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ein 08 ‘eeaan 207 pane acre tno, Say ie Rae. Teds os ets dea eh eserves Livraria Mrtns Fontes Era Lie 193013677 Fax (1) 108 0988 ait iimainsomescdrcom hh marines come Palo: Monten Fa oe KATO, foray Aizana- O eprncignds ide fechann. S 200}. Apresentagio Capitulo 2 Capitulo 3 Capitulo 4 Capitulo 5 Capitulo 6 1 {INDICE ods dios” de sitabetizacao Fatores facilitadores € pré-requi- sitos na aquisico da leitura em segunda lingua... Reconhecimento instantineo e processamento em leitUFA..su Processos de decodificagao: a in- teyragio do velho com 0 novo em ick Leitor, de analisador a recons- trutor ae Estratégia em interpretagio de sen- tengas e compreensio de textos 1, Objetivo do trabalho 2. Predigo em leitura 3, Estratégia e gramatica 21 33 49 65 79 79 aoe 81 CAPITULO 1 AQUISIGAO DA ESCRITA E “METODOS* DE ALFABETIZACAO* A alfabetizagio tem sido a grande preocupagao nos meios educacionais e académicos do pais nos Ailtimos anos, haja vista 0 ntimero de semindrios a ela dedicados nos anos de 1983 ¢ 1984. E comum sentir-se nessas ocasides uma preocupacio obsessi- va por parte dos educadores por “métodos” de alfa- betizacao, preocupacao essa causada pela busca ansiosa de um instrumento seguro para a conse- cucao dos objetivos minimos da escola: ensinar a ler € a escrever. Ese trabalho ¢ o resultado de feflexdesfetas durante 0 Enconto de Allabetizagio,promovido pela Faculdade de Educacao da UFMG, em 11, 12 € 13 de agosto de 1983, e na mesa-redonda sobre Alfabetizacio, no encon. to sobre Linguagem e Aprendizagem, promovido pelo Inttuto de Estudos da Linguagem da UNICAMP, em 25 de outubro de 1983, “Método”, porém, para uma grande maioria dos professores é definido meramente como um conjun- to de materiais, técnicas e procedimentos para se atingir um fim, isto é, um conjunto programado de atividades para 0 professor e o aluno. Contudo, qualquer método, para ser eficaz, deve ter a ele subjacentes hipéteses claras sobre a natureza do objeto a ser apreendido e sobre a natu- teza da aprendizagem desse objeto. Além disso, para ser eficazmente usado exige que seu aplicador tenha plena consciéncia dessas hipoteses, Essa cons- cigncia dard ao professor uma seguranca maior de sua pritica ¢ 0 levard a reformular sua metodologia a partir da evidéncia que ira encontrar durante essa pritica. Para uma boa parte dos alfabetizadores, 0 “mé- todo” parece ainda estar simplesmente ligado a uni- dade lingtifstica com que se trabalha: silébico zersus fonico, por exemplo. Nao thes parece claro que as. duas modalidades possam pressupor essencialmente um mesmo tipo de operagdo mental por parte do aprendiz: a andlise ou a sintese. Se Ihes for pergun- tado se 0 método silabico. € analitico ow sintético, muitos ndo saberdo responder. : Outro aspecto que se observa em nossa escola € a excessiva preocupacdo com a escrita € a pouca atengao que se dé para o desenvolvimento da leitu- ra. O insucesso escolar é avaliado principalmente em termos do desempenho da crianga na produgo da escrita. A propésito, E. Ferreiro (1983) expoe um caso que mostra nao ser essa uma preocupacao que se limita a0 Brasil. Conta ela que uma profes- sora lamentava que seu filho tivesse aprendido a ler sozinho antes de ingressar na escola, atribuindo 6 ts gop eae a esse fato 0 seu insucesso escolar por nao escre- ‘ito’, . “e acsemnacs maior dos métodos sintéticos, nas escolas brasileiras — seja 0 b +a = ba, o ba + be ‘bi + bo + bu, ou ainda 0 fonico ~, pode tamben ser motivada pela énfase maior dada a atividade escrita, a qual envolve, no infcio da aprenclizagem, ‘uma