You are on page 1of 16
tbs aed ETICA NAS ORGANIZACOES PAD TEXTOI i Nossa sociedade vive na at je uma redescoberta da é cia de valores morais em todas cias sociais, sejam elas ci cas ou econémicas. Certamente essa situagio no se dé por acaso; basta obser- ‘varmos que ela surge no mesmo momento em que a sociedade passa por uma grave crise de valores, identificada pelo senso conmum como falta de decoro, de respeito pelo outros ¢ de limites e, pelos estudiosos, como dificuldades de os in- dividuos internalizarem normas morais, respeito as leis e regras,so tuagiio pode ser analisada por varios angulos, dentre elescomo uma rea- de descaso com que sdo tratados pelos poderes pério da razao, que deixa de lado to ca emogio; pela exigéncia de icas pedagdgicas que privilegiam nos, entre outras. Em todas as io dos seres humanos de sere! fos, capazes de pensar, softer, organizar-se ¢ const . lade hoje, sobre as caracteristic: vemos entender alguns tos sce as condigées pat 22» acenca os con ~ APROXIMAGAO CONCEITUAL Na atualidade, a palavra virtude esté em desuso e a palayta moral foi subs. titulda por ética, por ser n : de que a vida humana € constitutivamente moral, pois ela se estrutura em torno de valores. Os projetos de vida, sejam eles individuais ou coletivos, configuram-se a partir de ideais que outea coisa nao sao sendo valores. Nossas ages, das mais simples as mais complexas, pressupdem escolhas que sio feitas a partir do valor que elas tenham pata nés. te € um valor? Ni istiga, assim como podemos pensar brar que podemos falar de valo- idicos ou morais, que os valores endo mora Os valores io moras diferem dos meraissobretudo por possuitem uma base real, um substrato material. Por exemplo, a digua, 0 ar que respiramon, uma ea. deira, um prato de alimento possuem valer; contuio, ele sé se tornaté realidade na telago com 0 ser humano, que em sua articulagao cultural dird se aquela co: 2 6 titi, bonita, conforedvel ots imprestindivel& vida, Os valores morais, diferentemente dos nio morais, nio possuem substrato material e sé existem nos atos e produtos hunians, tais como: comportamentos, interagoes sociais, decisdes tomadas, no produto ¢ aplicagio desses atos. Deles odemos falar em justca, honestidade ou integridade, assim como em responsabt lidade. Os valores morais so exclusivos do ser humano, pelo fato de se press Por que esse seja responsiivel pelo que faz e, pata isso, que seus atos tenhamse dado de forma live e conscience. DEFININDO.MORAL E ETICA __ Etimologicamente, as duas palavras possuem origens distintas e significados ienticos. Moral vem do latim mores, que quer dizer costume, conduta, modo de agir; enquanto ética vem do grego ethos e, do mesmo modo, quer dizer costume, modo de agir. Essa identidade existente entre elas marca a tendéncia de serem tratadas como a mesma coisa. Contudo, alguns autores, entre eles A. 8. Vasques, admitem que, apesar do estreito vinewlo que as une, elas sii diferentes. Consti, tuem-se em realidades afins, porém diversas. Vejamos em que se baseiam.. ioral, enquanto norma de conduta,refere-se as situagBes par as, no chegando & superacio desse nivel, A ética, destituida do papel normatizador, a0 menos no que diz respeito aos atos isolades, toma-se examinadora da moral. Exame que consiste em rellexio, em investigagio, em i i q eftesbes soone Attica 23, teorizagio, Poder-se-ia dizer que a moral normatiza e direciona a pritica das pes: soas, @ a ética teoriza sobre as condutas, estudando as concepgées que dio supor- dois caminhos diferentes que resultam em status também 6a ciéncia que estuda o comportamento moral dos homens na Sociedade" Esta definigo nos remete a duas questdes importantes: ao cardter so moral e a seu aspecto dialético. O primeico se com 0 papel que ela de- sempenha na sotiedacde, no sentido de poss m equilfbrio entre 0s a individuais e os interesses da sociedade; assim, niio existe uma mioral individual la & sempre social, pois envolve relagées entre sujeitos. Diante disso, as normas morais sfo colocadas em fungéo de uma concepgao teérica ei vigor, que & qua- se sempre, a concepgiio dominante. No segundo aspecto, 6 sabido que os valores morais expres Dessa forma, variam historicamente, pois cada sociedade edifica sues normas a partir das suas crengas, modelo social, formagao econémica e social. I nesse sen- tido que Lima Vaz. (1993) relembra que a ética (aqui entendida no sentido am- plo), desde sua 05, dirigiu-se & cultura e foi entendida como morada do homem, como abrigo protetor do ser humano; ou seja, como a condi- ia e de convivencia soci as de conduta, que so formuladss pela sociedade e servem para colocar. ites nos desejos ¢ ambigoes individuais e ditigi-los para uma relagdo equilib dacom as.necessidades sociais. No dizer de Lima Vez. (1993, p. 13), “0 dominio ‘ reino da necessidade é rompido pela abertura do espago humano io inserever-se os costumes, os hbitos, as normas ¢ os inter- Tais normas, explicitadas no modo de agit das pessoas, a principio podem parecer absolutamente individusis, ir em uma ago praticada por um da, Adquire outr volve, direta oui como produto de uma escolha as citcunstdncias hist6ricas do agente, sua histéria pessoal esta heranga familiar ecultural, “Apesar de 0 comportamento moral articular-se com as condigdes histérieas do agente moral, isto no impede que ele possa fazer escolhas ¢ se responsabili- ar por elas. Isto porque, como sabemos, com 0 ser htumano, a simples aquisigio de habitos, como acontece com os outros animais, nfo satisfaz. Ele reflete sobre ‘0 seu agir e busca orientar a sua prética de forma consciente para o que Ihe sea significativo, til e funcional. O homem é um animal que faz projetas, que.idea- 24 acerca pos concertos iza os fins que se propée alcangar, & (2976, p. 462) assim se refere a0 assur (0.0 coloca em um plano superior. Marx “a aranha cumpre as operagdes que se assemelham as do tecelio, as abe- Ihas envergonham muitos arquitetos com a construgéo dos seus cubicu- los de cera. Mas 0 que, de inicio, distingue o pior dos arquitetos da me- lhor abetha € 0 fato de que , primeiro na cabeca, 0 cubfeulo antes de fazé-lo de cera”. Por outro lado, o conhecimento humano tende sempre a um crescimento, a um avango. Ele se processa através de relagbes, de forma que cada experiénci toma-se fundamental para uma outra e o proceso desenrola-se ininterruptamente. Diante disso, o ser humano possui condigdes de maior compreensio do mundo, de tomar decisbes e de realizar agbes conscientes. Nas relagGes que siio mantidas com o mundo, outra caracteristica defini do ser humano se apresenta, O animal irracional mantém com o mundo exterior um niimero de relacdes bastante limitado, quase todas referentes & satisfagio de suas necessidades bisicas, como: alimentagio, seguranga, acasalamento etc. So necessidades referentes a seu ser bioldgico. Quanto ao ser huma comprova que ele nio se contenta em conhecer a natureza e explor: ta conhecer a si mesmo, compreender suas miihiplas relagdes, a fim de encon- tear sentido para sua existéncia, Dessa forma, o que queremos enfatizar é que o ser humano tem consciéncia da existéncia do mundo e de sua propria existéncia, enquanto 0 animal vive sua realidade de maneira fae obscura. Essa condigdo especifica do ser huma- no proporel mimero de relagdes, que se estencem desde a agao sobre a r intengao de transformé-la em seu beneficio ou em proveito coletivo, até o desenvolvimen- to de uma percepgio e fruigio estética do mundo. Assim, as relagdes humanas ndo se limitam aquelas mantidas com 0 mundo , mas se estendem As que envolvem os individuos entre si, tais como: relagées econémicas, juridicas e morais. Toda essa variedade de relagées que, porsua vez, determinam comportamen- tos também variados supe um sujeito real e concreto. Sendo ele sociale histori- camente localizado, traduzira em suas préticas os condicionamentos ¢ os limites que Ihe so impostos. sso justifica a predomindncia de um e no de outr de comportamento a cada momento histérico. E este 0 sujeito da pratica moral: real, histdrico, ee dotado de c digges de escotha, ou seja, de liberdade. © ato moral € exclusivo do ser humano porque este & o tinico dotado de consciéncia, de liberdade e de poder de decisao. Nesse momento, entra em cena a problemtica da liberdade interior, da li- berdade de escolha. E possivel falar de um sujeito livre, quando sabemos de to- | 1 nerusbessoaneagrica 25 dos 0s condi do momento em que ele pre o? Acreditamos que, a partir ta. 0 que exes qu: nao ‘amos pensando em uma situagio de absoluta liberdade sem nenhum tipo de limitagao causal. Mas, por outro lado, o ato moral também néo é arbitrério, ele depende de condigdes ¢ circunstincias que fogem ao controle do agente. ‘Assim, a iberdade que acreditamos fazer parte do agente moral nfo auséncia de condicionamentos; a0 contréo, cla dé-se dentro desses con entos, 0 que forca 0 sujeito a tomar decisdes