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A CIDADE E A ORGANIZACAO DO ESPAGO(*) Tnicialmente o tema nos faz refletir sobre a nogo de “organizagio do espago” utilizada correntemente pela Geografia. GEORGE (1971, p. 6 © 7) para civ tar um exempo, emprega o termo “organizacéo do espaga” no sentido de “arrumagio” que “designa os atuais empreendimentos destinados a modelar © espago herdado para neles se introduzirem as iGenicas juridicas © administrativas, que derivam de um espitito de sistematizagio da sua utilizacio”. ‘A nogio da “organizagao do espaco” se liga, para 0 autor, a0 “planejamento sistemético do espago” & ilo a relacdio histdrica entre homem e meio. Esta nogio esta relacionada & eoncepgio de ex aco-palco, ¢ isto quer dizar 0 espago geogrético en- tendido como paleo das atividads humanas, 0 lugat sobre 0 qual os agrapamentos humanos constroem sua existéncia. Hoje em dia, apesar de ter sido abo- lida a palavra espaco-palco, a nogao ainda esta muito presente na concepefo do espaco geogrifico, mesmo quando se analisa © espago geogréfico como espaco Ge relagies (GEORGE, 1969). Como partimos da premissa de espaco produto, isto &, 0 espaco geogratico enquanto produto das rela- ‘goes que se estabelecem, num determinado momento hist6rico entre sociedade © meio-citcundante, estamos analisando 0 espago geogrdtico como um elemento dinfmico, © componente ative na relagio do qual € produto, ¢ néio simplesmente como agente passivo. Ana Fani Alessandri Carlos (**) Nesse sentido, a nocd “organizagao do espaco”, estando metodologicamente associada a concepgio de espago-paleo, nfo pode ser aqui utilizada A nogfio evolui no pensamento geogrifico a par- tir do desenvolvimento da conceituagio de espaco g20- grafico, portanto, propomos a discussdo da nogto de “produgdo do espaco” em lugar da “organizacio do espago” pois ela esté em desacordo com 0 atual es ‘gio do pensamento seogrifico A uugo “produgae do espago” sc impée na ‘medida em que 0 espaco geogtifico é entendido como produto de relagdes, nao no sentido de arrumagio, mas de aurocriagdo constante. Ele ¢ fruto do processo de produgfio que se estabelece no seio da sociedade que tem por objetivo a reproducdo da existéncia hu- mana; e & portanto fruto do trabalho. Assim a premissa bisica de que partimos para 0 desenvolvimento do tema € a noco de espaco pro= duzido. espaco geogrifico é 0 produto das relagées que se estabelecem, através do trabalho, entre sociedade © meio circundante. © espaco geogritico & produzido concomitantemente a0 processo de produgdo da exis- téncia humana. Portanto, nfo é estético, nem acaba- do, mas uma prodacio humana ininterrupta. (©), — Ania proferida no concurso intezp0 para indica fo de 2 Auniliares de Bnsino, para conttato, no Dept? de Geografia da. FFLCH da USP, realizado em abril de 1981. Reeebido para publicacio em junho de 1981 (0) Mestre em Geogratia, Aluna do Curso de PésGraduigho, em nivel de Doutoramento 106 Deste modo, em cada momento histérico, tere- ‘mos uta producdo social peculiar e coerente ao desen- volvimento das foreas produtivas e, conseqiientemen- (e, wina producao espacial determinada. © espago geogrifico, enquanto produto do tra- balho, envolve a participagao dos membros da socie~ dade como um todo através da divistio do trabalho, que depende, em cada momento hist6rico, do desen- volvimento das forcas. pradutivas (como a mao-de~ obra produz, com que métodos produz, com que ins- trumentos, ete.). Os homens trabalham de maneira complementar, © a evolugio da diviséo do trabalho vai implicar em espagos diferenciados. A maior divisio do trabalho entre material ¢ 0 intelectual € traduzida pela separaco entre cidade ¢ campo. Para MARK e ENGELS (1974, p. 62) oposigio entre a cidade © 0 campo surge com a pas- sagem da barbie & civilizagdo, da organizacio tri bal 20 estado, do provineialismo & nacdo ¢ persiste através de toda a historia da civilizagao. ‘A cidade, ainda segundo os autores, é 0 resul- tado da concentrag%o da populagio, dos instrumentos do produgio, do capital, dos prazeres e das necessida~ des, enquanto que