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Cultivares resistentes ou tolerantes a fatores bióticos

e abióticos desfavoráveis: ponto-chave para a

cafeicultura sustentável
A cafeicultura está sempre evoluindo e proporcionando grandes desafios a todos os
envolvidos em sua cadeia produtiva. No Brasil, o plantio de café estende-se desde o Paraná
até o Pará, passando por São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Espírito Santo, Bahia
e Rondônia. Em cada estado existem regiões aptas para o cultivo do café com distintas
condições edafoclimáticas e diversos sistemas de cultivo e que possuem cafeicultores com
diferentes níveis tecnológicos. A diversidade de clima, de solo e de nível tecnológico na
Petek
cafeicultura leva a necessidade, constante, de desenvolvimento tecnológico.
Paralelamente ao desenvolvimento tecnológico, a busca por uma cafeicultura mais
sustentável intensificou-se nos últimos anos. Atendendo aos anseios dos consumidores e às
exigências da produção sustentável, a cafeicultura sustentável procura contemplar requisitos
econômicos, direcionados à utilização racional de recursos naturais e tecnológicos, sociais,
baseados no respeito às pessoas envolvidas na cadeia produtiva, além de ambientais, que
preconizam o emprego de tecnologias que não agridam o ambiente. Flávia

O
desenvolvimento de uma cafei- cultivares resistentes a pragas e doenças, o Centro de Café “Alcides Carvalho”, vi-
cultura sustentável no Brasil pas- evitam o uso excessivo de defensivos. sando a sustentabilidade da cafeicultura,
sa pelo aumento da rentabilidade Como conseqüência, entre os principais passou também a trabalhar com o obje-
do produtor, como forma de garantir sua impactos do uso de cultivares melhora- tivo de identificar no seu banco de ger-
permanência na atividade. Isso depende das estão o aumento da rentabilidade e da moplasma, fontes de resistência genética
de sistemas de cultivo estáveis, que pro- estabilidade do produtor, e a redução no a outras doenças e pragas de importância
porcionem maior longevidade para as emprego de defensivos com a conseqüen- econômica e/ou com potenciais riscos
lavouras e rentabilidade freqüente. Culti- te diminuição no custo de produção e no para a cafeicultura, além de adversidades
vares produtivas, adaptadas a cada con- impacto ao meio ambiente. climáticas. A cercosporiose (Cercospora
dição edafoclimática e sistema de cultivo Quando compararam a cultivar ‘Mun- coffeicola), também conhecida por man-
e resistentes a pragas e doenças, são dos do Novo’ com a primeira cultivar plan- cha-de-olho-pardo (Foto 1), até há pouco
principais componentes da sustentabili- tada no Brasil, denominada ‘Típica’ ou tempo era considerada doença secundária,
dade da cafeicultura. ‘Arábica’, e visualizaram mais de 200% mas encontra-se entre as principais doen-
A definição da sustentabilidade da de ganho em produtividade, já foi pos- ças da cultura no cerrado e, em outras re-
cafeicultura está em constante evolução, sível verificar a valiosa contribuição dos giões cafeicultoras. Sua importância tem
pois muitas das tecnologias consideradas pesquisadores do IAC para a sustentabili- aumentado, prejudicando a produção de
sustentáveis nas décadas de 50 e 60, hoje dade da cafeicultura brasileira. Posterior- grãos e a qualidade da bebida. O IAC tem
não o são mais. Entre os exemplos destas mente, a obtenção de cultivares de porte realizado estudos para a determinação da
tecnologias podem ser citados: plantios baixo como a ‘Catuaí Vermelho IAC 99’, relação entre nutrientes, principalmente
em espaçamentos largos (4 metros entre que possibilitaram maior adensamento, nitrogênio e potássio, e a incidência desta
linhas e 4 ou 3 metros entre plantas), der- além de facilitar a colheita e o recente de- doença (Foto 2). Em trabalho preliminar,
rubada de matas para o plantio do café senvolvimento de cultivares resistentes à realizado em progênies de café com resis-
e uso de cultivares pouco produtivas, ferrugem como a ‘Obatã IAC 1669-20’ e tência à ferrugem, foi possível confirmar
como ‘Típica’ e ‘Sumatra’. Hoje, devido a ‘Tupi IAC 1669-33’, deram continuidade a influência das concentrações de nitro-
à escassez de recursos e novas áreas para às relevantes contribuições do Centro de gênio e potássio na incidência da cercos-
plantio, é preciso adotar uma cafeicultu- Café “Alcides Carvalho” para a sustenta- poriose e ainda verificar a existência de
ra mais racional. bilidade da cultura do café no Brasil. É variabilidade genética quanto ao vigor ve-
Os programas de melhoramento ge- importante ressaltar que mais de 80% do getativo e à resistência a esta doença. As
nético de café do Centro de Café “Alci- parque cafeeiro do tipo arábica, do Brasil, pesquisas terão continuidade em busca
des Carvalho” do Instituto Agronômico é formado por cultivares desenvolvidas de cultivares mais resistentes à cercospo-
(IAC) já são, em sua essência, parceiros pelo IAC. riose e mais adaptadas para cada região e
da sustentabilidade da cafeicultura, pois Os esforços da pesquisa em genética sistema de cultivo.
têm como objetivo o desenvolvimento de e melhoramento de café para resistência Também como parte do apoio a sus-
cultivares com características de arquite- a doenças, até o momento, concentraram- tentabilidade da cafeicultura brasileira, o
tura e sistema radicular que maximizam se no desenvolvimento de cultivares re- IAC pretende contemplar em seus progra-
a eficiência no aproveitamento de fertili- sistentes à ferrugem (Hemileia vastatrix), mas de melhoramento, outras doenças,
zantes e de água, proporcionando aumen- pois esta é a mais importante doença da de ocorrência mais localizada, como a
to de produtividade e melhor qualidade cultura no Brasil, reduzindo, em média, mancha aureolada (Foto 3) (Pseudomo-
da bebida e, com o desenvolvimento de 35% da produção. Recentemente, porém, nas syringae pv. garcae) e a mancha de