conscientes. A convivéncia da berdade com determinagées caracteriza-se nao como uma forma de conciliacéo, ‘mas uma tomada de consciéneia dos determinismos que, também, compéern ‘mundo humano. Desse modo, a liberdade precisa ser analisada historicamente, e no como um dado a priori fruto éa abstracio; ela surge de condigdes concretas, e de um ser humano real, concreto e operante, capaz de transformar a realidade a partir des. £ esse poder que o ser humano possuii para coordenar suas ‘acerca de como deve agir que nos leva a consideré-lo comoo ver~ dadeiro agente da moral. PRATICA MORAL ‘Toda sociedade, por menor que seja ¢ por menos desenvolvida que pareca, a os através da porque eles. desempenham um pap ‘como elementos reguladores do compor- tamento das pessoas. Em outras palavras, como um elemento determinante do i nduta necessacia & sociedad. Logicamente, esses valores ni sio cla- jpostos pelas sociedades. © processo 6, de certa forma, sutil ¢ dé-se Os valores morais dominantes nao séo decididos voluntariamente por sujei- tos individuais; eles emergem da prépria experiéncia do grupo humano e vao-se cristalizando. Ao serem socializados, vio-se tornando consenso entre os membros da sociedade. A medida, porém, que se teoriza sobre essa moral, toma-se cons- ,€, entdc, enta-se buscar a hegemonia pela fos e comunicativos. zadios nesse processo de propagagao e de legitimago dos va~ lotes que interessam so muitos, variadbos e eficazes. Como dissemos, apéiam-se especialmente na familia e na escol i io do processo identifiea-se quase que com 10 pequienas, as eriangas comecam a ser modeladas conforme o “figu- rino oficial” e, nessa etapa, a familia clesempenha o papel central, porque as crian- 26 ‘gas aceitam 0s valores mais facilmente e, também, porque a familia é para elas uma referéncia muito forte. De uma forma ou de outra, os valores relevantes para a manutengio da sociedade acabam sendo passados. ‘A PRATICA MORAL EM NOSSA SOCIEDADE Asociedade contemporanea, mais do que qualquer outra, acreditou nos pode- res da ciéncia e da téenica como forma de proporcionar aos seres humanos uma vida de abundancia material ¢ de felicidade. Decerto, sew avango fez com que os individuos experimentassem poderes nunca vistos. Isso nos leva a crer que elas, se corretamente aplicadas, s6 seriam motivos de beneficios em todas os campos." ___ Entretanto, a conduc que o prépro ser humano Ihes impés fez com que a cincia ea técnica deixassem de ser yrondes promessas e se transformassem em perigosas ameagas, Primeito, porque elas nfo foram colocadas a servigo de to- dios; depois, porque clas, loge de libertarem 08 individuos, os tornaram seus escravos e, ainda transformaram-se em possbiidades de perigos ecoldgicos, de guerras nucleares, entre outtas. 4 ‘As falhas gue estamos registrando no processoclentiico e teenolégico tual certamente nao fazem parte da esséneia do mesmo, Ao contro, io frutos do ‘que 0 set humano tem feito dele; ecorrem de uma escolha politica de quem a e condut, A sociedade atual acha-se orientada por um verdadeiro culto 20 prazer @ a0 poder. No primeiro aspecto, desenvolveu um hedonismo que, longe de levar a0 bem-estar das pessoas, fomentou seu isolamento, sta depressio ea falta de pers- ‘pectiva para o futuro. No segundo aspecto, o poder econémico ganhou o mais alto aleance, fazendo oer humano voltar-se totalmente para a procura dos meios que litem 0 crescimento de seu poder econdmico. Assim, a sociedade capita: lista em que vivemos gerou relagGes materiais e sociais que dividem a populagio em classes antagdnicas: uma que desfruta dos beneficios do poder e outra que sofre as conseqiiéncias do poder. Todos desejam o bem-estar material, mas apenas al- guins 0 conseguem e desfrutam dele. Dentro dessa realidade, a concepao moral também se orienta na explora- go do ser humano pelo ser humano, onde o egoismo, a hipocrsia, o lucro e 0 individualism so incentivados e até cultuadas. A lei é a do “salve-se quem pit der”; cada individuo confia apenas em si mesmo e empreende todos 0s esforcos em prol da realizagio de seus interesses. Em fun¢ao disso, tudo se tornou inclusive o desconhecimento da existéncia do outro. 0 coletivo foi esque: para a manutengio dessas relagées, 0 coletivo ndo pode ser um objetivo. Nessa nova ordem, a esséncia humana ¢ alterada; valoriza-se no ser huma- no seu potencial produtivo, sua possi sei asus gid tan empepattonitder atin raftendes oenrairica 27 capital. Assim, ele passa a ser uma peca da engrenagem, um apendice ao proces: £0 produtivo, e néio um ser dotado de conscitineia, de expectativas e de desejos. ‘Como afirma Erich Fromm (1983), processa-se uma inverstio do modo “ser de vida para 0 modo “tet”. Af, 0 hiomtem vale pelo q) endo pelo que é. O lu ‘ro.¢ 0 poder tornam-se a meta central ea luta consiste em adquirir, em possutir fe em obter lucros. Com isso, desenvolve-se um processo de alienacio do ser hu- nano em que ele se submete ao produto de seu proprio trabalho, passando a tra taras coisas que ele criou como idolos. Como dizia Marx (1985, p. 146), "a alie- nagio conduz & perversio de todos os valores, fazendo da economia ¢ de seus valores —luero, trabalho, poupanca e sobriedade ~ a meta suprema da vids Esse estado de alienagio, apesar de néjo ser exclusivo das sociedades capita- lista, atinge nelas seu auge. ainda Marx (1970, p. 462) quem nos fala: “nos oficios manuais e nas manufaturas, o trabalhador utiliza-se de uma ferramenta; na fabrica, a maquina utiliza-se dele. La, 05 movimentos do instrumento de trabalho procediam dele; aqui, é 0 movimento das méqui- ras que ele tem de acompanhar”, Por outro lado, desenvolveu-se uma forma de repressio caracterizada pel cocupagiio do espago interior do eu, pela perda da individualidade a0 fazer com que todo cidadio identifique seus interesses com os interesses do préprio sna. Assim, todos permianecem submetidos ao poder co capita 0 “grande senhor ie roge essa sociedad, ‘A possibilidade de menor esforgo fisico e maior tempo livre para o trabal dor, anunciados pela nova forma de produgéo mecanizada, nd chegou a tornar- se realidade. No méximo, substituiu-se 0 cansago fisico pela tensio emocional, 0 que nio deiza de ser uma foima de escravizagio. ‘A moral que vigora em nossa sociedade baseia-se na exploragdo do ser hu mano € no aviltamento da pessoa. Nao s= preocupa em saber 0 que é bom para ele, esim 0 que é benéfico ao processo produtivo, ao capital em que o egoismo e fo culto do eu tornaram-se qualidades e sin6nimos de progresso ¢ de maturidacle. Essa prética moral identifica-se com as necessidades de justificagdo e de acomodagio necessérias a uma sociedade regida pela desigualdade e pelo pro- cesso de explora modo, nossa moral despreza as tudes padblicas da iberdade e valoriza os ditos "vicias’ indivi como: sexo, vestimenta, descanso, ot seja, prende-se no mora lismo privado, deixando de lado a moral puiblica O fato & que, através de mecanismos individuais ou institucionais, as dade faz com que 0s individuos tenham um tipo de comportamento que sati a seus interesses, estabelecendo relagées materiais e sociais perversas, na med! da em que quer fazer de todos fiéis servidores dos diecionamentos do capital. 28 acerca cos concertos A PRATICA MORAL QUE DESEJAMOS A construgio de uma nova orientago moral impie-se, poi n- ciando a destrulgd da naturezae do proprio ser humana, Mas de qe fons ela poderd acontecer? Sera por um processo natural de desgaste dos valores existen- tes? A prépria moral promoverd sua transformagio? ania? firmarmos que o ato moral €exclusivo do ser humano, somos levados a admitir que a moral possui raizes nele, pois dele depende a decisio quanto 20 tipo de comportamento a ser assumnido, Contudo, como fizemos ver ao longo destas reflexdes, os valores mor cles servem a determina is. Assim, stia manutengo ou superagao néio so frutos dla escolha livre ngdo ou siperagdo nao sao frutos da escolha livre do. agente, mas da estrutura social, politica e econé a lea que ele se ; ‘mica da sociedad a i lova orientagao moral exige alteragdes P ncia coetiee, principalmente, nas estrus sociais no que liz respeito a suas relagées de produgio e do poder. £ impossivel o advento de novos valores se no existirem condigées propfcias para ta Os valores niio se modificarso 3 r Por si mesmos; sua alteragio s6 acontecera como exigencia de uma nova order, de novas condigées conertas de producio ¢.de vida. Como o proceso ene a base condmica ea ins cc, as trans formagées ocorridas na consciéncia coletiva podem interferir a favor das altera~ ¢8es da esirutura da sociedade. Mane diz que as ielas poem ganar orca material”. {preciso usar essa forga em todas as suas possibilidades, Com isso, se ansiamos uma nova ordem moral , 50 va ordem moral, mais justa, mais humana e menos diseriminatéia,precisamos rir ascondigdes favordveis para qufea sua ‘© que serd totalmente impossivel de acontecer ge esperarmos