIZ EGIDIO COSTI1, GIOVANI SERRANO MACHADO1,
FREDERICO GUSTAVO DA LUZ RIBEIRO2, PAULO FERNANDO SOBRAL DA SILVA2

RESUMO são direta do nervo mediano são responsáveis pelo desenvol-


vimento agudo ou crônico desta síndrome(7,15,20,26).
Os autores apresentam o release endoscópico do túnel
Existe maior prevalência em pacientes do sexo femini-
do carpo, realizado com a técnica de Agee com instru-
no(4,20). O diagnóstico é predominantemente clínico, porém
mental modificado. A simplificação do instrumental tor-
exames complementares podem nos auxiliar(9,12,17,25).
nou possível a realização da técnica por um único portal,
Na sua fase inicial, o tratamento pode ser conservador com
com menor custo. Foram realizadas 72 cirurgias em 62
o uso de splints, antiinflamatórios não hormonais, injeções
pacientes portadores de síndrome do túnel do carpo, no
de corticóides dentro do túnel, vitamina B6 e modificações
período de fevereiro de 1995 a junho de 1996. As compli-
da atividade profissional(13,14,22). Quando houver falhas no tra-
cações pós-operatórias encontradas foram semelhantes às
tamento conservador ou quando o paciente apresentar sinais
descritas por Agee, com seu instrumental.
avançados, como hipotrofia da região tenar, dor permanente
e alterações da sensibilidade, o tratamento cirúrgico se im-
SUMMARY
põe(18).
Endoscopic release of carpal tunnel using Agee technique O primeiro relato de tratamento cirúrgico do túnel do car-
with modified instruments po foi feito por Marie e Foix, em 1913(28). Na década de 50,
The authors present the endoscopic release of the carpal esta cirurgia foi popularizada por Phalen(23). O método aber-
tunnel, performed according to the Agee method with modi- to era o preferido pela maioria dos autores, pela possibilida-
fied instruments. The development of simple instruments has de de visibilização das eventuais variações anatômicas ao
made it possible for the performance of this method through nível do túnel(26).
a single portal, with lower cost. 72 operations were performed Em função das complicações pós-operatórias, houve ten-
in 62 patients with carpal tunnel syndrome from February dência à diminuição da agressão cirúrgica no tratamento da
1995 to June 1996. The postoperative complications found síndrome, aparecendo técnicas cirúrgicas menos traumáti-
are similar to those described by Agee, using his instruments. cas(2,4,11,16,24,25,27,28). Em 1989, Chow descreveu uma nova téc-
nica para tratamento da síndrome do túnel do carpo que con-
INTRODUÇÃO sistia no release sob visão endoscópica através de dois por-
tais, técnica esta que é minimamente agressiva e com índi-
A síndrome do túnel do carpo é a neuropatia periférica ces baixos de complicações(3,5,6,10,23). Recentemente, Agee
compressiva mais freqüentemente encontrada no membro descreveu a técnica endoscópica por um único portal com
superior(25). O aumento da pressão intracarpal e a compres- instrumental cirúrgico próprio(1,21).
Devido ao alto custo do instrumental de Agee, desenvol-
vemos uma modificação da técnica, que permite realizar a
* Trab. realiz. no GOT – Grupo de Ortopedia e Traumatologia Ltda., Hos-
mesma cirurgia, dispensando esse instrumental sofisticado.
pital Memorial São José, Recife, PE. Nosso objetivo neste trabalho é fazer uma revisão de ca-
1. Médico Ortopedista do Serviço. sos de liberação endoscópica do túnel do carpo operados pela
2. Residente do 3º ano do Serviço. técnica de Agee, com instrumental modificado.
Rev Bras Ortop _ Vol. 32, Nº 1 – Janeiro, 1997 75
M. CORTEZ, L.E. COSTI, G.S. MACHADO, F.G.L. RIBEIRO & P.F.S. SILVA

