You are on page 1of 5

DESIGNER – UM CONTADOR DE HISTÓRIAS

Raquel Gularte Queiroz. Bacharel em Design pela Universidade do Estado de Santa Catarina
e aluna do Programa de Pós-Graduação em Gestão do Design da Universidade Federal de
Santa Catarina. raquel_q@hotmail.com

Chimamanda Ngozi Adichie é uma escritora nigeriana e se apresenta como uma


“contadora de histórias”. Em outubro de 2009 ela causou frisson ao discursar no
Global TED - evento que reune pensadores do mundo todo com o propósito de
espalhar suas idéias. Chimamanda falou sobre “o perigo de uma história única”, o
perigo de um único olhar sobre uma pessoa, um povo ou uma cultura – algo limitador
e que gera estereótipos difíceis de serem superados. Para ilustrar essa idéia,
Chimamanda contou um pouco de sua própria trajetória, repleta de histórias únicas
que por muito tempo limitaram sua visão de mundo. Como escritora, e assim,
contadora de histórias, hoje ela se preocupa em mostrar às pessoas diferentes
perspectivas e a importância de se conhecer outras verdades. Esse texto se propõe
a provocar uma reflexão sobre a relação do designer com o “perigo de uma história
única”, localizando-o nesse cenário, seja como um profissional que se utiliza de
histórias (únicas?) para a construção de novos mundos e para possibilitar melhor
acesso a informação, seja como um “difusor” ou mesmo contador de histórias. Para
isso o procedimento adotado é a busca de referências bilbiográficas de autores com
notória compreensão do ofício de design/projeto/comunicação, permitindo assim
traçar um parelelo entre essas duas atividades – contar histórias e projetar
produtos/imagens. Bruno Munari (1998), já na primeira página de seu livro “Das
coisas nascem coisas” que aborda essencialmente metodologia projetual, traz as
quatro regras do método cartesiano, sendo a primeira delas: “nunca aceitar algo como
verdadeiro sem conhecê-lo evidentemente como tal: isto é, evitar cuidadosamente a
precipitação e a prevenção; não incluir nos meus juízos nada que não se apresente
tão clara e distintamente à minha inteligência a ponto de excluir qualquer
possibilidade de dúvida”. Oras, seria evidente para o filósofo Descartes, assim como é
para o professor e designer Munari, e espera-se que seja para todo designer, que ao
projetar uma peça seja necessário conhecer seu usuário, seu cliente, mercado
produtivo e sociedade/cultura/ambiente nos quais essa peça estará inserida. O ponto
a ser levantado nesse momento é: Aonde ou como o designer busca esse
conhecimento? Que “histórias únicas” o designer pode estar usando para basear seus
projetos? Olhando mais adiante pode-se dizer que o designer atua não somente
ouvindo histórias mas também criando-as através do projeto de produtos e sistemas,
recriando hábitos, “produzindo subjetividades” (Pinheiro, 2009). Strunk (1989, 9)
afirma que “tudo que vemos nos comunica alguma coisa”. Possivelmente ele não
negaria que enquanto criador de identidades visuais e mesmo enquanto ferramenta
do marketing e da publicidade, o designer é um contador de histórias – histórias
essas, que por serem contadas de forma praticamente subliminar (através de
imagens, cores, simbolismos) tornam o seu receptor inocente como uma criança (que
Chimamanda menciona em seu discurso) Concluindo, o designer possui vários
compromissos ao projetar, e o (não) cumprimento da maioria deles – como requisitos
técnicos, estéticos, de prazo e orçamento - fica evidente a curtíssimo prazo. Porém,
reconhecendo-o como um contador da histórias fica evidente também o compromisso
com a sociedade que ávida e ingenuamente ouve e deseja suas histórias.

Referências
MUNARI, Bruno . Das Coisas Nascem Coisas. Ed Martins Fontes, São Paulo, 1998. 1ª Ed.
PINHEIRO, Marta de Araújo. Dias estranhos: publicidade e espetáculo. Revista da
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação | E-compós,
Brasília, v.12, n.3, set./dez. 2009.
STRUNCK, Gilberto L. Identidade visual: a direção do olhar. Rio de Janeiro, Europa, 1989.
ANEXO I

TRANSCRIÇÃO DO DISCURSO DE CHIMAMANDA ADICHIE NO TED


Traduzido para Português (Portugal) por Goreti Araújo. Revisado por Paulo Calçada. Fonte: www.ted.com

Eu sou uma contadora de histórias. E gostaria de vos contar algumas histórias pessoais sobre
aquilo que gosto de chamar "o perigo da história única". Eu cresci num campus universitário na
parte oriental da Nigéria. A minha mãe diz que comecei a ler aos dois anos, embora eu pense
que aos quatro provavelmente esteja perto da verdade. Por isso eu fui uma leitora precoce. E o
que eu li eram livros para crianças Britânicos e Americanos.

