You are on page 1of 4

O TESOURO E A PÉROLA PRECIOSA

– A vocação, algo de valor imenso, uma prova muito especial do amor de Deus.

– Deus passa pela vida de cada pessoa em circunstâncias bem determinadas de idade,
trabalho, etc. Passa e chama.

– Generosidade perante a chamada do Senhor.

I. O REINO DOS CÉUS é semelhante a um tesouro escondido num campo,


o qual, quando um homem o acha, esconde- o e, cheio de alegria pelo que
encontrou, vai, vende tudo o que tem e compra aquele campo. Também é
semelhante a um mercador que busca boas pérolas. E, tendo encontrado uma
de grande valor, vai, vende tudo o que tem e compra- a1.

Com estas duas parábolas, Jesus revela no Evangelho da Missa o valor


supremo do Reino de Deus e qual deve ser a atitude do homem para
alcançá-lo. O tesouro e a pérola têm sido imagens utilizadas tradicionalmente
para exprimir a grandeza da vocação, o caminho pessoal para alcançar Cristo
nesta vida e depois, para sempre, no Céu.

O tesouro significa a abundância de dons que se recebem juntamente com a


vocação: graças para vencer os obstáculos, para crescer em fidelidade dia a
dia, para o apostolado...; a pérola indica a beleza e a maravilha do
chamamento divino: não é somente algo de altíssimo valor, mas também o
ideal mais belo e perfeito que o homem pode descobrir.

Há uma novidade nesta segunda parábola em relação à do tesouro: a


descoberta da pérola foi precedida por uma busca afanosa, ao passo que o
tesouro foi encontrado de improviso2. Ambas as situações podem dar-se no
chamamento divino. Muitos podem ter encontrado a sua vocação quase sem
procurá-la; foi um tesouro que os deslumbrou repentinamente. Outros
experimentaram uma inquietação íntima, posta por Deus em seus corações,
que os levou a procurar a pérola de maior valor; sentiram uma insatisfação em
relação às coisas humanas que os impeliu a continuar a busca: Quid adhuc
mihi deest? Que me falta?3 Em ambos os casos – um encontro repentino ou a
busca prolongada –, tratou-se de algo de altíssimo valor: “uma honra imensa,
um orgulho grande e santo, uma prova de predilecção, um carinho
particularíssimo, que Deus manifestou num momento concreto, mas que estava
na sua mente desde toda a eternidade”4.

II. UMA VEZ DESCOBERTA a pérola ou encontrado o tesouro, é necessário


dar mais um passo. A atitude que se deve tomar é idêntica em ambas as
parábolas e está descrita nos mesmos termos: vai, vende tudo o que tem e
compra- o. O desprendimento, a generosidade, é condição indispensável para
se entrar na posse do achado. “Escrevias: «[...] Esta passagem do Santo
Evangelho caiu na minha alma e lançou raízes. Já a tinha lido muitas vezes,
sem captar a sua substância, o seu sabor divino».

“Tudo..., tudo tem que ser vendido pelo homem sensato, para conseguir o
tesouro, a pérola preciosa da Glória!”5 Não há nada de tanto valor!

Mas nem o homem que encontrou o tesouro nem aquele que descobriu a
pérola sentem falta do que antes possuíam e que venderam. A riqueza do que
acharam é de tal ordem que compensa de longe o que deram em troca, isto é,
tudo o que tinham. A mesma coisa acontece com os que descobrem ou
encontram o seu caminho pessoal para Deus: abandonam tudo e encontram
tudo. O Senhor sublinha na parábola a alegria com que aqueles homens
venderam o que possuíam. É razoável pensar que se tratava de coisas que
apreciavam: casa, mobília, peças decorativas... Representavam o esforço de
anos de trabalho. Mas vendem tudo, sem calculismos, sem pensar demasiado,
com alegria.

Deus passa pela vida de cada pessoa em circunstâncias bem determinadas,


numa idade concreta, em situações diferentes. Passa e chama uns na primeira
hora6, quando têm ainda poucos anos, e pede-lhes as suas ambições, as
esperanças e projectos de um futuro que, a essa idade, parece cheio de
promessas; a outros, chama-os na maturidade da vida... ou no seu declínio. E
a maioria, o Senhor encontra-os no seu trabalho de homens e mulheres
correntes no meio do mundo, e deseja que continuem a ser fiéis comuns para
que santifiquem esse mundo em cujo cerne se encontram, sem abandonar
nenhuma das suas responsabilidades, mas vivendo através delas uma entrega
plena e total a Deus.

Em qualquer idade em que se receba a chamada, o Senhor concede uma


juventude interior que tudo renova, um entusiasmo de coisas por estrear e de
ímpeto apostólico. Ecce nova facio omnia7, diz o Senhor; Eu posso renovar
tudo, acabar com a rotina da tua vida, ensinar-te a olhar mais longe e mais alto.
Não vale a pena? Não está aí a fonte da alegria que não passa, que já não tem
altos e baixos?