operacdo basicamente de composi¢ao, embora mais tarde ela possa ser acompanhada complemen tarmente por uma operacdo de decomposicao men- tal do léxico visual ja adquirido . Ora, em uma aprendizagem natural da jeitura ~ ‘co caso da crianga mencionada por Ferreiro ¢ tantas ultras que se auto-alfabetizam —, 0 aprendiz. recorre a estimulos visuais que abundam em seu meio, ¢ ‘através da decomposi¢ao progressiva desses ele- mmentos, vem a inferir as unidades que compoem a ‘escrita de sua lingua, Nao se pode afirmar, pois, que um método que simula a atividade da escrita seja necessariamente 0 indicado para a aquisicio da leitura. ; ; A pritica de grande némero de nossas escola de privilegiar as atividades de escrita, parece fazer supor que a producao segur-se automaticament ee recepgdo. Em outras palavras, se professor ensinar ‘© aluno a escrever, 0 aluno aprenderé automatica- mente a ler. Contudo, 0 exemplo dado por Ferreiro € outros tantos de que temos conhecimento mos: tram que. letura pode ser adquitida independents mente da escrita. Temos ainda 0 caso de proficientes i la, a mesma precupacio. Tr Notsse também, a nivel de pré-escola, Preooao Vejuse, por exemplo, a énfase que se costuma dar & coordenag nos testes de pronto. y yy leitores de uma lingua estrangeira que nada escre- vem nessa lingua, quando o inverso parece impos- sivel. Nao quero dizer com isso que a pratica de produgdo nao possa intervir favoravelmente na ca- pacidade de recep¢io, principalmente levando-se €m conta que 0 ato de escrever exige menos auto- matizagio e mais reflexo metalingitistica. Na verda- de, uma vez iniciado 0 processo da aquisicao da lei- tura € da escrita, parece haver uma interferéncia reciproca, de forma que quanto mais se I melhor se escreve, e quanto mais'se escreve melhor se Ié Voltando ao problema das operacdes de andlise sintese, podemos admitir que ambos os processos estejam complementarmente subjacentes as ativida- des de leitura e escrita Em que medida, porém, a discriminagao visual precisa € um processamento analitico no nivel de unidades menores que a palavra so necessarios para a leitura? Na medida em que o aprendiz desen- volve sua capacidade de se apoiar em estruturas cada vez maiores — em seu conhecimento do mun- do ~, esse tipo de operacio sera cada vez menos a nivel de uniclades grafémicas e silabicas e cada vez mais a nivel de fatias informacionais significativas?. © reconhecimento das formas seré em grande Parte determinado por processos inferenciais ¢ de predicdes ditadas pelo conhecimento lingiistico e extralingtiistico do leitor. O leitor proficiente € capaz de compreender um texto escrito em letra cursiva bem pouco legivel, exatamente porque ele faz uso dessa sua habilidade para ler sem tentar decodificar 2 Para uma melhor compreensio da operago de fatiamento em lel- ‘ura, vide Perineal. (1983), silica teapot Secret ARE tg. 8. cada grafema. Aquele que escreve fluentemente, em escrita cursiva, também nao tem 0 cuidado de dese- nhar todos os tragos distintos de cada letra, contando com a capacidade do leitor de ler pelo significado. ‘As metodologias comumente usadas pouco ex- ploram a capacidade demonstrada pelos auto-alfabe- tizados de extrair significados dos estimulos disponi- veis. A aprendizagem é vista nao como um processo ativo, mas meramente receptivo. Todavia, se obser- varmos as criangas no inicio do aprendizado, verifi- caremos que elas ja fa'zem uso bastante regular de estratégias de inferéncia e muitas jé demonstram uma boa consciéncia metalinguiistica. Relativamente a esse liltimo aspecto, Ferreiro (1977) mostra