f outro lado, essa luta nfo depende apenas do esforgo individual, pois a’constet. io de uma nova prética moral 6, antes de tuclo, um problema politico Vemos, assim, que a luta por uma nova e verdadeira prética mor er , P va e verdadeira prética moral imy alteragdes profundas. Se isso néio ocorre, podemos ter a substituigo de um ¢6 0 moral por outro de igual qualidade, o que nao caracteriza nenhum avango. E Comm apresentarem-nos situasdes de manutengio de cédigo moral como ma- nifestagSes de uma nova ordem,fato que se carateriza como uma forma de en- godo, que tem por objetivo calar as vozes e desarticular os surtos de inconfor- mismo, desequilibradores da ordem estabelecida, CARACTERISTICAS DE UMA NOVA ORDEM MORAL Em primeiro lugar, faz-se -ssdrio respeil fa necessario respeitar a pluralidade dos valores, r que a liberdade 86 pode manifestar-se efcazmente quando existe igualdade de oportunidades. A diferenca precisa ser reconhecida na ordem dos valores e dos fins, nueNorssomenerca 29 Essa nova ética deve permitirao ser humano escolher sua finalidade de viver, a partir daquela que se apresente a ele como capaz de Ihe proporcionar uina “vida oa’, Dito em outros termos, a pluralidade é 0 respeito & autonomia do ser huma- no, a sua capacidade de escolher; 6 0 caminho mais coerente com nossa faculdade criadora, pois respeita 0 exercicio da liberdade, Diferentemente de uma ordem de yalor que se caracteriza pela unicidade, baseada na imposigio de valores. Aliberdade &0 cerne dessa nova ética, Entendida como a supressao de todo tipo de coagio, interna e externa, ¢ de toda repressio imposta pela lei ou pela necessidade, Em outras palavras, 0 ser humano torna-se livre quando conseg olhar a realidade de forma mais simples, mais alegre e menos séria, Quando cle consegue ultrapassar 0 modelo de trabalho alienado, centrado na seriedade ena falta de prazer. Livre da repressio c da exploracao, representativas de uma so- ciedade comprometida apenas com a produtividade, com o lucro desmedido € com ‘sucesso a qualquer prego. Apesar da hegemonia que os cresce a consciéncia de que nao basta sanhar dinheiro sem sequer ter tempo para gnsté fisicas, os individuos possuem as espirituais (amizade, prazer, cultura, deseanso). Onovo discurso filoséfico (Pés-modert adesse ideal voltando-se pata avida pritica e distanciando-se das formulas e saberes estabelecidos. # no bojo dessas possibilidades que essa nova moral, que pode ser identificada como ‘emancipatéria, se coloca. ssa ética pode ser assumida como a da justiga social, ao colocar em primet- ro plano o bem, em detrimento da defesa da lei moral. A ela nfo interessam as condigées de raga, classe ou sexo, pois seu compromisso é com a liberdade de escolhia de todos os individuos e com a superagdo de toda forma de exploragio € de dominagio, inclusive aquela que tem sido exercida pela razdo sobre os instin- 05 ¢ 0s sentimentos. Essa proposta procura trabalhat com o sério ao lado do pra- zer edo belo. Sem dtivida, essa é uma proposta que encontra muitas resisténcias nas socie~ dades capitalistas que se assentam na relagio do trabalho assalariado com os proprietdtios dos meios de produgio. Nesse contexto, ela se caracteriza como uma proposta rransgressora, porém, como diz Gianotti,"é na transgressio que a com peténcia se revela [...] 0 sujeito sé se mostra na transgressio ou quando abando- na de vez. um determinado sistema de regras” (1992, p. 241). 86 através da transgressio & ordem estabelecida o ser humano terd condi- ‘goes de alcancar a liberdade e cleger 0 seu prdprio caminho. © que nao significa ‘o“reino da liberdade”, a falta de limites e de critérios, mas sim a substituigio de critérios externos por internos, pela escolha responsdvel, que é, sem dilvida, paradigma ético mais eficaz para se assegurar a convivencia pacifica entre os in- dividuos e reconhecer os contrérios. listas mantém, no mundo atual, a nfio pode resumir-se a que, além das necessidades 30° actnca pos coxcruros 86 ass jossivel construir uma moral libertadora em todos os aspec- tos, tanto no \gdes externas, quanto no das internas. No primeito, fomentando a libertagie dos paises pobres do jugo dos paises reas, de modo a terem o direito de tragar o seu préprio eaminho, longe de impasigdes externas, Essa libertagiio impée-se, pois, como sabemos, muito da alienagao e da desuma- nizagdo decorre da situagao de dominacio a que, historicamente, esses paises tém estado submetidos. No plano interno, dentro do dominio do préprio pats, no que diz respeito as Telagdes que os seres humanos mantém entre si, seja na relagéo fami se refere as (negros, mulheres, indios etc.); e, principalmente, no que diz respeito aos pobres e aos oprimidos. Em todos os casos, deve-se ter presente um compromisso inaliendvel com a transformagio social, com a construgio de uma sociedade mais justa e igualitéria, onde a pratica moral seja embasada no respei- (0 mtituo, na honestidade, na igualdade, na solidariedade e no armor. Para Erich Fromm (1983), esta é a palavra mégica: amor. Ele advoga a ne- cessidade de uma revolugio nas consciéncias em que o amor seja o elemento determinante. Concordamos com ele em parte, pois, certamente, estamos viven- do um momento de desamor, e muitas das situagées decorrem disso; entretanto, como afirmamos anteriormente, o anior sozinho nio terd condigdes de operar a transformagdes necessérias; elas dependem de mudangas mais profundas, de base, nas relngdes materiais e sociais entre os seres humanos. Acreditamos que somente numa sociedade igualitdria, onde os individuos tenham os mesmos direitos de participar das decisées e das execugSes dos proje- tos sociais, onde o trabalho seja desenvolvido cooperativamente por todos, onde a marginalidade e o preconceito sejam abolides, sera possivel o desenvolvimen- to de uma motal eujos valores sejam representativos de todos 0s individuos, e vida humana séja respeitada em todos os sentidos. No dizer de Vésquez (1975, P39): {nismo; trard também uma mudanga radical na atitude para com a mulher e a estabilizagao das relagées familiares, realizagio efetiva do principio Kantiano que con © homem como fim e no como meio”, la a considerar sempre Por outro lado, como dissemos, no devemos lutar contra a individuatidade e sim contra o individualismo. As qualidade is devem ser respei assumidas dentro da esfera piblica, ctiando condigées para que seus anseios e desejos possam ser realizados, desde que nio se transformem em egoismo ¢ in- dividualismo. Situagdes que deixariam de reconhecer a existéncia do outro e pas- sariam por cima de qualidades como tolerdncia, cooperagiio social ¢ eqjiidade, FACULDA CaM BIBLIOTECA pais Doutrinas Eticas | 2, Princ omens ‘Apés termos discutido os conceitos bisicos, necessérios ao entendlimento da iin, de refletnnos sobre a prea mora na soredade contemporines,espe- ramos que tenha ficado evidente que cada sociedade, cada c\ valore moras diferentes, correspondentes a suas cordigbes histérleas ea seis ineresses enecesidades.Prtanto, po conta da areulago histrea pela for. ma como cada sociedade vé os valores, existem diferentes douttinas éicas, 4 nse op acs, mas artes othe 20 pce, alberi so interesse& a itica Organizacional, no presente ca fants, sem nenhurma pretenso de esgotar o assuno; muito peo conto, nos stntengd €tratttode forma genéres, pos precuramos com iso apenas com preender a historicidade dos valores e nos apropriarmos de elementos Flos As reflexdes que procuraremos fazer nos capitulos subseqtlentes. lo, IDADE ANTIGA viveram os fil6- No perfodo considerado Cléssco da Idade Antiga, no qual viveram os f6- sofos Sécrates, Patio e Aristoteles, a ética adquire grande valor. ApSs ie to pré-soertic, em que o interes investigative concentrou-se no mundo fisio, na tentativa de compreenderem sua esséncia, 0s filésofos se volram para 9 $7 ¢ para os problemas socais€ morais As condigBes da Grécia, especialmente d ‘Atenas, baseada na democracia escravista ¢ na democratizacao da vida politica, entre outras, favoreceram o surgimento da filosofia moral, 32 acancapos covcri0s Formada por comunidades independentes e dispersas em torno do Mediter neo, tinha certa homogeneidade quanto a lingua ¢ erengas religiosas, dentre outras. 