o campo pe em evidéncia 0 fato posto, 0 isolamento ¢ a dispersfio. A oposis cidade e campo 86 pode existr no quadro da proprie- dade privada; é a mais flagrante subordinagio do indi- viguo A divisto do trabalho, da subordinagio de uma atividade doterminada que Ihe € imposta. (© trabatho © as condicionantes histéricas em que ele 6 realizado € 2 chave da compreensio da procugdo espacial; produgio esta que traz em seu bojo a unidade do diverso, isto é, as contradi diferenciagSes que geram o seu proprio desenvol- vimento. Nesse contexto a producdo do espaco geo- grafico nao pode ser analisada desvinculada do pro- cesso de produgéo historicamente determinado. © modo de producto determinante — no caso atual, 0 capitalista — se materializa espacial- mente através da producio do espago global enquan- to totalidade, contendo em seu bojo a diferencia- ‘¢d0 entre 0 urbano € 0 rural, pois 0 processo de produglio se articula espacisimente através da di- visio entre trabalho industrial © comercial ¢ trabax tho agricola, isto é através da diferenciactio ea tre urbano ¢ agrério. Hoje no capitalismo, a cidade como produto do trabalho industrial assume papel hegeménico no co- mando do processo de produedio espacial como um todo, articulando ¢ determinando a divisdo espacial ¢ social do tcabalho; articulando e determinando a cha- mada rede urbana através da rede de cidade que vai desde as cidades pequenas, médias, as metrépoles re giouais, nacionais, até as chamadas metrépoles intcr- nacionais, como uma distribuicio social ¢ espacial das diferentes condigdes gerais da produgio em fun- 0 do tipo de atividades. Partimos, portanto, da tese segundo a qual 0 ‘modo de producdo se materializa na producao espax cial, © espago urbano (que é a producio da cidade), como elemento da totalidade também sofre 0 mes- mo processo de materializagio. Como isto ocorre? A cidade no $6 6 fruto do processo de produ- Ho capitalista como uma condigao desse provesso. A cidade € determinada por relagées de produ- 40, e vista dentro do processo de producdo global & frato da separagio entre 0 trabalho industrial e co- ‘mercial de um lado e do trabalho agricola do outro © trabalfio industrial, no capitalismo, assume papel determinante; tem um papel hegeménico ¢ transforma a agricultura em um ramo seu. B este por sua vez, confere & cidade um papel hegemd- nico no comando do proceso de produgio espa- cial, uma vez que ele se realiza e viabiliza na cida- de e através dela, A cidade apresentaria hoje as condigdes. gerais desse processo de producao. Com 0 desenvolvimento do processo de produ- io baseado no desenvolvimento das forgas produti vvas, a cidade vai ganhando cada vez mais sua influén- cia sobre © campo e sobre Greas vizinhas, toman- do-se a expresso espacial mais importante desse sis- tema de produgo; 0 ponto de maior expressio espa- cial. A cidade passa assim a comandar 0 process de produgao espacial através de uma grande concea~ ‘raga cumulativa de fungdes © grau de complexidade de fungdes osté relacio- nado com 0 grau de desenvolvimento do processo produtivo, baseado na divisio do trabalho e na di- ferenciagio das classes sociais. A cidade passa @ co- mandar nfo s6 a producto de sua rea, mas seu pa- pel c poder extravasam seus limites alcangando ¢ st bordinando no somente freas agricolas — cuja fun- go seria a de fornecer matérias primas ¢ alimentos para a produgao e consumo urbanos — mas se relaco- nando com outros espagos urbanos através da div's80 espacial do trabalho determinada pela metrépolc, constituindo em miltiplas relagSes e interrelagbes es- ppaciais a producdo do espaco global. © que ovorre & a espacializagio do processo de producao capita lista que tem na cidade seu centro de acumulaczo. Para KAUTSKY (1966, Initodugio), 0 modo de produgio capitalista, dominante na sociedade, atual, consiste no antagonismo entre classe assalaria- a ¢ capitalisia. Tal antagonismo move 0 nosso sé culo € the dé fisionomia. © sistema de produc ca pitalista se descnvolve primelramente, vis de regra, ras cidades © mais especificamente nas indéstr'as. O desenvolvimento