Eu fui também uma escritora precoce. E quando comecei a escrever, por volta dos sete anos,
histórias a lápis com ilustrações a lápis de cor que a minha pobre mãe era obrigada a ler, eu
escrevia exactamente o tipo de histórias que eu lia. Todas as minhas personagens eram
brancas e de olhos azuis. Brincavam na neve. Comiam maçãs. (Risos) E falavam muito do
tempo, como era maravilhoso o sol ter aparecido. (Risos) Isto, apesar do facto de eu viver na
Nigéria. Nunca tinha estado fora da Nigéria. Nós não tínhamos neve. Nós comíamos mangas.
E nós nunca falávamos do tempo, porque não havia necessidade.

As minhas personagens também bebiam muita cerveja de ginja porque as personagens dos
livros Britânicos que eu lia bebiam cerveja de ginja. Não importava que eu não tivesse ideia do
que cerveja de ginja fosse. (Risos) E por muitos anos, eu tive o desejo desesperado de provar
cerveja de ginja. Mas isso é outra história.

O que isto demonstra, penso eu, é o quão impressionáveis e vulneráveis somos face a uma
história, particularmente as crianças. Porque tudo que tinha lido eram livros em que as
personagens eram estrangeiras, eu convenci-me que os livros, pela sua própria natureza,
tinham de incluir estrangeiros, e tinham de ser sobre coisas com as quais não podia
pessoalmente identificar-me. Bem, as coisas mudaram quando descobri livros Africanos. Não
havia muitos disponíveis. E eles não eram tão fáceis de encontrar como os livros estrangeiros.

Mas devido a escritores como Chinua Achebe e Camara Laye eu passei por uma mudança
mental na minha percepção da literatura. Apercebi-me que pessoas como eu, raparigas com a
pele cor de chocolate, cujo cabelo estranho não podia formar rabos-de-cavalo, também podiam
existir na literatura. Comecei a escrever sobre coisas que reconhecia.

Bem, eu amava aqueles livros Americanos e Britânicos que lia. Eles agitaram a minha
imaginação. Eles abriram novos mundos para mim. Mas a consequência não intencional foi que
eu não sabia que as pessoas como eu podiam existir na literatura. Então o que a descoberta de
escritores Africanos fez por mim foi isto: Salvou-me de ter uma história única daquilo que os
livros são.

Eu venho de uma família Nigeriana, convencional de classe-média. O meu pai era professor. A
minha mãe era administradora. Por isso nós tínhamos, como era a norma, ajuda doméstica a
viver em casa, que frequentemente vinha de vilas rurais próximas. Por isso no ano em que fiz
oito anos arranjámos um novo rapaz de recados. O nome dele era Fide. A única coisa que a
minha mãe nos disse sobre ele foi que a família dele era muito pobre. A minha mãe mandava
inhames e arroz, e as nossas roupas velhas, à família dele. E quando eu não terminava o meu
jantar a minha mãe dizia, "Acaba a tua comida! Tu não sabes? Pessoas como a família do Fide
não têm nada.". Por isso eu sentia enorme piedade pela família do Fide.

Então um Sábado fomos à vila dele fazer uma visita. E a mãe dele mostrou-nos um cesto com
um padrão lindo, feito de ráfia seca, que o irmão dele tinha feito. Eu fiquei atónita. Não me tinha
ocorrido que alguém da família dele pudesse de facto criar algo. Tudo o que tinha ouvido sobre
eles era o quão pobres eram, de forma que se tinha tornado impossível para mim vê-los como
algo além de pobres. A sua pobreza era a minha história única sobre eles.

Anos mais tarde, pensei sobre isto quando deixei a Nigéria, para ir para a universidade nos
Estados Unidos. Eu tinha 19 anos. A minha companheira de quarto americana ficou chocada
comigo. Ela perguntou onde eu tinha aprendido a falar Inglês tão bem, e ficou confusa quando
disse que a Nigéria por acaso tinha o Inglês como língua oficial. Ela perguntou se podia ouvir
aquilo a que chamou a minha "música tribal", e ficou consequentemente muito desapontada
quando eu desencantei a minha cassete da Mariah Carey. (Risos) Ela presumiu que eu não
sabia como se usava um fogão.

