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TEMPO COMUM. NONA SEMANA.

QUARTA-FEIRA

75. RESSUSCITAREMOS COM OS NOSSOS


PRÓPRIOS CORPOS
– Uma verdade de fé ensinada expressamente por Jesus.

– Qualidades e dotes dos corpos gloriosos.

– Unidade entre o corpo e a alma.

I. OS SADUCEUS, que não criam na ressurreição, aproximaram-se de


Jesus para tentar fazê-lo cair numa cilada. Segundo a antiga lei de Moisés1,
se um homem morria sem deixar filhos, o irmão devia casar-se com a viúva
para dar descendência ao falecido, e devia pôr o nome deste ao primeiro dos
filhos. Os saduceus pretendem pôr em ridículo diante de Jesus a fé na
ressurreição dos mortos e inventam um problema pitoresco2: se uma mulher
se casa sete vezes ao enviuvar de sucessivos irmãos, de qual deles será ela
esposa no céu? Jesus responde-lhes ressaltando a frivolidade da objeção.
Citando diversas passagens do Antigo Testamento, reafirma-lhes a existência
da ressurreição e desfaz-lhes o argumento comentando-lhes as propriedades
dos corpos ressuscitados3.

Censura-os por não conhecerem as Escrituras nem o poder de Deus, pois


a verdade da ressurreição já estava firmemente estabelecida na Revelação.
Isaías havia profetizado: A multidão dos que dormem no pó da terra
despertará, uns para eterna vida, outros para vergonha e confusão4. A mãe
dos Macabeus confortava os seus filhos no momento do martírio recordando-
lhes que o Criador do mundo [...] vos restituirá, na sua misericórdia, tanto o
espírito como a vida, se agora fizerdes pouco caso de vós mesmos por amor
às suas leis5. E para Jó, esta mesma verdade será o consolo dos seus dias
maus: Sei que o meu Redentor vive e que no último dia ressuscitarei do pó
[...]; na minha própria carne contemplarei a Deus6.

Devemos fomentar nas nossas almas a virtude da esperança, e


concretamente o desejo de ver a Deus. “Os que amam procuram ver-se. Os
enamorados só têm olhos para o seu amor. Não é lógico que seja assim? O
coração humano sente esses imperativos. Mentiria se negasse que me
arrasta tanto a ânsia de contemplar a face de Jesus Cristo. Vultum tuum,
Domine, requiram, procurarei, Senhor, o teu rosto”7.

Este desejo será saciado se permanecermos fiéis à nossa vocação de


cristãos, porque a solicitude de Deus pelas suas criaturas levou-o a
estabelecer a ressurreição da carne, verdade que constitui um dos artigos
fundamentais do Credo8, pois se não há ressurreição dos mortos, nem Cristo
ressuscitou, e se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação e também é
vã a vossa fé9. “A Igreja crê na ressurreição dos mortos [...] e entende que a
ressurreição se refere ao homem inteiro”10, incluído o seu corpo, o mesmo
que tiver tido durante a sua passagem pela terra11.

A liturgia transmite esta verdade consoladora em inúmeras ocasiões: nEle


(em Cristo) brilhou para nós a esperança da feliz ressurreição. E àqueles a
quem a certeza da morte entristece, a promessa da imortalidade consola. Ó
Pai, para os que crêem em Vós, a vida não é tirada, mas transformada; e,
desfeito o nosso corpo mortal, é-nos dado nos céus um corpo imperecível12.

Deus espera-nos para sempre na sua glória. Que tristeza tão grande para
aqueles que puseram toda a sua confiança neste mundo! E que alegria para
os que sabemos que seremos nós mesmos, alma e corpo, que, com a ajuda
da graça, viveremos eternamente com Jesus Cristo, com os anjos e os
santos, louvando a Santíssima Trindade!

II. O NOSSO CORPO NO CÉU terá características diferentes, mas


continuará a ser corpo e ocupará um lugar, como acontece agora com o
Corpo glorioso de Cristo e o da Virgem Maria. Não sabemos onde está esse
lugar nem como se forma: a terra ter-se-á transfigurado13.

A recompensa de Deus estender-se-á ao corpo e o tornará imortal, pois a


caducidade é consequência e sinal do pecado e a criação passou a estar
submetida a ela por causa do pecado 14. Tudo o que ameaça e impede a vida
desaparecerá15. Os ressuscitados para a glória – como afirma São João no
Apocalipse – não terão fome nem sede, nem o sol ou calor algum os
abrasará16.

A fé e a esperança na glorificação do nosso corpo levar-nos-ão a apreciá-lo


no seu justo valor. O homem “não deve desprezar a vida corporal, antes pelo
contrário, deve ter como algo bom e honrar o seu próprio corpo, como criatura
de Deus que ressuscitará no último dia”17. No entanto, como está tão longe
desta justa avaliação o culto que vemos prestar ao corpo nos nossos dias!

Temos certamente o dever de cuidar dele, de empregar os meios


oportunos para evitar as doenças, o sofrimento, a fome..., mas sem esquecer
que esse corpo ressuscitará no último dia, e que o importante é que
ressuscite para ir para o Céu, não para o inferno. Para além da saúde,
devemos propor-nos aceitar amorosamente a vontade de Deus sobre a nossa
vida.