que as crian- 2s, por volta de seis anos, revelam essa capacidade a0 operarem com segmentos de palavras conheci- das, inferindo a leitura de cadeias de letras resultan- tes de permutas de partes de palavras ja conhecidas*. Os materiais de alfabetizagao, via de regra, in- troduzem gradativamente novas unidades, deixando muito pouco desafio para o aluno*. Todas essas questdes levam-nos a enfatizar que 86 tem sentido discutir métodos de alfabetizacao, mediante uma melhor compreensio das hipoteses ¢ comportamento sobre possiveis concepgdes da crian—. a diante da escrita Antes de passarmos a sintetizar alguns estudos relevantes sobre as possiveis concepgdes da crianga, teceremos algumas consideragdes sobre a natureza 3. Bm portugues, vide estudo de Ana Paulo Goyano (1989. 46 No material para © Mobral desrito em Kato (1978), procurcu-se utilizar como palavistchaves aquelas que no s6 era signiicativas para 0 rmobralense, mas que se prestasem a permula e supressées, de modo a teabalhar com essa capachdade de segmnentagoe iferéncia, que podemos pressupcr no ado, 9 € a evolucao do cédigo escrito’, que, por revelarem &s concepedes do homem sobre ele, podem ser eh Cidativas a respeito de sua concepgio pela crianga, Embora existam muitas lendas tas dna! gem da escrita, os lingiiistas, hoje, partilham de uma crenga comum de que a escrita desenvolveu-se gra- dativamente do pictograma para o ideograma’ e/ou para o fonograma. primeiro tem uma natureza estritamente ic6- nica, isto é, h4 uma relacdo nao arbitraria entre o objeto e sua representagio. Os sinais de trafegos uti- lizados hoje podem ser considerados como exem- plos de uma linguagem pictogrifica. __O ideograma se origina da estilizagao desses pictogramas, de uma simplificacao convencional que converte as desenhos originais em simbolos linguist os, cuja forma passa a ter uma relagao arbitraria com © objetivo ou conceito representado. O ideograma Passa assim a ter também o estatuto de um simbolo de segunda ordem. Além de representar um objeto ou conceito, passa a representar a palavra que repre- senla esse objeto ou conceito, Ora, essa, por defi- nicdo, tem também uma existéncia em termos de sons da lingua. Dondé“o ideograma também ser pronuncidvel’, 5, Pars mies dete cheese asso, (974), e Gelb (1963), Spanos oe aly chama os dis itera de “emasogics 3 slog, em ops 805 sistemas “fonograficos”, que apresentam sons e silabas. ie 7, Para uma lingua cua escrita & ideogrifica, os empréstimos lin- sss contuem um sti robles, vers ems secon de nua em seu valor estat ott dean dee cok ‘lr ectopic lr mere ga, oct en trevese na excita da ing de ge on ada stasis a {elo fonogrifico para representar apenas esses empréstimes, i 10 { 5 i : b Houve também casos de fonetizagio direta dos pictogramas. Os hier6glifos, que eram originari mente pictogrificos, desenvolveram-se em um siste- ma silabico, qual foi apropriado pelos fenicios e depois pelos gregos. Mas, enquanto nas linguas se- mifticas as silabas eram simples ¢ regulares, 0 grego apresentava uma estrutura silabica mais complexa que exigiu a adaptacio dos simbolos emprestados dos fenicios para representar sons individuais — consoantes e vogais*. Foi assim inventado o sistema alfabético?. Sven Ohman" diz que, na verdade, a in- vengao da escrita alfabética € uma “descoberta”, pois, quando 0 homem comegou a usar um simbo- lo para cada som, ele apenas operou consciente- mente com seu conhecimento da organizagio fono- légica de sua lingua © caminho que o homem percorreu em sua his- t6ria para descobrir a escrita reflete-se de forma im- pressionante nas concepgdes da crianga ao adquirir a escrita, Nesse sentido, a crianga parece estar “bio- programada” para percorrer em sua vida 0 mesmo caminho percorrido pelos seus ancestrais através dos tempos, sendo a existéncia das etapas desse percur- so dependente também da existéncia de estimulos ambientais". Passaremos a examinar agora as pesquisas de Ferreiro € Teberosky (1979) € Lavine (1972), com Segundo a Ineratura, os propricsfenicios i usavam alguns de seus simbolos com valor esizamente consonant, '9.