O que me espantou foi isto: Ela tinha sentido pena de mim mesmo antes de me ter visto. A sua
posição base em relação a mim, enquanto Africana, era uma espécie de piedade paternalista
bem intencionada. A minha companheira de quarto tinha uma história única de África. Uma
história única de catástrofe. Nesta história única não havia possibilidade de Africanos serem
semelhantes a ela, de forma alguma. Nenhuma possibilidade de sentimentos mais complexos
que a piedade. Nenhuma possibilidade de uma conexão entre humanos iguais.

Devo dizer que antes de ir para os Estados Unidos eu não me identificava conscientemente
como Africana. Mas nos Estados Unidos sempre que África surgia as pessoas voltavam-se
para mim. Não importava que eu nada soubesse sobre locais como a Namíbia. Mas eu acabei
por abraçar esta nova identidade. E de muitas formas eu penso em mim mesma agora como
Africana. Embora ainda me irrite bastante quando África é referida como um país. Sendo o
exemplo mais recente o meu em tudo o resto maravilhoso voo de Lagos à dois dias, no qual havia um
anúncio no voo da Virgin sobre o trabalho de caridade na "Índia, África e outros países". (Risos)

Então depois de ter estado vários anos nos Estados Unidos como Africana, comecei a perceber
a reacção da minha companheira de quarto para comigo. Se eu não tivesse crescido na
Nigéria, e se tudo que eu soubesse sobre África fosse de imagens populares, também eu
pensaria que a África era um local de belas paisagens, belos animais, e pessoas
incompreensíveis, lutando guerras sem sentido, morrendo de pobreza e SIDA, incapazes de
falar por si mesmas, e esperando ser salvas, por um meigo, estrangeiro branco. Eu veria os
Africanos da mesma forma que eu, enquanto criança, tinha visto a família do Fide.

Esta história única de África vem em última análise, penso eu, da literatura ocidental. Agora,
aqui está uma citação da escrita de um mercador londrino chamado John Locke, que navegou
até ao oeste de África em 1561, e manteve uma descrição fascinante da sua viagem. Depois
de se referir aos Africanos negros como "as bestas que não não têm casas", escreve, "Eles são
também pessoas sem cabeças, tendo a sua boca e olhos nos seios".

Bem, eu rio-me sempre que leio isto. E temos de admirar a imaginação de John Locke. Mas o
que é importante sobre esta escrita é que representa o início de uma tradição em contar
histórias Africanas no Ocidente. Uma tradição de uma África Subsariana enquanto lugar de
negativos, de diferença, de escuridão, de pessoas que, nas palavras do maravilhoso poeta,
Rudyard Kipling, são "metade diabo, metade criança".

E então eu comecei a perceber que a minha companheira de quarto Americana devia ter, ao
longo da vida, visto e ouvido diferentes versões desta história singular, como tinha um
professor, que uma vez me disse que o meu romance não era "autenticamente Africano". Bem,
eu estava mais que disposta a aceitar que havia várias coisas erradas com o romance, que eu
tinha falhado em vários locais. Mas não havia imaginado que tinha falhado em conseguir algo
chamado autenticidade Africana. Na verdade eu não sabia o que autenticidade Africana era. O
professor disse-me que as minhas personagens eram demasiado parecidas com ele, um
homem com educação e de classe média. As minhas personagens conduziam carros. Elas não
estavam famintas. Portanto elas não eram autenticamente Africanas.

Mas eu devo rapidamente somar que também eu sou culpada na questão da história única. À
uns anos atrás, visitei o México dos Estados Unidos. O clima político nos Estados Unidos na
altura era tenso. E havia debates a decorrer sobre a imigração. E, como muitas vezes acontece
na América, a imigração tornou-se sinónimo de Mexicanos. Havia histórias infindáveis de
Mexicanos enquanto pessoas fugindo ao sistema de saúde, infiltrando-se pela fronteira, sendo
presas na fronteira, esse tipo de coisa.

Lembro-me de andar no meu primeiro dia em Guadalajara, vendo as pessoas a ir trabalhar,


enrolando tortilhas no mercado, fumando, rindo. Lembro-me de primeiro sentir uma breve
surpresa. E depois fiquei submersa em vergonha. Apercebi-me de que estava tão imersa na
cobertura dos media sobre os Mexicanos que eles se haviam tornado uma só coisa na minha
mente, o abjecto imigrante. Eu tinha cedido à história única dos Mexicanos e eu não podia
sentir mais vergonha de mim. E é assim que se cria uma história única, mostra um povo como
uma coisa, como uma única coisa, vezes sem conta, e é isso que eles se tornam.