0 isolamento das comunidades diminuiu a partir do século VII a.C. com © incremento do comércio decorrente da invengio da moeda. CO surgimento da polis fez. com que o centro da cidade passasse a sera praga piiblica, a agora. Nela aconteciam as discusses e era permitida a participagao de todos 05 cidadaos, quais sejarn: os homens adultos, exeetuando-se os escravos € iros. Nessa nova forma de organizagao social e politica, a democra- cia, 0 logos, ou seja, a razdio, a palavra e o discurso tomaram-se mais importan- tes do que a condigao social ¢ econémica do individuo. Isso porque entendia-se que 0s assuntos piblicos dependiam do poder de argumentagio.. Com isso a antigiiidade grega repeliu o mundo da pratica por nao conseguir ver nele nada além de seu aspecto pratico-utilitétio, A atividade manual era con- siderada indigna dos homens livres, que deveriam ocupar-se com as de caréter intelectual, ficando aos escravos a responsabilidade com o trabalho manual. Essa Aivisdo do trabalho servi para acentuar ainda mais a disténcia entre a teoria ea pratica. E, como nao poderia deixar de ser, a atividade prética dcupou um lugar inferior no mundo grego. Sécrates (469-399 a.C.), considerado o pai da filosofia moral, nasceu em Atenas, filho de um escultor e de uma parteira. f.consideraclo um marco, de modo que todos 05 pensadores que 0 antecederam foram identificados como pré- socréticos. Apesar de conversar bastante, nada deixou escrito. Viveu a democra- cia grega do inicio aofim. Foi condenado & morte no ano de 399 a.C. Dedicou-se & busca da verdade, que deveria ser uma forma de juizo univer- sal, capaz. de dirigir a vida das pessoas, no plano pessoal e politico. Nao preten- dia ensinar e sim aprender, o que era feito através de um método que evitaria os desvios e conduziria o pensamento a esséncia das coisas, baseado na formulagio de questées e que levatia ao conhecimento verdadeito. Assim, procurou despertar 0s ividuos para sua ignordncia, por vé-la como perigosa ¢ iluséria, e recomendava: “conhece-te a ti mesmo”. Ele mesmo, ao set identificado como 0 homem mais sabio, e nfo confiante nisso, procurou conver. sat com outras pessoas também tidas como tal; em todos os casos, concluiu so- bre a inverdade, admitindo que de fato era mais sdbio porque tinha consciéncia as suas limitagdes, ao saber que nada sabia. A questi central de sua ética era o bem supremo da vida humana, a flit dade (eudemonia). Esta nao devia consistir em ter sorte ou ser rico, por exemplo, ‘esim em proceder bem e ter uma alma boa. Portanto, o Bem era agir bem e a fel cidade, ter uma vida correta, apresentada da seguinte maneira: “a arte moral na éa arte de viver bem tendo em vista alcangar a felicidade, e sim a arte de ser fe- liz porque se vive bem” (Maritain, 1964, p. 35). revarasnorranasincas 33 ata 80 a mesma coisa. Entretanto, so determina das pelo que 0 ser humano é, consistem nos bens da alma, em ter o espirito livre de perturbagbes e dedicado 20 conhecimento ¢ a verdade. Esse conhecimento era considerado por ele como a virtude, ¢ a ignordncia como 0 vicio. “Todo pecador é um ignorante. Ninguém é mau por querer 0 ra as porque nio conhece o bem” (ibidem, p. 36). Como se vé, hé nele um entr lagamento entre bondade, conhecimento ¢ felicidade. Conhecendo o bem, oho- mem agiria bem, com 0 que se sentria feliz porque seria dono de seu destino © de si mesmo, Para ele, as questées morais nfo sfo puramente convensées influenciadas pelas cizcunstincias, mas problemas que devem ser resolvidos & luz da raza. O ‘que implicava denunciar as falsas virtudes. lavdio (427-347 a.C.), também natural de Atenas, foi diseipulo de Sécrates, ‘a quem imortalizou através de sua obra, seguindo-o em alguns aspectos ¢ rejel- tando-o em outros. Apés a morte de Sécrates ¢ vendo nela a sintese da situacao desgovernada, no plano dos valores, por que passava a Grécia, desiste do desejo de participar da politica c funda a Acaclemia, dedicando-se a reflex filoséfica assim como a discussio sobre temas diversos, tais como a matemética ¢ a astro nomia. Para ele, tudo 0 que conhecemos como existente, até mesmo os concsitos que esto em nossa mente, nio sio reais e sim imagens reflexas do Ser transcen- dente, pois segundo cle, existiam dois mundos: um sensivel e outro supra-sensi- vel ot inteligivel. Como dizem Luckesi ¢ Pass0s (2000, p. 136): “thd um mundo préprio das Idéias, transcendente, fora do espago e do tem- 30, aléin das esferas do sentir e do pensar. As idéias si a verdadeira rea- em nossa expet So dois mundos distintos, porém, articulados, pois o primeiro seria imita- ‘io do segundo. Da mesma forma que ele subordina o mundo sensivel ao das idéias, também © faz. com o bem moral ao supramoral. “O bem s6 pertence ao mundo em ‘como reflexo,” Sua moral, assim como a de Sécrates e como serdia de Aristételes, Geudemonista (Felicidade). Para ele, assim como o fim da vida humana é trans- cendente, a moral também consistiré em um preparo para a felicidade, que se encontra fora da vida terrena. Diferentemente de Sécrates, Platio considers que amoral é aarte de prepararo individuo para uma felicidade que nfo esté na vida terrena. Diante disso, via a alma como con: de razio, vontade eapetite, des- tacando a superioridacte da primeira (razsio), em dettimento da ftima (apctite), tida como inferior por estar ligada is necessidades corporais. Ox seja, pela con- 34 acancaos concerres templagao os individuos atingiriam o mundo das idéias; para tanto, fazia-se ne- cesstiio purificar-se e desvincular-se do mundo da matéria Nesse proceso, & preciso que as virtudes sejam praticadas. Dentre elas: a prudéncia, tida como a virtude da razao; a forteleza, virtude da vontade; ea tem- Peranga, virtude do apetite. Como sua teoria éica relaciona-se com a politica, a azo (prudéncia) corresponderia aos governantes (Fildsofos), a fortaleza aos guerreiros e a temperanga aos artesios, ___ Avalorizagio dada a razio, & contemplagio, fica evidenciada na classifica: so apresentada. Do mesmo modo, nas recomendadas pelo fildsofo, ao apresen- tar a férmula para a felicidade: “cada um de nés para set feliz deve procurar 2 temperanga ¢ nela exercer-se, fugit 0 mais répido posstvel da intemperanca, agit de tal modo que nao precise ser castigado” (Plato, 1948, p. 478). Caso o castigo no pudesse ser evitado, deveria ser aceito com resignagio, pois o pagamento da divida tornaria possivel a felicidade. Arist6teles (384-322 a.C.) nasceu em Estagira, foi discipulo de Plato e pre- ceptor de Alexandre Magno. Foi um dedicado disefpulo da Academia de Plato mais tarde fundou sua escola, o Liceu, que se tornou um centio de estudos das ciéncias naturais, Diferentemente de Platio, seu mestre, nio desprezou o mundo se muito pelo contrério, buscou unir as observagées desse & ciéncia e & filosofia, Também rejeitou o mundo inteligivel, por vé-lo como incapaz de oferecer expli cagdes sobre as questées ligadas aos sentidos. O conhecimento deveria ser do real € nao de sua idéia, portanto, parte dos sentidos. “Para Aristételes, o conhecimento € esse processo de abstragao pelo qual o intelecto produz conceitos universais que, ao contratio das idéias de Platao, nao existem separadamente das coisas ¢ do intelecto” (Abra, 1999, p. $6). Preocupot-se bastante com a forma como as pessoas viviam na sociedade. Assim, escreveu obras importantes sobre a ética: £tica a Fudemo, Etica a Nicémaco € uma Magna Erica. Sua ética era finalista, no sentido de visar a um fim, no caso, «que 0 ser humano pudesse alcangac a felicidace. Entendia a moral como um con. Junto de qualidades que definia a forma de viver e de conviver das pessoas, uma espécie de segunda natureza que guiaria o ser humano para a elicidade, conside- rada a aspiragao da vida humana, Conforme entendia, a felicidade era composta de vatios bens, dentre eles: a sabedoria, a virtude e 0 prazer. A sabedoria era considerada o bem de maior va- lor, por se identificar com a contemplacao, atitude muito mais importante do que 2 acio naquele momento. Em seguida, vinha a virtudee, por iltimo, o prazer, que do era considerado constitutivo da natureza humana, e sim a ela incorporado por acréscimo, PaNGRAS DoUTADASErCa 35 © bem moral consistia em agir de forma equilibrada e sob a orientagdo da ra- © ponto justo levaria & felicidade, a uma “vida boa e bela rio como privilégio individual e sim coletivo, pois considerava que o bem indivi dual ndo poderia estar em desacorcio com o bem social. A orientagio era viver em conformidade com a tazo e com as virudes do cidado, de onde viriam odiscer- nimento e oautocontrole, que fariam a assimetria entre desejos e hablldades. Como se vé, viver bem e de modo equilibrado néo era uma situago natural do ser humano, mas decorrente de um aprendizado que se daria por intermédio da razao e do desenvolvimento de bons habitos. Diante disso, ele valorizou a vontade humana e a deliberagdo, seguidas do esforgo para praticar bons habitos. Em sintese, a pritica moral exercitada pelos filésofos orientou-se por cpios gerais acerca do fim e do bem, fornecidos pela reflexsio ontolégica. A idé de bem moral dependia da idéia do ser, ¢ como os seres humanos s6 atingiriam sua perfeigao a partir do prévio saber racional sobre o ser, sett comportamento deveria ser orientado pela compreensao da esséncia, pois esse entendimento era condigio para se perseguir 0 verdadeiro bem. Com a morte de Alexandre Magno, a Macedénia e a Grécia desagregam-se e passam a ser dominadas pelo Império Romano. Entretanto, culturalmente os ‘gregos sao superiores e exercem forte influéncia, inclusive sobre Roma, de modo que