da indiistria urbana Tanga também ‘© germe da dissoluedo da familia rural primitiva. In:~ cialmente a propriedade do camponés continha a ter- ra necesséria & alimentagio de sua famflia; a depen @éncia cada vez maior do mercado 20 dinheiro fazia ‘com que o Tavrador tivesse paralelamente uma maior necessidade de terra ditada pela diversificagéo © au- mento da quantidade dos géneros que deveria colher e vender. “0 continuo desenvolvimento do capital'smo, vai aumentando cada vez mais a influéncia da cidade so- bre o campo, uma vez que esta, além de subtrair-the tertitério, vai subordinando paulat’namente a agricul- tura ao setor urbano industrial. Mais do que sto. 0 desenvolvimento do sistema capitalista vai proporcio- nar o surgimento da grande cidade, da metrépole, que ‘comandarfi nfo somente as reas rurais como esten- 107 decd seu dominio sobre outras cidades de porte infe- rior, visando melhores condides de acumulaclo, ior- nando-se pois a expressio espacial desse sistema de produco” (CARLOS, 1979, p. 46) ‘A cidade nfo pode portanto, ser analisada como tum organismo em si, isolada de seu processo de for maciio, como fazem multos gedgrafos. A cidade deve ser entendida como uma forma espacial fruto de um amplo processo. Néo é a cidade em si que produz 0 espaco, ela é um ponte formal de comando. “A cida- e atual apenas assume a forma espacial das relagies de produgio que ocorrem nese modo de producdo espocifico.... Néo é a cidade em si o fator de eriagao € desenvolvimento de uma regido atual, mas o proces- so de acumulagio capitalista, € a cidade como “sede” da acumulagdo “assume”, formalmente 0 papel dint mico de comando do espago” (CARLOS, 1979, p. 46) A cidade, assume a forma de comando espacial: do um lado articulando e determinando a div'sio es- pacial do trabalho através da articulngéo néo 36 da rede urbana, mas também determinando o papel do ‘campo no process geral de produgo espacial; © de outro, possibilitando, com essa produgio espacial geral, as condigées gerais necessérias 20 desenvol- vimento do processo de producao capitalista. A cidade hoje no € s6 condicdo para a repro- dugdo do capital, como também um produto do pro~ cesso de produgao capitalista. Do mesmo modo que © capital & a categoria determinante na anélise do processo de producao capitalists, cla também sera determinante no processo de produgao espacial, na ‘medida em que este também & um produto do proces- so de produgdo capitalista. A divisao do trabalho que se estabelece no pro- cesso produtivo, na unidade de producto, também se estabelece espacialmente nfo 66 a nivel cidade-campo ¢ cidade-cidade, mas também dentro de cada parcela do expaco, determinada pela hierarquizagao coman- dada pela metrépole, ¢ esta por sua vez, dependeré do desenvolvimento das relagées capitalistas de produ- go de um determinado ps 108 ‘Como esse processo se desenvolve de modo anta- g6nico e contradit6rio, © processo de produgao espa~ cial também apresentaré esses mesmos antagonis- ‘mos, 0 que implica, em dima andtise, num desen- volvimento espacial desigual; fendmeno este co- mandado e determinado pelo provesso de acumula- eo do capital No capitalismo, 0 fendmeno centralizador, exer- cido pela grande cidade se faz sentir pelo seu papel de niicleo das atividades de gestio determinadas pelo fato de set 0 ponto de maior expresso espacial da acumulagdo do capital, pelo proceso produtivo, ¢ portanto, de atividade industrial, financeira e politica “As sociedades de hoje apresentam grandes aglomeragées humanas de dimensoes nunca aleanga- Gas de um lado, e por outro 0 campo tem sofrido ‘um processo constants de despovoamento. Esse fe- némeno é fruto do grande processo de urbanizacio que 0 modo de produgdo capitalista pos em marcha, a9 Indo de mudancas na estrutura agréria. © proceso de urbanizacio tende a acelerar-se pelas transformagies ccorridas no setor industrial, financeiro e de scrvigos que necessitam © desenvol- vem uma base urbana. A divisto especializada do trabalho, forga os trabalhadores a um nivel de apro- ximagio cada vez maior, obrigando a maioria a