Qual a melhor idade para entregar-se a Deus? Aquela em que o Senhor


chama. Tanto faz também que se seja solteiro, casado ou viúvo, porque Deus
nos quer com tudo o que somos e temos, dentro das nossas circunstâncias
particulares. O importante, pois, é ser generoso com Ele no momento e
sempre, sem confiar em que haverá outra oportunidade; sem pensar também
que já passou o tempo das decisões cheias de audácia e de valentia, que é
muito tarde... ou muito cedo. Sempre é tempo para a alegria do encontro
divino.

III. EM COMPARAÇÃO com a pérola de grande preço achada pelo mercador


– comenta São Gregório Magno –, nada tem valor, e a alma abandona tudo o
que tinha adquirido, desfaz-se de tudo o que vinha carregando sobre as costas
e considera disforme tudo o que lhe parecia belo na terra, porque somente o
resplendor daquela pérola preciosa brilha aos olhos da sua alma8.

Quem é chamado – seja qual for a sua situação pessoal – deve entregar ao
Senhor tudo o que Ele lhe pede: com frequência, tudo o que estiver em
condições de dar-lhe. As circunstâncias, no entanto, são diferentes e, portanto,
dar tudo nem sempre irá significar materialmente a mesma coisa: uma pessoa
casada, por exemplo, não pode nem deve abandonar o que, por vontade de
Deus, pertence aos seus: o amor à mulher ou ao marido, a dedicação à família,
a educação dos filhos... Para essa pessoa, dar tudo significa viver a vida de um
modo novo, cumprindo melhor os seus deveres; significa viver heroicamente as
suas obrigações familiares; desposar-se de si própria no esforço por educar
cristã e humanamente os filhos; preocupar-se pelas outras famílias amigas;
falar-lhes de Deus com a conduta e com a palavra; encontrar tempo para
colaborar em tarefas de apostolado...: “Na vida real de um homem ou de uma
mulher casados, que depois descobrem o significado vocacional do seu
matrimónio, a «descoberta» aparece sempre como uma dimensão concreta da
sua vocação cristã, que é o que há de mais radical”9.

Mas em qualquer estado ou situação, quando se deseja seguir o Senhor


mais de perto, compreende-se que ninguém pode ficar fechado no seu
pequeno mundo. Compreende-se que é necessário iluminar a vida dos outros,
chegar mais longe, entrar mais a fundo no ambiente em que se vive para
transformá-lo, ampliando o círculo de amizades, empenhando-se numa acção
apostólica mais intensa e extensa. Isto diz respeito também aos casados, aos
doentes, aos de idade avançada, que, dentro dos limites das suas
circunstâncias de vida, devem sentir-se responsáveis por um mundo que está
às escuras.

Seguir assim os passos de Cristo, numa entrega plena, nunca é fácil. Quem
se encontra instalado numa posição mais ou menos estável, quem se
considera com a vida já realizada, pode ver que essa tranquilidade conquistada
– à qual considera ter pleno direito – corre perigo. E é com isso precisamente
que Cristo pede que rompamos: com a rotina, com a mediocridade, com a
vulgaridade cómoda.

A vocação sempre exige renúncia e uma mudança profunda na conduta.


Implica a entrega a Deus daquilo que se tinha reservado para si, e deixa a
descoberto os apegamentos, as fraquezas, os redutos que se supunham
intocáveis e que, no entanto, é preciso destruir para adquirir o tesouro sem
preço, a pérola incomparável. É o próprio Jesus quem nos procura: Não fostes
vós que me escolhestes, mas eu que vos escolhi 10. E se Ele chama, também
dá as graças necessárias para segui-lo, no começo da vida, na maturidade e
na velhice.

São José, nosso Pai e Senhor, encontrou o tesouro da sua vida e a pérola
preciosa na missão de cuidar de Jesus e de Maria aqui na terra. Peçamos-lhe
hoje que nos ajude sempre a viver com plenitude e alegria o que Deus quer de
cada um de nós, e que entendamos em todo o momento que nada vale tanto a
pena como o cumprimento fiel dos compromissos da nossa vocação.

(1) Mt 13, 44-45; (2) cfr. F. M. Moschner, Las parábolas del Reino de los Cielos, Rialp, Madrid,
1957, pág. 11; (3) Mt 19, 20; (4) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 18; (5) ib., n. 993; (6) cfr. Mt
20, 1 e segs.; (7) Apoc 2, 2-6; (8) cfr. São Gregório Magno, Homilias sobre os Evangelhos, 11;
(9) P. Rodriguez, Vocación, trabajo, contemplación, EUNSA, Pamplona, 1986, pág. 31; (10) Jo
15, 16.

(Fonte: Website de Francisco Fernández Carvajal AQUI)

You might also like