a perda de autonomia politica nio interferitt sobre seu patriménio cultural. Apesar disso, o contato da cultura grega com outras culturas trouxe modifi cagBes profundas na vida dos gregos, em sua forma de governo, nas erencas re sgiosas e, especialmente, na concepcio de si mesmos. Deixam de ser livres cid aos da pdlis, para serem igualados a todos os demais homens, tidos por eles como barbaros. Também eles sdo, agora, stiditos. Isso acarreta mudancas significativas no plano moral, pois ela se realizava na politica, por ser © homem, acima de tudo, um animal politico que sé encon- trava a felicidade na pélis. E nesse momento, denominado de helenistico, que surgem as correntes filosdficas denominadas de epicurismo e estoicismo. Epicuro (341-270 a.C), criador do epicurismo, éfilho de um mestre-escola ¢ de uma cartomante, nascett em Samos, colénia de Atenas. De cultura requintada levou uma vida regrada e dedicada & cincia, No ano de 306, fun- dou em Atenas a Escola do Jardim, onde vivia com seus discipulos. Sua filosofia estava dividida em trés partes: canénica, fisica ¢ ética. A tlti- ma é considerada a mais importante, por ser a que indicaria 0 caminho da sabe- doria e, portanto, da felicidade. Como escreveu: “uma vida feliz & imposstvel sema sabedioria, a honestidade e a justiga, € estas, por sua ver, sio insepardveis de uma vida feliz. Aquele cue nio vive nem honesta, nem sabia, nem justamente, nfo pode viver fe por Corbisier, 1984, p. 318). raxcrnsoounmasincss 37 86 Acerca vos conenrros r iio tenderia exterior. Também, a contemplagao Entendia que a vida humana podia ser afetada pelo prazer ou pela dor, sen- if gesejavel em si porque no tend: eum eee Models enor! doo primeiro sua inclinagi , de modo que a dor deveria ser evitada. Para pede lugar ora a viewde moral que éculoeads como o gue bide melt np ; p Prazer seria “o fim ¢ o comego de uma vida bem aventurada’, o primeiro jf fante. Assim, o fim supremo da vida hum , os bens nacurais. O prazer, identificado com a auséncia do solrimento e da dor, teboa. onal Se eee lcdade: j Bm que consis a viude? Ba, 20 mesmo tempo, conhecmento racona é cay i O prarer Felicidade, como fica posto, nao consiste em qualquer forma de e forca suprema. Ser virtuoso é ser senhor de si, capi F nat é viver de acordo coma lei impe- prazer, ¢ sim naquele mais duradouro ¢ estvel, vindo do repouso ¢ niio do mo- # * sya natureza. “Viver de acordo com Se ora no ceaa (aaa vimento, Esse era um prazer superior aquele oriundo de movimento, porque evi f° rial da nature, de acordo com 04) taria qualquer tipo de desprazer, de perturbago, condigdo para o verdadeiro §f 2.1964, p. 75 1, € 0 sdbio (0 Prazer. Como afirma Pessanha (1992, p. 75): “o dpice desse tipo de prazer éa "para os est6icos, no mundo acontece apenas o que Deus quer, Conquista da imperturbabilidade de espirito (ataraxia). Mas ela s6 chega Aiscernimento da diversidade dos desejos, pois nem todos devem ser atendid it a0 individuo o méximo de prazer. Para isso, leveriam ser cultivadas, tais como a amizade, a ¥ i is importante é viver conforme a razio, ein) deve aceitar seu destino, O mais importante é ne aad, tendo consciéncia do seu destino de sua fungio no universo, sem deixar do **minar pelas paixdes nem pelas coisas do mundo exterior. Essa € a posigo bio, aquele que nfo permite ser perturbado pelo mundo externo. dogura e a magnanimidade, 0 fim da vida moral €0 prazer, de modo que desaparece a idia de bem em si, Também a virtude é relativizada, consistindo apenas na capacidade de se ob. ter o prazer maior, enquanto o homem virtuoso torna-se aguele que sabe as for. mas de chegar ao méximo de prazet como minimo de softimento, Prazer nio como “Trulgio dos sentidos", como escreveu, ¢ sim como auiséncia de softimento fileo Ja, houv cane jutifcao pels epidemias e plo medoreinants, entre outros. Todavi, howe noc ural, como a preservagio da cultura greco-t Assim, fazia-se necessirio que os desejos fossem controlados, a fim de nto if! icativos no campo ee eat eentticn, ‘a organizagio do sis- Ultrapassarem os naturais. Ser prudente quanto aos prazeres € os instintos cons. hana, a produgao de um pensar tituitia em caminho seguro 4 verdadeira felicidade, Na visio de Pessanha (1992, p. 75): lia foi nascime época que a sucedeu, de Idade Média foi considerada pelo Rena rento, Epo 7 ituagio politica social era mais complexa, de modo que nio se podia gtd a nein arnons da ll grea Tumbin p: ques scl shouve o predominio da teoria sobre a pratica. O Cristianismo tornow-se cial ¢ influenciou tudo, inclusive a pra a as © conteiclo moral moaificou-se, entrando em cena a sine, hued ea soso parm eee, una ve gu 2S Iumanoseram considerados como a imagem ea semelhanga de Des. O que os “unifcava era a autoridade de Deus, identificada como a orgem ofundamento da lei moral, Esta decorre de verdades reveladas que deviam ser respeita seguidas a fim de que o ser humano pudesse atingir a salvacio. i SA ética cristd estabelece a relngiio entre Deus ¢ homem, baseandose em verdadesreveladas. Nela, Deus €colocaco como origmt ¢ fim de tudo, inclusive das ages humanas. Assim, resta 20 ser humano seguir as leis divinas, su se ale. ‘esse controle racional da afetividade coloca a existéncia humana em com a natureza das coisas reveladas pela fisica e impede que se siga na direcao apontada pelo desejo que nio expressa uma necessi. dade natural, antes constitui imposigio do meio social em seu aparente A ética epicurista orienta para a necessidacle de haver limites, a fim de g: rantira serenidade e uma vida feliz e sem atropelos, e para se construlr uma “es: vética da existéne Zendo (324-263 a.C.) éoriundo de Citi via a vaidade como a coisa ¥a 0 mesmo aos jovens. re), ouco e is (cia do mundo. Viveu de forma simples ¢ ensina- O Estoicismo , acima de tudo, uma ética, ou seja, orientagao central consiste em de acordo tal como o havi uma forma de viver, cuja fer conforme a natureza, o que significa dizer, 5 nfo fizeram ies morais diferentes daquelas da dade de igual- Com esse entendimento, fe lentre as quais, a fé, a esperanga e a caridade, Ta 38 scenca voscoxcsrras dade entre os seres humanos, pela condigio de filhos de Det le uma igualdade espiritual e s6 possivel no plano sobrenat A ética cristi era, pois, uma forma de regular a vida das pessoas, tendo em vista mundo futuro, Baseava-se em regras de condutta abstratas e tniversai, oriundas de Deus. A subordinagdo da ética a principios ri dinagio que a filosofia vivia em relagio & teologia. As principais teorias morais desenvolvidas nesse perfodo confirmam essa orientagio. Santo Agostinko (354-430) nasceu em Tagaste, provincia romana ce Numidia, filho de um pagio e de uma crista. Foi professor de retdrica, viveu em Roma em Milio. Apés uma vida considerada desregrada,! converteu-se ao Cris- tianismo e tornou-se bispo de Hipona. De inicio, caracterizado por grande inquietagao intelectu: maniquefsmo, uma giam o mundo. Nao sa escteveu obras como Ce inculou-se ao que acreditava que dois princfpios, 0 bem e 0 mal, re- feito, tomou conhecimento do pensamento de Plato ¢ ses e Acidade de Agostinho viveu em um periodo situaclo entre o fim do mundo grego c o inicio da Idade Média (séculos IV e V), no qual o Cristianismo o centro de tudo, ¢ a razdo acha-se em decadéncia. Props restauré-la através da fé, pois considerava ossivel ao intelecto hiumano levar & verdade, imutdvel e eterma, Desse modo, © tinico caminho possivel seria Deus e a fé, porque era preciso “compreender para ‘rer, crer para compreender” Para ele, o ser humano era a sede de Deus ¢ mundo exterior s6 fazia sen- tido porque tinha Deus, em si. A verdade est4, portanto, dentro de cada um e ser desvelada através da meditagao. Essa busca da verdade faz. do homem um ser inguieto e em continua procura 4 Deus era a concretizagao da bondade alisoluta, “o principio eterno, cxiador de todas as coisas; ele €0 ser. Ele €em si; nao muda; épleno” (Luckesi, Passos, 2000, p. 167), enquanto © homem, a encarnagio do pecado, a miséria e da da nagio. O gnero humano, em seu entender, consitula-se de uma “massa de pe cado¢ perizao" cuja recuperagio depenci da vontade eda bondade divinas, A ‘moral fazia parte do dominio divino, sendo suas normas e seus valores cries livres de Deus, Assim, os valores moraiss6teriam sentido por sua relagao com a vontade de Deus, e o bem sé seria bem diante da mesma condigao. Eniretanto,o ser humano podera, ela sua faculdade da vontade, que é1+ vre eeriadora, optar por afastarse dos ensinamentos civinos edirigirse paca 9 mal. Nesse descaminho, apesar de ser de sua ineira responsabilidad, ele pre’ saria da vontade e do poder divinos para reencontrar 0 eaminho do bem, Com isso, afirmava que o pecado facia parte da esséncia da humanidade, pois, pelo 1 Ele naca miouciosamente sua vida em se vo Iniculado Confsses abi ee sieshea pes Sinise rncoxsoourmaséncs 39 pecado original, o ser humano tornot-se seu