CASUÍSTICA E MÉTODOS
Foram operadas, em nosso serviço, no período de feverei-
ro de 1995 a junho de 1996, 72 mãos em 62 pacientes (dez
casos bilaterais). Dos 62 pacientes, 55 (88,7%) eram do sexo
feminino e sete (11,2%), do masculino. A idade variou entre
17 e 86 anos, com a média de 50 anos. Em nossa casuística
foram operadas 34 mãos do lado direito e 38 do lado es-
querdo.
Nas 72 cirurgias do túnel do carpo, realizamos simulta-
neamente três cirurgias para tenossinovite estenosante de De
Quervain, quatro liberações para dedo em gatilho, uma res-
secção de cisto de bainha do tendão flexor radial do carpo,
uma sesamoidite do polegar, uma instabilidade trapézio-me- Fig. 1 –
Instrumental de
tacarpiana e uma osteotomia distal da ulna (Darrach). Agee modificado:
No pré-operatório, todos os pacientes foram avaliados cli- 1) cabo de bisturi
cilíndrico com
nicamente pelos testes de Phalen e Tinel. Em nosso serviço inclinação de 45º e
não é rotina a realização da eletroneuromiografia, porém 16 lâmina nº 15; 2)
pacientes (25,8%) já nos procuraram com este exame reali- “probe”; 3)
cânula; 4)
zado. trocarte.
No pós-operatório, usamos tala gessada tipo luva por uma
média de 9,2 dias. Nos pacientes em que houve associação
de cirurgia na mesma mão, o tempo de imobilização foi mais Retira-se o trocarte e coloca-se a ótica, visibilizando o teto
prolongado, podendo chegar até 30 dias. do ligamento anular do carpo. Retiramos a ótica e introduzi-
mos a lâmina do bisturi com o fio de corte voltado anterior-
Instrumental
mente e, em seguida, reintroduzimos a ótica, visibilizando a
O instrumental utilizado (fig. 1) é uma modificação do lâmina e o ligamento, seccionando-o de proximal para distal
desenvolvido na Califórnia, por John M. Agee. Consiste em (fig. 3). Suturamos a pele com náilon 5.0 e imobilizamos o
endocarts da Wolff como cabo de bisturi cilíndrico com pon- punho com tala gessada tipo luva.
ta inclinada a 45º e lâmina de bisturi nº 15. Utilizamos mate-
rial de videoartroscopia com ótica de 30º e saída da fonte no RESULTADOS
mesmo sentido da angulação da lente.
A avaliação pós-operatória baseou-se exclusivamente no
Técnica cirúrgica exame clínico.
Com o paciente em decúbito dorsal, sob anestesia local e Das 72 mãos submetidas a liberação endoscópica do túnel
sedação, fazemos o esvaziamento e garroteamento do mem- do carpo, oito pacientes (oito mãos – 11,1%) apresentavam
bro superior, com torniquete pneumático em aproximadamen- dor no pilar palmar, começando no 15º dia de pós-operató-
te 250mmHg, ao nível do braço. rio, todos obtendo resolução favorável num prazo máximo
Após preparo do campo cirúrgico, o punho é mantido em de 60 dias; dois pacientes (duas mãos – 2,1%) apresentavam
extensão de 30º. Uma incisão cutânea transversal é feita a hipersensibilidade na cicatriz cirúrgica; um paciente (uma
cerca de 2,0mm proximal à prega de flexão do punho entre a mão – 1,3%) apresentou parestesia no dedo anular, com re-
borda lateral do tendão flexor ulnar do carpo e a borda me- gressão do quadro por volta do 15º dia de pós-operatório, e
dial do tendão do palmar longo (fig. 2). um paciente (uma mão – 1,3%) apresentou infecção superfi-
Deslocando a sinóvia proximalmente ao ligamento anular cial na ferida operatória, com involução do quadro através
do carpo, introduz-se a cânula com trocarte rente a este e a de curativos, sem uso de antibióticos.
borda lateral do ganchoso até a intersecção imaginária da O retorno às atividades diárias com menos de dez dias e o
linha do eixo longitudinal do dedo anular com a linha da retorno ao trabalho com menos de 15 dias ocorreu em 41
borda medial do polegar em abdução de 90º (fig. 2). pacientes (66,1%) do total de 62 pacientes operados.
76 Rev Bras Ortop _ Vol. 32, Nº 1 – Janeiro, 1997
LIBERAÇÃO ENDOSCÓPICA DO TÚNEL DO CARPO PELA TÉCNICA DE AGEE COM INSTRUMENTAL MODIFICADO