£ possive! que o sistema alfabéticofosse, pelo menos de inicio, in- tencionalmente, um sstema de transcigiofonética. 10, Sven Ohman, Professor de Fonética da Universidade de Upsala, Suécia; trabalho apresertado no Intemational Speech Symposium, Kioto, Ja- ‘Po, apud Fronkin e Rodman (1974) 11. Veja Bickerton (1981) para o conceito de “bioprogram” n criangas, cujos resultados foram confirmados no contexto brasileiro por Rego (1982). Ferreiro e Teberosky mostram que nos primei- ros contatos da crianga com textos ilustrados, a crianga ainda nao diferencia da fungao do texto a da figura, achando que esta titima também é lida. A ilustragao é vista com fungio pictografica pela crian- a", Lavine mostra que as criangas, aos trés anos, ja rejeitam figuras e desenhos como escrita. Porém, mesmo depois de passada essa fase pictogrifica, a ctianga atrbui ainda, segundo Ferreiro, um certo va- lor icOnico a escrta. Os sujeitos mais novos dessa pesquisa acreditam que objetos grandes sao repre- sentados por palavras mais longas. Assim, se escre- vermos casa casinba, a crianca achari que € a pri meira que representa 0 conceito da segunda. Nao ha ainda, nessa fase, a descoberta de que a escrita de sua lingua tem uma relacao arbitriria com 0s ob- jetos que ela representa. A crianga ndo atingiu ainda, @ nosso ver, a fase fonogrifica, pois ela nao tem consciéncia de que casinha é mais longa porque a palavra tem mais sons dlo que casa, Ferreiro e Tebe- rely chamam essa etapa de pé-sisbia, Ditamos 1 a crianga esta na fase intermediaria ic tografica ea ideogrifica. ae Quanto aos tragos da escrita, Lavine mostra a importancia da estimulagdo ambiental no desenvol- vimento da percepcio da crianca. Utilizando crian- gas de 3, 4 © 5 anos, ¢ jogando com estimulos de quatro tipos ~ a) figuras, b) ideogramas ¢ desenhos 12 Geb distingue o desenho puro ro do pictograma por este himo ter ntidamente uma funio de registro e comunicacto de informagio, a0 con ttiio do primero, que pode ser uma manifesacio puramente etic. 12 estilizados, c) palavras em escrita hebraica, ed) pala vras em inglés, em tipo tanto de imprensa como 0 cursivo -, Lavine verificou que todas as faixas aceita- ram os estimulos c e d como escrita € rejeitaram os de tipo a. As criancas menores aceitaram ainda os de tipo b. Podemos dizer entao que as criangas meno- res estariam na fase intermediaria entre a ideogréfica ea fonografica, ¢ as maiores jé estariam estritamente dentro da fase fonogrifica. ‘Apés a fase pré-silabica, Ferreiro e Teberosky distinguem trés fases: a silabica, a silabico-alfabética ¢ a alfabética, conforme a crianga atribua a cada simbo- Jo ovvalor de uma silaba, de uma silaba ou de um seg- mento fonético e, finalmente, apenas de um segmen- to fonético. Na verdade, como Ferreiro e Teberosky estio trabalhando com a concep¢ao infantil do que 0 simbolo alfabético representa, em lugar de “fase alfa- bbética” teria sido mais adequado se elas tivessem uti- lizado “fase fonética”, como faz, Lemle (1983) a0 pro- por suas fases hipotéticas da aquisicao da escrita ‘Observa-se nesse material, como quisemos mos- trar, um