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POEMAS SOBRE FOTOS DAS CRIANÇAS DO HOLOCAUSTO

AINDA A TEMPO DA INFÂNCIA


© J.T.Parreira

Foto de crianças sobreviventes da ala infantil--Barraco 66--do campo de Buchenwald, logo após a
libertação do mesmo pelos Aliados. Alemanha, foto tirada após 11 de abril de 1945.

BARRACA 66

Esperavam que a voz fosse suave


as palavras novas
num toque de pluma nos ouvidos
nos olhos
que não estão assustados
O sorriso começa agora a dar um ar
das suas asas, um pássaro
novo
deixa alegres vestígios sobre a neve.
Logo após a libertação crianças sobreviventes do campo de Auschwitz saem das barracas. Foto
tirada na Polônia, depois de 27 de janeiro de 1945.

A LIBERTAÇÃO

A neve
que caía como as plumas
de um céu assustado
era um toque suave nos cabelos
nos rostos e nas fechadas mãos
ao frio
era a primeira voz de amor
a neve, no silêncio
branco que se ouvia.

Órfãos judeus alemães chegam à estação de trem de Marselha para seguir viagem rumo à área do
Mandato Britânico denominada Palestina, como parte da Aliyah Bet (imigração "ilegal"). Marselha,
França, 25 de março de 1948.
VIRAGEM

No ano seguinte àquele em que nasci, órfãos


judeus chegavam a Marselha, um salto
do comboio para um barco proibido
que à força de nafta aportaria
à Palestina
todos estavam vivos ilegais
e com os pés firmes como punhos
com os olhos atados às malas
vulneráveis.

Deportação de crianças judias do gueto de Lodz, Polônia, durante a ação "Gehsperre" (toque de
recolher), setembro de 1942.

A morte não deveria ser obrigatória


em marcha
nestes pequenos pés
Uma fila de olhos sem regresso
pequenas dimensões
onde só deveria estar a alegria
vão
sem reparar que é enganosa
a sua infância tranquila.
Crianças comendo nas ruas do gueto. Varsóvia, Polônia, entre 1940 e 1943.
— United States Holocaust Memorial Museum

LÁZAROS

Crianças comendo as ruas do gueto


o inverno
vai abatendo a floresta
das pernas que percorrem
sinistras
as sombras do medo
Na imensa área da tijela
uma só migalha
que não pára.
Dois irmãos posando para uma fotografia de família no gueto de Kovno. Um mês depois, eles
foram deportados para o campo de Majdanek. Kovno, Lituânia, fevereiro de 1944.

DUAS ESTRELAS

Duas estrelas apagam


o brilho dos olhos, o branco
é quase intenso, fere
como fumo e cinza
nosso olhar desprevenido
Duas estrelas entram
pelas janelas da minha casa
e aí estremecem a água dos meus olhos.
Crianças judias com tigelas de sopa no gueto de Varsóvia. Varsóvia, Polônia, por volta de 1940

A TIJELA DA SOPA

Uma sopa de brancura fria


espera
que um retrato, sem dor ainda
se revele eterno, todo
o retrato é assim
preserva olhos discretos
e outros olhos mudos
abertos
que por uma vez percorrem
todas as distâncias
no meu corpo.
Membros de um Einsatzkommando, Esquadrão Móvel de Extermínio, momentos antes de
covardemente assassinarem um menino judeu pelas costas. Os corpos de sua família, mortos por
aqueles monstros, estão caídos à sua frente. Dia 4 de julho de 1943.
— Dokumentationsarchiv des Oesterreichischen Widerstandes

O OLHAR

Com o olhar resolvido


a não ver
o olho da mira, o ponto
da mira da máscara do Mal
que virá detrás, olha
em frente
à distância dos pés
a morte que estava
reunindo as famílias.

Chegada de um carregamento de judeus holandeses no gueto de Theresienstadt. Tchecoslováquia,


fevereiro de 1944.
A CHEGADA

Para os olhares bárbaros


que soltam a água fria
como um gume de lâmina
um abismo
indiferente ao medo
e à fadiga
Reúnem-se
nas malas folhas com rostos
molduras inteiras, roupa gasta
e um candelabro
com um braço partido
vidas que já nem pertencem
ao passado.

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