É impossível falar sobre a história única sem falar do poder. Há uma palavra, uma palavra
malvada, em que penso, sempre que penso sobre a estrutura do poder no mundo, e é "nkali". É
um substantivo que livremente se traduz por "ser maior que outro". Como os nossos mundos
económico e político, também as histórias se definem pelo princípio do nkali. Como são
contadas, quem as conta, quando são contadas, quantas histórias são contadas, estão
realmente dependentes do poder.

O poder é a capacidade de não só contar a história de outra pessoa, mas de fazê-la a história
definitiva dessa pessoa. O poeta Palestiniano Mourid Barghouti escreve que se queres
desapropriar um povo, a forma mais simples de o fazer é contar a sua história, e começar com
"Em segundo lugar". Começa a história com as setas dos Nativos Americanos, e não com a
chegada dos Britânicos, e terás uma história completamente diferente. Começa a história com
o fracasso do estado Africano, e não com a criação colonial do estado Africano, e terás uma
história totalmente diferente.

Falei recentemente numa universidade onde um estudante me disse que era uma grande pena
que os homens Nigerianos fossem abusadores como a personagem do pai no meu romance.
Eu disse-lhe que tinha acabado de ler um romance chamado "Psicopata Americano" (Risos) e
que era uma grande pena que os jovens Americanos fossem assassinos em série. (Risos)
(Aplausos) Bem, obviamente eu disse isto num ataque de leve irritação. (Risos)

Nunca me tinha ocorrido pensar que apenas porque tinha lido um romance no qual uma das
personagens era um assassino em série que ele de alguma forma representaria todos os
Americanos. E agora, isto não é porque sou melhor pessoa que o estudante, mas, devido ao
poder económico e cultural Americano, eu tinha muitas histórias da América. Eu havia lido Tyler
e Updike e Steinbeck e Gaitskill. Não tinha uma história única da América.

Quando soube, há uns anos, que era esperado os escritores que tinham tido infâncias bastante
infelizes terem sucesso, comecei a pensar como poderia inventar coisas horríveis que os meus
pais me teriam feito. (Risos) Mas a verdade é que eu tive uma infância muito feliz, cheia de riso
e amor, numa família muito unida.

Mas também tive avós que morreram em campos de refugiados. O meu primo Polle morreu
porque não teve assistência médica adequada. Um dos meus amigos mais próximos, Okoloma,
morreu num desastre de avião porque os nossos camiões dos bombeiros não tinham água.
Cresci sob governos militares repressivos que desvalorizavam a educação, de forma que por
vezes os meus pais não recebiam os seus salários. E por isso, enquanto criança, vi a geleia
desaparecer da mesa de pequeno-almoço, depois desapareceu a margarina, depois o pão
ficou muito caro, depois foi o leite que teve de ser racionado. E mais que tudo, um medo
político normalizado invadiu as nossas vidas.

Todas estas histórias fazem de mim quem eu sou. Mas insistir apenas nestas histórias
negativas é planar a minha experiência, e esquecer tantas outras histórias que me formaram. A
história única cria estereótipos. E o problema com os estereótipos não é eles serem mentira,
mas eles serem incompletos. Eles fazem uma história tornar-se a única história.

Claro que a África é um continente cheio de catástrofes. Há as que são imensas, como as
horripilantes violações no Congo. E há as deprimentes, como o facto de 5,000 pessoas se
candidatarem para uma única vaga de emprego na Nigéria. Mas há outras histórias que não
são sobre catástrofe. E é muito importante, é igualmente importante falar sobre elas.

Sempre senti que é impossível relacionar-me adequadamente com um lugar ou uma pessoa
sem me relacionar com todas as histórias desse lugar ou pessoa. A consequência da história
única é isto: rouba as pessoas da sua dignidade. Torna o reconhecimento da nossa humanidade
partilhada difícil. Enfatiza o quanto somos diferentes em vez do quanto somos semelhantes.
E se antes da minha viagem Mexicana eu tivesse seguido o debate sobre a imigração das duas
perspectivas, dos Estados Unidos e do México? E se a minha mãe nos tivesse contado que a
família do Fide era pobre e trabalhadora? E se nós tivéssemos uma rede televisiva Africana
que divulgasse diversas histórias Africanas para todo o mundo? O que o escritor Nigeriano
Chinua Achebe chama "um equilíbrio de histórias".

