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Quem emigrava sem licena era denegrido por tais senhores, que os
encaravam como fugitivos, traidores. Quem ficava era desvalorizado,
no fosse pr-se a fazer exigncias. O historiador cita, por exemplo,
Gonalo Correia de Oliveira, ministro da economia de 1965 a 1969,
que diz terem ficado s os trabalhadores diminudos fisicamente e os
que nunca prestaram para coisa alguma.
Tardar a repetir-se este discurso?
Pouco lhes interessavam as aspiraes de cada um. Argumentavam
que a emigrao quebrava a unidade do Estado; que privava o
Imprio de soldados e colonos; que os emigrantes, coitados, teriam
saudades da vida simples do campo; que sofreriam influenciais
terrveis dos franceses, esses descristianizados e comunistas, e
acabariam por corromper toda a sociedade portuguesa.
Entre 1957 e 1974 mais de um milho e meio de portugueses saram
de Portugal, a maior parte para Frana. O que raio se passava com a
toda poderosa polcia poltica, a quem cabia vigiar as fronteiras?
No era para as elites rurais e industriais perceberem, s que no
estancar as sadas e torn-las tortuosas estava longe de ser descuido
do Estado Novo, esclarece Victor Pereira no livro. Dava jeito que os
homens partissem sozinhos e endividados. S assim mandariam todo
o dinheiro possvel para c. Impedir as pessoas de sair com os papis
em ordem era tambm um meio de as fragilizar: Clandestinos, os
emigrantes mostravam-se mais dceis e mais prudentes.
Hoje, por todo o lado, ouvimos aluses quele tempo. Em cada ano,
mais de 100 mil pessoas saem do pas. Saam mais de 100 mil por
ano no fim da dcada de 1960 e no princpio da dcada de 1970.
Estamos no mesmo stio, repete-se. No estamos. Naquela altura,
como conclui Victor Pereira, comeava a europeizao de Portugal.
Agora, vivemos a chinesizao da Europa.
Ana Cristina Pereira. O Pblico. 23/06/2014