Fig. 2 – 1) Portal
de entrada entre o
tendão do palmar
longo e o tendão
do flexor ulnar do
carpo; 2) borda
lateral do
ganchoso; 3)
intersecção da
linha do eixo
longitudinal do
dedo anular com a Fig. 3 – Visibilização transoperatória
linha da borda
medial do polegar
em abdução de
90º; 4) arco
palmar superficial; transitório, tanto nos pacientes com dor no pilar palmar quanto
5) ligamento
anular do carpo.
nos que tiveram parestesia do dedo anular e infecção super-
ficial na ferida operatória. Como complicações permanen-
tes, relatamos dois casos (2,1%) de hipersensibilidade ao ní-
DISCUSSÃO vel da cicatriz cirúrgica.
Preferimos o release endoscópico com anestesia local por
A literatura considera que a liberação endoscópica do tú-
considerarmos que esta técnica anestésica representa menor
nel do carpo traz melhores resultados que a liberação aberta
risco ao paciente e, também, não observamos alterações à
clássica, por ter menor número de complicações e permitir visibilização endoscópica no ato cirúrgico. Dagrenat et al.(8)
retorno precoce ao trabalho(1,2,4,11,17,24,25,27). Brown et al.(4) re-
descreveram que em mais de 1.500 pacientes submetidos a
lataram em seus estudos uma média de retorno ao trabalho
cirurgia endoscópica do túnel do carpo, sob anestesia local,
de 14 dias no método endoscópico e de 28 dias no método ocorreu apenas uma punção acidental do nervo mediano, sen-
aberto clássico.
do esta a complicação potencial desta técnica anestésica, não
Michael G. Brown et al.(3) observaram o tempo de retorno
tendo sido encontrada em nossa casuística.
ao trabalho, em pacientes submetidos a liberação endoscópi-
Palmer & Hanrahan(19), 1995, relatam em seu trabalho 400
ca do túnel do carpo, de 16 dias na técnica de um portal e de
a 500 mil casos cirúrgicos da síndrome do túnel do carpo por
17 dias na técnica de dois portais. Houve um índice de com-
ano nos EUA, com os custos em torno de dois bilhões de
plicações de 6% na técnica de um portal e de 5% na técnica
dólares/ano, havendo tendência para baixa destes custos com
de dois portais. Chow(6), em 1993, referiu que 38% dos paci-
a cirurgia endoscópica. Brown et al.(4) relatam que a cirurgia
entes estudados retornaram às suas atividades normais com
endoscópica é cerca de 500 dólares mais cara, porém estes
uma semana, 59% com duas semanas, 73% com três sema-
custos são contrabalançados pelo retorno precoce da função
nas e 84% com quatro semanas.
e ao trabalho. Achamos que a cirurgia endoscópica pelo mé-
David et al.(21), em 169 mãos operadas pela técnica de Agee,
todo de Agee é uma boa técnica para liberação do túnel do
relataram uma transecção parcial do arco palmar superficial,
carpo, porém os custos do instrumental tornam-na inviável
uma contusão do nervo digital, uma neuropraxia do ulnar e
em alguns serviços.
um hematoma. Agee et al.(1) encontraram, em sua casuística
de 122 pacientes, um release incompleto e duas neuropra-
CONCLUSÃO
xias transitórias do ulnar.
Analisando as complicações encontradas em nossa casuís- Concluímos em nossos estudos que é possível fazer a libe-
tica, observamos que estas, em sua maioria, foram de caráter ração endoscópica do túnel do carpo pela técnica de Agee
Rev Bras Ortop _ Vol. 32, Nº 1 – Janeiro, 1997 77
M. CORTEZ, L.E. COSTI, G.S. MACHADO, F.G.L. RIBEIRO & P.F.S. SILVA