Não tenhamos uma preocupação desmedida pelo bem-estar físico.


Lembremo-nos sempre de que “ao corpo, é preciso dar-lhe um pouco menos
que o devido. Senão, atraiçoa”18. Saibamos também aproveitar
sobrenaturalmente as incomodidades ou os achaques que nos possam atingir
– sem deixar de fazer serenamente o possível por evitá-los –, e não
perderemos a alegria e a paz por termos posto o coração num bem relativo e
transitório que só será definitivo e pleno na glória. “Tinha razão quem disse
que a alma e o corpo são dois inimigos que não se podem separar, e dois
amigos que não se podem ver”19.

Não devemos esquecer em momento nenhum para onde nos


encaminhamos e o verdadeiro valor das coisas que tanto nos preocupam.
Deus criou-nos para estarmos para sempre com Cristo, em alma e corpo. Por
isso, aqui na terra, “a última palavra só poderá ser um sorriso..., um cântico
jovial”20, porque, no além, o Senhor espera-nos de braços abertos e com
gesto acolhedor.

III. BASEANDO-SE NA NATUREZA da alma e em diversas passagens da


Sagrada Escritura, a doutrina cristã mostra a conveniência de que os corpos
ressuscitem e tornem a juntar-se à alma. Em primeiro lugar, porque a alma é
apenas uma parte do homem e, enquanto estiver separada do corpo, não
poderá gozar de uma felicidade tão completa e acabada como a que possui a
pessoa inteira. Por outro lado, como a alma foi criada para unir-se a um
corpo, sofreria uma violência sobre o seu modo próprio de ser se viesse a
separar-se dele definitivamente. Por último, e principalmente, é mais
conforme com a sabedoria, a justiça e a misericórdia divinas que a alma volte
a unir-se ao corpo a fim de que ambos – o homem completo, que não é só
alma nem só corpo – participem do prémio ou do castigo merecido na sua
passagem pela vida na terra, se bem que seja uma verdade de fé que a alma
imediatamente depois da morte recebe o prémio ou o castigo, sem esperar
pelo momento da ressurreição do corpo.

À luz do ensinamento da Igreja, vemos pois com outra profundidade que o


corpo não é um mero instrumento da alma, ainda que receba dela a
capacidade de agir e contribua com ela para a existência e o desenvolvimento
da pessoa. Pelo corpo, o homem está em contacto com a realidade terrena
que deve dominar, trabalhar e santificar porque Deus assim o quis 21. Pelo
corpo, o homem pode entrar em comunicação com os seus semelhantes e
colaborar na edificação e desenvolvimento da comunidade social. Não
podemos esquecer também que o homem recebe através do corpo a graça
dos sacramentos: Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo?
22

Somos homens e mulheres de carne e osso, mas a graça estende a sua


influência ao corpo, diviniza-o de certo modo, proporcionando-lhe uma
espécie de antecipação da ressurreição gloriosa. A consideração frequente de
que este nosso corpo, templo da Santíssima Trindade quando vivemos em
graça, está destinado por Deus a ser glorificado, pode ajudar-nos muito a
viver com a dignidade e a compostura de um discípulo de Cristo.

Peçamos a São José que nos ensine a viver um respeito delicado pelos
outros e por nós mesmos. O corpo que temos na vida terrena também está
destinado a participar para sempre da glória inefável de Deus.

(1) Deut 24, 5 e segs.; (2) Mc 12, 18-27; (3) cfr. Santos Evangelhos, EUNSA, comentários a
Mc 12, 18-27 e lugares paralelos; (4) Is 26, 19; (5) 2 Mac 7, 23; (6) Jo 19, 25-26; (7) São
Josemaría Escrivá, em Folha informativa, n. 1, pág. 5; (8) cfr. Symbolum Quicumque, Dz. 40;
Bento XII, Const. Benedictus Deus, 29-I-1336; (9) 1 Cor 15, 13-14; (10) Congregação para a
Doutrina da Fé, Carta sobre algumas questões referentes à escatologia, 17-V-1979; (11)
Conc. XI de Toledo, a. 675; Dz. 287 (540); cfr. Conc. IV Latrão, Sobre a fé católica, cap. I, Dz.
429 (801); etc.; (12) Missal Romano, Prefácio I de defuntos; (13) cfr. M. Schmaus, Teologia
dogmática, vol. VII, Os novíssimos, pág. 514; (14) Rom 8, 20; (15) cfr. M. Schmaus, op. cit.,
vol. VII, pág. 255 e segs.; (16) Apoc 7, 15; (17) Conc. Vat. II, Const. Gaudium et spes, 14; (18)
São Josemaría Escrivá, Caminho, n. 196; (19) ib., n. 195; (20) L. Ramoneda Molins, Vientos
que jamás ha roto nadie, Danfel, Montevideo, 1984, pág. 41; (21) Gen 1, 28; (22) 1 Cor 6, 15.

(Fonte: Website de Francisco Fernández Carvajal AQUI)

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