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O pesquisador e folclorista Mário Souto Maior define o folclore como “um estudo
integrante das ciências antropológicas e culturais: é qualquer aceitação coletiva, anônima ou
não, e essencialmente popular. As maneiras de pensar, agir, sentir de um povo, constituem o
fato folclórico, preservadas pela tradição popular e pela imitação”.
No tocante ao anonimato, o fato folclórico despersonaliza o autor porque, aceito e
modificado pela coletividade, passa a ser uma obra do povo. Duas origens tem o fato folclórico:
ou é uma criação de alguém, que foi aceita e tomada de todos, ou é um fato erudito, que desceu
às camadas populares, onde se folclorizou.
Nesta entrevista, Mário Souto Maior fala sobre o folclore nordestino, principalmente o
pernambucano, e analisa a sua “morte” nos centros urbanos, e o que ainda se pode fazer para
preservá-lo. Além disso, o pesquisador denuncia a descaracterização do folclore, onde o povo
não mais participa, dando lugar a uma simples recriação.
Um dos lugares citados pelo folclorista e pesquisador Mário Souto Maior, pela inexistência
dos folguedos populares é o Rio Grande do Sul, onde o folclore está elitizado. Lá o povo - o
verdadeiro povo que faz o folclore - não dança mais. O que está acontecendo é uma recriação.
“No Nordeste, o próprio povo já é o folclore”, diz complementando: “quanto maior reunião de
gente que fale a mesma língua e tenha os mesmos costumes, o folclore é mais forte”.
E o folclore está sendo descaracterizado aos poucos. Mário Souto Maior dá alguns
exemplos: “na Vaquejada, é oferecido como prêmio um carro zelo quilômetro e a inscrição
custa Cr$ 2 mil; o verdadeiro vaqueiro não pode concorrer. Quem concorre? O dentista, o
médico ou um fazendeiro”. Outro exemplo: cadeiras na calçada. Porém, o trânsito de hoje não
permite, e tem mais: como se vai fazer adivinhações na bananeira, ou acender uma fogueira,
morando-se num apartamento? “Para o folclorista não se pode medir a intensidade do folclore
na cidade grande, porque o povo é elitizado”.
Outras formas de folclore citadas pelo pesquisador Mário Souto Maior são os provérbios,
as legendas de caminhão, as superstições. Nesta última, ele dá um exemplo atual: “o homem
quando foi à Lua levou uma mascote e pisou em solo lunar com o pé direito. O que é isso? É
folclore”.
Os remédios populares também são uma forma de folclore e estão desaparecendo, cedendo
lugar aos quimioterápicos. Porém, antes que acabassem, Mário Souto Maior fez uso deles, para
cura da ameba: “me ensinaram tomar durante 30 dias, em jejum, um copo d'água gelada com
três gotas de creolina. Fiquei bom até hoje”.
Quanto à cultura indígena, Mário Souto Maior a analisa em termos de folclore: “O negro é
mais musical e o índio é mais místico. Era muito de adorar. Ganhamos dele a maneira de fazer
as lendas, a casa popular e todas as comidas à base de mandioca”.
JC - Por que alguns folguedos populares estão desaparecendo como, por exemplo, a
Nau Catarineta?
Souto Maior - A Nau Catarineta nunca foi uma manifestação muito difundida. Tem seu
Conta Mário Souto Maior que o folclore é, acima de tudo, dinâmico: “Em 1977, em Olinda,
assisti a um mamulengo onde um dos personagens era uma aeromoça da Varig. Outra vez, vi
em João Pessoa um caboclinho totalmente influenciado pela tv: era uma tribo de índio com
rifle, tenda e machado”. Segundo o pesquisador, o folclore está sendo prejudicado pela tv.
Ambos distraem, porém, o folclore é mais dispendioso e gasta tempo para os ensaios. A tv está
mais à mão.
Quase ao final da entrevista, perguntado por que tanta dedicação ao estudo sobre o
folclore, o pesquisador conta mais uma estória: “Há dez anos atrás, quando Mauro Mota era
diretor do IJNPS, li uma revista que estava pagando 200 mil réis a quem escrevesse o melhor
artigo sobre folclore. Perguntei a Mauro Mota o que era folclore, escrevi o artigo “Três Histórias
de Deus Quando Fez o Mundo” e ganhei. Tomei gosto pela coisa, transformei-me num
folclorista e pesquisador e hoje, em qualquer jornal, fala-se quase que diariamente sobre o
folclore. Fico feliz de haver contribuído para a divulgação do folclore”.
Feliz fica o Nordeste em possuir um grande nome, como o de Mário Souto Maior que, há
uma década, vem pesquisando e difundindo o nosso folclore, “preservando e cultuando a
pureza do folclore para que ele não se misture com a tecnologia - como ele mesmo diz - porque
vai desaparecer”. E um povo sem folclore também está fadado a desaparecer.
Fonte: D’ OLIVEIRA, Fernanda. Folclore: que fazer para preservá-lo. Jornal do Commercio, Recife, 12 ago. 1979. p. 42.