escravo e condenado a pecar sem- pree, 96 através da grasa, poderia livrar-se dele. ‘Agraca, dom divino, cra um instrumento necessério por ser 0 tinico capaz de resgatat o ser humano dos pecados do mundo, Por outro lado, pot ser um ins- trumento de corresio, cla poderia conviver com o livre arbltrio, sem afeté-lo. ‘Tomds de Aquino (1225-1274) nasceu em Roceasecca, na Itilia, estudow na © Universidade de Népoles e no ano de 1243 passou a fazer parte da Ordem clos -” Dominieanos. Também estudou na Universidade de Pars, onde recebeu o titulo ‘de doutor em teologia e tornow-se seu professor, Tem uma obra significativa, em que comenta a Biblia, discute a obra de Aristételes, dentre outros assuntos. Sua “maior preocupacio em todos os seus escritos, porém, é discutir 0 uso da razo, © gs erros cometidos e os acertos apresentados. Ela néio deveria extrapolar seus I nites e penetrar naqueles do campo da fé, nem deixar de contribuir quando fos- se chamada para colaborat com el © século XIII earacterizou-se como um momento de crise na Filosofia, provocada principalmente pelo aparecimento das idéias aristotélicas, pela funda- ‘gio das Universidades ¢ pelo surgimento das ordens religiosas: franciscana ¢ “Apesar das mudangas provocadas por esses acontecimentos, a ess@n =" cia metafisica do pensamento filoséfico niio se alkerou. ‘Tomé de Aquino considera afilosofia menos importante do que a fé, & qual devetia se submeter de forma natural. Ele, como de resto todos os grandes meclie- , fundamentou sua concepgio de mundo e sua conseqiiente concepgio mo- ral, também, em um fim tiltimo, em uma verdade transeendental, em Deus. Des- te fim supremo dependia a felicidade humana, ; ‘A doutrina moral tomista, como toda a sua concepsio filoséfic i se com os principios te6ricos da doutrina aristotélica, com algumas distingdes. No caso da moral aristotélica, como procuramos mostrar, a felicidade é 0 fim dltimo do ser humano, Em Tomds de Aquino, o fim titimo é Deus, e a felicidade encon- tra-se Nele. ‘Tomés distanciou-se de Arist6teles quanto ao fim tltimo da pritica moral, entretanto, quanto ao caminho para se atingia felicidade, eles se encontram, pois, tanto para tim quanto para o outro, chegariam a ela pela contemplagao ¢ pelo conhecimento. Para Toms de Aquino, esse conhecimento caracterizava-se como a contemplagio de Deus e dos seus atributos. Com isso, a Idade Média, sem fugir & orientagio metafisica, inaugura uma novidade no terreno da moral ao deslocar 0 eixo do fim tilimo da vida humana, de um valor bom em si mesmo, para um bem que est em Deus. Se para as con cepgées anteriores, a felicidade era atingida no préprio ser, agora, ela se encon- tra no plano transcendental e atingi-la requer apreender o fim dltimo que se en- contra em Dews, 40 ncteca nos cavcertos Essa alteragao interfere, também, no conceito de fe terabsoluto ¢ transforma-se em Bem-aventuranga, que razio, nem pela filosofia, mas pela fé erista gue ganha igida nem pl IDADE MODERNA. ‘A Modernidade, estabel 05 séculos XVI e XIX, difere da anterior em todos os aspectos: econé: 0, social e espiritual. Centrada em rela- Bes econdmicas capitalistas € no desenvolvimento cientifico, hé o fortalecimen- to da burguesia, que postula impor-se politicamente; criam-se estados modernos centralizados ¢ a Igreja Catélica perde a hegemonia que até entao desfrutava, Nesse contexto, também ocorre a separagio entre razlo e fé, emergindo 0 ser humano como um valor em si mesmo. Desfaz-se a idéia de que existe uma natureza humana e descobre-se 0 individuo uno e sujeito como o ponto de parti dae o centro do conhecimento. Do mesmo modo, nfo mais se sustenta a idéia da ica como 0 caminho para se chegar a uma vida boa no sentido aristotélico. A vida boa ganha novos \dose a felicidade passa a ser, por exemplo, a liber- dade de escotha. A possibilidace de escolha da profissio, religiio ou a forma de vida que se quiser sio exemplos dessa nova condigéo, __ Isso foi possivel, porque os individuos passaram a ter valor por si mesmos e iio apenas por serem cidadaos da pélis, como acontecia com a ética aristotél ou por serem a imagem e semelhanga de Deus, como se dava na ética medieval. A ética que surge ¢ vigora nesse periodo ¢ de tendéncia antropocéntrica, em que o ser humano & seu fim e fundamento, apesar de ainda consistir na idéia de um ser universal e possuidor de uma natureza instvel. Assim mesmo, ele apare- ce como 0 centro de tudo: da ciéncia, da politica, da arte e da moral. ‘So muitas as teorias éticas que feutificaram nesse periode, entretanto, des- tacaremos as idéias de Kant e Karl Marx.? Immanuel Kant (1724-1804) nasceu em Ko iase toda a sua vida, apesar de acompat nesmo de longe, a grande conturbagao social por que passava a sociedade, consubstanciada em fatos signi- ficativos como a Revolugio Francesa (1789). Sua contribuigéo é enorme nas campos do conhecimento ¢ da ética, No pri- meiro aspecto, demonstrou que nao era 0 sujeito a girar em torno do objeto, 20 contrdtio, o que ele conhecia era produto de sua consciéneia, (0785) ¢ cori. 3 sabicn a vitnterwnreeasais disse aera rexopaspouremaséncas 41 ar que a lei mo- dor, vai estar presente também em sua doutrina moral, a0 a ral era a0 homem pela sua propria consciéncia. Para ele, otinico bem em si mesmo era a boa vontade. A vontade é boa quando age sem nenhum interesse que no seja 0 cumprimento do dever pelo dever. 0 ordenamento feito pela boa vontade é universal ¢ deve servir a todos em qualquer tempo ou espaco. £0 que cle chamou de imperativo categérico, que recomenda: “age de maneira que possa querer que o motivo que te levow a agir se torne lei universal”. independente de condigdes empiricas, por conseguinte, como vontade pura de- terminada pela simples forma da lei, e este principio de determinagio ¢ visto como ‘Como se vé, a moral kantiana difere substancialmente das concepgdes ante- riormente apresentadas, contudo, apresenta alguns elementos de identificagio. © Seu ideal moral foi profundamente marcado pelo Cristianismo e por suas convic- (Ges cristés. Com esses elementos, cle fundou uma moral auténoma e absoluta, extremamente fiel ao valor sagcado da obrigagao moral, e baseada no imperati- vvo categ6rico do dever imposto racionalmente. nquanto as cout gir uma fe- licidade ow um bem, esta é uma moral da pura razifo edo puro dover. A pritica moral devia basear-se apenas nas orientagées da razao, deixando totalmente de Jado o mundo empirico. Assim, ele construiu uma moral desinteresseda, despro- vida de qualquer finalidade e de qualquer motivagio, que nao fosse o “cumpri- mento do dever pelo devee”, pois, para ele, atinica coisa verdadeiramente boa , como dissemos, “uma boa vontade”, a disposigao em seguir a lei moral em Getrimento das vantageas que cla pudesse proporcionar ao individuo, Assim, a lei moral seria incondicional ¢ absoluta. Kant reconhecia que os preceitos da sua Btica eram duos ¢ dificeis de se- rem colocedos em pritica, contudo, estava convencido de que uma sociedade seria possivel se a beleza, a felicidade, o amor, se submetessem ao dever lade. Dessa forma, cle aproximou-se da doutrina moral revelada e das doutrinas idealistas ao criar uma moral que nio levava em contaa sitwagao do homem no miindo; por outro lado, ele distanciou-se das doutrinas morais da Idade Ant da Idade Média a0 perceber a fragilidade do eudemonismo ¢ do bem supremo € edificou uma moral mais consistente alicergada no puro dever. ‘A moral kantiana, baseada no puro dever, é metafisica ¢ idealista, na medi- io formal (0 dever), sem Ihe d 42. ncencnos conceros IDADE CONTEMPORANEA Esse é um periodo de grande progresso cientifico ¢ valorizagio do ser hut mano conereto. Também de reago ao formalismo ¢ racionalismo kant desse modo, a uma ética centrada em valores absolutos. tenha o ser humano como sua origem e seu fim, Nio podemos falar de uma nogio comum de bem nem de felicidade porque nao sabemos o que deve ser uma humanidade perfeita; assim, as regras morals transformam-se em regeas de convivéns tos fundamentais passam a ser a igualdade e a liberdade, ou seja, as chamadas “virtudes p te de umia sociedade plural e heterogenea, a ética precisa ser capaz de garantir 0 cumprirzento de direitos fundamentais a todos 0s individuos, nfo pe imposigo ou obrij:agéo, com cédigos a serem obedecidos. A exigéncia de fide dade a prinepios jrontos seria muito pouico eficaz, Representando essa época, destacaremos © Marxismo, o Pragmatismo e 0 Existencialismo co"no coneepgSes mais signficativas do ponto de vista da refle. xio ética, Karl Marx (1818-1883) nasceu em Tréves, na Alemanha, no s familia de classe média. Foi o fundador e maior representante do hist6rico. Pa ‘de que 0 dealismo mistificava a re la decorrente dos conceitos e, dessa forma, criava uma moral também mistifica, da, pois embasada em prineipios irr igurou uma nova teoria moral com bases assentadas no concreto, no rel, na pritica, Entendia que o ser humano era ao mesmo tempo social ¢ histérico, objetivo ¢ subjetivo, capaz de criar e de interferir na realidade ¢ transformé-la A sua me. ida, Nesse processo, ele néo s6 construfa o seu mundo concréo, como também a sua fundamentagéo valorativa. Assim, existe uma relagio de dependéncia entre © mundo material das for- S28 produtivas e das relagées de proclugao, que ele denominava de infra-estrttu. 