estreito paralelismo entre as fases da historia da escrita e as fases de desenvolvimento da crianga com reiacao a esse Objeo Para Fronkin e Rodman (4974), uma crianga s6 podera aprender o sistema al- fabético quando cada segmento sonoro de sua lin gua tiver para ela uma realidade psicol6gica. Em ou- tras palavras, a alfabetizacao se tornara possivel ‘quando a crianca tiver consciéncia da relacao simbo- lo grafico e som oral de sua lingua Na pesquisa de Lavine, as criangas j4 revelam essa consciéncia, no momento em que rejeitam se- qiéncias com 0 mesmo sinal € também estimulos com um tnico sinal como exemplos possiveis de » 3 ie escrita, Ora, a variedade e a multiplicidade nao sao caracteristicas da escrita, mas dos signos da propria lingua falada, e, possivelmente, quando a crianca descobre que a escrita nao representa os objetos di- retamente, mas as palavras de sua lingua oral, passa a encaré-las como isomérficas a eles. E importante, neste momento, apontar para 0 fato_ de que embora o alfabeto tenha correspondén- cia simbélica mais a nivel fonémico, a hipétese inici- al do aprendiz, nessa fase, é de que o simbolo grafi- - c0.0u grafema representa o som fisico assim como ele 0 owve. Reflexdes de ordem sociolingtiistica fazem-se necessarias nesse ponto, AS diferencas dialetais pas- sam a constituir um sério problema enquanto a crianga nao descobrir que a relacao entre fala € es- rita nao é direta™, isto 6, que a escrita ndo € uma transcrig2o fonética da fala e que o registro escrito exige um planejamento mais cuidadoso a nivel de unidades maiores do discurso. Criangas que tém o privilégio de ter contato com a lingua escrita antes de irem para a escola, através da leitura que Ihes € feita pelo adulto, ja tém_consciéncia pelo menos dos aspectos discursivos que diferenciam a fala e a escri- ta. Duas criangas podem estar na mesma fase cog- nitiva, mas uma poder enfrentar mais dificuldades que a outra se nao tiver tido a estimulago ambiental de que falamos ou se entre o seu dialeto e a forma ortogrifica e o dialeto prestigiado pela escola hou- ver uma maior distancia. 1, Vide discussio mais detalhada desseaspecto em Abaurre (1983) ¢ Lemle (1978) 14 ails | 4 3 Tendo em vista as caracteristicas do sistema or- togrifico do portugués, Lemle postula, diante dos dados que 0s iniciantes produzem em portugués, quatro fases calcadas nas seguintes hipoteses: a) hi- potese fonética, b) hipsiese de que ha arbitrariedades no sistema ortogrifico, ¢) hipétese de que ha regulari- dades contextuais entre fala e escrita e d) hipétese de ‘que hi regularidades oriundas da morfologia. _ Essas hipéteses io relativas ao cardter fonémico eas convengdes arbitrérias da escrita portuguesa, que nip mantém uma biunivocidade perfeita entre som € grafema. Como sabemds, um mesmo som pode ser representado por mais de um grafema, € um mesmo sgrafera pode representar mais de um som da lingua. ‘© dominio pleno do sistema implica 0 dominio das regularidades e irregularidades nao s6 a nivel grafo- fonol6gico, mas também a nivel grafomorfol6gico. ‘As hipéteses de Lemle foram calcadas sobretudo na escrita produzida por recém-alfabetizados. Da mesma forma, observando esses mesmos alunos, po- der-se-iam fazer reflexdes ¢ teorizagdes a respeito da ‘evolucdo do comportamento em termos da aquisicao gradativa da fluéncia ém leitura. Jé pressupusemos, no inicio deste trabalho, que a crianga faz largo uso. de operagdes de andlise e sintese. O crescimento de seu léxico visual e sua familiaridade com os segmen- tos mais freqentes da lingua, sejam eles morfemas ou nao, liberam 0 aprendiz dessas