Professional Documents
Culture Documents
COMUNIDADES DA AMAZÔNIA∗
Célio Bermann
(Professor do PIPGE/USP)
cbermann@iee.usp.br
Resumo
Neste trabalho, são analisadas algumas estruturas de planejamento energético e identificados seus
elementos principais, visando compor uma estrutura para ser utilizada em pequenas comunidades
amazônicas.
∗
Este artigo deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Marcos Vinicius Miranda da ; BERMANN, C. . Planejamento
energético para pequenas comunidades da Amazônia. In: Anais do I Encontro de Ciência e Tecnologia para a
Amazônia, 1999, Belém. Anais do I Encontro de Ciência e Tecnologia para a Amazônia, 1999.
energético deve estar integrado ao planejamento do desenvolvimento para que possa cumprir de
forma satisfatória a sua função (FOELL, 1985; PEARCE; WEBB, 1987).
O planejamento energético direcionado para a zona rural deve ter como finalidade a identificação e a
busca de soluções para a problemática da carência de atendimento energético, bem como para as
questões que se inter-relacionam com essa problemática. Neste caso, o planejamento energético
passa a ter um papel mais efetivo, porque deixa de ser apenas um mecanismo de identificação dos
problemas e questões envolvidas, como atualmente é caracterizado (RAMANI apud SINHA et al,
1994).
Existem muitas estruturas de planejamento energético que foram concebidas para regiões carentes.
Entretanto, embora apresentando elementos de convergência, essas estruturas devem ser adaptadas
de acordo com as peculiaridades de cada região.
RAPPEL et al (1984) definiram uma estrutura de planejamento composta por cinco elementos
principais: descrição dos sistemas, balanço energético atual, balanço energético tendencial,
atendimento da demanda e seleção das alternativas de oferta.
Em linhas gerais, o primeiro elemento é representado por uma descrição, que envolve as seguintes
questões: ecológica, caracterizada pela elaboração de um inventário dos recursos naturais, cuja
finalidade é detectar os desequilíbrios ecológicos atuais e potenciais, sócio-econômica, onde se
define o perfil sócio-econômico da localidade a ser beneficiada, e tecnológica, que se divide em
infra-estrutura disponível, como: transporte, saneamento, saúde, educação, organização político-
social e parâmetros de qualidade de vida, e equipamentos e máquinas agrícolas.
O segundo e o terceiro elementos são representados por balanços energéticos locais. No primeiro
caso, define-se um balanço energético atual, através de um profundo conhecimento das
potencialidades energéticas e equipamentos disponíveis. Posteriormente, por meio de cenários para a
região pesquisada, estabelece-se um balanço energético tendencial.
O quarto elemento consiste na valorização dos recursos locais, onde as alternativas energéticas
seriam identificadas, tendo como objetivo o uso racional e eficiente das fontes de energia para o
atendimento das necessidades básicas da população envolvida.
Por último, tem-se a avaliação e seleção das alternativas de oferta, levando em consideração os
impactos econômico, social e ambiental. A escolha das alternativas energéticas ficaria submetida a
um processo de decisão da comunidade diretamente envolvida.
FOELL (1985) afirma que a grande falha dos planejamentos energéticos em países pobres reside no
levantamento e na coleta de dados sem a identificação dos problemas envolvidos e na ausência de
definição das decisões a serem implementadas. Isso acaba levando a uma coleta desnecessária de
dados, com custos extremamente elevados. Para evitar essa falha, ele propõe que o planejamento
seja conduzido por cinco diretrizes básicas:
• Identificação dos problemas básicos, seguida pela lista de objetivos em respostas aos problemas.
• Identificação de políticas alternativas em resposta aos problemas e objetivos.
• Determinação das conseqüências das alternativas.
• Avaliação das conseqüências das alternativas, baseada em uma variedade de valores e critérios.
• Desenvolvimento de um plano ou agenda de ação, caracterizado pela incorporação e disseminação
dos resultados.
Na prática, essa estrutura de planejamento energético é composta por três elementos metodológicos:
desenvolvimento sócio-econômico, análise da demanda e análise da oferta, bem como das inter-
relações envolvendo tecnologia, economia e meio ambiente.
O desenvolvimento sócio-econômico é determinado por informações a respeito da economia e da
melhoria da qualidade de vida da população, pois esses fatores tenderão a exercer influências sobre a
demanda de energia.
A análise da oferta de energia tem por finalidade definir as alternativas energéticas que podem
satisfazer a demanda, de modo a maximizar o aproveitamento dos recursos energéticos, levando em
consideração os custos e o gerenciamento ambiental. Segundo FOELL (1985) essa análise é limitada
por mudanças tecnológicas, incertezas nas bases dos recursos, investimentos elevados e pela
inserção das questões ambientais, entre outras. Para torná-la mais efetiva é necessário avaliar as
potencialidades das reservas energéticas endógenas e exógenas, bem como as tecnologias
disponíveis no mercado.
O segundo elemento compreende uma listagem de alternativas tecnológicas que podem ser
utilizadas para o atendimento das necessidades energéticas. Neste caso, a opção deve ser feita por
tecnologias que utilizem recursos energéticos endógenos.