vie ver em grandes cidades A cidade esté assim, submetida as leis da acu- rmulagao capitalista, daf a estreita relacdo entre este © © processo de urbanizagéo” (CARLOS, 1979, p. 48 © 49) © processo de urbanizagdio, enquanto proceso desencadeado pelo modo de produgo capitalista, que impée uma base urbana para seu desenvolvimento, possibilita a diminuicto do tempo gasto no ciclo de rotagio do capital e com iss0 0 processo de desvalo- rizagao do capital Para LOGIKINE (1979, cap. 111), a aglome- ragtio dos meios de produgio e de troca (banco/co- mércio), nfo especifica de forma alguma a cidade ca- pitalista. na medida em que a cidade medieval j4 reu- nia atividades produtivas ¢ mereantis, se bem que ex ‘menor escala. O que parece caractetizar duplamente, para 0 autor, a cidade capitalsta, € de um lado a eres- cente concentragao dos meios de consumo coletivo & de outro, 0 modo do conjunto dos meios de reprodu- fio do capital e da forga de trabalho, Para o autor, a cidade 6, num determinado momento, a meterializa- cio das condigées gerais de produgio. No entanto, acreditamos que nfo é s6 a cidade que materialize as condigdes gerais da producio ca- pitalista, mas a produgao espacial como um todo, que além de vinbilizar 0 processo de produgio ca- pitalista 6 um produto dele. Deste modo a produ- odo espaco geogrifico viabiliza a realizacto do ciclo do capital e, conseqdememente, a tepro- ducao ampliada do capital. Esquematicamente 0 processo efclico do capital (1) se resume em trés momentos, em cada um dos quais, o capital assume uma forma: 7 MP DM ——P—~—M-—pD \rr ato de proceso ato de cireulagio produiivo cireulagio onde D_ = dinheiro D’ = dinheiro acrescido de mais valia M = mereadoria MP = matéria-prima FT = forga de trabalho P= produto processo deve ser visto om sua unidade de con- junto, onde os ciclos, as formas de reproducio das irés modalidades do capital se deseavolvem continua- ‘mente, sob pena de paralizagao momentiinea do ciclo, que causaria um processo de desvalorizagio do ca- pital. A agilizagio do ciclo tem como pressuposto @ (1) — “Rerumindo ag tcés {Gemmulag em sua uniade, vemos que todas at premissas do processo.sparecem com> fou restltedo, como premissa produsida por cle mesmo. Todos o8 momentos aparscem aqui como ponto de partida, ponte de transigio © ponto de tetorna. © processo em sett Conjunto. se apresenta como unidade do processo do produ- 0 € do. processo de circulacio, o processo de producto Serve de mediador do processo de cireulagao © vice-versa ‘Nota comum aot 188 giclos 6 a valorizasae do valor com Finaidade determinante”. (MARX, 1975, vol If, p. 90) cantinuidade (2) do p:ocesso de reprodugio amplia- da do capital que visa a completa interrelagio entre estos movimentos ¢ conseqlientemente 0 acionamenta de mocanismos que impecam sua imobilizagao em. qualquer um dos momentos. A mais vali eriada no processo de producio deve ser realizada pela cireu- lagio c a mereadoria deve chegar até a esfera do consumo (sem consumo nfo hé produgdo, © vice versa). Como produgio € consumo esto cada vez mais. distanciados espacialmente (condigio histérica do de~ senvolvimento do capitalismo), 0 processo de produ Gio deve eriar as condigGes de ligagio entre essas duias esferas da produgio getal, de modo a minimizar 0 tempo de duracio no qual o produto se transfere de jum momento a outro. Portanto, uma série de ativi- dades particulares encadeadas so criadas com esse objetivo. “A medida que se desenvolve 0 ciclo do capital cria-se € desenvolve-se paralelamente todo um pro- cesse de produgéo do espago pela sociedade que no 56 possiblita @ produgio © reprodugdo do capital como também a existéacia humana... O expaco & produzido para atender as necessidades da producto e da cireulagio de mercadorias, visando o funciona- mento perfeito do ciclo do capital” (CARLOS, 1979, p. 90) Concretamente, a anilise do ciclo do capital € sua relago com © processo de produgio espacial po- de ser, resumidamente, analisado da seguinte forma: 19 fase do ciclo: o capital nesse momento é re- presentado formalmete pelo dinheiro; é como dinhei- ro (D) que ele entre no mercado para comprar forca de trabalho © as meios de producio necessaries a0 proceso de producdo nas maos do capitalista. Esse momento tem como condigio basica (exce- tuando-se as condigdes histéricas necessérias & exis- téncia do capitalismo) 0 mercado, que espacialmen- te se formaliza com a existéncia de uma aglomeragio populacional urbana (uma cidade) onde o capitals ta encontra mio-de-obra e 05 meios ¢ insteumentos de trabalho. 