operacdes, poden- do-se pressupor que © reconhecimento passe a se ‘dar de forma instantinea, como se 0 estimulo presen- te fosse de natureza ideogrifica. Nesse proceso, tem-se, a partir do estimulo visual, uma decodificacao TT. Para maiotes detalhes sobre o processo, vide Kato (1983, b) 15 direta, sem mediagio fonética ou fonolégica. A vo- calizacio e a subvocalizagio deixam de ocorrer. O pequeno leitor comega a usar estratégias mais deduti- vas", fazendo previsdes significativas, coerentes com seu conhecimento lingiistico e extralingitistico. Vimos até aqui que as pesquisas ¢ teorias es- peculativas sobre a aquisicao da escrita supdem eta- pas seqiienciais caracterizadas por diferentes con- cepgdes € por diferentes comportamentos. Mas ha evidéncias também que apontam para a possibilida- de de haver: a) regressdes de comportamentos e b) superposigdes de concepgdes. Assim, uma leitura mais linear e menos preditiva pode ocorrer mesmo em leitores altamente proficientes, quando o grau de novidade do texto ou sua complexidade estrutural diminuem sua legibilidade e exigem, para sua com- preensio, operacdes de anilise-sintese a nivel de unidades menores do que o leitor esti acostumado a utilizar. Ha momentos em que a vocalizagdo ou a subvocalizagao se faz necessaria Dissemos anteriormente que, 4 medida que au- menta o vocabulirio visual do aprendiz, este passa de uma leitura analitico-sintética, de natureza fono- ‘grifica;para uma leitura de cardter ideogritico. Apa rentemente, esse retomo 4 leitura ideogrifica pode- ria ser encarado como regressio de comportamento. Contudo, ao contrario da crianga na fase icénico- ideografica, essa fase posterior mostra que, embora 0 leitor faca uma leitura ideogrifica, esta nao € acom- panhada de uma concepeao ideogrifica da escrita, Em outras palavras, ele tem plena consciéncia de Fai mares dees solves ne psd sags em Kato (1983 a € 1983 b/1984). 16 que 0 estimulos sio decomponiveis em unidades Iingtiisticas menores. Devemos dizer entao que a lei- tura ideogrifica da fase posterior a fotogrifica € um comportamento de nivel lingtistico (do sujeito como usuario da lingua) ea capacidade de segmentar 0 €s- timulo em unidades constituintes € um compor- tamento de nivel metalingiistico (do sujeito como analista do objeto que ele usa). A regressio parece se dar a nivel estritamente da habilidade lingtiistica ¢ nao de capacidade metalingiistica [As sobreposicdes de concepgoes t@m uma evi- déncia na escrita de*palavras pouco familiares, et situagdes de incerteza. Uma crianga, ou até um adulto, ao ter que escrever uma palavra totalmente nova, poder tender a aproximar a escrita da repre- sentacao fonética, mesmo que tenha j4 consciéncia de que nossa escrita nao tem essa natureza estrita, ¢ em outras situagdes consegue escrever respeitando as regularidades contextuais. Em um certo sentido, ‘embora haja aparentemente uma sobreposicao de concepgées, na verdade 0 que ocorre uma regres- ‘so a0 comportamento da fase fonética. ‘Um fendmeno contrario se observa, entretanto, em outras situacdes de incerteza. © aprendiz pode ‘generalizar excessivamente sua nova hipotese, pro- duzindo aquilo que chamariamos tradicionalmente de erros de hipercorrec4o. Tomemos, por exemplo, ‘0 caso de um aprendiz. que observa o som [il de seu dialeto, em situagao dtona, representado grafemica- mente pela letra e. Por extensio, ele podera escrever *previlégio com e, quando aqui a escrita respeita a correspondéncia grafema-som. Vejamos como se ‘deu tal extensdo. Comparem-se a regra do portu- gués (RP) e a regra que o aprendiz.aplica (RA). 