4, € 0 mundo espiritual, das idgias politics, juridicas, filosdficas ¢ dos valores, que ele chamava de superestrutura. Nessa relacio, o primeiro exerce uma predo, mindncia sobre o segundo, Assim, a infra-estrutura (base econ6miea) condiciona estrutura (as formas da consciéncia) nfo de forma mecdnica, e sim ido, como 0 fatar econémico é 0 determinante, sua alteragio interfere a superestrutura ideolégica e, conseqiientemente, nos valores morais. Esse t de entendimento serve para explicar 0 cardter histérico ¢ dial mano, a sociedade e os valores ganham na doutrina marxista, Amoral (e o processo a ela articulado) na sociedade, em geral, ¢ na burgue- ‘a, em especifico, serve de justficagio as relagoes maceriais e sociais que os seres humanos estabelecem entre si, Muitos dos preceitos morais definidos s6 podem adh 4 a unctesscouranastncas 43 existir em determinados regimes socizis. Por exemplo, o preceito “no roubat” 56 pode existir em uma sociedade onde impera a propriedade privada; sem ela, niio poderia existir roubo, Assim, a moral, ao mesmo tempo, se assenta ese direciona ds relagBes que os seres humanos estabelecem entre si, Daf vem a compreensio de que a moral compée, com outros elementos, a superestrutura espiritual da sociedade. As relagBes que os individuos mantém com o mundo alteram-se continua- mente, pois elas seguem o fluxo das transformagées histérico-sociaise, princi mente, econémicas. Com isso, nfo queremos dizer que as formas de produgio ou a histéria sio as tinicas responsdveis pelo destino dos seres hurnanos. Ao contré- rio, existe uma relagdo dialética entre elas e as idéias humanas, sendo esses 0s maiores protagor ‘Assim, a moral deixa de ser, como queciam os idealistas, um conjunto de valo- mos e imutveis aos quais os seres humanos ceviam submeter-se, ¢ transfor- masse em um conjuinto de notmas construidas por eles a partir do préprio processo de desenvolvimento das sociedades, tornanco-se temporais e espaciais Apesar de a moral ser uma construgio humana, nas sociedades dividas em classes ela representa os interesses da classe dominante, Nao que este seja o tini- co caminho possivel- 0 de cima para baixo ~ mas pelo fato de que, como enten- ia Marx, as idéias dominantes em uma sociedade sio as idéias da classe domi- * nante, Isso decorre do fato de ser a classe dominante quem detém os melos de produgio, assim como os mecanismos de poder a eles articulados ~ 05 meios de comunicagaio de massa, a veiculagao de valores, os servigos da legislagao ete. -, podendo impor suas idéias a quem nao os possuie que se encontra, de certa for- ma, vulnerdvel a aceité-las. moral sob a perspectiva marxista é relativa, porque condicionada ao mo- we ducondisga hc, etambendeclase pot eda ens cbs ss ‘morais, os quais serdo constituidos ou adaptados aos principios da classe inte, o1t antagbnicos a eles. Comisso, os valores morais alteram-se de época para época ou apresentam-se com caracteristicas diferentes dentro de um mes- mo periodo, a depender das diferentes classes sociais. Friedrich Nietzsche (1844-1900), de origem alemi e filho de pastores pr testantes, apés ter pensado em seguir a mesma carreira, afastou-se do Cristiani >, assim como fez com todas as teorias cientificas e com a em formutar um sistema teérico, mas “uma te do que moe passou a critic sociedade, Seu interesse nao consi n sistem experiéncia estética da vida”, a qual considerava muito mais impor 0 primeiro, Escreveu livros como Nascimento da tragédia, de 1871; 0 andaritho e sua sombra, de 1880;A gaia ciéncia; Para além do bem e do mal, de 1886; eA genealogia a moral, em que faz, entre outras coisas, uma-verdacera inversdo dos valores, colocando aqueles que eram tidos pela tradigao como fundamentais em segundo plano, ou seja, como erro ¢ decadéncia, 44 — scercioos coxcetros Procurou ultrapassar a dicotomia que colocava a verdade como um Bem e 0 erro como Mal, buscanclo conhecer a origem dos valores, ou seja, entender 0 porqut da valorizagio de determinados atos e niio de outros, individuos, em especial os fracos. Como escreveu na “o bom é 0 que nao injuria ninguém, nem ofende, nem ata- a, nem usa de represdlias, sendo que deixa a Deus o cuidado da vinganga e vive oculto como nés ¢ evita tentagio e espera pouco da vida, como nés.os pacientes, les € 05 justos” (Nietzsche, 1985, p. 79). a recai, em especial, sobre os representantes do Cristianismo, que, segundo ele, procuravam passa wm ideal ascético para a vida humana, onde as Pessoas estivessem distantes da « sibigdo, da alegria e das transgress6es, por exem- plo. Como definiu: “por ideal ase. ico entendem o asceti al que se divi tho que fez pairar o seu vo por cima da vida, em. vvex de descansar nela” (Ibidem, .. 73). Disse que a sociedade ens': a 0s individuos a viverem de acordo com um ‘moralismo doentio, que desqualifica 0 que existe de mais humano, como os sen- a, 05 “educa” a fim de tornd-los" F como ttm recurso importante, como au veementemente, pois acredita que somente rat-se dos costumes ¢ da moral serio indepen- Nesse processo, usa a ria, Situago que ele c duos que conseguiram dentes e “préximos de st mesm O indlividuo soberano € 0 que se orienta por sua conscifncia e responde por mesmo. Recomendla, portanto, aos seres humanos lutarem para tornatem-se 'senhores dos scug instintos fundamentais, dos seus instintos plebeus ¢ animalistas” (Ibidem)p. 32), que haviam sido deixados de lado por imposigio de um “moralismo doentio”. Charles Sanders Peirce (1854-1914) nasceu em Cambridge, filho de um ma- tematico reconhecido, especializou-se em fisica e matematica. E considerado 0 cviador do Pragmatism - de prégma -, que significa agao e, depot tendéncia surgiu entre pensadores norte-americanos como justficat concedido pela sociedade burguesa ao lucro ¢ 20 bem-estar material. Inclui en- tte seus representantes, além do criador, William James (1842-1910) e John Dewey (1859-1952). Desconsiderando toda verdade metafisica, defendia que as questées filosé- ficas precisavam ser tratadas mediante o rigor do método cientifico, por acredi- tar que “a importdncia de uma concep¢ao filos6fica dependia de suas conse- iiéncias priticas" (Luckesi e Passos, 2000, p. 218). Prag: eaves tome staat 4 Siena rxcratoournsasémcas 45 istancia da especulagio ¢ se vine necessirio como 0 nico cai problemas p daverdade, Para ele, a verdade & o ttl, ou seja, 0 que melhor ajudar os seres hummanos a vivereme a conviverem. No que se refere & moral, algo é bom quando conduz de um fim exitoso, Nao existem, portanto, valores absolutos. O queé bom ‘ou matt é relativo, variando de situagio para situagio. Depende de sua utilidade para a atividade prética. Jean-Paul Sartre (1905-1980) nasceu em Paris ¢ foi erinclo pelo avé, em vit- tude da morte prematura do pai. & considerado um dos expoentes do Existen- cialismo, concepgio filoséfica que parte do principio de que a existéncia precede a esséncia, ou seja, que 0 individuo é aquilo que quiser ser, que se projetou ser. 0 filésofo 6 representante do existencialismo ateu, que rejeita toda verdade metafisica, assim como todo valor universal, Como nao existe lei, o ser hurnano tem 0 dircito de escolher o seu destino ¢ a sua vida, ¢ por essa escolha ¢ total- ‘mente responsdvel. Néo havendo lugar para a existéncia de um ser sobrenatural, tudo, inclusive os valores, decorre dos seres humanos. Como esereveu: “ohomem ro existe, se descobre ¢ s6 depois se define. Assim, nZo hé natureza huma- na visto que néo ha Deus para coneeber” (Sartre, Os pensadores, 1979, p. 6). Adtica bas de modo que so os seres humanos se na liberdade como que vao atribuir valor ao mundo, pois ele néo tem valor nem sentido. Os seres hhumanos véo Ihe atribuindo valor, a partir de sua experiéncia conereta e de sues no se dd pela submissiio a prineipios esta de, ¢ como niio existem pi normas, 4 liberdade torna-se o fim da moral e 0 valor mais importante. ‘ Como assevera Maritain (1964, p. 426): “na auséncia di valor, objetivamente fundado e de qualquer preceito de uma ~agora que jé nao hé ninguém para dar ordens, €@ cad: compete criar ou inventar em cada caso os valores que 01 (ibidem, p. 426). Essa é uma concepeiio surgida em momento de crise (Segunda Guerra Mun- dial), cm que os individuos precisavam acreditar em set potencial criader e aban- donar 0 conformismo a fim de reconstrutrem suas vidas e a sociedade. do e qualquer i moral universal duo particular que ESCOLA DE FRANKFURT los XVII 46 \ acexca pos coscerras condigio de progresso i Essas conviegbes