109 Essa parcela da populagdo que vende sua forga de trabalho com o objetivo de reproducdo de sua exis- téncia, emprega seu salirio de modo a realizé-la Sao gastos com habitagio, alimentagao, energia, sai~ de, transporte, educagao, saneamento, vestwério, 1a- vet, ete; necessidades estas que exigem uma ceria aglomeragio imposta pela socializagio do consumo, ctiando um espaco peculiar, diferenciado do espaco agritio. Por outro lado, os meios e instrumentos de tra- balho devem estar & venda no mesmo locus do mezca- do, facilitando com sua proximidade ¢ diminuindo 0 tempo gasto pelo capitalista, nesse primeiro momento do ciclo. As matérias primas e auxiliares também de- ‘vem set compradas, nese momento, ¢ para isso de~ vem estar disponiveis no mereado 0 que implica nao somente num grande interrelacionamento entre 08 ra- mos de atividades, (entre ramos industriais, entre ati- vidade urbana-rural, etc.) como uma vasta rede de transporte, criando um relacionamento espacial 28 jase do ciclo: restringe-se 2 unidade produ tiva, & eriagio do valor; o que exige fisicamente tum estabelecimento compativel com a atividade a ser desenvolvida. Para o funcionamento da unidade produtiva, ‘como unidade de acumulaco do capital, é necessério também que seja satisfeita uma série de necessida- des além do prédio de instalagies, tais como: ener- a industrial, servigos de apoio & produgio, eseri- t6rios, bancos, rede de comunicacdo © transporte, unidades de distribuicgo e armazenamento etc. Deste modo, 0 processo de produgio imediato ‘nfo se restringe espacialmente & unidade produtiva fisica, mas para seu funcionamento nevessita de uma sério de requisites que se produzem espacialmente criando toda uma gama de relagdes ¢ interrelagdes, além de uma cadeia de unidades produtivas interti- gadas, eriando uma paisegem diferenciada cosrente (2) — “A continuidade infinta do proceso, 9 pss- sagem fluids do valor de ta forma 2 outra, de'uma fs Sera outre a condisio esencial da produgio fundsda sobre o valor”: (MARX, 1975, vol. I, p. 52). 110 com o desenvolvimento das forgas. produtivas num ‘momento determinado. 38 fase do ciclo: a transformago da mercadoria em dinheiro (Mt D’). Ato que se realiza nna circulagdo. Com 0 desenvolvimento das relacdes capitalistas, € invidvel que © capitalista venda sua propria mercadoria a0 consumidor individual; pois a rotago do capital sofreria uma paralizagao. Nesse sentido, para nfio impedir a continuidade do ciclo, uma série de atividades 6 realizada, por um am- plo setor de distribuigéo e venda; enquanto 0 ct- pitalista se restringe exclusivamente & producio ime- dita. Nesta fase é de suma importincia uma rede de ‘transporte, postos de armazenamnento e de distribu do das mercadotias (nfo somente a0 constrmidor individual, mas também a outras unidades industrais, ‘uma vez que o produto de uma indéstria pode ser a ‘matéria prima de outra); 0 que envolve uma série de trabalhos (improdutivos, € claro) que tem por obje- tivo fazer as mercadorias chegatem a seu destino 0 mais tépido possivel, pois sem consumo nao hé pro- dugio Esta fase também exige uma aglomeracao espa- cial determinada. © que se depreende dessa exposicio sistemitica € que se vai produzindo um espaco para atender as, necessidades da produco © reproducio de relacdes determinadas pela atividade produtiva, que dependerd do estdgio de desenvolvimento das forcas produtivas. [A produao espacial gicbal nfo ocorte somente pelas condigdes de produgio vigentes, mas fazem par- te das condigées gerals da producdo material. Por tanto, a intertelagio entre parcelas do espaco ferenciadas serio determinadas