com um novo instrumental, relativamente simples e de bai- 13. Irwin, L.R. & Suman, R.K.: Steroid injection for carpal tunnel syndrome.
J Hand Surg [Br] 21: 355-357, 1996.
xo custo. Tal instrumental, que faz o corte do ligamento no
sentido de proximal para distal, torna menor o risco de lesão 14. Jacobson, M.D., Plancher, K.D. & Kleinman, W.B.: Vitamina B6 (pyri-
doxine) therapy for carpal tunnel syndrome. Hand Clin 12: 253-257,
acidental de nervos e do arco palmar. Por outro lado, os índi- 1996.
ces de complicações e o retorno às atividades diárias e ao
15. Kerwin, G., Williams, C.S. & Seiler, J.G.: The pathophysiology of car-
trabalho são compatíveis com os da literatura. pal tunnel syndrome. Hand Clin 12: 243-251, 1996.
16. Lee, W.P.A., Plancher, K.D. & Strickland, J.W.: Carpal tunnel release
REFERÊNCIAS with a small palmar incision. Hand Clin 12: 271-284, 1996.
1. Agee, J.M., McCarrol, H.R., Tortosa, R.D. et al: Endoscopic release of 17. Mesgarzadeh, M., Triolo, J., Schneck, C.D. et al: Carpal tunnel syndrome.
the carpal tunnel: a randomized prospective multicenter study. J Hand MR imaging diagnosis. Magn Reson Imaging Clin North Am 3: 249-
Surg [Am] 17: 987-995, 1992. 264, 1995.
2. Agee, J.M., Peimer, C.A., Pyrek, J.D. et al: Endoscopic carpal tunnel 18. Nicolan, W.B., Alkaitis, D., Glickel, S.Z. et al: Results of treatment of
release: a prospective study of complications and surgical experience. J severe carpal tunnel syndrome. J Hand Surg [Am] 17: 1020-1023, 1992.
Hand Surg [Am] 20: 165-171, 1995.
19. Palmer, D.H. & Hanrahan, L.P.: Social and economic costs of carpal
3. Brown, M.G., Keyser, B., Rothenberg, E.S. et al: Endoscopic carpal tun-
tunnel surgery. Instr Course Lect 44: 167-172, 1995.
nel release. J Hand Surg [Am] 17: 1009-1011, 1992.
4. Brown, R.A., Gelberman, R.H., Seiler, J.G. et al: Carpal tunnel release: 20. Rojviroj, S., Sirichativapee, W., Kowsuwon, W. et al: Pressures in the
a prospective, randomized, assessment of open and endoscopic methods. carpal tunnel: a comparison between patients with carpal tunnel syn-
J Bone Joint Surg [Am] 75: 1265-1275, 1993. drome and normal subjects. J Bone Joint Surg [Br] 72: 516-518, 1990.
5. Chow, J.C.: Endoscopic release of the carpal ligament: a new technique 21. Ruch, D.S. & Poehling, G.G.: Endoscopic carpal tunnel release: the Agee
for carpal tunnel syndrome. Arthroscopy 5: 19-24, 1989. technique. Hand Clin 12: 299-303, 1996.
6. Chow, J.C.: The Chow technique of endoscopic release of the carpal 22. Sailer, S.M.: The role of splinting and rehabilitation in the treatment of
ligament for carpal tunnel syndrome: four years of clinical results. Ar- carpal and cubital tunnel syndromes. Hand Clin 12: 223-241, 1996.
throscopy 9: 301-313, 1993.
23. Seiler, J.G., Barnes, K., Gelberman, R.H. et al: Endoscopic carpal tun-
7. Cobb, T.K., Cooney, W.P., Kai-Nan, A.N. et al: Pressure dynamics of the
carpal tunnel and flexor compartment of the forearm. J Hand Surg [Am] nel release: an anatomic study of the two incision method in human
20: 193-198, 1995. cadavers. J Hand Surg [Am] 17: 996-1002, 1992.
8. Dagranat, P., Spaite, A., Restelli, S. et al: Locoregional anesthesia for 24. Sennwald, G.R. & Benedetti, R.: The value of one portal endoscopic
endoscopic surgery of the carpal tunnel. Ann Fr Anesth Reanim 14: 306- carpal tunnel release: a prospective randomized study. Knee Surg Sports
309, 1995. Traumatol Arthrosc 3: 113-116, 1995.
9. De Smet, L., Steenwenckx, A., Van den Bogaert, G. et al: Value of cli- 25. Slater Jr., R.R. & Bynum, D.K.: Diagnosis and treatment of carpal tun-
nical provocative tests in carpal tunnel syndrome. Acta Orthop Belg 61: nel syndrome (see coments). Orthop Rev 22: 1095-1105, 1993.
177-182, 1995.
26. Steinberg, D.R. & Szabo, R.M.: Anatomy of the median nerve at the
10. Fisher, T.J. & Hastings, H.: Endoscopic carpal tunnel release: Chow tech-
wrist: open carpal tunnel release classic. Hand Clin 12: 259-269, 1996.
nique. Hand Clin 12: 285-297, 1996.
11. Futami, T.: Surgery for bilateral carpal tunnel syndrome. Endoscopic 27. Viegas, S.F., Pollard, A. & Kaminski, K.: Carpal arch alteration and re-
and release compared in 10 patients. Acta Orthop Scand 66: 153-155, lated clinical status after endoscopic carpal tunnel release. J Hand Surg
1995. [Am] 17: 1012-1016, 1992.
12. Hilburn, J.W.: General principles and use of electrodiagnostic studies in 28. Zumiotti, A.V., Ohno, P.E., Prada, F.S. et al: Complicações do tratamen-
carpal and cubital tunnel syndromes: with special attention to pitfalls to cirúrgico da síndrome do túnel do carpo. Rev Bras Ortop 31: 199-
and interpretation. Hand Clin 12: 205-221, 1996. 202, 1996.

78 Rev Bras Ortop _ Vol. 32, Nº 1 – Janeiro, 1997

You might also like