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phoma (Foto 4) ou complexo phoma/asco- de frutos (Foto 5) e a seca de ramos, bem a mancha de phoma ou complexo phoma/
chyta (Phoma tarda e Phoma costarricen- como, se existe relação deste problema ascochyta ocorrem em regiões de elevada
cis), além de fatores abióticos e/ou de cau- com a presença de Colletotrichum spp. nos altitude, sujeitas a ventos frios e chuvas. A
sa desconhecida, que provocam a queda ramos de cafeeiros. A mancha aureolada e mancha aureolada e o complexo phoma/
ascochyta, ao causarem desfolha, seca de
ramos e queda de flores e frutos, podem
resultar em prejuízos consideráveis.
Pesquisas também estão sendo reali-
zadas em conjunto com o Instituto Bioló-
gico (IB), nas principais regiões produto-
ras de São Paulo, no sentido do entendi-
mento e da caracterização do problema de
queda de frutos e seca de ramos e da bus-
ca de fontes de resistência genética a estes
distúrbios, cujas causas, bióticas e abióti-
cas, ainda precisam ser esclarecidas.
Além das pragas, como o bicho minei-
ro (Leucoptera coffeela) e os nematóides
Foto 1. Lesões características Foto 2. Sintomas da doença (Meloidogyne spp.), já contempladas nos
de cercosporiose no campo. (cercosporiose) no final do ciclo da programas de melhoramento do IAC, es-
cultura, em lavoura com deficiências na tudos para a identificação de fontes de re-
adubação excesso de carga. sistência à broca (Hipothenemus hampei)
(Foto 6), também estão sendo conduzidos
pelos pesquisadores. Existem indicações
de que as espécies Coffea eugenioides e
Coffea kapakata podem ser fontes de re-
sistência à broca, mas estudos complemen-
tares, necessários para sua confirmação,
estão sendo instalados, na busca da deter-
minação do grau de resistência, bem como
da possibilidade de utilização dessas fon-
tes de resistência nos programas de melho-
ramento do cafeeiro. Dessa forma, preten-
de-se o desenvolvimento de cultivares que
possam favorecer a adoção de programas
de manejo integrado de pragas.
Além dos programas de melhoramen-
Foto 3. Sintomas de mancha aureolada. Foto 4. Sintomas de mancha de phoma. to em andamento, outra atividade essen-
cial realizada pelo Centro de Café “Alcides
Carvalho”, é a instalação de unidades de
demonstração e ensaios regionais de cul-
tivares e linhagens, nas principais regiões
produtoras do estado de São Paulo, com o
objetivo de indicar os materiais mais adap-
tados para cada região e nível tecnológico.
O Centro de Café “Alcides Carvalho”
está constantemente em busca de tecno-
logias que proporcionem melhorias para
a cadeia produtiva do café e promovam a
sustentabilidade econômica, social e am-
biental da cafeicultura.

Marcos Rafael Petek


Instituto Agronômico, Centro de Café
“Alcides Carvalho”
( (19) 3241-5188 ramal 370; FAX: (19)
32120458
* mrpetek@iac.sp.gov.br

Flávia R. A. Patrício
Instituto Biológico, Centro Experimental
Central
Foto 5. Queda de frutos mumificados: Foto 6. Broca atacando ( (19) 3251-8714
fatores bióticos ou abióticos? fruto de cafeeiro. * flavia@biologico.sp.gov.br

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