pela divisio do tra- ‘balho no seio do processo produtivo. A cidade © 0 campo, que constituem aparente~ ‘mente duas formas espaciais distintas, se integram nt- ma unidade indissociavel, apesar de a primeira do- minar ¢ determinar a segunda, a atividade hegeménica: a indistria. a cidade abriga “As cidades evolvem, de acordo com sua impor- tncia, uma area mais ou menos ampla de dominacéo ligada a ela por uma rede de comunicagio e transpo: tes, que possibilitam um fator indispensével a essa dominagio. E importante frisar, que sob o aspecto formal, cidade © campo apresentam paisagens diver- sas e antagénicas dadas pela utilizacao diferenciada do solo ¢ de sua prépria atividade produtiva” (CAR- LOS, 1979, p. 92), mas isto nao quer dizer que se- jam duas parcelas isoladas e autnomas Espacialmente 0 desenvolvimento do modo de roduedo capitalista implica numa tendéncia no so- mente a uma aglomeractio populacional (forea de trabalho e superpopulagio relativa), mas também de meios ¢ unidades de produgfo, o que leva a uma pro- funda diviso espacial do trabalho imposta pelo mer- ado em expansio Assim 0 urbano é fruto da dinamica do desen- volvimento das forcas produtivas que se desenvolvem plenamente no urbano, e mais especificamente na grande aglomeragdo urbana, ou seja na metrépole, pois € ai que as condigies gerais de ptodugao se en- contram mais deseavolvidas. “Nao hé desenvolvimento capitalista sem aglo- ‘meragdes, num primeifo momento, ¢ sem rede num segundo. Pode haver aglomeracio sem capitalism, ‘mas niio hé capitalismo sem aglomeragbes” (FUN- DAP, 1978 p. 11) (Grifo do autor). © espaco do capital exprime essa tendéncia dupla do modo de produgio capitalista que € a de aglomerar capital fixo num ponto ¢ de se expandic através da mule tiplicagdo desses pontos, abarcando dreas cada vez maiores © causando assim 0 chamado désenvolvi- mento desigual e combinado. © desenvolvimento antagénieo do capitalismo interfere no desenvolvimento da produeo espacial tomando-a diferenciada ¢ antagOnica; diferenciacio © antagonismos estes criados pelo proprio processo em expansfo. Esse procesto implica no desenvolvi- ‘mento da grande aglomeraso em detrimento de ou- tras pateslas do espago; desenvolvimento acentuado ainda mais pelo estég.o do capitalismo monopolista {que através da criaglo de grandes unidades produtoras, © da internacionalizacdo erescemte da producio, cria uum espago ainda mais hierarquizado e diferenciado. Essa situagGo tende a acelerar, espacialmente, as de- sigualdades, uma vez que a produgdo espacial esté voltada para a maior eficiéneia do funcionamento do padréo do acumulagio imposto pelo modo de produ- edo capitalista Podemos frisar ainda, que 0 processo de urbani- zago € um provesso de produgéo ¢ reproducio de capital, e que este processo se materializa na cidade, uma vez que a cidade viabiliza as condigdes gerais de produgio, O urbano é o lugar particular onde se realiza a produgdo e a reprodugio ampliada da forva de trabalho nas condigdes de quantidade e qualidade requeridas pelo avango da divisio social do trabalho. Mm Por este motive a cidade nao pode ser analisada como clemento em si que ganha expresio, mas como uma forma espacial das relagGes sociais de produydo A cidade 6 ainda, um campo privilegiado das lutas de classe, pois se por um lado o espago urbano 6 cada vez mais socializado (tanto no que se refcre ao potencial de expansio, quanto no que se refere a sua produgio), por outro lado a sua apropriagio geral privada ‘Assim, concretiza-se ao longo da histéria um processo de produgio espacial que € earacteristico 80 desenvolvimento do modo de producto vigente. BIBLIOGRAFIA 4 — CARLOS, Ana Fani A, — (1979) — Reflenses sobre ‘© espaga geosrético. Dissertago de Mestrado. Mi- rmeografado. Sao Paulo. 2 — FUNDAP — (1978) — Nota intodutéria sobre @ consiruee de um objeto de estudo: urbane. Fun dap, Mimeografado. S. Paulo. 3 — GEORGE, Pierre — (1969) — Sociologia © Geogca- fia, Ed. Forense, Rio de Janeiro ae — 97!) — A agio do Homem. Difusso Furopéia do Livro, S. 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