Por último, selecionam-se as melhores tecnologias para satisfazer as demandas energéticas, de forma
que uma combinação ótima de tecnologias seja integrada em um sistema eficiente e sustentável
(SINHA et al, 1994).
A análise das três estruturas de planejamento energético apresentadas revela como elementos de
consenso a necessidade de uma base de informação, que permita a identificação e o conhecimento
de fatores ecológicos, econômicos, sociais e tecnológicos, que se inter-relacionam com a
problemática energética local, o desenvolvimento de análises demanda/oferta de energia, visando
adequar os sistemas de oferta às necessidades energéticas da população a ser atendida e a inserção
da questão ambiental na estrutura do planejamento energético.
Desta forma, para a Amazônia, pode-se conceber uma estrutura de planejamento energético
composta por três elementos principais: diagnóstico local, análise da demanda energética básica e
análise dos sistemas de oferta, além da definição das relações intrínsecas, envolvendo fatores
sociais, econômicos, ambientais e tecnológicos (figura 1).
Modificar a Sustentabilidade
Situação de não- do
atendimento Atendimento
Satisfação das
Energético
Necessidades
Básicas
PLANEJAMENTO ENERGÉTICO
DIAGNÓSTICO LOCAL
Clima Político-Institucionais
Vegetação Sociais
Hidrologia Econômicos
Outros Energético
ANÁLISE DA DEMANDA
Bens
População
Preços
Trabalho ANÁLISE DA OFERTA
Economia
Endógena Exógena
1
As relações intrínsecas são representadas na figura pelas setas duplas.
O diagnóstico local é constituído por informações sobre as potencialidades energéticas, que
envolvem parâmetros relacionados aos recursos energéticos endógenos potenciais, como clima
(temperatura, pluviosidade, direção e velocidade dos ventos, radiação solar global, insolação,
nebulosidade), vegetação (área de cobertura vegetal, tipo de vegetação, produtividade florestal,
incluindo resíduos, áreas de tensão florestal), hidrologia (características de relevo, avaliação do
potencial hidráulico para pequenas centrais hidrelétricas, amplitude das marés, distribuição dos
cursos d’água) e peculiaridades das comunidades, que caracterizam as relações intrínsecas que
envolvem as pequenas comunidades, os sistemas ecológicos e as externalidades ao contexto local,
definidas em político-institucional (localização geográfica, jurisdição, situação agrária e
organização política), social (população, estrutura sócio-produtiva, educação, saúde e saneamento
básico), econômico (renda familiar e bens duráveis) e energético (matriz energética e implicações
do consumo de energia local).
Com relação aos aspectos político-institucionais, sociais, econômicos e energéticos, uma exposição
mais detalhada torna-se necessária para um melhor entendimento.
Os aspectos sociais têm como objetivo fornecer elementos para a identificação das necessidades
energéticas básicas, das condições para a inserção de tecnologias e de possíveis conflitos
envolvendo a produção de alimentos e a oferta de energia.
Os aspetos energéticos têm por finalidade caracterizar as fontes de energia consumidas e o consumo
energético das comunidades, bem como as implicações econômicas, sociais e ambientais relativas a
esse consumo.
Após a realização das análises de planejamento energético, tem-se a divulgação dos resultados
obtidos para a tomada decisão. Nessa fase, o planejador deve adotar uma postura ética, onde as
vantagens e desvantagens de cada alternativa energética, bem como das estratégias de
sustentabilidade do atendimento energético, sejam explicitadas. Essa postura deve ser adotada tanto
para os tomadores de decisão quanto para as comunidades a serem beneficiadas. Por outro lado,
como essas comunidades, de um modo geral, possuem uma baixa escolaridade, os resultados devem
necessariamente ser transmitidos em uma linguagem acessível a elas, com o objetivo de torná-las
participantes do processo decisório.
Conclusões
A estrutura de planejamento energético apresentada neste artigo reúne os elementos principais das
análises de planejamento energético para áreas carentes de países em desenvolvimento.
Referências bibliográficas
FOELL, W.K. Energy planning in developing countries. Energy Policy, v.13, n.4, p.350-354,
aug.1985. Special Issue.
GUERRA, H.N. et al. Comunidade de São Tomé: uma experiência em planejamento energético.
CONGRESSO BRASILEIRO DE ENERGIA, 6, Rio de Janeiro, 1993, Anais, Rio de Janeiro,
Clube de Engenharia / COPPE/UFRJ, 1993. p.185-190.
PEARCE, D.; WEBB, M. Rural electrification in developing countries: a reappraisal. Energy
Policy, v.15, n.4, p.329-338, aug.1987.
RAPPEL, E. et al. Planejamento energético no meio-rural: estudo-de-caso na micro-região de
Valença, BA. CONGRESSO BRASILEIRO DE ENERGIA, 3, Rio de Janeiro, 1984, Anais,
Rio de Janeiro, Clube de Engenharia / COPPE/UFRJ, 1984. p.1267-1274.
SINHA, C. S. et al. Rural energy planning in India: designing effetive intervention strategies.
Energy Policy, v. 19, n. 5, p.441-448, jun.1991.