E se a minha companheira de quarto soubesse do meu editor Nigeriano, Mukta Bakaray, um


homem notável que deixou o seu emprego num banco para seguir o seu sonho e começar uma
editora? Bem, a sabedoria popular ditava que os Nigerianos não lêem literatura. Ele
discordava. Ele sentia que as pessoas que podiam ler, iriam ler, se a literatura fosse tornada
acessível e disponível para eles.

Pouco depois dele ter publicado o meu primeiro romance eu fui a uma estação de televisão em
Lagos para ser entrevistada. E uma mulher que trabalhava como mensageira lá veio até mim e
disse-me, "Eu gostei muito do seu romance. Não gostei do final. Agora tem de escrever uma
sequela, e é isto que vai acontecer..." (Risos) E continuou dizendo-me o que escrever na
sequela. Não fiquei apenas encantada, fiquei muito comovida. Aqui estava uma mulher, parte
das massas comuns de Nigerianos, que não era suposto serem leitores. Ela não tinha apenas
lido o livro, tinha até tomado posse dele e sentia-se no direito de me dizer o que escrever na
sequela.

Bem, e se a minha companheira de quarto soubesse da minha amiga Fumi Onda, uma mulher
intrépida que é anfitriã de um programa televisivo em Lagos, e que está determinada em contar
as histórias que preferíamos esquecer? E se a minha companheira de quarto soubesse da
cirurgia ao coração que foi levada a cabo no hospital de Lagos na semana passada? E se a
minha companheira de quarto soubesse da música Nigeriana contemporânea? Pessoas
talentosas cantando em Inglês e Pidgin, e Igbo e Yoruba e Ijo, misturando influências de Jay-Z
a Fela de Bob Marley aos seus avós. E se a minha companheira de quarto soubesse da
advogada que recentemente foi a tribunal na Nigéria desafiar uma lei ridícula que exigia que as
mulheres tivessem o consentimento dos maridos antes de renovar os seus passaportes? E se
a minha companheira de quarto conhecesse Nollywood, cheio de pessoas inovadoras fazendo
filmes apesar de grandes questões técnicas? Filmes tão populares que são na verdade o
melhor exemplo dos Nigerianos a consumir o que produzem. E se a minha companheira de
quarto soubesse da minha magnificamente ambiciosa entrançadora de cabelo, que acaba de
começar o seu próprio negócio vendendo extensões de cabelo? Ou sobre os milhões de outros
Nigerianos que começam os seus negócios e por vezes fracassam, mas continuam a albergar ambição?

Sempre que estou em casa sou confrontada com as fontes habituais de irritação pela maioria
dos Nigerianos: a nossa infraestrutura falhada, o nosso governo fracassado. Mas também pela
incrível resistência de pessoas que florescem apesar do governo, em vez de devido a ele.
Ensino workshops de escrita em Lagos todos os Verões. E é extraordinário para mim o número
de pessoas que se inscrevem, quantas pessoas estão ansiosas por escrever, por contar histórias.

O meu editor Nigeriano e eu acabamos de começar uma não-lucrativa chamada Fundo


Farafina. E temos grandes sonhos de construir bibliotecas e renovar bibliotecas que já existem,
e providenciar livros a escolas estatais que nada têm nas suas bibliotecas, e também de
organizar muitos e muitos workshops, de leitura e escrita, para todas as pessoas que estão
ansiosas por contar as nossas muitas histórias. As histórias importam. Muitas histórias
importam. As histórias têm sido usadas para desprover e tornar maligno. Mas as histórias
também podem ser usadas para potenciar e para humanizar. As histórias podem quebrar a
dignidade de um povo. Mas as histórias também podem reparar essa dignidade quebrada.

A escritora Americana Alice Walker escreveu isto sobre os seus parentes sulistas que se
mudaram para norte. Ela apresentou-os a um livro sobre a vida sulista que eles haviam deixado
para trás. "Eles sentaram-se em volta, lendo eles mesmos o livro, ouvindo-me ler o livro, e uma
espécie de paraíso foi reconquistado". Eu gostaria de terminar com este pensamento: Que
quando rejeitamos a história única, quando nos apercebemos que nunca há uma história única
sobre nenhum lugar, reconquistamos uma espécie de paraíso. Obrigada. (Aplausos)

You might also like