7 RP: se uma palavra tem um som [il, em posigao 4tona, ele pode ser ortograficamente representado pore. RA: se uma palavra tem um som [i], em posi¢o 4tona, ele é ortograficamente representado por e. Note-se que RA € muito mais abrangente do que RP, donde podermos dizer que se trata de uma generalizagao excessiva. Pode-se dizer ainda que RA é uma hipétese do aprendiz a respeito da ortografia de sua lingua, que antecede a fase em que ele aprende e usa RP. Setia possivel continuar fazendo mais reflexdes sobre as pesquisas ¢ especulagdes da lingliistica da psicolingiiistica, acerca das concepcées € com- portamentos de criangas em fase de alfabetizagio, mas as que foram feitas aqui parecem set suficientes para voltarmos & questo inicial dos métodos de al- fabetizacao. Enfatizamos, no inicio deste trabalho, a impor- tincia de se compreender as hipéteses sobre apren- dizagem subjacentes a esses métodos. Analisemos cada tipo e vejamos o que a ele subjaz: __ 1. O método global puro supée que a apreen- sio do gstimulo visual se dé:de forma ideografica; sem anilise das partes que 0 compéem. 2. O global analitico-silabico supde que a concepgao da crianga sobre a palavra escrita € que 0s estimulos sio decomponiveis em unidades menores, silébicas, ou que € possivel introduzir a ela tal nogao. 3. O global-analitico-fonémico pressupée ser essa decomposigio possivel de ser feita a nivel fonémico-grafémico. 18 “pee 4, O silébico-sintético supde que a crianga seja capaz de perceber uma entidade mais abstrata que a palavra, a silaba, e a partir de sua representacao grafémica chegar a unidades significativas como a palavra e a frase. 5. 0 fénico-sintético supde que a crianga seja ca- paz de captar unidades sonoras fisicas, menores que a silaba — 0 fone para, a partir de sua representacao grafémica, chegar as unidades significativas. E importante lembrar ainda que, ao ler, a crian- ‘ca tem como estimulo palavras ¢ frases significativas, pelo menos no contexto natural de comunicacio. Para escrever, porém, ela tem que combinar ele- mentos como a letra ou a silaba. © global analitico, nesse sentido, simula melhor aquilo que ocorre naturalmente quando a crianga se defronta com 0 universo visual que a cerca. A per- cepgio da crianga nao parte de segmentos isolados. Ela chega a eles através da discriminacao dos tracos distintos dos estimulos que ela observa. Assim, 20 observar 0 antincio da Coca-Cola, ela poder vir a segmentar a silaba co, dada a sua dupla ocorréncia, e, na comparagao do co com o ca, poder vir a dife- renciar 0 a do 0 € a isolar 0 ¢, € assim por diante. Uma vez percebidas essas unidades, que em si nao tém significado, elas poderdo ser combinadas para se chegar a entidades significativas. De qual- quer forma, para uma alfabetizagao eficaz, a escola deverd assegurar-se de que a crianca esteja em con- digdes de cognitivamente aprender essas unidades. Nao pretendo encerrar aqui com solugdes, mas apenas expressar minha convic¢ao de que muito do insucesso escolar poderia ser evitado se, em lugar 19 dena da obsessio pelo “método”, a escola procurasse ser um verdadeiro laboratério de observagao do que ‘corre no processo da aprendizagem, abordando a ctianga como um sujeito ativo desse processo. O treinamento do professor ndo consistiria em mera- mente Ihe suprir conjuntos de técnicas e procedi- mentos, isto é, verdadeiras “receitas”, mas sobretudo em tomé-lo consciente da natureza do objeto que vai ensinar e capaz de observar © processo de sua aprendizagem, rele intervindo de mancira a melhor ajudar os seus aiunos 20 ob

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