foram abaladas em decorréncia dos rumos n tomandlo, do o ser humano ¢ seus, interesses em segundo plano diante da razéo tecnol: Ossurgimento da Escola deu-se nesse momento dificil, em que a confianga cega na razio emancipatéria foi desfeita, dando lugar & critica no seu poder de levar os seres humanos a situagao verdadeiramente humana; também criticavam a ividade cientifica, No Prefécio da edigio de 1947, do livro ca do esclarecimento, Adorno e Horkheimer demonstram a que eles da Es- cola de Frankfurt se propunham: “o que nos propuséramos era, de fato, nada menos do que descobrir por que a humanidade, em vez de entrat em um estad verdadeiramente humano, esté se afundanclo em uma nova espécie de barbarie” (2985, p. 12). AFBcola de Frankfurt 6a grande responsével por esses debates, especialmente pela énfase que deu aos estudos sobre a raziio. A designagio foi concedida a um grupo de pesquisadores alemies vinculados a0 Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt, destacando-se Theodor Adorno, Max Horkheimer, Herbert Marcuse, ich Fromm, Walter Benjamin e Jiirgen Habermas. Suas reflexées pa teorias marxista e freudiana, assim como das res como Hegel, Kant e Max Weber. Adorno (1903-1973) nasceu em Frankfurt, ¢, com a tomada do poder pelos nazistas, refugiow-se na Inglaterra ¢ em 1938 mudou-se para os Estados Unidos. ‘Ao regressar para a Al no ano de 1950, ut pela recuperagio do ram das as recebidas de pensado- acerca do poder revolucionario do ‘© antagonismo existente no interior estava exercendo grande poder sobre a socieda- dos mais fortes economicamente. Assim: “a Também; a0 lado de Horkhelmer, discute a inddstria cultural como porta- dora da ideologia dominante e comprometida em determinar 0 consumo. Para ~ eles, através dela os comportamentos poderiam ser homogeneizados e haveria a assiicagio das pessoas: cultural, ao aspirar & integragio vertical de seus consumido- res, néio apenas adapta seus produtos ao consumo das massas, mas, em larga medida, determina 0 préprio consumo. Interessada nos homens apenas enguanto consumidores ou empregaclos, a ind reduz ahumanidade, em seu conjunto, assim como cada um de seus elementos, as condigées pensadiores, 1991, p. IX), 3 O Instituto foi fundado no ano de 1923, pelo economist 4 4 4 4 p Punemasspourinas éricas 47 Critica que o ser humano, apesar de ter sido se em vitima da técnica, da indi tural que pretende barrar a consciéneia critica das massas. Com esse empenho, 0 écio, a diversio e o lazer tornaram-se prolongamentos do trabalho. Horkheimer (1895-1973) nasceu em Stuttgart e permaneceu em Frankfurt até 1934, quando teve que se refugiar, mudando-se para os Estados Unidos, onde se tornou professor na Universidade de Cohimbia, Em 1949, retornou a Frank- furt e passou a se dedicar & reorganizagao do Instituto de Pesquisa Soci Delineou os tragos principais da teoria critica em oposigio teoria tradi- cional, para ele, assentada no pensamento cartesiano. Essa teoria nao se preocu- pa com a “génese social dos problemas” de como aciéncia é usada. A ciéncia tra- dicional, pela busca de rigor, se toma abstrata e distante da realidade. A teoria stiperaria esse subjetivismo e procuraria conhecer a “pra proferida no ano de 1951, ele formaliza a no caracteriza-se por conceber tm tipo de razio a, formal e instrumental, cujo tinico critério de verdade é sett valor ‘operativo, ou seja, seu papel de dominagio do homem ¢ da natureza” (Horkheimer ¢ Adorno, Os pensadores, p. XIID Sua proposta & no sentido de os individuos reagirem as imposigées tota- lizadoras impostas pelo positivismo. Em suima, 0s dois filésofos denunciavam que a razio apresentou como uma promessa de emancipagio do ser humano, compromisso ao tornar-se instrumental ¢ a servigo da dominagio desse ¢ da natureza, De maneia pessimista, néo viam saida parao problema, pois para eles use (1898-1979) é fortemente influenciado pot Marx e Freud. Em sew 0, ele afirma que “as pessoas livres nao necessitam de liber- suficientemente fortes para libertarem-se” (1981, p. 16). Analisa que a relagio entre liberdade e servicio passou a ser tida como algo natural, assim como o amalgama que se fez entre liberdade e agressao, pro- dlugio e destruicio. Também registra o seu empenho em edificar um mundo de acordo com os los seres humanos. Faz-se necessario rmudar 05, rumos da idéia de progresso, subverter a ordem. Como escreveu, tima nova dire- ‘do para 0 progresso “dependeria completamente de oportunidades de ativar necessidades orgénicas, bioldgicas, que se encontram repi isto 6, fazer do corpo humano um instrumento de prazer ¢ p. 16). 4 Expresso usada para o conjunto das concepgbes da Escola de Frankfurt ’ 48 Defende que a tecnologia poderia ajudar a sociednde a ser menos repressi- lo aos seres humanos mais tempo livre. Contudo, tem consciéncia que tal reorientagao nao depende da tecnologia e sim dos individuos. Seu prognésti C0 para a auséncia desse redirecionamento é sombrio, pois resvalaria na dominas $0 do ser humano por algo que ele mesmo havia criado e na sua posterior massifi. cagio ¢ impoténcia para a critica e para a condugao de seu préprio destino, No livro A Ideologia da sociedade industrial: 0 homem unidimensional, ele acusa a sociedade de ser irracional e justifica sua posigdo nos seguintes termos: “sua produtividade é destruidora do livre desenvolvimento das necessid: des ¢ faculdades humanas; sua paz mantida pela constante ameaca de guerra; seu crescimento dependente da represstio das possibili reais de amenizar a luta pela existéncia ~ individual, nacio ional” (1973, p. 14), Hobermas nasceu no ano de 1929 ¢ fax parte do segundo momento da Esco- 1a. Tenta dar continuidade ao pensamento frankfurtiano através da teoria da ado comunicativa. Ele procurou repensar a razio e a teoria de uma sociedade demo. critica, pois achava que ela havia sido reduizida a uma forga produtiva, Nas pala vras de Tenério (2002, p. 53): “a tazfo, portanto, mesmo aquela ‘critica’ nfo Emancipa o homem, uma vez que utiliza crtérios positvistas pata analisar ques ‘es préticas”, Apesar disso, discorda de Adorno e Horkheimer quanto a impossibilidade de cxistir uma razo emaneipatéria, pois no acreditava nos trabalhadores como agentes de mudanga e propunha a razio dialdgica, eentrada no didlogo e naar. gumentagéo. Nas palavras de Cotrim (2000, p. 226): “razdo que surge da chamrinda agiio comunicati como meio de conseguir o tonsenso. Para tanto, & necessdri que fortalega as estruturas lberdade e nao constrangiment e interna. uma agio ;pazes de promover as condigdes de iprescindiveis a0 didlogo", $6 se torna vailido quando for capaz d rangicos, nto através do seu consentiment, participagio argumentativa efetiva. Iss0 porque, como registra 0 0 Consciéneia moral e agir comun menta- so moral, os participantes prosseguem seu agir comunicativo numa atitude re- © objetivo de restaurar um consenso perturbado” (1989, p. 87). Para ele, as argumentagoes mor 05 conflitos que se fo na prittica eniscieasooumnuséncas 49 tendimento mito, intersubjetivo pode levar a um acordo que é de natureza re- flexiva; 56 entio os participantes podem saber que eles chegaram a uma comuni- cagio comum” (1989, p. 87). Desse modo, como dissemos, nio ha uma prescrigdo de comportamento moral a ser seguio por todos de forma eategérica, mas a apresentagio de alter nativas para que sejam analisadas por ‘odos e receba deles suas opinides. A nor- ma universal sera aquela da vontade de todos. Na visio do fildsofo, a participagdio efetiva de cada individuo nesse proces- so era necessétia, dentre outros motivos, porque evitaria que os outros deformas- “gem seus interesses. Apenas ele teria 0 verdadeiro conhecimento daquilo que Ihe fosse importante, Entretanto, a exigéncia nfo pressupbe que seus interesses de- ‘vem ser impostes, a0 contririo, devem ser expostos aos argumentos eeriticas dos * demas [+ Além disso, as interpretagdes das necessidades individuais ni padem dat- se de forma monoldgica, pois so frutos da tradigao que é partilhada por todos. Desse mode, a Brica do discurso afirma que as argumentagSes morais inscrem-se “- nos contextos do agir comunicativo, Em sintese, como dissemos no inicio do capitulo, as doutrinas morais va- riam a depender das condigdes histbrico-sociais e da forma de interpretagio da realidacle hegem@nica, Os pensadores da Idade Antiga desenvolveram nia mo- 1 de elite, prépria de homens : orlentavam a vida na pélis. Na Tdade Médi =. prometiam aos individuos uma vida melhor, numa realidade mais justa ‘dria que seri is focos de revolta. Em Kant, identificamos uma reagSo aos prineipios medievals ¢ uma crenga antropocéntrica moderna. Seu pensamento acompanhout os grandes acontecimen- tos que antecederam a Revolugio Frai ‘como os exponen Pensamento alemao, ansiou pela erista veralismo. aprese: as, como a kant a na raziio cartesiana, que se ti capital. Habermas propde uma mentagio.

You might also like